TST - INFORMATIVOS 2021 246 - de 18 a 29 de outubro

Data da publicação:

Seção Especializada em Dissídios Coletivos

Katia Magalhães Arruda - TST



Dissídio coletivo de natureza jurídica. Interpretação dos arts. 1º e 13 da Lei nº 9.719/98 e 32, 33, 39, 41 e 43 da Lei nº 12.815/13. Gerenciamento, intermediação e fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso. Competência exclusiva do Órgão Gestor de Mão de Obra - OGMO.



DISSÍDIO COLETIVO JURÍDICO AJUIZADO PELA FENOP. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1º E 13 DA LEI Nº 9.719/98, E, 32, 33, 39, 41 E 43 DA LEI 12.815/13. ÓRGÃOS GESTORES DE MÃO DE OBRA – OGMO. ATRIBUIÇÃO EXCLUSIVA PARA GERIR E INTERMEDIAR O FORNECIMENTO DE MÃO DE OBRA DE TRABALHADOR AVULSO. A Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP ajuizou dissídio coletivo de natureza jurídica, postulando a interpretação dos arts. 1º e 13 da Lei 9.719/9, e 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, a fim de que seja declarada a competência exclusiva do OGMO para gerir e intermediar o fornecimento de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso. O art. 241 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho estabelece que: “Os dissídios coletivos podem ser: (...) II - de natureza jurídica, para interpretação de cláusulas de sentenças normativas, de instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções coletivas, de disposições legais particulares de categoria profissional ou econômica e de atos normativos”. O dissídio coletivo de natureza jurídica é uma ação declaratória, que tem como finalidade a interpretação de normas coletivas preexistentes (dispositivo legal, convencional ou regulamentar), que vigoram no âmbito das relações de trabalho ocorridas entre as categorias profissional e econômica de um determinado ramo de atividade. Dentro desse limite normativo é que deve ser apreciada esta demanda. Verifica-se que a suscitante (FENOP) busca o provimento judicial, para interpretação de disposições legais particulares atinentes à categoria profissional dos portuários avulsos. Ou seja, a demanda tem como objeto normas de caráter não genérico, o que se harmoniza com a diretriz revelada na Orientação Jurisprudencial nº 7 da SDC do TST (Não se presta o dissídio coletivo de natureza jurídica à interpretação de normas de caráter genérico, a teor do disposto no art. 313, II, do RITST). Portanto, quanto a esse aspecto, a demanda tem viabilidade. A reforma da legislação estatal atinente aos portos, promovida pela edição da Lei nº 8.630/93 e, posteriormente, pela Lei nº 12.815/13, teve como objetivo a modernização da atividade portuária brasileira. Dentre as várias alterações promovidas nas relações ocorridas nos portos, o novo marco legal estabeleceu aos operadores portuários a obrigação de constituir Órgãos Gestores de Mão de Obra – OGMO, em cada porto organizado, com a função de gerir a mão de obra nos portos (art. 18, caput, da Lei 8.630/93; posteriormente, art. 32, caput, da Lei 12.815/13). A criação dos Órgãos Gestores de Mão de Obra – OGMO é um dos pilares da nova legislação portuária, com consequente ruptura do monopólio das entidades sindicais quanto à intermediação da mão de obra portuária avulsa. Na linha da diretriz de modernização do funcionamento das atividades portuárias, a nova legislação estabeleceu que a intermediação para contratação de mão de obra do trabalho portuário avulso deverá ser requisitada ao órgão gestor de mão-de-obra (art. 1º da Lei 9.719/98). Registre-se que o novo marco legislativo da atividade portuária não eliminou completamente a atuação, historicamente consagrada, dos sindicatos dos trabalhadores avulsos, que, evidentemente, podem contribuir para o aprimoramento do trabalho portuário, bem como para o desenvolvimento e eficácia das atividades desse importante ramo econômico. O novo ordenamento vigente admite a celebração de instrumento coletivo autônomo entre os trabalhadores e tomadores de serviço (parágrafo único do art. 32 da Lei 12.815/2013). Entretanto, o referido dispositivo deve ser interpretado, de forma sistêmica, à luz do disposto no art. 43 da mesma lei (12.815/2013), que prevê que serão objeto de negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores portuários avulsos e dos operadores portuários as questões atinentes à “remuneração, a definição das funções, a composição dos ternos, a multifuncionalidade e as demais condições do trabalho avulso”. Reconhece-se a singularidade histórica da atuação das entidades sindicais representantes dos trabalhadores portuários, inclusive na gestão da mão de obra dos avulsos, no entanto, a partir do novo marco legislativo das atividades portuárias (normas estatais posteriores à Constituição Federal) incumbe tão somente aos entes sindicais portuários compor a estrutura tripartite do Órgão Gestor de Mão de Obra - OGMO, na defesa dos interesses e direitos individuais, plúrimos e coletivos dos trabalhadores. Ao contrário do que aparentemente revelaria a literalidade da norma estatal, o instrumento coletivo autônomo autorizado pelo parágrafo único do art. 32 da Lei 12.815/2013 encontra limite na própria lei, que admite ocorrer negociação coletiva apenas com relação às questões concernentes à remuneração, a definição das funções, a composição dos ternos, a multifuncionalidade e as demais condições do trabalho avulso, consoante disposto no art. 43 da Lei 12.815/2013.

Importante registrar que, nos termos da legislação vigente, o Órgão de Gestão de Mão de Obra – OGMO tem como finalidade específica a intermediação e gestão da mão de obra do trabalhador avulso, com caráter de utilidade pública, sendo-lhe vedado ter fins lucrativos, prestar serviços a terceiros ou exercer qualquer atividade não vinculada à gestão de mão de obra (art. 39 da Lei 12.815/2013). Esse limite estabelecido na lei, que restringe como única razão para a existência do OGMO a atividade específica da gestão de mão de obra do trabalhador avulso, reforça o entendimento de que é atribuição exclusiva do OGMO a intermediação da mão de obra do trabalhador avulso nas atividades portuárias. Julga-se parcialmente procedente este dissídio coletivo jurídico para, conferindo interpretação sistêmica aos arts. 1º e 13 da Lei nº 9.719/98, e, 32, 33, 39, 41 e 43 da Lei 12.815/13, declarar que o OGMO detém exclusiva atribuição para gerir e intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador avulso.

PEDIDO DE INGRESSO DO SINDICATO DOS CONFERENTES DE CARGA E DESCARGA NOS PORTOS DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO NO POLO PASSIVO DA LIDE. O Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo apresentou pedido de inserção no polo passivo da demanda. Prevalece nesta Corte o entendimento de que, nos dissídios coletivos suscitados perante o Tribunal Superior do Trabalho, que tenha abrangência de âmbito nacional, os legitimados a figurar no processo são apenas as entidades de grau superior representantes das categorias (federações e confederações), não se reconhecendo legitimidade aos sindicatos com base estadual para atuar nesta espécie de demanda. Cito julgados nesse sentido. O art. 138 do CPC preceitua que “O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, ou poderá, por decisão irrecorrível, de ofício a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação. § 1º A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a interposição de recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração e a hipótese do § 3.º. § 2º Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae”. No âmbito de norma regulamentar do TST, o art. 3º, II, da Instrução Normativa nº 39/16 do TST, estabelece que: “Sem prejuízo de outros, aplicam-se ao Processo do Trabalho, em face de omissão e compatibilidade, os preceitos do Código de Processo Civil que regulam os seguintes temas: (...) II – art. 138 e parágrafos (amicus curiae)”. Desse modo, tendo em vista a relevância da matéria objeto da presente demanda, com apoio no art. 138 do CPC/2015, admito a intervenção do Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo, na qualidade de “amicus curiae”, com poderes específicos para apresentar razões, manifestações por escrito, documentos e memoriais, sendo-lhe vedado apresentar recurso no curso deste processo, ressalvada a oposição de embargos de declaração.

RECONVENÇÃO PROPOSTA PELA FNP. PRELIMINAR DE IRREGULARIDADE DA PEÇA RECONVENCIONAL ARGUIDA PELA SUSCITANTE EM CONTESTAÇÃO À RECONVENÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA DE NORMA REGULAMENTAR. A FNP propôs reconvenção em conjunto com a peça de contestação. Em razões de contrariedade às reconvenções, a suscitante (FENOP) afirma que a Federação Nacional dos Portuários - FNP apresentou sua reconvenção pelo sistema e-DOC, apesar de a presente demanda tramitar pelo via do sistema PJe. Nesse cenário, aponta desconformidade com o disposto no ATO SEGJUD.GP Nº 32/2017. Verifica-se que a petição contendo a reconvenção apresentada pela FNP foi protocolizada através do Sistema Integrado de Protocolização e Fluxo de Documentos Eletrônicos - e-DOC, embora a peça seja relacionada a processo que se encontra em tramitação nesta Corte pelo Sistema de Processo Judicial Eletrônico - PJe, conforme a informação oriunda da Secretaria Judiciária do TST. O art. 4° do Ato SEGJUD.GP 32/2017 estabelece que o “recebimento de petição inicial ou de prosseguimento, relativamente aos processos em tramitação no Sistema PJe, somente ocorrerá no meio eletrônico próprio desse sistema, sendo vedada a utilização do e-DOC ou de qualquer outro sistema de peticionamento eletrônico".

Reconvenção proposta pela Federação Nacional dos Portuários – FNP não admitida, a teor da referida norma regulamentar (art. 4° do Ato SEGJUD.GP 32/2017).

RECONVENÇÃO PROPOSTA PELAS ENTIDADES FNE e FENCCOVIB. FNE e FENCCOVIB propuseram reconvenção, buscando a procedência de pedidos diversos. A proposição de reconvenção é admitida no processo do trabalho de natureza coletiva, com o processamento orientado, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil, uma vez a CLT é omissa quanto a esse instituto (art. 769 da CLT). O art. 343 do CPC assim estabelece: “Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa”. No caso, verifica-se que alguns dos pedidos apresentados na reconvenção (decretação da substituição de trabalhadores irregularmente contratados para funções típicas portuárias e o reconhecimento da representatividade sindical) não tratam de mera interpretação de normas autônomas ou heterônomas, mas sim de pretensões de cunho condenatório/constitutivo. Tais postulações são incompatíveis com o instrumento de dissídio coletivo jurídico, cujo objeto se limita à interpretação de uma norma legal ou coletiva específica de certa categoria. Por outro lado, infere-se que há compatibilidade, bem como conexão entre a ação principal e a reconvenção quanto ao pedido reconvencional para o reconhecimento de que “as funções típicas portuárias, previstas no artigo 40 da Lei 12.815/13, só podem ser exercidas por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, seja no regime jurídico do emprego ou do trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado”. Portanto, cabe admitir a reconvenção proposta, especificamente para análise desse tema. A reforma da legislação estatal atinente aos portos, promovida pela edição da Lei nº 8.630/93 e, posteriormente, pela Lei nº 12.815/13, teve como objetivo a modernização da atividade portuária brasileira. O novo marco legal da atividade portuária tem a criação do OGMO como um dos pilares.

