Data da publicação:
Acordão - TST
Alberto Bastos Balazeiro - TST
SERVENTE RECEBERÁ ADICIONAL DE INSALUBRIDADE ACIMA DO PREVISTO EM CONVENÇÃO COLETIVA
RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. SERVENTE. DIFERENÇAS DE ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PAGAMENTO DO ADICIONAL EM GRAU MÁXIMO. SÚMULA 448, II, DO TST. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA DE PAGAMENTO EM GRAU MÉDIO. ANÁLISE DOS ARTS. 611-A, XII E 611-B, XVII E XVIII, DA CLT. TEMA 1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA
1. A controvérsia diz respeito à possibilidade de enquadramento das atribuições da reclamante na atividade tipificada como insalubre em grau máximo (40%), nos termos do anexo 14 da NR 15 e da Súmula 448/TST, tendo em vista a previsão normativa de que a composição salarial da reclamante está acrescida de adicional de insalubridade em grau médio (20%).
2. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a limpeza e coleta de lixo de sanitários, em locais de grande circulação de pessoas, devem ser enquadradas como atividade insalubre (em grau máximo), nos termos da Súmula 448, II, do TST.
3. O STF no julgamento do ARE 1121633 (Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral) fixou a tese jurídica de que "São constitucionais os acordos e convenções coletiva que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis", excepcionando, portanto, os direitos absolutamente indisponíveis. Assim, a regra geral é de validade das normas coletivas, ainda que pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas.
4. Infere-se do conceito de direitos absolutamente indisponíveis, a garantia de um patamar civilizatório mínimo, diretamente ligado à dignidade da pessoa humana e ao conceito de trabalho decente, e que, portanto, não podem ser flexibilizados.
5. Assim, muito embora a CLT assegure a prevalência do negociado sobre o legislado, o enquadramento das atividades tipificadas como insalubres deve sempre ter em vista o princípio da dignidade da pessoa humana em conjunto com a necessidade de garantir segurança, higidez e saúde do empregado (arts. 611-A, XII e 611-B, XVII e XVIII, da CLT), constituindo, portanto, matéria de ordem pública, nos termos do art. 7º, XXIII, da Constituição da República, insuscetível de negociação coletiva.
6. Logo, a existência de norma infraconstitucional que expressamente veda a redução do adicional de insalubridade (art. 611-B, XVII e XVIII, da CLT), ao fundamento de que são normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, coaduna-se e faz incidir a exceção prevista no Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral do STF, por tratar-se de direito absolutamente indisponível.
Recurso de revista de que não se conhece. (TST-RR-401-40.2020.5.12.0001, Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 28/04/2023)
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-401-40.2020.5.12.0001, em que é Recorrente ORBENK ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. e é Recorrida SILVIA ROTTA.
Irresignada, a reclamada interpõe recurso de revista, buscando reformar a decisão proferida pelo Tribunal Regional no tocante aos seguintes temas: "Adicional de insalubridade". Aponta ofensa a dispositivos de lei, da Constituição da República, bem como transcreve arestos para confronto de teses (fls. 905/932).
O recurso foi admitido mediante o despacho de fls. 975/978.
Não foram oferecidas contrarrazões.
Dispensado o Parecer do Ministério Público do Trabalho (art. 95 do RITST).
É o relatório.
V O T O
Trata-se de recurso interposto contra acórdão publicado após a vigência da Lei nº 13.015/2014 (art. 896, § 1º-A, da CLT) e da Lei nº 13.467/2017 (demonstração prévia de transcendência da causa, conforme estabelecido nos artigos 896-A da CLT e 246 e 247 do Regimento Interno desta Corte Superior).
A controvérsia dos autos diz respeito ao tema "Adicional de Insalubridade. Previsão em Norma Coletiva".
O STF reconheceu a repercussão geral da questão alusiva à validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente (Tema 1046, leading case ARE 1121633).
Assim, reconheço a transcendência política, nos termos do art. 896-A, II, da CLT.
Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade do recurso de revista, prossigo no exame dos pressupostos específicos, nos termos do art. 896 da CLT.
1. CONHECIMENTO
1.1. SERVENTE. DIFERENÇAS DE ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PAGAMENTO DO ADICIONAL EM GRAU MÁXIMO. SÚMULA 448, II, DO TST. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA DE PAGAMENTO EM GRAU MÉDIO. TEMA 1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF
O Tribunal Regional deu parcial provimento ao recurso interposto pela reclamante, sob os seguintes fundamentos, transcritos nas razões do recurso de revista, a teor do que dispõe o art. 896, § 1º-A, I, da CLT:
"Salienta-se que apesar de o Juiz não estar adstrito ao laudo pericial para a formação do seu convencimento, a conclusão técnica deve prevalecer quando ausentes elementos nos autos que a infirmem (CPC, art. 479; CLT, art. 195 da CLT). E nas condições em que o serviço era prestado no caso em comento, resulta comprovada a presença da insalubridade em grau máximo em face do contato da trabalhadora com o lixo dos banheiros, bem assim pela limpeza diária realizada nos mesmos.
Em tal contexto probatório, embora no exercício do mister de servente de limpeza, no qual a trabalhadora limpa os banheiros e recolhe o lixo, não haja identidade com atividades realizadas em contato com lixo urbano, em tanques ou galerias de esgotos, assentada resulta a diretriz jurisprudencial de que inexistindo prova da utilização das instalações sanitárias de forma restrita e por grupo conhecido e regular de pessoas (situação na qual não se enquadra a ré, porque os locais de trabalho em que a autora desempenhou suas atividades denotam evidente grande fluxo/circulação de pessoas que utilizam os banheiros - creche/HEMOSC/Câmara de vereadores), o adicional de insalubridade é devido.
(...)
Em igual direção a Súmula TST nº 448, II:
ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. [...] II – A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/1978 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano.
De se ressaltar, outrossim, que a Súmula retrocitada (nº 448, II do TST) apenas uniformizou o entendimento segundo o qual a higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação e a respectiva coleta de lixo se enquadram na hipótese prevista no Anexo 14 da NR- 15, não havendo falar que o verbete em questão teria "criado" o direito do adicional de insalubridade, inexistindo, nem em tese, violação ao art. 8º, § 2º da CLT.
(...)
Não obstante a conclusão dissertada, merece destaque o fato de que as normas coletivas incidentes no caso estabelecem a composição salarial da obreira já acrescida de adicional de insalubridade em grau médio (20%), como se denota, por exemplo, da cláusula terceira da CCT 2015/2015 (ID. c7deb85, pág. 4, "q"), sendo cabível a aplicação parcial, na hipótese (em relação às correlatas a partir de 11-11- 2017), do entendimento disposto no art. 611-A, XII, da CLT (introduzido pela Lei n. 13.467/2017), que expressamente autoriza o enquadramento do grau de insalubridade mediante acordo coletivo, inclusive com prevalência sobre a Lei, de modo a prestigiar a composição coletiva.
(...)
Logo, partindo da premissa de que a ré quitava o adicional de insalubridade em grau médio por toda a contratualidade, em respeito à cláusula convencional acima referida e correlatas (CCTs 2016 e 2017 - ID. e2a39ff e ss.), e considerando a declaração da prescrição das eventuais verbas devidas anteriormente a 03-06-2015 (sentença - ID. fc43587, fl. 768), é devido o pagamento da diferença do adicional (médio para máximo), no período efetivamente laborado pela autora, compreendido entre o marco prescricional, 03- 06-2015, e 10-11-2017 (que precedeu a vigência da Lei n. 13.467/2017).
Dou provimento parcial para condenar a ré ao pagamento da diferença entre o adicional de insalubridade devido (grau máximo 40%) e o percebido pela autora (grau médio 20%), no período efetivamente laborado, compreendido entre 03-06-2015 e 10-11-2017, tendo-se como base de cálculo o salário mínimo (Súmula nº 48 deste Eg. Regional), com reflexos em aviso prévio, férias acrescidas de um terço constitucional, gratificação natalina, FGTS e multa de 40%. (grifos nossos)" (fls. 907/910).
