Data da publicação:
Acordão - TST
Maurício Godinho Delgado - TST
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . 1. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONDUTA NEGLIGENTE DA RECLAMADA. EMPRESA DE GRANDE PORTE DO SETOR DE SUPERMERCADOS. AUSÊNCIA DE MEDIDAS EFICAZES DE VERIFICAÇÃO DA VALIDADE DOS PRODUTOS EM COMERCIALIZAÇÃO. TRANSFERÊNCIA INDEVIDA DA RESPONSABILIDADE À EMPREGADA. PRISÃO EM FLAGRANTE DA RECLAMANTE. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO CRIMINAL. DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, DA INVIOLABILIDADE PSÍQUICA (ALÉM DA FÍSICA) DA PESSOA HUMANA, DO BEM-ESTAR INDIVIDUAL (ALÉM DO SOCIAL) DO SER HUMANO, TODOS INTEGRANTES DO PATRIMÔNIO MORAL DA PESSOA FÍSICA. 2. VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SÚMULA 297/TST.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONDUTA NEGLIGENTE DA RECLAMADA. EMPRESA DE GRANDE PORTE DO SETOR DE SUPERMERCADOS.
A conquista e afirmação da dignidade da pessoa humana não mais podem se restringir à sua liberdade e intangibilidade física e psíquica, envolvendo, naturalmente, também a conquista e afirmação de sua individualidade no meio econômico e social, com repercussões positivas conexas no plano cultural - o que se faz, de maneira geral, considerado o conjunto mais amplo e diversificado das pessoas, mediante o trabalho e, particularmente, o emprego. O direito à indenização por dano moral encontra amparo no art. 5º, V e X, da Constituição da República; e no art. 186 do CCB/2002, bem como nos princípios basilares da nova ordem constitucional, mormente naqueles que dizem respeito à proteção da dignidade humana, da inviolabilidade (física e psíquica) do direito à vida, do bem-estar individual (e social), da segurança física e psíquica do indivíduo, além da valorização do trabalho humano. O patrimônio moral da pessoa humana envolve todos esses bens imateriais, consubstanciados, pela Constituição, em princípios fundamentais. Afrontado esse patrimônio moral, em seu conjunto ou em parte relevante, cabe a indenização por dano moral deflagrada pela Constituição de 1988. Para a caracterização do dano moral, é preciso a conjugação de três requisitos: a comprovação do dano; nexo de causalidade entre a conduta do empregador e o dano sofrido; e a culpa (tendo o art. 927 do Código Civil introduzido, excepcionalmente, a responsabilidade objetiva, sem culpa, nas situações mais raras aventadas por aquela regra legal). Na hipótese dos autos, foi evidenciada a conduta negligente da Reclamada, empresa de grande porte no setor de hipermercados, que, ao deixar de adotar medidas eficazes de verificação da validade dos produtos em comercialização, transferiu para a obreira obrigação que não estava exclusivamente na sua esfera pessoal de controle, impingindo-lhe inegável sofrimento - pois, da conduta que foi atribuída à empregada, decorreu sua prisão em flagrante, angústia que, segundo o TRT, "tem perdurado ao longo dos anos, ao figurar como Ré em processo criminal, evento ensejador de mácula à idoneidade moral, com inegável constrangimento e prejuízos no meio familiar, social e profissional, e cuja delonga na tramitação do processo criminal, tampouco lhe propicia a superação desse fato marcante e prejudicial, bastante para afetar intensamente o comportamento e o bem estar psíquicos". Asseverou o Tribunal Regional ainda que, "a despeito da imputação patronal de responsabilidade à reclamante, por ser a autoridade máxima da loja, atuando como longa manus do empregador, certo é que a empregadora manteve o contrato de trabalho por mais de cinco anos, considerando que a dispensa sem justa causa ocorreu em 10.4.2015 (fls. 17), o que infirma a tese defensiva de poder ser atribuída à Reclamante a culpa pela presença de produtos em comercialização com data de validade vencida". Dos dados fáticos transcritos pelo Tribunal Regional, verifica-se que não ficou demonstrada a negligência direta da obreira na verificação da validade dos produtos comercializados na Reclamada, pois tal vistoria dependeria de um sistema mais complexo de monitoramento, escapando à possibilidade de inspeção individual e pessoal das mercadorias. Não poderia a empresa transferir à Reclamante os riscos do empreendimento (art. 2º, caput, da CLT), imputando-lhe um ato falho grave de responsabilidade do próprio ente patronal, que não respeitou regras básicas de avaliação da higidez dos produtos postos à venda. Assim, diante da submissão da Reclamante a situação que atentou contra a sua dignidade, a sua integridade psíquica e o seu bem-estar individual - bens imateriais que compõem seu patrimônio moral protegido pela Constituição -, impõe-se a manutenção da condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais, conforme autorizam o inciso X do art. 5º da Constituição Federal e os arts. 186 e 927, caput, do CCB/2002. Ademais, diante do quadro fático delineado no acórdão regional, qualquer conclusão em sentido diverso dependeria do revolvimento de fatos e provas, procedimento vedado nesta instância recursal, conforme o disposto na Súmula 126/TST. Agravo de instrumento desprovido. (TST-Ag-AIRR-1000602-37.2017.5.02.0053, 3ª Turma, rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, julgado em 24/8/2022)
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