Na linha da diretriz da modernização do funcionamento das atividades portuárias, à luz da interpretação sistêmica da legislação vigente, infere-se que o OGMO detém a exclusiva atribuição para gerir e intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador avulso. No caso, a controvérsia apontada na reconvenção, sobre a contratação de trabalhadores portuários, deve ser analisada no cenário jurídico estabelecido a partir da edição da Lei nº 12.815/2013, que revogou expressamente a Lei nº 8.630/93. O novo instrumento legislativo estabelece que ao órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário - OGMO cabe administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso (art. 32, I, da Lei nº 12.815/13). O § 2º do art. 40 da Lei nº 12.815/2013, diz que a contratação de trabalhadores portuários de capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações com vínculo empregatício por prazo indeterminado será feita exclusivamente dentre trabalhadores portuários avulsos registrados. Infere-se, por mera interpretação literal, que a palavra "exclusivamente", contida na norma estatal, revela que contratação de trabalhadores portuários deve ser realizada tão somente dentre aqueles que possuem registro no OGMO. Conclusão diversa, no sentido de ser possível contratar trabalhadores não registrados, violaria o significado mínimo do texto objeto da interpretação, que é o ponto de partida do intérprete. Julgados nesse sentido.

a Lei nº 12.815/2013 (que revogou expressamente a Lei nº 8.630/93) alterou o regime de contratação dos trabalhadores para as atividades específicas portuárias, estabelecendo expressamente que a contratação de trabalhadores portuários de capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações, com vínculo empregatício por prazo indeterminado, será feita exclusivamente dentre trabalhadores portuários avulsos registrados (§ 2º do art. 40 da Lei nº 12.815/2013). O art. 44 da Lei nº 12.815/13, que faculta aos titulares de instalações portuárias sujeitas a regime de autorização (terminais de uso privado) a contratação de trabalhadores a prazo indeterminado, deve ser interpretado de forma sistêmica, em sintonia com os objetivos de modernização e eficiência das atividades portuárias, que tem como um dos pilares a exclusividade da gestão da mão de obra portuária pelo OGMO, inclusive como forma de valorização e qualificação da mão de obra portuária. A partir de uma interpretação teleológica e sistemática da legislação portuária, conclui-se que a contratação de trabalhadores para as atividades específicas portuárias (capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações - art. 40 da Lei 12.815/13), com vínculo empregatício por prazo indeterminado, deverá ocorrer exclusivamente dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados, sempre que existir o órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário constituído na localidade do contratante. Julga-se parcialmente procedente a reconvenção, a fim de declarar que as funções típicas portuárias, previstas no art. 40 da Lei 12.815/13, devem ser exercidas exclusivamente por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, tanto no regime jurídico de emprego ou no regime de trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado, sempre que existir o órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário constituído na localidade em que ocorrer a contratação.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA ATP - ASSOCIAÇÃO DE TERMINAIS PORTUÁRIOS PRIVADOS. INDEFERIMENTO DE INGRESSO DE AMICUS CURIAE. Esta relatora indeferiu o pedido de ingresso da ATP - Associação de Terminais Portuários Privados na qualidade de amicus curiae. A ATP opôs embargos de declaração em face dessa decisão. Não constatados os vícios de procedimento previstos nos arts. 1.022 do CPC/2015 e 897-A da CLT, rejeita-se os embargos de declaração. (TST-SDC-1000360-97.2017.5.00.0000, SDC, rel. Min. Kátia Magalhães Arruda, 18/10/2021).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de DC-1000360-97.2017.5.00.0000, em que é SUSCITANTE FEDERAÇÃO NACIONAL DOS OPERADORES PORTUÁRIOS e são SUSCITADO FEDERAÇÃO NACIONAL DOS ESTIVADORES, FED NAC DOS CONF E CONS DE CARGA E DVP TRAB DE BLOCOS ARRUMADORES E AMARRADORES DE NAVIOS NAS ATIV PORTUÁRIAS e FEDERAÇÃO NACIONAL DOS PORTUÁRIOS.

A Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP ajuizou dissídio coletivo de natureza jurídica, com pedido de tutela de evidência e inibitória, em face da Federação Nacional dos Estivadores - FNE, da Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Blocos, Arrumadores e Amarradores de Navios nas Atividades Portuárias e da Federação Nacional dos Portuários – FNP.

A suscitante requer a procedência total desta representação coletiva, a fim de que seja dada pelo Tribunal Superior do Trabalho - TST a correta interpretação aos artigos 1º e 13 da Lei 9.719/98 e aos artigos 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, declarando ser da competência exclusiva do OGMO a gerência e o fornecimento de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso, e a vedação aos sindicatos laborais a intermediarem o fornecimento de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso.

O Vice-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, à época Ministro Renato de Lacerda Paiva, indeferiu os pedidos de concessão de tutela de evidência e de tutela inibitória, nos termos da decisão de fls. 920/921.

O Ministro Renato de Lacerda Paiva, no exercício da Vice-Presidência do TST, também conduziu reuniões entre as partes na busca por uma solução negociada para o conflito, que, no entanto, apesar dos esforços, não lograram êxito no objetivo de alcançar a autocomposição.

Nesse cenário, a suscitante (FENOP) postulou o encerramento das tratativas por uma solução de consenso e, consequentemente, o prosseguimento do processo.

O pedido foi acolhido pelo Ministro Vice-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, que decretou o término do procedimento negocial e a distribuição regular do feito, conforme despacho de fls. 769/770.

O processo foi a mim distribuído, no âmbito desta Seção Especializada em Dissídios Coletivos.

A Federação Nacional dos Estivadores – FNE e a Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Blocos, Arrumadores e Amarradores de Navios nas Atividades Portuárias apresentaram, em peça única, contestação e reconvenção (fls. 714/743).

A Federação Nacional dos Portuários – FNP apresentou contestação e reconvenção, também em peça única (fls. 246/275).

O Sindicato dos Estivadores, Trabalhadores Avulsos e com Vínculo Empregatício em Estiva nos Portos do Estado do Espírito Santo - SETEMEES apresentou contestação (fls. 597/613).

A Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP requereu a exclusão da contestação protocolizada pelo SETEMEES (fls. 584/586).

A PORTOCEL – Terminal Especializado de Barra do Riacho e a ATP – Associação de Terminais Portuários Privados apresentaram pedido de intervenção no feito, para atuarem como assistente (fls. 427/461) e amicus curiae (fls. 367/395), respectivamente.

O Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão também apresentou pedido de intervenção no feito, para atuar como amicus curiae (fls. 784/789).

Por intermédio de despacho, analisei e deferi parcialmente os pedidos de intervenção no feito, nos seguintes termos (fls. 200/204):

“1 - admitir a intervenção do Sindicato dos Estivadores, Trabalhadores Avulsos e Com Vínculo Empregatício em Estiva nos Portos do Estado do Espírito Santo - SETEMEES, do Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão, e, da PORTOCEL, todos na qualidade de “amicus curiae”, com poderes específicos para apresentar razões, manifestações por escrito, documentos e memoriais, sendo-lhes vedado apresentar qualquer espécie de recurso no curso deste processo;

2 - Indeferir o pedido da ATP – Associação de Terminais Portuários Privados, para ingressar neste processo na condição de “amicus curiae”;

3 - Assinalar o prazo de 15 (quinze) dias para que a PORTOCEL, o Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão e o Sindicato dos Estivadores, Trabalhadores Avulsos e com Vínculo Empregatício em Estiva nos Portos do Estado do Espírito Santo – SETEMEES, querendo, apresentem manifestações, na qualidade de “amicus curiae”, observados os limites e poderes estabelecidos;

4 - Fixar prazo sucessivo de 15 (quinze) dias, para que a suscitante e os suscitados, querendo, apresentem suas razões a respeito das alegações, que eventualmente forem apontadas nas manifestações dos “amicus curiae”, ora admitidos.”

O Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo apresentou pedido de inserção no polo passivo da demanda, conforme petição de fls. 194/195.

A ATP – Associação de Terminais Portuários Privados opôs embargos de declaração (fls. 192/195), em face da decisão que indeferiu o seu ingresso no processo na condição de amicus curiae.

A SETEMEES e a PORTOCEL apresentaram manifestação, na qualidade de amicus curiae, às fls. 89/99 e 100/133, respectivamente.

Parecer do Ministério Público do Trabalho às fls. 578/581, complementado por meio do documento ID – e0e067b.

A suscitante (FENOP) apresentou razões de contrariedade às reconvenções (fls. 1.173/1.181)

É o relatório.

V O T O

1 - PEDIDO DE INGRESSO DO SINDICATO DOS CONFERENTES DE CARGA E DESCARGA NOS PORTOS DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO NO POLO PASSIVO DA LIDE

O Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo apresentou pedido de inserção no polo passivo da demanda.

Alega que a discussão ora travada não é de âmbito nacional, mas sim local, por essa razão o ente sindical entende como necessária a sua intervenção no presente dissídio, no intuito de defender o acordo coletivo ora questionado.

Diz que o processo versa sobre acordos coletivos firmados com terminais privados locais, caracterizando o conflito de âmbito local. Complementa que “os sindicatos dos estivadores são de base territorial estadual, o que reforça a conclusão de que possui a prerrogativa de defender o acordo coletivo do qual é signatário”.

Postula o ingresso no polo passivo deste dissídio coletivo.

Ao exame:

Prevalece nesta Corte o entendimento de que, nos dissídios coletivos suscitados perante o Tribunal Superior do Trabalho, que tenha abrangência de âmbito nacional, os legitimados a figurar no processo são apenas as entidades de grau superior representantes das categorias (federações e confederações), não se reconhecendo legitimidade aos sindicatos com base estadual para atuar nesta espécie de demanda.

Nesse sentido cito o seguinte julgado:

"DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA. CONAB. EMPRESA DE ÂMBITO NACIONAL. FALTA DE COMUM ACORDO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DE SINDICATOS DE BASE TERRITORIAL ESTADUAL. ILEGITIMIDADE ATIVA AD PROCESSUM DA CONFEDERAÇÃO SUSCITANTE. FALTA DE REGISTRO SINDICAL. EXTINÇÃO INTEGRAL DO PROCESSO DE DISSÍDIO COLETIVO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. (...) Não bastasse, segundo a atual e pacífica jurisprudência da Seção de Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, em dissídios coletivos suscitados perante o Tribunal Superior do Trabalho, em face de empresa de âmbito nacional, os legitimados a figurar no processo são as federações e confederações dos trabalhadores . Precedente. Logo, não se legitimam para a causa os Sindicatos profissionais Suscitantes, todos de base estadual. (...) Dissídio coletivo de natureza econômica que se julga extinto, sem resolução do mérito" (DC-7353- 86.2011.5.00.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 22/06/2012).

No caso, a presente representação coletiva jurídica tem como objeto questão que envolve interesses de abrangência nacional, portanto, na linha da jurisprudência prevalente nesta Corte, não cabe admitir o Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo (sindicato estadual) como parte da demanda.

Por outro lado, conforme consta na exordial, o acordo coletivo firmado entre o Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo (ora requerente) e a PORTOCEL foi uma das causas para a instauração deste dissídio coletivo jurídico.

O art. 138 do CPC assim preceitua:

“O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, ou poderá, por decisão irrecorrível, de ofício a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação. (grifamos)

§ 1º A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a interposição de recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração e a hipótese do § 3.º.

§ 2º Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae. (grifamos)

§ 3º O amicus curiae pode recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas.”

O art. 3º, II, da Instrução Normativa nº 39/16 do TST, estabelece que:

“Sem prejuízo de outros, aplicam-se ao Processo do Trabalho, em face de omissão e compatibilidade, os preceitos do Código de Processo Civil que regulam os seguintes temas:

(...)

II – art. 138 e parágrafos (amicus curiae)”.