A reclamada pretende a reforma do julgado. Sustenta que a reclamante sempre recebeu o adicional de insalubridade corretamente em grau médio, conforme Convenção Coletiva de Trabalho da categoria, não tendo que se falar no pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo nos primeiros dez meses do contrato de trabalho. Alega inaplicabilidade da Súmula 448 do TST. Aponta violação aos arts. 5°, II, e 7º, XXVI, da Constituição da República, bem como colaciona arestos para confronto de teses.
Inicialmente, nas causas sujeitas ao procedimento sumaríssimo, somente será admitido recurso de revista por contrariedade a súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho ou a súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal e por violação direta da Constituição da República, nos termos do art. 896, § 9º, da CLT e da Súmula 442 do TST.
A controvérsia diz respeito à possibilidade de enquadramento das atribuições da reclamante na atividade tipificada como insalubre em grau máximo (40%), nos termos do anexo 14 da NR 15, tendo em vista a previsão normativa de que a composição salarial da reclamante está acrescida de adicional de insalubridade em grau médio (20%).
Extrai-se dos autos que a reclamante, contratada pela reclamada para a prestação de serviços como servente, trabalhava na limpeza de banheiros de uso público e coletivo de local de grande circulação, assim como na respectiva coleta de lixo.
Nos termos do art. 189 da CLT somente são consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que por sua natureza, condições ou métodos de trabalho exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância delimitados pelo Ministério do Trabalho.
A NR-15, Anexo 14, da Portaria 3.214/78 enquadra como atividade insalubre de grau máximo aquela em contato permanente com lixo urbano, o qual se equipara aos banheiros públicos, como no caso dos autos.
Este Tribunal Superior, por sua vez, firmou o entendimento no sentido de que a limpeza de instalações sanitárias de uso público ou coletivo enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, por se equiparar ao lixo urbano.
Eis o teor da Súmula 448, II, do TST:
SUM-448 ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 4 da SBDI-I com nova redação do item II) - Res. 194/2014, DEJT divulgado em 21, 22 e 23.05.2014
II – A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano.
Nesse sentido, são os seguintes julgados desta Corte:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEI 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. AUXILIAR DE SERVIÇOS GERAIS. LIMPEZA DE BANHEIROS E RECOLHIMENTO DE LIXO EM HOSPITAL PÚBLICO. AMBIENTE DE GRANDE CIRCULAÇÃO. SÚMULA 448, II, DO TST. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Reconhecida a transcendência da causa e demonstrada provável contrariedade à Súmula 448, II, do TST, deve ser processado o recurso de revista para melhor exame da matéria. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. LEI 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. AUXILIAR DE SERVIÇOS GERAIS. LIMPEZA DE BANHEIROS E RECOLHIMENTO DE LIXO EM HOSPITAL PÚBLICO. AMBIENTE DE GRANDE CIRCULAÇÃO. SÚMULA 448, II, DO TST. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Esta Corte Superior pacificou o entendimento de que a limpeza e coleta de lixo de sanitários, em locais de grande circulação de pessoas, como no caso, hospital, devem ser enquadradas como atividade insalubre, nos termos da Súmula n.º 448, II, do TST. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10500-32.2021.5.03.0180, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 09/08/2022).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO A ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. GRAU MÁXIMO. HIGIENIZAÇÃO E COLETA DE LIXO DE INSTALAÇÕES SANITÁRIAS HOSPITALARES. SÚMULA N.º 448, II, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA NÃO RECONHECIDA. 1. Cuida-se de controvérsia acerca do pagamento do adicional de insalubridade a empregada que efetuava a higienização e coleta de lixo de instalações sanitárias de uso público de grande circulação. No caso dos autos, o Tribunal Regional manteve a sentença por meio da qual a reclamada fora condenada ao pagamento do adicional de insalubridade à demandante, em grau máximo, sob o fundamento de que , " no exercício de suas atividades, a autora higienizou vestiários e diversos banheiros, bem como recolheu o lixo desses locais (ID. d4449d4 - Pág. 6 e 7) ". Destacou, ainda, que o perito, " em resposta aos quesitos, [...] esclareceu que tais banheiros eram frequentados por centenas de pessoas (ID. d4449d4 - Pág. 14 e 15, item 10), cujo público é composto de profissionais da saúde, prestadores de serviços em geral, pacientes, visitantes e acompanhantes (ID. d4449d4 - Pág. 21, item 8) ". 