Desse modo, tendo em vista a relevância da matéria objeto da presente demanda, com apoio no art. 138 do CPC/2015, admito a intervenção do Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo, na qualidade de “amicus curiae”, com poderes específicos para apresentar razões, manifestações por escrito, documentos e memoriais, sendo-lhe vedado apresentar recurso no curso deste processo, ressalvada a oposição de embargos de declaração.

2 – DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. INTEPRETAÇÃO DE DISPOSIÇÕES LEGAIS PARTICULARES À ATIVIDADE PORTUÁRIA.

Trata-se de dissídio coletivo jurídico ajuizado pela Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP com o objetivo de obter a interpretação dos artigos 1º e 13 da Lei 9.719/98 e dos artigos 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, para que seja declarada a competência exclusiva do OGMO quanto à gerência e ao fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso, assim como a vedação aos sindicatos laborais de intermediarem o fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso.

A suscitante (FENOP) noticia que alguns sindicatos laborais de trabalhadores portuários firmaram acordos diretos com as empresas para o fornecimento de mão de obra portuária.

Diz que os referidos acordos foram firmados com terminais privados fora dos portos organizados, tendo por base uma interpretação abusiva e ilegítima dos arts. 32, parágrafo único, e 44 da Lei nº 12.815/13.

Alega que os acordos de fornecimento direto de mão de obra de trabalhador portuário avulso, realizados pelos sindicatos, excluem a intervenção ou a participação do OGMO – Órgão Gestor de Mão de Obra.

Afirma que as Leis nºs 8.630/93, 9.719/98 e 12.815/13 suprimiram a possibilidade de o sindicato representante de trabalhadores portuários administrar ou fornecer mão de obra de trabalhador portuário avulso.

Informa que o legislador pátrio atribuiu competência legal ao OGMO para gerir, administrar, treinar e fornecer mão de obra de trabalhador portuário, assim como de trabalhador portuário avulso.

Ressalta que as Leis nºs 12.815/13 e 9.719/98 expressam a competência do OGMO para o fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso.

Pondera que, “se um terminal privado fora do porto organizado pretender contratar trabalhador portuário em regime de emprego, a prazo indeterminado, poderá fazê-lo sem assegurar prioridade aos trabalhadores registrados no OGMO, mas se quiser trabalhar com trabalhador portuário avulso deverá necessariamente requisitar tais trabalhadores ao OGMO e somente ao OGMO”.

Sustenta que os sindicatos laborais não podem administrar ou fornecer mão de obra de trabalhador portuário avulso dentro ou fora da área do porto organizado.

Assevera que, “ao intermediar e fornecer mão-de-obra diretamente, os sindicatos atuam com interesses empresariais e se afastam de sua função constitucional”.

Informa que “outro vício insuperável que vem sendo praticado pelos sindicatos nesses acordos de contratação direta de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso, é o fato de somente incluírem na atividade trabalhadores sindicalizados e que estejam adimplentes com as contribuições sindicais, o que desrespeita frontalmente o Princípio da Liberdade de Associação”.

Salienta que os sindicatos estão credenciando trabalhadores sem treinamento e não habilitados pelo OGMO, desrespeitando o art. 3º da Convenção 137 da OIT e o art. 32, II, da Lei nº 12.815/13.

Informa que essa prática já atinge quatro diferentes estados brasileiros (SP, ES, PA e AM) e já há notícias de que em Santa Catarina e no Paraná existem movimentos no mesmo sentido. Complementa que isso demonstra o caráter nacional da lide e a consequente competência do Tribunal Superior do Trabalho, nos moldes do art. 67 do seu regimento interno.

O suscitante ressalta que, em observância à Orientação Jurisprudencial nº 7 da SDC do TST, não busca a interpretação de norma de caráter genérico, mas sim de norma legal específica que rege o trabalho portuário, norma essa que atinge diretamente os direitos da categoria empresarial representada pela FENOP.

Narra que ao longo do ano de 2017 eclodiram em diversos portos brasileiros acordos coletivos de trabalho ilegais, por meio dos quais empresas portuárias firmaram com sindicatos laborais portuários acordos para fornecimento direto de mão de obra portuária avulsa, sem o intermédio do OGMO.

Diz que essa prática abusiva tem gerado uma série de consequências negativas no setor portuário, em especial para a categoria econômica das operações portuárias representada pelo suscitante.

A FENOP destaca, como uma das consequências negativas, a concorrência desleal, “na medida em que as empresas que firmaram esses acordos abusivos e nulos, através de requisição de mão obra portuária avulsa feita diretamente junto ao sindicato laboral e sem intermédio do OGMO, reduzem os custos incorridos na contratação, pois deixam de remunerar ao OGMO a necessária taxa por ele cobrada de todos os usuários da mão de obra do trabalhador portuário avulso”.

Afirma que o OGMO, por expressa previsão legal, “exerce diversas competências que geram custos expressivos, como: administrar, treinar, habilitar e fornecer a mão de obra do trabalhador portuário avulso implantando todo um complexo sistema rodizial de engajamentos e de atendimento a esse grande contingente de trabalhadores portuários avulsos, fornecendo EPI, disponibilizando estrutura de saúde ocupacional, estrutura administrativa e de apoio, treinamento e demais atividades que são exercidas pelo OGMO para os milhares de trabalhadores portuários avulsos detentores de registro ou de cadastro.”

Alega que o OGMO depende da receita decorrente das taxas cobradas para a administração e o fornecimento da mão de obra portuária avulsa, já que o art. 39 da Lei nº 12.815/13 proíbe expressamente o OGMO de exercer qualquer outra atividade.

Complementa que os referidos acordos inviabilizam a operacionalização dos OGMOs, tendo em vista que lhes suprimem a única fonte de receita.

O suscitante frisa que “o sindicato vem engajando como trabalhador portuário avulso trabalhadores alienígenas ao sistema do OGMO e que não possuem a necessária e indispensável habilitação profissional (registro ou cadastro do OGMO) e o faz com trabalhadores que se filiam ao sindicato, escolhidos por critérios não de formação profissional, mas sim de afinidade com a diretoria do sindicato”.

Reforça que “o sindicato vem entregando as oportunidades de trabalho exclusivas e pertencentes aos trabalhadores portuários avulsos integrantes do sistema do OGMO a terceiros alienígenas ao OGMO e, para fazê-lo, obriga esses "novos trabalhadores" a se filiarem e a se manterem adimplentes com o sindicato”.

Noticia algumas negociações coletivas que preveem a contratação de trabalhadores avulsos diretamente com os sindicatos laborais, sem a participação do OGMO: a) acordo coletivo de trabalho firmado entre o Sindicato dos Estivadores de Santos e a empresa Ultrafértil S.A.; b) acordo coletivo firmado em 2015, entre a Superterminais Comércio e Indústria LTDA. e o Sindicato dos Estivadores de Manaus; c) acordo coletivo de trabalho firmado em 2017, entre a empresa Norte Operações de Terminais S.A. e o Sindicato dos Estivadores do Pará, que prevê no parágrafo único da cláusula terceira a restrição de contratação de mão de obra apenas aos estivadores filiados ao sindicato.

Diz que o acordo coletivo de trabalho firmado em 2017, entre a PORTOCEL e o Sindicato dos Estivadores, Trabalhadores Avulsos e com Vínculo Empregatício em Estiva nos Portos do Estado de Espírito Santo, para reger as relações de trabalho entre PORTOCEL e os trabalhadores portuários avulsos sindicalizados de conferência de carga e descarga e estiva na movimentação de cargas e descargas, envolve não só a atividade de estiva, como também a de conferente de carga.

Denuncia que “a cláusula segunda do referido acordo é clara e não deixa margem a qualquer dúvida, os direitos ali regrados são assegurados apenas aos trabalhadores portuários avulsos SINDICALIZADOS”.

Salienta que o ACT “cria uma contribuição assistencial sindical de absurdos 23% sobre o valor total pago pela PORTOCEL pela movimentação de mão de obra, o que prova estar o sindicato atuando com interesses empresariais e em detrimento da categoria profissional que por ele deveria ser representada”.

Informa que o item II da Cláusula Décima Sexta do referido ACT prevê que os engajamentos no trabalho serão feitos sem qualquer intervenção do OGMO.

Argumenta que o art. 1º da Lei nº 9.719/98 determina que a mão de obra do trabalhador portuário avulso deverá ser requisitada ao OGMO. Trata-se de uma imposição legal, segundo o suscitante.

Sustenta que o art. 13 do diploma supracitado “também afirma expressamente que essa obrigação de requisitar o trabalhador portuário avulso ao OGMO se aplica não apenas aos Operadores Portuários (empresas portuárias localizadas dentro do porto organizado), mas se aplica igualmente a qualquer requisitante de mão de obra avulsa, mesmo que não seja Operador Portuário”.

Reforça que “a Lei 12.815/13 manteve a COMPETÊNCIA LEGAL EXCLUSIVA DO OGMO para gerir, treinar, habilitar e fornecer a mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso (arts 32 e 33 da Lei 12.815/13), assim como reiterou competir exclusivamente ao OGMO manter o registro e o cadastro do trabalhador portuário (arts. 32, II e 41 da Lei 12.815/93)”.

Afirma que “a razão de existir do OGMO é gerenciar a mão-de-obra portuária, atuando como gerenciador do seu fornecimento, arrecadador dos pagamentos devidos aos trabalhadores e dos respectivos encargos incidentes e, consequentemente, repassador de tais valores para pagamento aos seus respectivos titulares”.

Destaca que a Lei nº 12.023/2009 prevê a possibilidade de fornecimento de mão de obra avulsa por sindicatos, mas ressalva que as suas disposições não se aplicam ao trabalho portuário avulso (art. 11).

Enfatiza que “a outorga de competência feita ao OGMO pela Lei 12.815/13 é, claramente, uma COMPETÊNCIA EXCLUSIVA! Cabe ao OGMO e exclusivamente ao OGMO a competência para gerir, fornecer, treinar, habilitar e manter o registro e o cadastro do trabalhador portuário avulso, seja dentro ou seja fora porto organizado”.

Complementa que “no mesmo sentido são as determinações contidas na Lei 12.815/13 e essas são que se aplicam, portanto, em todo o território nacional. LEIS NACIONAIS. Não há falar-se em operações dentro ou fora dos portos organizados no que pertine a essa competência exclusiva outorgada por lei ao OGMO (reitera o disposto no art. 13 da Lei 9.719/98)”.

Assevera que, caso “uma empresa pretender contratar mão de obra de trabalhador portuário avulso, esteja ela localizada dentro ou fora do porto organizado, DEVERÁ NECESSARIAMENTE FAZÊ-LO MEDIANTE REQUISIÇÃO AO OGMO”.

Destaca que a alteração legislativa feita no Brasil pela Lei nº 8.630/93, seguida pelas Leis nºs 9.719/98 e 12.815/13, retirou dos sindicatos laborais a possibilidade jurídica de continuarem com o fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso.

Diz que os acordos firmados são baseados em uma interpretação abusiva do parágrafo único do art. 32 da Lei nº 12.815/13.

Salienta que o dispositivo citado “se refere às condições de trabalho, remuneração, formação de equipes e demais aspectos referidos no art. 43 da Lei 12.815/13 e não derroga, em absoluto, a expressa e exclusiva competência atribuída por lei ao OGMO para fornecer mão de obra do trabalhador portuário avulso”.