2. Constatado o preenchimento dos demais requisitos processuais de admissibilidade, o exame do Recurso de Revista sob o prisma do pressuposto de transcendência revelou que: a) não há falar em transcendência política da causa, na medida em que o acórdão recorrido revela consonância com o disposto na Súmula n.º 448, II, deste Tribunal Superior; b) não se verifica a transcendência jurídica , visto que ausentes indícios da existência de questão nova acerca da controvérsia ora submetida a exame, mormente diante da plena vigência da Súmula n.º 448, II, desta Corte superior, a obstaculizar a pretensão recursal; c) não identificada a transcendência social da causa, visto que não se cuida de pretensão recursal formulada em face de suposta supressão ou limitação de direitos sociais assegurados na legislação pátria; e d) não demonstrada a transcendência econômica , visto que o valor arbitrado à condenação não se revela elevado ou desproporcional ao pedido formulado e deferido na instância ordinária. 3. Configurado o óbice relativo ao não reconhecimento da transcendência da causa quanto ao tema sob exame, resulta inviável o processamento do Recurso de Revista. 4. Agravo de Instrumento não provido" (AIRR-10696-27.2020.5.03.0183, 6ª Turma, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 08/04/2022).
"I [...] 2 - LIMPEZA DE BANHEIROS COLETIVOS. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. A Corte de origem concluiu que reclamante executava a retirada de lixo e a limpeza de banheiros usados por diversas pessoas, exercendo a função de auxiliar de limpeza, nas dependências do Hospital São Pedro (de 16/03/2009 a 12/04/2008 e de 18/08/09 a 20/12/2009), na Secretaria da Agricultura (de 01/04/2009 a 30/06/2009), e no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (de agosto/10 a novembro/10), enquadrando-as como instalações sanitárias de uso público ou coletivo. Desse modo, o Tribunal Regional, ao concluir ser devido o pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo, diante da premissa de que a reclamante laborava na higienização de instalações sanitárias de uso coletivo, e a respectiva coleta de lixo, comunga do entendimento consubstanciado na Súmula 448, II, do TST. Recurso de revista não conhecido. [...]" (ARR-1363-43.2011.5.04.0020, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 17/12/2021).
"RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO - LIMPEZA E HIGIENIZAÇÃO DE SANITÁRIOS DE USO PÚBLICO EM HOSPITAL - CARACTERIZAÇÃO - TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Tratando-se de recurso de revista interposto em face de decisão regional que se mostra contrária à jurisprudência consolidada desta Corte, revela-se presente a transcendência política da causa (art. 896-A, §1º, inciso II, da CLT), a justificar o prosseguimento do exame do apelo. Na questão de fundo, tem-se que o TST já pacificou entendimento no sentido de que " A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano " (Súmula/TST nº 448, II). Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional consignou que, embora a reclamante trabalhasse realizando a limpeza de banheiros de grande circulação pessoas (cerca de 400), em ambiente hospitalar, não é devido o adicional de insalubridade, visto que a atividade realizada não se assemelha à coleta e industrialização de lixo urbano. Dessa forma, verifica-se que a decisão do Tribunal Regional está em dissonância com a Súmula nº 448, II, do TST, valendo acrescentar que a introdução do referido item II na Súmula nº 448 foi realizada com o propósito de fazer a distinção da diretriz contida no então item II da Orientação Jurisprudencial nº 4 da SBDI/TST, no sentido de que a limpeza de escritórios não daria ensejo ao adicional de insalubridade. A exceção a tal exegese, atualmente, conforme se extrai do verbete sumular, dá-se apenas quando a atividade de higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo ocorre em locais com grande circulação de pessoas, em sentido estrito, assim compreendidos grandes empresas, shoppings, grandes escolas públicas ou particulares etc. No presente caso, se observa claramente que a trabalhadora se ocupava da limpeza de banheiros, em ambiente de grande circulação de pessoas, sendo devido, portanto, o referido adicional. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1708-26.2017.5.12.0036, 7ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 04/06/2021).