Argumenta que o art. 43 da Lei nº 12.815/13 delimita os temas da negociação que precederá ao OGMO. A suscitante alega que, havendo negociação coletiva firmada entre representantes dos trabalhadores portuários avulsos e operadores portuários, disciplinando aspectos relativos às condições de trabalho, essas regras prevalecerão, dispensado a intervenção do OGMO para defini-las.

Enfatiza que o entendimento conferido pelos sindicatos ao art. 44 da Lei nº 12.815/13 é equivocado, haja vista que o referido dispositivo apenas faculta às empresas portuárias localizadas fora do porto organizado a contratar trabalhadores por prazo indeterminado, ou seja, no regime de relação de emprego.

Reafirma que, “se essas mesmas empresas portuárias pretenderem contratar a mão de obra de trabalhadores portuários AVULSOS, deverão NECESSARIAMENTE fazê-lo mediante requisição dessa mão de obra ao OGMO! Essa é a prescrição impositiva e expressa dos artigos 1º e 13, ambos da Lei 9.719/98”.

Por fim, postula a interpretação dos arts. 1º e 13 da Lei nº 9.719/98 e dos arts. 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, a fim de que seja declarada a competência exclusiva do OGMO para gerenciar e fornecer mão de obra de trabalhador portuário avulso. Requer, também, que seja vedado aos sindicatos laborais intermediarem o fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso.

Em suas razões contestatórias, a Federação Nacional dos Estivadores – FNE, a Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Blocos, Arrumadores e Amarradores de Navios nas Atividades Portuárias e a Federação Nacional dos Portuários – FNP argumentam, em preliminar, que a ação escolhida pela suscitante (dissídio coletivo de natureza jurídica) é inadequada, sugerindo que deveria ter sido ajuizada ação anulatória.

Complementam que o meio eleito é impróprio para provocar as anulações/suspensões dos acordos coletivos de trabalho, assim como a condenação dos sindicatos laborais de se absterem de intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador portuário avulso mesmo fora da área de porto organizado.

Postulam a extinção do feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485 do CPC.

Ainda em contestação, no tocante ao mérito, as suscitadas “não se opõem à interpretação dada pela suscitante aos artigos 1° e 13° da Lei 9.719/98 e 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, a fim de que seja declarada a competência exclusiva do OGMO para o gerenciamento e fornecimento de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso, mas que tal competência seja limitada aos casos em que a empresa responsável seja operador portuário ou a ele assemelhado”.

Requerem que as negociações coletivas contestadas neste dissídio coletivo sejam mantidas, pelos motivos e fatos alinhados a seguir, que foram vivenciados no momento da celebração desses acordos: a) segundo as suscitadas, predominava o entendimento (quiçá equivocado) de que para Terminais de Uso Privativo – TUP era facultativa a requisição de mão de obra intermediada pelo OGMO; b) era dominante, entre alguns sindicatos e TUPs, que o ACT precederia o órgão gestor, bem como dispensaria a intervenção do OGMO nas relações entre capital e trabalho no porto, nos termos dos arts. 32, parágrafo único, e 44 da Lei nº 12.815/13; c) informam que havia “reclamações de TUPs dando conta de que o OGMO não vinha fornecendo a mão de obra avulsa dentro das condições e necessidades exigidas pelos terminais”; d) noticiam que os “entendimentos de então era que, nos acordos seriam estabelecidos critérios para a contratação de trabalhadores portuários avulsos, pelos quais se resolveriam os problemas e dificuldades apresentados pelos TUPs que, ao final, eram as causas de recusa à utilização de trabalhadores do órgão gestor”; e) “nesses acordos havia o entendimento de que deveria ficar estabelecida a desobrigação das partes quanto à intermediação do fornecimento da mão de obra, pelo OGMO”; Complementam que esses acordos estavam amparados pelo parágrafo único do art. 32 da Lei nº 12.815/13 e pelo art. 7º, XXIV, da CF/88; f) dizem que os Terminais de Uso Privativo “sempre lembravam ou insistiam reiteradamente na sua faculdade de contratar livremente trabalhador com vinculo empregatício por prazo indeterminado, sem a necessidade, portanto, de requisição da mão de obra avulsa. E sempre faziam menção ao fato de a "constituição do OGMO pelos Operadores Portuários se dá exclusivamente para a gestão da mão de obra avulsa na área do Porto Organizado".

As suscitadas reforçam o pedido de que os acordos coletivos discutidos nesta ação sejam mantidos até o final de suas vigências, tendo em vista que as negociações coletivas são atos jurídicos perfeitos, nos temos do art. 7º, XXVI, da CF/88, além de estarem em consonância com o parágrafo único do art. 32 da Lei nº 12.815/13.

Ao exame:

O art. 241 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho estabelece que: “Os dissídios coletivos podem ser: (...) II - de natureza jurídica, para interpretação de cláusulas de sentenças normativas, de instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções coletivas, de disposições legais particulares de categoria profissional ou econômica e de atos normativos”.

O dissídio coletivo de natureza jurídica é uma ação declaratória, que tem como finalidade a interpretação de normas coletivas preexistentes (dispositivo legal, convencional ou regulamentar), que vigoram no âmbito das relações de trabalho ocorridas entre as categorias profissional e econômica de um determinado ramo de atividade.

Dentro desse limite normativo é que será apreciada esta demanda, na qual a FENOP postula a interpretação dos arts. 1º e 13 da Lei 9.719/98, e 32, 33 e 41 da Lei 12.815/13, a fim de que seja declarada a competência exclusiva do OGMO para gerenciar e fornecer mão-de-obra de trabalhador portuário avulso.

Verifica-se que a suscitante (FENOP) busca o provimento judicial, para interpretação de disposições legais particulares atinentes à categoria profissional dos portuários avulsos. Ou seja, a demanda tem como objeto normas de caráter não genérico, o que se harmoniza com a diretriz revelada na Orientação Jurisprudencial nº 7 da SDC do TST (DISSÍDIO COLETIVO. NATUREZA JURÍDICA. INTERPRETAÇÃO DE NORMA DE CARÁTER GENÉRICO. INVIABILIDADE. Não se presta o dissídio coletivo de natureza jurídica à interpretação de normas de caráter genérico, a teor do disposto no art. 313, II, do RITST). Portanto, quanto a esse aspecto, a demanda tem viabilidade.

Eis o teor das normas apontadas pela suscitante (arts. 1º e 13 da Lei 9.719/98, e 32, 33 e 41 da Lei 12.815/2013):

Art. 1º - Observado o disposto nos arts. 18 e seu parágrafo único, 19 e seus parágrafos, 20, 21, 22, 25 e 27 e seus parágrafos, 29, 47, 49 e 56 e seu parágrafo único, da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, a mão-de-obra do trabalho portuário avulso deverá ser requisitada ao órgão gestor de mão-de-obra.

Art. 13. Esta Lei também se aplica aos requisitantes de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso junto ao órgão gestor de mão-de-obra que não sejam operadores portuários.

Art. 32. Os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário, destinado a: I - administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso; II - manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso; III - treinar e habilitar profissionalmente o trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro; IV - selecionar e registrar o trabalhador portuário avulso; V - estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso; VI - expedir os documentos de identificação do trabalhador portuário; e VII - arrecadar e repassar aos beneficiários os valores devidos pelos operadores portuários relativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários.

Parágrafo único. Caso celebrado contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviços, o disposto no instrumento precederá o órgão gestor e dispensará sua intervenção nas relações entre capital e trabalho no porto.

Art. 33. Compete ao órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário avulso:

I - aplicar, quando couber, normas disciplinares previstas em lei, contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho, no caso de transgressão disciplinar, as seguintes penalidades: a) repreensão verbal ou por escrito; b) suspensão do registro pelo período de 10 (dez) a 30 (trinta) dias; ou c) cancelamento do registro;

II - promover: a) a formação profissional do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso, adequando-a aos modernos processos de movimentação de carga e de operação de aparelhos e equipamentos portuários; b) o treinamento multifuncional do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso; e c) a criação de programas de realocação e de cancelamento do registro, sem ônus para o trabalhador; III - arrecadar e repassar aos beneficiários contribuições destinadas a incentivar o cancelamento do registro e a aposentadoria voluntária; IV - arrecadar as contribuições destinadas ao custeio do órgão; V - zelar pelas normas de saúde, higiene e segurança no trabalho portuário avulso; e VI - submeter à administração do porto propostas para aprimoramento da operação portuária e valorização econômica do porto.

§ 1º O órgão não responde por prejuízos causados pelos trabalhadores portuários avulsos aos tomadores dos seus serviços ou a terceiros.

§ 2º O órgão responde, solidariamente com os operadores portuários, pela remuneração devida ao trabalhador portuário avulso e pelas indenizações decorrentes de acidente de trabalho .

§ 3º O órgão pode exigir dos operadores portuários garantia prévia dos respectivos pagamentos, para atender a requisição de trabalhadores portuários avulsos.

§ 4º As matérias constantes nas alíneas a e b do inciso II deste artigo serão discutidas em fórum permanente, composto, em caráter paritário, por representantes do governo e da sociedade civil.

§ 5º A representação da sociedade civil no fórum previsto no § 4º será paritária entre trabalhadores e empresários.

Art. 41. O órgão de gestão de mão de obra:

I - organizará e manterá cadastro de trabalhadores portuários habilitados ao desempenho das atividades referidas no § 1º do art. 40; e

II - organizará e manterá o registro dos trabalhadores portuários avulsos.

§ 1º A inscrição no cadastro do trabalhador portuário dependerá exclusivamente de prévia habilitação profissional do trabalhador interessado, mediante treinamento realizado em entidade indicada pelo órgão de gestão de mão de obra.

§ 2º O ingresso no registro do trabalhador portuário avulso depende de prévia seleção e inscrição no cadastro de que trata o inciso I do caput , obedecidas a disponibilidade de vagas e a ordem cronológica de inscrição no cadastro.

§ 3º A inscrição no cadastro e o registro do trabalhador portuário extinguem-se por morte ou cancelamento.

A reforma da legislação estatal atinente aos portos, promovida pela edição da Lei nº 8.630/93 e, posteriormente, pela Lei nº 12.815/13, teve como objetivo a modernização da atividade portuária brasileira.

Dentre as várias alterações promovidas nas relações e atividades portuárias, o novo marco legal estabeleceu aos operadores portuários a obrigação de constituir Órgãos Gestores de Mão de Obra – OGMO, em cada porto organizado, com a função de gerir a mão de obra nos portos (art. 18, caput, da Lei 8.630/93; posteriormente, art. 32, caput, da Lei 12.815/13).

A criação dos Órgãos Gestores de Mão de Obra – OGMO é um dos pilares da nova legislação portuária, com consequente ruptura do monopólio das entidades sindicais quanto à intermediação da mão de obra portuária avulsa.

Na linha da diretriz da modernização do funcionamento das atividades portuárias, a nova legislação estabeleceu que a intermediação para contratação de mão de obra do trabalho portuário avulso deverá ser requisitada ao órgão gestor de mão-de-obra (art. 1º da Lei 9.719/98).

Registre-se que o novo marco legislativo da atividade portuária não eliminou completamente a atuação, historicamente consagrada, dos sindicatos dos trabalhadores avulsos, que, evidentemente, podem contribuir para o aprimoramento do trabalho portuário, bem como para o desenvolvimento e eficácia das atividades desse importante ramo econômico.

Por isso, o ordenamento jurídico vigente admite a celebração de instrumento coletivo autônomo entre os trabalhadores e tomadores de serviço (parágrafo único do art. 32 da Lei 12.815/2013). Entretanto, o referido dispositivo deve ser interpretado, de forma sistêmica, à luz do disposto no art. 43 da mesma lei (12.815/2013), que prevê que serão objeto de negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores portuários avulsos e dos operadores portuários as questões atinentes à “remuneração, a definição das funções, a composição dos ternos, a multifuncionalidade e as demais condições do trabalho avulso”.

Reconhece-se a singularidade histórica da atuação das entidades sindicais representantes dos trabalhadores portuários, inclusive na gestão da mão de obra dos avulsos. No entanto, a partir do novo marco legislativo das atividades portuárias (normas estatais posteriores à Constituição Federal) incumbe tão somente aos entes sindicais portuários compor a estrutura tripartite do Órgão Gestor de Mão de Obra - OGMO, na defesa dos interesses e direitos individuais, plúrimos e coletivos dos trabalhadores.

Sobre o tema, peço licença para transcrever a seguinte ementa:

"INSTRUMENTO NORMATIVO COLETIVO – CLÁUSULA PERMISSIVA DA ATUAÇÃO DO SINDICATO PROFISSIONAL COMO ÓRGÃO GESTOR DE MÃO-DE-OBRA DO TRABALHADOR AVULSO NÃO PORTUÁRIO – MANIFESTA ILEGALIDADE E INCONSTITUCIONALIDADE – A Constituição da República, ao elevar o status jurídico das entidades sindicais no Direito brasileiro, assim o fez em consideração ao seu importante papel de organização defensora dos direitos coletivos e individuais dos trabalhadores, quer de origem constitucional, legal, coletiva privada ou, até mesmo, contratual. Nessa linha, confirmou o imprescindível caráter representativo dos trabalhadores do respectivo sindicato profissional (art. 8º, II, CF/88), firmando, ainda, que “ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria , inclusive em questões judiciais ou administrativas” (art. 8º, III, CF/88 – grifos acrescidos). Nesse quadro, desponta como manifestamente inconstitucional regra jurídica autorizadora da descaracterização do papel e funções essenciais do sindicato, transformando-o em locador e gestor de mão-de-obra, com interesses claramente empresariais e potencialmente contrários aos dos próprios trabalhadores envolvidos. A exceção legal surgida antes 1988, referente aos sindicatos de trabalhadores avulsos portuários , é absolutamente singular, não podendo ser transplantada para outras realidades do País, que envolvam terceirização ou locação de mão-de-obra. A própria Lei nº 8.630/1993, subsequente à Constituição, preferiu evitar o aparente conflito de situações jurídicas, criando órgão gestor de mão-de-obra no seguimento portuário brasileiro (OGMO), de composição tripartite e não apenas sindical (art. 24, Lei nº 8630/93), sem prejuízo de reconhecer a singularidade histórica da atuação sindicalista nesse específico segmento diferenciado (art. 18, incisos I a VII e parágrafo único, Lei nº 8630/93). Não tem, portanto, respaldo constitucional regra jurídica que comprometa a estrutura e funções do sindicato profissional como entidade voltada, essencialmente, à defesa dos interesses e direitos individuais, plúrimos e coletivos dos trabalhadores. Recurso ordinário provido para excluir a cláusula "(RODC-169900-03.2004.5.15.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 24/10/2008).

Ao contrário do que aparentemente revelaria a literalidade da norma estatal, o instrumento coletivo autônomo autorizado pelo parágrafo único do art. 32 da Lei 12.815/2013 encontra limite na própria lei, que admite ocorrer negociação coletiva apenas com relação às questões concernentes à remuneração, a definição das funções, a composição dos ternos, a multifuncionalidade e as demais condições do trabalho avulso, consoante disposto no art. 43 da Lei 12.815/2013.

Importante registrar que, nos termos da legislação vigente, o Órgão de Gestão de Mão de Obra – OGMO tem como finalidade específica a intermediação e gestão da mão de obra do trabalhador avulso, com caráter de utilidade pública, sendo-lhe vedado ter fins lucrativos, prestar serviços a terceiros ou exercer qualquer atividade não vinculada à gestão de mão de obra (art. 39 da Lei 12.815/2013).

O limite estabelecido na lei, que restringe como única razão para a existência do OGMO a atividade específica da gestão de mão de obra do trabalhador avulso, reforça o entendimento de que é atribuição exclusiva do OGMO a intermediação da mão de obra do trabalhador avulso nas atividades portuárias.

Sobre o tema ensinam Ronaldo FLEURY, Meirinho AUGUSTO e Cristiano PAIXÃO:

“3.10 A escalação dos trabalhadores portuários avulsos

Outro tema crucial para o estabelecimento das relações de trabalho nos portos, especialmente no cenário construído após a vigência da Lei nº 8.630/93, relacionava-se à escalação dos trabalhadores portuários avulsos. Como a titularidade da prerrogativa para escalação dos trabalhadores não estava definida, de modo claro e inequívoco, na Lei de Modernização dos Portos, foi editado um diploma posterior, a saber, a Lei nº 9.719, de 27 de novembro de 1998 . E, com essa norma, ficou explicitado, no art. 5º, que a “escalação do trabalhador portuário avulso, em sistema de rodízio, será feita pelo órgão gestor de mão-de-obra”.

A problemática da escalação implicou em uma mudança de mentalidade a ser assimilada pelos atores sociais envolvidos no mundo do trabalho portuário. Tradicionalmente, a indicação das equipes era feita pelos sindicatos profissionais, e houve compreensível resistência à mudança representada pelo dispositivo legal. Ocorre, entretanto, que a equitativa distribuição de postos de trabalho, além de mandamento legal, é dispositivo constitucional, que decorre da máxima, exposta no art. 5º, caput, da Carta Política, que estipula a igualdade de todos perante a lei. E, como é claro, uma Constituição democrática não poderá admitir situações de discriminação injustificada.

Apesar da literalidade da lei, ainda persistiu a luta dos dirigentes sindicais pela manutenção do poder de escalação dos trabalhadores avulsos ou pela ingerência na escalação. Sustentavam, alguns dirigentes sindicais, que a Lei nº 9.719/98, apesar de determinar que a escalação seja feita pelo OGMO, não impõe que o local seja restrito à sede do órgão gestor, o que permitiria que a distribuição do trabalho permanecesse sendo feita nas próprias sedes das entidades sindicais, a partir de terminais conectados ao OGMO. Tal alternativa foi experimentada nos portos de Itajaí, Rio Grande e Paranaguá, com resultados desastrosos. Diversas decisões judiciais foram responsáveis pela transferência da escalação para instalações próprias dos OGMOs.

Além da coação que era exercida sobre os trabalhadores no sentido de que não se habilitassem para o trabalho (aqueles que não eram favorecidos pelas diretorias dos sindicatos), por óbvio, era comum a habilitação de obreiros que não estavam presentes e, por fim, aqueles trabalhadores que não se afinavam com a direção sindical ou que optassem pela não filiação à entidade sindical eram veladamente constrangidos a não se habilitar para o trabalho.

Como se não bastassem esses expedientes destinados a frustrar a correta aplicação da lei, pode ser constatada, na experiência prática em algumas comunidades portuárias, a pré-escalação dos trabalhadores pelos sindicatos, que se desenvolve da seguinte forma: os obreiros são coagidos a comparecer à sede do sindicato antes de se dirigirem para o OGMO e, no sindicato, há uma pré-escalação, somente sendo permitido que aqueles escolhidos pelo sindicato compareçam à parede .

Portanto, é imperioso que a escalação se dê pelos Órgãos Gestores de Mão de Obra em locais próprios, sem qualquer vinculação jurídica com os sindicatos, para que seja garantido aos trabalhadores o livre acesso aos locais de chamada.

Com os avanços tecnológicos, e o amplo acesso dos trabalhadores à rede mundial de computadores, smartphones, e outros meios telemáticos, começou-se a implantar a escalação remota, chegando à escalação digital por intermédio de aplicativos, tendo sido um dos pioneiros o OGMO de Vitória.

Recentemente, o OGMO de Santos, o maior do Brasil, implantou a escalação digital, desenvolvendo um aplicativo para permitir que o trabalhador portuário avulso possa acompanhar a escalação e optar pela oferta que lhe aprouver, seguindo o rodízio, de qualquer lugar, sem a necessidade de sua presença física no ponto de escalação.

Em decorrência da pandemia do novo coronavírus que eclodiu em 2020, o Governo Federal editou a MP nº 945/2020 para adoção de medidas temporárias em resposta à pandemia, voltada principalmente para o setor portuário. Embora a grande maioria dos dispositivos tenha vigência temporária, houve algumas mudanças na Lei nº 9.719/1998, entre elas uma relacionada à forma escalação dos TPAs, com o acréscimo dos §§ 1º, 2º e 3º ao art. 5º.

Art. 5º (...)

§ 1º O Órgão Gestor de Mão de Obra fará a escalação de trabalhadores portuários avulsos por meio eletrônico, de modo que o trabalhador possa habilitar-se sem comparecer ao posto de escalação.

§ 2º O meio eletrônico adotado para a escalação de trabalhadores portuários avulsos deverá ser inviolável e tecnicamente seguro.

§ 3º Fica vedada a escalação presencial de trabalhadores portuários

Esses parágrafos foram mantidos pela Lei de conversão da MP (Lei nº 14.047, de 24 de agosto de 2020).

Outro ponto fundamental na escalação dos TPAs é o descanso interjornada, na medida em que a CLT era omissa. Assim, na escalação dos trabalhadores tornou-se essencial o respeito à determinação contida no art. 8º, da Lei nº 9.719/98, que determina a observância do intervalo mínimo de onze horas entre as jornadas de trabalho.

Art. 8o Na escalação diária do trabalhador portuário avulso deverá sempre ser observado um intervalo mínimo de onze horas consecutivas entre duas jornadas, salvo em situações excepcionais, constantes de acordo ou convenção coletiva de trabalho.

O primeiro aspecto que cumpre salientar é que a norma citada diz respeito às condições de trabalho, ou seja, é uma norma de segurança e medicina do trabalho, como será analisado em item posterior.

Outro aspecto que não pode ser desprezado é que o intervalo interjornadas permite maior amplitude do rodízio, fator essencial para a distribuição igualitária e justa do trabalho. No que respeita à excepcionalidade prevista no dispositivo legal supracitado, que permitiria a flexibilização do intervalo, pelas razões já expostas, situação excepcional seria a falta de trabalhadores habilitados e aptos ao trabalho ou o distanciamento de certos terminais do porto principal, que dificulta o deslocamento tanto ao trabalhador quanto ao operador, máxime se tais terminais não possuem uma movimentação muito intensa de navios. Em outras palavras, se, excepcionalmente, não houver trabalhadores aptos aguardando oportunidade de trabalho, poder-se-á utilizar aqueles que são habilitados e que ainda não cumpriram integralmente o intervalo interjornadas. Admitir-se a possibilidade da dobra importaria a exclusão quase total dos trabalhadores cadastrados, que somente seriam escalados para os trabalhos mais desgastantes e com pior remuneração.

Revelam-se inadequados, nesse contexto, entendimentos que regulem determinadas cargas como excepcionais ou até determinados portos, como já se pretendeu no porto de São Sebastião-SP, em que se argumentava que, por ter pouca movimentação de carga, o atracamento de navios era excepcional, logo, sempre haveria a excepcionalidade referida na lei.

Outro aspecto importante a ser ressaltado é que a escalação dos trabalhadores portuários pelos OGMOs permite uma maior legalidade do processo e escolha dos trabalhadores, pois não fica sujeita a demandas políticas sindicais.