"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVIMENTO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. GRAU MÁXIMO. LIMPEZA DE BANHEIRO DE USO COLETIVO EM HOSPITAL. A contrariedade à Súmula 448, II, do TST encoraja o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. GRAU MÁXIMO. LIMPEZA DE BANHEIRO DE USO COLETIVO EM HOSPITAL. As atividades de limpeza de banheiros de uso coletivo em hospital e o manuseio de lixo deles oriundo, para além do que disciplina o item II da Súmula 448/TST, enquadram-se no Anexo 14 da NR 15 da Portaria nº 3.214 do Ministério do Trabalho e Emprego. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10741-33.2018.5.03.0108, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 19/06/2020).
Na hipótese, consta dos autos que a reclamante recebia adicional de insalubridade no percentual de 20%, conforme ajustado em norma coletiva, a saber:
"Não obstante a conclusão dissertada, merece destaque o fato de que as normas coletivas incidentes no caso estabelecem a composição salarial da obreira já acrescida de adicional de insalubridade em grau médio (20%), como se denota, por exemplo, da cláusula terceira da CCT 2015/2015 (ID. c7deb85, pág. 4, ‘q’), sendo cabível a aplicação parcial, na hipótese (em relação às correlatas a partir de 11-11-2017), do entendimento disposto no art. 611-A, XII, da CLT (introduzido pela Lei n. 13.467/2017), que expressamente autoriza o enquadramento do grau de insalubridade mediante acordo coletivo, inclusive com prevalência sobre a Lei, de modo a prestigiar a composição coletiva.
Recordo que a autora foi admitida nos quadros da ré em 05-03-2015 e dispensada em 25-09-2018.
Logo, partindo da premissa de que a ré quitava o adicional de insalubridade em grau médio por toda a contratualidade, em respeito à cláusula convencional acima referida e correlatas (CCTs 2016 e 2017 - ID. e2a39ff e ss.), e considerando a declaração da prescrição das eventuais verbas devidas anteriormente a 03-06-2015 (sentença - ID. fc43587, fl. 768), é devido o pagamento da diferença do adicional (médio para máximo), no período efetivamente laborado pela autora, compreendido entre o marco prescricional, 03-06-2015, e 10-11-2017 (que precedeu a vigência da Lei n. 13.467/2017)" (fls. 851).
Portanto, na hipótese, inexiste controvérsia sobre a caracterização das condições de trabalho da reclamante (servente – atuava na limpeza de banheiros de uso público e coletivo de local de grande circulação, assim como na respectiva coleta de lixo) como insalubre.
Logo, ultrapassada esta questão, verifica-se que o STF no julgamento do ARE 1121633 (Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral), fixou a tese jurídica de que "São constitucionais os acordos e convenções coletiva que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis".
A tese do STF é de que, excepcionando os direitos absolutamente indisponíveis, a regra geral é de validade das normas coletivas, ainda que pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas.
O Ministro Alexandre Ramos conceitua direitos absolutamente indisponíveis como:
"A conclusão a que chego é da possibilidade da negociação coletiva flexibilizar, reduzir, alterar ou retirar direitos trabalhistas, como regra geral, da qual são exceções os direitos absolutamente indisponíveis, assim considerados aqueles constantes nas normas constitucionais fechadas e/ou proibitivas, nas normas internacionais do trabalho, desde que autoexecutáveis e nas normas infraconstitucionais que expressamente vedam ou limitam a negociação coletiva, como o artigo 611-B da CLT. A excepcionalidade das normas restritivas repousa no princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva e na adoção do termo ‘exclusivamente’ no caput do art. acima referido. Se a Constituição, desde 1988, já proclamava o ‘reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho’ (artigo 7º, XXVI), de forma a elevar a negociação coletiva como a melhor e mais democrática forma de pacificação dos conflitos coletivos de trabalho e de arranjos setoriais de atividades econômicas e profissionais, foi com a fixação de tese no Tema 1.046 da repercussão geral que tal dispositivo passa a ganhar maior protagonismo[1].
Assim, infere-se do conceito de direitos absolutamente indisponíveis, a garantia de um patamar civilizatório mínimo, diretamente ligado à dignidade da pessoa humana e ao conceito de trabalho decente (segurança, higidez e saúde) e que, portanto, não podem ser flexibilizados.
A hipótese dos autos trata de norma coletiva que reduz o percentual do adicional de insalubridade quando configurado o grau máximo (Súmula 448, II, do TST).
A CLT no art. 611-A, XII dispõe que "A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: (...) XII – enquadramento do grau de insalubridade".
Verifica-se do art. 611-B, XVII e XVIII, da CLT que:
"Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
(...)
XVII – normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;
XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;"
Observa-se, portanto, que o inc. XII do art. 611-A ao possibilitar redução do percentual do adicional de insalubridade, por norma coletiva, ofende a saúde do empregado pela exposição maior em ambientes nocivos, submetendo-o a condições degradantes em contrariedade aos incs. XVII e XVIII do art. 611-B que proíbe negociação coletiva sobre direitos que visam à segurança, higidez e saúde do empregado.
A corroborar esta tese, cita-se Noemia Reis Martins de Mendonça, que assinala:
"É visível que direitos trabalhistas podem ser profundamente afetados nas futuras negociações ou acordos, pois os incisos do artigo 611-A trata de pontos sensíveis para os trabalhadores, tais como: jornada de trabalho, intervalo de descanso, regime de trabalho, insalubridade, descanso semanal, remuneração entre outros. Assim, ao analisar de forma global o presente artigo, concluímos que este vem a ferir, na sua essência, o princípio da dignidade da pessoa humana, pois, o caput, inicialmente, nos remete a entender que apenas o princípio da legalidade ou da reserva legal está sendo afrontado, mas, ao nos deslocarmos para os incisos do artigo encontramos as mais variadas possibilidades de transgressões ao trabalhador"[2].
Assim, muito embora a CLT assegure a prevalência do negociado sobre o legislado, deve-se considerar o princípio da dignidade da pessoa humana em conjunto com a necessidade de garantir segurança, higidez e saúde do empregado, constituindo, portanto, matéria de ordem pública (art. 7º, XXIII, da Constituição da República), insuscetível de negociação coletiva.
Logo, a existência de norma infraconstitucional que expressamente veda a redução do adicional de insalubridade (art. 611-B, XVII e XVIII, da CLT), ao fundamento de que são normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, coaduna-se e faz incidir a exceção prevista no Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral do STF, por tratar-se de direito absolutamente indisponível.
Diante de todo o exposto, a decisão do Tribunal Regional de que é devido o pagamento das diferenças do adicional de insalubridade de grau médio para grau máximo não ofende o art. 7º, XXVI, da Constituição da República (art. 896, § 9º, da CLT e da Súmula 442 do TST).
Por fim, o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da Constituição da República, tem caráter genérico, o que impede a configuração de ofensa de natureza direta e literal ao citado dispositivo, conforme entendimento firmado na Súmula 636 do STF.
Nestes termos, NÃO CONHEÇO do recurso de revista.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista.
Brasília, 18 de abril de 2023.
ALBERTO BASTOS BALAZEIRO
Ministro Relator
[2] https://www.conjur.com.br/2022-set-30/alexandre-luiz-ramos-direito-absolutamente-indisponivel
Instituto Valentin Carrion © Todos direitos reservados | LGPD Desen. e Adm by vianett