(...)

3.16.1 Negociação coletiva e a escalação dos trabalhadores avulsos;

Matéria que tem sido renovada é se os sindicatos dos trabalhadores e operadores portuários, por normas autônomas coletivas, podem excluir a gestão da mão de obra realizada pelo OGMO? Ou seja, como deve ser interpretado o art. 32, parágrafo único, da Lei nº 12.815/2013?

Em primeiro lugar, é preciso verificar o que dispõe o art. 32, parágrafo único, da Lei dos Portos.

Art. 32. Os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário, destinado a:

(...)

Parágrafo único. Caso celebrado contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviços, o disposto no instrumento precederá o órgão gestor e dispensará sua intervenção nas relações entre capital e trabalho no porto. (sem grifo no original)

A partir desse dispositivo, os sindicatos profissionais sustentam que, havendo instrumento coletivo de trabalho, o OGMO é dispensado de intervir na gestão da mão de obra. Essa interpretação, contudo, é equivocada, na medida em que o texto fala na dispensa da intervenção do OGMO nas “relações entre capital e trabalho no porto”.

Na verdade, a legislação confere ao OGMO a prerrogativa de dispor sobre os aspectos do trabalho portuário enquanto não houver instrumento coletivo de trabalho a regulá-lo. A intervenção a que se refere o art. 32, parágrafo único, da Lei nº 12.815/2013 é a regulação do trabalho stricto sensu (composição dos ternos, estabelecimento dos horários de trabalho, forma de apuração da remuneração, etc.). Enquanto não houver negociação coletiva dispondo sobre tais questões, o OGMO tenha a prerrogativa de disciplinar a relação capital x trabalho, para não haver vácuo normativo.

Com a negociação coletiva, o disposto no instrumento coletivo de trabalho precederá o órgão gestor, afastando as disposições elaboradas pelo OGMO, e dispensará sua intervenção nas condições de prestação do trabalho avulso.

Ademais, não é razoável a interpretação que confere aos atores sociais representantes do capital e do trabalho disporem sobre atribuições de um terceiro, estabelecidas em lei.

Fundamental ter em conta que o art. 5º da Lei nº 9.719/1998 determina que a escalação do trabalhador portuário avulso, em sistema de rodízio, será feita pelo órgão gestor de mão de obra.

Importante ressaltar ainda que o parágrafo único, do art. 32, da Lei 12.815, apenas repete dispositivo idêntico que já constava na Lei 8630/93, em seu art. 18, parágrafo único. Ou seja, não se trata de uma inovação legislativa.

Outro aspecto fundamental diz respeito à responsabilidade pela gestão do trabalho avulso e as responsabilidades inerentes. O art. 2º, § 4º , da Lei nº 9.719/98 prevê que “o operador portuário e o órgão gestor de mão-de-obra são solidariamente responsáveis pelo pagamento dos encargos trabalhistas, das contribuições previdenciárias e demais obrigações, inclusive acessórias, devidas à Seguridade Social, arrecadadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, vedada a invocação do benefício de ordem”. Retirar o OGMO da gestão da mão-de-obra por completo retiraria-lhe, por consequência, a responsabilidade pelo cumprimento das normas de saúde e segurança, além do pagamento da própria remuneração pelo trabalho dos avulsos. A quem caberia, em sendo o sindicato o órgão escalador, a responsabilidade?

Por fim, também há que ser definido o cumprimento das normas do ISPS Code, no que diz respeito ao controle de acesso e permanência dos trabalhadores avulsos nos portos e nos navios. O Tratado Internacional de cumprimento obrigatório pelos portos nacionais exige o controle absoluto no acesso de pessoas aos terminais e aos navios e quem faz esse controle e repassa à Autoridade Portuária é exclusivamente o Órgão Gestor de Mão de Obra. Eventual decisão que permita a escalação por outro Ente, como o Sindicato, pode levar à cassação da certificação internacional.

Em resumo, a legislação determina que a mão de obra avulsa portuária seja gerenciada e escalada pelos Órgãos Gestores e a previsão legal ora em análise prevê que as condições de trabalho (composição das equipes de trabalho, jornadas, remuneração) negociadas coletivamente devem se sobrepor às condições estabelecidas pelos OGMOs. Mas a escalação, contudo, permanece como atribuição exclusiva dos OGMOs. Qualquer interpretação que permita a escalação dos trabalhadores avulsos diretamente pelos sindicatos, sob o argumento de que o instrumento coletivo de trabalho pode dispensar a intervenção do OGMO, representa um retrocesso aos avanços obtidos pela legislação que modernizou as relações laborais nos portos, além de se chocar frontalmente com os objetivos traçados pelo legislador. "Trabalho Portuário - A Modernização dos Portos e as Relações de Trabalho no Brasil", FLEURY, Ronaldo; Meirinho, AUGUSTO; PAIXÃO, Cristiano, 3ª edição, no prelo."

Julgo parcialmente procedente este dissídio coletivo jurídico para, conferindo interpretação sistêmica aos arts. 1º e 13 da Lei nº 9.719/98, e, 32, 33, 39, 41 e 43 da Lei 12.815/13, declarar que o OGMO detém exclusiva atribuição para gerir e intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador avulso.

3 – RECONVENÇÕES APRESENTADAS PELAS ENTIDADES FNE, FENCCOVIB E FNP

3.1 – PRELIMINAR ARGUIDA PELA SUSCITANTE EM CONTESTAÇÃO À RECONVENÇÃO. IRREGULARIDADE DA PEÇA RECONVENCIONAL PROPOSTA PELA FNP. NÃO OBSERVÂNCIA DE NORMA REGULAMENTAR.

As entidades FNE e FENCCOVIB propuseram reconvenção no bojo da peça contestatória (fls. 385/414).

A FNP também propôs reconvenção em conjunto com a peça de contestação (fls. 797/826).

Em razões de contrariedade às reconvenções, a suscitante (FENOP) afirma que a Federação Nacional dos Portuários - FNP apresentou sua reconvenção pelo sistema e-DOC, apesar de a presente demanda tramitar pelo via do sistema PJe.

Nesse cenário, aponta desconformidade com o disposto no ATO SEGJUD.GP Nº 32/2017.

Verifica-se que a petição contendo a reconvenção apresentada pela FNP foi protocolizada através do Sistema Integrado de Protocolização e Fluxo de Documentos Eletrônicos - e-DOC, embora a peça seja relacionada a processo que se encontra em tramitação nesta Corte pelo Sistema de Processo Judicial Eletrônico - PJe, conforme a informação oriunda da Secretaria Judiciária do TST (fl. 877/878).

O art. 4° do Ato SEGJUD.GP 32/2017 estabelece que o “recebimento de petição inicial ou de prosseguimento, relativamente aos processos em tramitação no Sistema PJe, somente ocorrerá no meio eletrônico próprio desse sistema, sendo vedada a utilização do e-DOC ou de qualquer outro sistema de peticionamento eletrônico".

Dessa forma, cabe acolher os argumentos da FENOP para não receber a reconvenção proposta pela Federação Nacional dos Portuários - FNP, a teor da referida norma regulamentar (art. 4° do Ato SEGJUD.GP 32/2017).

3.2 - RECONVENÇÃO PROPOSTA PELAS ENTIDADES FNE e FENCCOVIB

As entidades FNE e FENCCOVIB propuseram reconvenção no bojo da peça contestatória (fls. 385/414).

As suscitadas noticiam que os Terminais de Uso Privado, valendo-se de algumas decisões judiciais, estão adotando postura abusiva em relação aos trabalhadores portuários e aos seus sindicatos, impondo às entidades sindicais que assinem acordos coletivos para fornecimento de mão de obra direto com os sindicatos laborais, sem a intervenção do OGMO.

Alegam que “fazem ou cedem a isto para evitar que os TUPs venham a contratar empregados no mercado comum de trabalho e que, com tal atitude, fique eliminada toda e qualquer oportunidade de trabalho para os portuários legalmente reconhecidos”.

Reforçam que tal atitude dos Terminais de Uso Privado é abusiva e precisa, com urgência, ser repelida pelo Colendo TST.

Afirmam que “as atividades portuárias de "capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações" constituem por expressa previsão de lei, categoria profissional diferenciada e, portanto, essas atividades só podem ser exercidas por trabalhadores portuários, que são exclusivamente aqueles registrados ou cadastrados no órgão gestor de mão de obra do trabalho portuário”.

Asseveram que o art. 44 da Lei nº 12.815/13 não admite em hipótese alguma que os TUPs contratem trabalhadores do mercado comum de trabalho, fora da condição de trabalhador portuário registrado no OGMO.

Ressaltam que, “se os TUPs querem contratar trabalhadores portuários a vínculo permanente poderão fazê-lo, mas deverão respeitar a reserva de mercado de trabalho à categoria profissional criada por lei e integrada, exclusivamente, por trabalhadores portuários registrados no OGMO”.

Argumentam que “é defeso aos Terminais de Uso Privado realizar as atividades típicas portuárias, que constituem categoria profissional diferenciada, com trabalhadores que não sejam registrados ou cadastrados no OGMO, seja na modalidade de avulso ou contratado com vínculo de emprego por prazo indeterminado”.

As federações salientam que o operador portuário, ao requisitar trabalhador portuário avulso, localizado dentro ou fora do porto organizado, deverá efetuar a requisição junto ao OGMO, órgão a quem compete manter com exclusividade o cadastro do trabalhador portuário ou registro do trabalhador portuário avulso.

Alegam que qualquer uma das duas modalidades de contratação de mão de obra portuária autorizadas pela Lei nº 12.815/13 (avulso e vínculo empregatício) deverá ser realizada por intermédio do OGMO.

Postulam o provimento do pedido reconvencional formulado, a fim de que seja declarado o reconhecimento de que as “as funções típicas portuárias, previstas no artigo 40 da Lei 12.815/13, só podem ser exercidas por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, seja no regime jurídico do emprego ou do trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado”.

Concomitantemente, requerem que sejam substituídos todos os trabalhadores irregularmente contratados para funções típicas portuárias, na seguinte proporção: 40% dos trabalhadores irregulares deverão ser substituídos no primeiro ano; 30%, nos seis meses subsequentes; e, por fim, mais 30% nos próximos seis meses.

Reclamam, também, o reconhecimento de que “são dos sindicatos portuários laborais respectivos a representatividade dos trabalhadores que exerçam as atividades tidas como categorias diferenciadas com relação às profissões/atividades previstas no artigo 40 da Lei n° 12.815/13”.

Esclarecem que “o reconhecimento da representatividade sindical exclusiva dos Sindicatos Laborais Portuários é absolutamente necessária, mormente ao se ter em conta que os TUPs somente poderão contratar trabalhadores portuários a vínculo permanente, mediante contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho”.

Por fim, postulam que o TST se pronuncie acerca da representação sindical, no sentido de que somente os sindicatos laborais portuários possuem, em cada uma das categorias profissionais diferenciadas previstas no art. 40 da Lei nº 12.815/13, a necessária e indispensável representação sindical para firmarem norma coletiva, nos termos do art. 44 da referida lei.

Em contestação, a suscitante (FENOP) afirma que as suscitadas “apresentam reconvenção, abordando assuntos que não guardam qualquer relação com o objeto do presente dissídio, trazendo em seu bojo pedidos totalmente divorciados do rito e natureza singular que devem guardar os dissídios coletivos de natureza jurídica”.

Diz que falta conexão em relação “ao pedido e a causa de pedir das Federações Laborais Suscitadas quanto ao reconhecimento de representação sindical de trabalhadores contratados a vínculo empregatício pelos terminais de uso privado”, uma vez que a “questão da representatividade sindical de trabalhadores contratados a vínculo de emprego não é matéria afeta ao dissídio coletivo de natureza jurídica”.

Invoca a observância da Orientação Jurisprudencial nº 09 da SDC do TST.

A suscitante (FENOP) alega ainda que “os pedidos cominatórios de condenação dos terminais de uso privado em obrigação de fazer (substituição dos trabalhadores contratados a vínculo de emprego pelos terminais de uso privado) e de não fazer (proibição de firmar acordo coletivo de trabalho com entidades sindicais que não sejam legítimas representantes dos trabalhadores portuários) formulados pelas Federações Laborais Suscitadas, além de seguir rito processual completamente diverso, não guardarem qualquer conexão com o pedido e causa de pedir formulados pela FENOP em sua inicial, não podendo, portanto, serem apreciados em sede de reconvenção neste Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica”.

Postula a extinção das reconvenções apresentadas pelas federações suscitadas, sem resolução do mérito, ante a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo nos termos do art. 485, IV, do CPC.

No tocante ao mérito da reconvenção proposta pela FNE e FENCCOVIB, a suscitante (FENOP) afirma que a “contratação de trabalhadores a vínculo de emprego pelos terminais de uso privado, tratado no art. 44 da Lei nº 12.815/2013, além de não ter qualquer conexidade com o objeto desta lide, que cuida exclusivamente do trabalho portuário avulso, não prescinde de interpretação, haja vista o entendimento uníssono e remansoso desta Eg. Justiça Especializada”.

Nessa linha de raciocínio, caso superadas as preliminares arguidas, a FENOP postula o decreto de improcedência das reconvenções.

Ao exame:

Consabido é que a proposição de reconvenção é admitida no processo do trabalho de natureza coletiva, com o processamento orientado, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil, uma vez a CLT é omissa quanto a esse instituto (art. 769 da CLT).

O art. 343 do CPC assim estabelece:

“Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa”.

Ensinam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

"Além de exigir-se o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais, para a admissibilidade da reconvenção existem quatro pressupostos específicos: a) que o juiz da causa principal não seja absolutamente incompetente para julgar a reconvenção; b) haver compatibilidade entre os ritos procedimentais da ação principal e da ação reconvencional; c) haver processo pendente (litispendência); d) haver conexão (CPC 55) entre a reconvenção, a ação principal ou algum dos fundamentos da defesa. Não há necessidade de o réu contestar para poder reconvir (CPC 343 § 6.º). Entretanto, caso queira exercitar as duas formas de resposta do réu, deverá fazê-lo simultaneamente, isto é, a contestação deve conter em si o pedido que constitui a reconvenção”. (Código de processo civil comentado. 16ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, pág. 1983).

No caso, reconhece-se que estão satisfeitos os pressupostos genéricos autorizadores da admissão da reconvenção proposta pela FNE e FENCCOVIB.

Quanto ao preenchimento dos pressupostos específicos da reconvenção, como já dito alhures, cabe ajuizamento de dissídio coletivo de natureza jurídica apenas quando há discussão quanto à interpretação de normas de sentenças normativas, de instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções coletivas, de disposições legais atinentes à categoria profissional ou econômica e de atos normativos, cuja solução exija pronunciamento judicial por meio de ação de conteúdo declaratório, quanto ao sentido e ao alcance da decisão questionada, e seus efeitos nas relações de trabalho.

O dissídio coletivo de natureza jurídica tem como objeto a interpretação de uma cláusula já existente, para que o verdadeiro sentido e a abrangência sejam esclarecidos para a categoria envolvida. A decisão resultante deste tipo de dissídio é de natureza declaratória.

No caso, verifica-se que alguns dos pedidos apresentados na reconvenção (decretação da substituição de trabalhadores irregularmente contratados para funções típicas portuárias e o reconhecimento da representatividade sindical) não tratam de mera interpretação de normas autônomas ou heterônomas, mas sim de pretensões de cunho condenatório/constitutivo. Tais postulações são incompatíveis com o instrumento de dissídio coletivo jurídico, cujo objeto se limita à interpretação de uma norma legal ou coletiva específica de certa categoria.

Nesse sentido cito alguns julgados desta SDC:

"I – (...). II - RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO DOS EMPREGADOS TERRESTRES EM TRANSPORTES AQUAVIÁRIOS E OPERADORES PORTUÁRIOS DO ESTADO DE SÃO PAULO - DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA - MANIFESTAÇÃO ACERCA DA REPRESENTAÇÃO SINDICAL DA CATEGORIA - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA - ANÁLISE DE OFÍCIO. A declaração da legitimidade para a representação sindical é incompatível com o objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica, visto que não está amparada na busca de uma interpretação acerca de determinada norma legal ou coletiva, o que denota a incompatibilidade da via processual utilizada e enseja a extinção do processo sem resolução do mérito quanto a esse pleito, em análise realizada de ofício, nos termos do art. 267, VI, do CPC. Processo extinto sem resolução do mérito no tópico" (RO-1000543-19.2014.5.02.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 25/09/2015).

RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA E JURÍDICA. DECLARAÇÃO DE LEGITIMIDADE DE REPRESENTAÇÃO. INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. EXTINÇÃO. Não se viabiliza o ajuizamento de dissídio coletivo, com dupla adjetivação quanto à sua natureza, com o objetivo precípuo de se obter a declaração de legitimidade de representação, bem como da nulidade de acordo coletivo de trabalho. Além de a análise da questão da disputa de representatividade sindical ser admitida nesta Seção Especializada somente sob a forma incidental, o dissídio coletivo de natureza jurídica visa à interpretação de normas de sentenças normativas, de acordos e convenções coletivas e de dispositivos legais atinentes a determinada categoria profissional, e a discussão da matéria ora pretendida pressupõe o exame de norma genérica, o que é vedado nos termos da OJ nº 7 da SDC. Assim, dá-se provimento ao recurso ordinário da empresa Convenção São Paulo Indústria de Bebidas e Conexos Ltda. para, acolhendo a preliminar de inadequação da via processual eleita, extinguir o feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC, restando prejudicado o recurso ordinário interposto pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Jundiaí, Cajamar, Campo Limpo Paulista, Louveira, Itupeva, Várzea Paulista, Vinhedo, Itatiba e Cabreúva. Processo extinto, sem resolução de mérito. (RODC-2008500-35.2006.5.02.0000, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, SDC, DEJT 25/9/2009)

RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. PRETENSÃO DE DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DE ACORDO CELEBRADO ENTRE OS SUSCITADOS, COM A INTERMEDIAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, A RESPEITO DA REPRESENTATIVIDADE SINDICAL DE GARÇONS, COZINHEIROS, AJUDANTES DE COZINHA E CHAPEIROS, QUANDO CONTRATADOS POR PANIFICADORAS, NA BASE TERRITORIAL DE BAURU E REGIÃO IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. Acórdão regional em que se decretou a extinção do processo sem resolução do mérito, tendo em vista a inadequação da via processual eleita, por duplo fundamento: 1) incompatibilidade entre a tutela jurisdicional pretendida (anulação de acordo sobre representatividade sindical), de natureza constitutiva-negativa, e a ação ajuizada (dissídio coletivo de natureza jurídica), de caráter meramente declaratório, cuja finalidade é a interpretação de norma prevista em instrumento coletivo; 2) presença de debate a respeito de enquadramento sindical, que pressupõe o exame de norma genérica (art. 570 da CLT), incompatível com o dissídio coletivo de natureza jurídica, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 07 desta Seção Normativa. Recurso ordinário em que não se impugna objetivamente os fundamentos adotados na decisão regional. Recurso desfundamentado, a teor da Súmula nº 422 desta Corte. Decisão regional que, de todo modo, está em conformidade com a jurisprudência desta Seção Normativa, no sentido de que incompatíveis com a natureza do dissídio coletivo de natureza jurídica pretensões que envolvem declaração de nulidade de normas previstas em instrumentos coletivos e disputa por titularidade de representação sindical. Recurso ordinário a que se nega provimento. (RODC-88100-45.2007.5.15.0000, Relator Ministro Fernando Eizo Ono, SDC, DEJT 6/2/2009).

Por outro lado, o objeto do presente dissídio coletivo jurídico é a interpretação das normas estatais para aferimento da exclusividade do OGMO para intermediação da mão de obra do trabalhador avulso. Portanto, ao menos em tese, infere-se que há conexão entre a ação principal e a reconvenção, especificamente quanto ao pedido reconvencional de reconhecimento de que “as funções típicas portuárias, previstas no artigo 40 da Lei 12.815/13, só podem ser exercidas por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, seja no regime jurídico do emprego ou do trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado”.

Verifica-se que a análise do referido pedido reconvencional implica na interpretação da legislação específica da categoria quanto à abrangência da exclusividade do OGMO para intermediação e gestão da mão de obra do trabalho portuário.

Portanto, com relação ao pedido atinente à declaração da obrigatoriedade da contratação via OGMO de trabalhadores para exercerem todas as funções tipicamente portuárias, reconhece-se a conexão entre a ação principal e ação reconvencional, bem como adequação do pedido formulado, o que autoriza a admissão da reconvenção, para análise desse tema específico.

A reforma da legislação estatal atinente aos portos, promovida pela edição da Lei nº 8.630/93 e, posteriormente, pela Lei nº 12.815/13, teve como objetivo a modernização da atividade portuária brasileira. O novo marco legal da atividade portuária tem a criação do OGMO como um dos pilares.

Na linha da diretriz da modernização do funcionamento das atividades portuárias, conforme já pronunciado nesta assentada, a luz de interpretação sistêmica da legislação vigente, o OGMO detém exclusiva atribuição para gerir e intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador avulso.

No caso, cabe analisar a controvérsia levantada nas razões da reconvenção no cenário do novo regime de contratação de trabalhadores portuários, a partir da edição da Lei nº 12.815/2013, que revogou expressamente a Lei nº 8.630/93.

O novo instrumento legislativo estabelece que ao órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário - OGMO cabe administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso (art. 32, I, da Lei nº 12.815/13).

O § 2º do art. 40 da Lei nº 12.815/2013, diz que a contratação de trabalhadores portuários de capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações com vínculo empregatício por prazo indeterminado será feita exclusivamente dentre trabalhadores portuários avulsos registrados.

Por simples interpretação literal, infere-se que a palavra "exclusivamente", contida na norma estatal, revela que contratação de trabalhadores portuários deve ser realizada tão somente dentre aqueles que possuem registro no OGMO.

Conclusão diversa, no sentido da possibilidade de contratar trabalhadores não registrados, violaria o significado mínimo do texto objeto da interpretação, que é o ponto de partida do intérprete.

Nesse sentido o seguinte julgado desta SDC:

"I - RECURSO ORDINÁRIO DA MARIMEX DESPACHOS, TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA. - DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA - CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES PORTUÁRIOS - INTERPRETAÇÃO DO ART. 40, § 2º, DA LEI Nº 12.815/2013 - EXCLUSIVIDADE DE CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES REGISTRADOS NO OGMO 1. A pretensão da Suscitante passível de análise se refere à nova redação legal para o regime de contratação de trabalhadores portuários, questionando se, a partir da data da vigência da Lei nº 12.815/2013, ainda é possível a contratação de trabalhadores não registrados no OGMO, desde que seja concedida prioridade àqueles que tenham registro. 2. O art. 40, § 2º, da Lei nº 12.815/2013, confere exclusividade aos trabalhadores portuários avulsos registrados nos casos de contratação para os serviços de capatazia, bloco, estiva, conferência e conserto de carga e vigilância de embarcações, com vínculo empregatício por prazo indeterminado. 3. Nesse caso, a interpretação literal é suficiente para entender que a contratação de trabalhadores portuários deve ser realizada apenas dentre aqueles que possuem registro no OGMO. Vale destacar que na redação legal há a palavra " exclusivamente " para delimitar a contratação apenas aos trabalhadores portuários registrados, incluindo expressamente os serviços de capatazia e bloco, de modo que qualquer conclusão pela possibilidade de contratar trabalhadores não registrados violaria o significado mínimo do texto objeto da interpretação, que é o ponto de partida do intérprete. 4. A interpretação histórica do art. 40, § 2º, da Lei nº 12.815/2013 indica que a contratação exclusiva de trabalhadores portuários registrados está em sintonia com um cenário de modernização e eficiência, porquanto o OGMO tem em sua essência justamente a busca por essas duas qualidades para o setor portuário. 5. A partir de uma intepretação sistemática, a análise do conjunto normativo da Lei nº 12.815/2013 permite concluir que em nenhum momento o legislador estabeleceu diferença entre capatazia e bloco e os demais serviços portuários, havendo tratamento unitário para todos eles. 6. A imposição legal de exclusividade de trabalhadores registrados só vale para as contratações realizadas a partir da vigência da Lei nº 12.815/2013, de modo que as anteriores seguem o regime estabelecido pelo Eg. TST no RODC 20.174/2004-000-02-00.0. Recurso Ordinário conhecido e desprovido. II - RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO DOS EMPREGADOS TERRESTRES EM TRANSPORTES AQUAVIÁRIOS E OPERADORES PORTUÁRIOS DO ESTADO DE SÃO PAULO - DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA - MANIFESTAÇÃO ACERCA DA REPRESENTAÇÃO SINDICAL DA CATEGORIA - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA - ANÁLISE DE OFÍCIO A declaração da legitimidade para a representação sindical é incompatível com o objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica, visto que não está amparada na busca de uma interpretação acerca de determinada norma legal ou coletiva, o que denota a incompatibilidade da via processual utilizada e enseja a extinção do processo sem resolução do mérito quanto a esse pleito, em análise realizada de ofício, nos termos do art. 267, VI, do CPC. Processo extinto sem resolução do mérito no tópico " (RO-1000543-19.2014.5.02.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 25/09/2015).

Cabe registrar que, sob a égide do regime de contratação que era fixado pelo art. 26, da Lei nº 8.630/93, esta SDC declarou que os operadores portuários poderiam contratar trabalhadores não registrados no OGMO, especificamente para os serviços de capatazia e bloco (Processo nº RODC-20.174/2004-000-02-00.0, relator Ministro Ives Gandra).

No entanto, a Lei nº 12.815/2013 (que revogou expressamente a Lei nº 8.630/93) alterou o regime de contratação dos trabalhadores para as atividades específicas portuárias, estabelecendo expressamente que a contratação de trabalhadores portuários de capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações, com vínculo empregatício por prazo indeterminado, será feita exclusivamente dentre trabalhadores portuários avulsos registrados (§ 2º do art. 40 da Lei nº 12.815/2013).

O art. 44 da Lei nº 12.815/13, que faculta aos titulares de instalações portuárias sujeitas a regime de autorização (terminais de uso privado) a contratação de trabalhadores a prazo indeterminado, deve ser interpretado de forma sistêmica, em sintonia com os objetivos de modernização e eficiência das atividades portuárias, que tem como um dos pilares a exclusividade da gestão da mão de obra portuária pelo OGMO, inclusive como forma de valorização e qualificação da mão de obra portuária.

A partir de uma interpretação teleológica e sistemática da legislação portuária, conclui-se que a contratação de trabalhadores para as atividades específicas portuárias (capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações - art. 40 da Lei 12.815/13), com vínculo empregatício por prazo indeterminado, deverá ocorrer exclusivamente dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados, sempre que existir o órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário constituído na localidade da instalação portuária contratante.  

Julgo parcialmente procedente a reconvenção, a fim de declarar que as funções típicas portuárias, previstas no art. 40 da Lei 12.815/13, devem ser exercidas exclusivamente por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, tanto no regime jurídico de emprego ou no regime de trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado, sempre que existir o órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário constituído na localidade em que ocorrer a contratação.

4 – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA ATP - ASSOCIAÇÃO DE TERMINAIS PORTUÁRIOS PRIVADOS. INDEFERIMENTO DE INGRESSO DE AMICUS CURIAE.

Esta relatora indeferiu o pedido de ingresso da ATP - Associação de Terminais Portuários Privados na qualidade de amicus curiae, pelos seguintes fundamentos:

“A ATP – Associação de Terminais Portuários Privados apresentou pedido no sentido de ingressar na lide na condição de “amicus curiae”.

Conforme o ordenamento jurídico vigente e a jurisprudência desta Corte, é bastante restrita a legitimidade para atuação em dissídio coletivo jurídico.

No caso, não vislumbro necessidade e tampouco pertinência para o ingresso da requerente (ATP) na demanda na qualidade de “amicus curiae” ou de como sua atuação possa acrescer subsídios ao julgamento da causa, até porque não se trata de entidade com representatividade sindical, tampouco a requerente é parte envolvida nos acordos coletivos que motivaram a instauração desta demanda, como nos demais casos acima analisados.

Indefiro o pedido.”

A ATP opôs embargos de declaração em face dessa decisão.

Alega que a decisão embargada deixou de examinar a matéria à luz do que preceitua o estatuto social da embargante.

Diz que a entidade foi constituída exatamente para “congregar as entidades que sejam titulares de outorga para exploração de instalações portuárias de uso privado, sujeitas ao regime de autorização”.

Alega que “a FENOP, Suscitante, não representa os interesses e a categoria econômica dos Terminais de Uso Privado (...), mas apenas os Operadores Portuários, que atuam na movimentação de cargas dentro da área do porto organizado (...)”.

Diz que a FENOP “ataca exatamente os interesses e o direito dos Terminais de Uso Privado relacionados à “liberdade de contratação de mão de obra, observados os princípios constitucionais” (Estatuto Social, artigo 4º, XI), inclusive e especialmente o direito dos Terminais de Uso Privado de firmarem acordo coletivo regulando a requisição de mão de obra fora dos quadros do OGMO”.

Afirma, em síntese, que o pedido da suscitante atinge interesses que são representados pela embargante.

Complementa que apenas o teor dos pedidos da reconvenção já seria suficiente para autorizar o pedido de ingresso da ATP como amicus curiae.

Assevera que, pelos fundamentos expostos, “fica demonstrado o interesse, a adequação, a necessidade e o cabimento do pedido de ingresso da ATP como Amicus Curiae nestes Autos, dada a efetiva possibilidade, capacidade e interesse de contribuir, de forma institucional, para a solução adequada da controvérsia instalada nestes autos”.

Postula a reforma da decisão, com efeito modificativo, a fim de que seja sanada a omissão apontada.

Ao exame.

No caso, não há que se falar em omissão, obscuridade ou contradição da decisão, mas em decisão contrária ao interesse da embargante.

Conforme consignada na decisão embargada, não ficou demonstrada a necessidade e a pertinência para o ingresso da requerente na demanda na qualidade de amicus curiae ou de como sua atuação poderia acrescer subsídios ao julgamento da causa.

Também ficou registrado que a ATP não é uma entidade com representatividade sindical, tampouco é parte envolvida nos acordos coletivos que motivaram a instauração deste dissídio.

Assim, os pedidos invocados pela requerente foram devidamente analisados por esta relatora e decididos nos estritos termos da jurisprudência desta Sessão Especializada.

Vale registrar que o magistrado não está obrigado a rebater todos os argumentos da parte, mas sim a responder, de forma fundamentada, aos questionamentos por ela trazidos acerca da questão jurídica posta.

Nesse contexto, não há omissão, contradição e obscuridade a serem sanados.

No caso, é nítida a intenção da associação embargante de reformar a decisão que indeferiu o pedido, porém, cabe registrar que é irrecorrível a decisão que denega o ingresso de terceiro na condição de amicus curiae em processo subjetivo, conforme pronunciado pelo STF no julgamento do Processo nº RE 602584-AgR/DF, Redator do acórdão Ministro LUIZ FUX, julgamento: 17/10/2018, Publicação: 20/03/2020, Órgão julgador: Tribunal Pleno.

Também nesse sentido cito a seguinte decisão do Tribunal Pleno desta Corte Superior:

"AGRAVO EM PETIÇÃO EM INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - ASSISTÊNCIA SIMPLES - AMICUS CURIAE - REJEIÇÃO - NATUREZA INSTRUTÓRIA DA PARTICIPAÇÃO - INDEFERIMENTO DE INGRESSO - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - IRRECORRIBILIDADE - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (...) AMICUS CURIAE - REJEIÇÃO - NATUREZA INSTRUTÓRIA DA PARTICIPAÇÃO - INDEFERIMENTO DE INGRESSO - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - IRRECORRIBILIDADE. 1. O Código de Processo Civil de 2015 trata especificamente da figura jurídica do amicus curiae, estabelecendo em seu art. 138 e parágrafos os procedimentos sobre a questão. 2. Exata normatização encerra comando no sentido de que, por decisão irrecorrível do relator, o ingresso de terceiros no processo se dará considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia. 3. Em recente julgado do Supremo Tribunal Federal , estabeleceu-se que o § 1º da citada norma permite apenas, contra a decisão do relator, a oposição de embargos de declaração, para prestar esclarecimentos. 4. O ingresso do amicus curiae está inserido nas faculdades exclusivas do relator, as quais não se submetem ao crivo do Tribunal, pois, nos termos da lei, referido instituto detém natureza de diligência predominantemente instrutória, cuja apreciação está primariamente submetida ao relator ou, se este julgar necessário, ao escrutínio coletivo do Tribunal, não constituindo direito subjetivo do requerente (ADIn 3.460-ED/DF, Rel. Min. Teori Zavascki). 5. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Questão de Ordem no REsp 1.696.396/MT (1º/8/2018), decidiu que "a leitura do art. 138 do CPC/15, não deixa dúvida de que a decisão unipessoal que verse sobre a admissibilidade do amicus curiae não é impugnável por agravo interno, seja porque o caput expressamente a coloca como uma decisão irrecorrível, seja porque o § 1º expressamente diz que a intervenção não autoriza a interposição de recursos, ressalvada a oposição de embargos de declaração ou a interposição de recurso contra a decisão que julgar o IRDR" (Questão de Ordem no REsp 1.696.396/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi). 6. Na doutrina assim também se reconhece a irrecorribilidade da decisão, quando Araken de Assis (2016, p. 708) leciona que "o art. 138, caput, generalizou a inadmissibilidade do recurso próprio contra o ato admitindo, ou não, a intervenção do amicus curiae, excepcionando, nesse caso, o art. 1.015, IX, do NCPC". 7. Na mesma esteira, Didier (2015, p. 524) revela que a decisão sobre a intervenção do amicus curiae , admitindo-a ou não, é irrecorrível (art. 138, caput , CPC) . Agravo não conhecido" (Ag-IAC-5639-31.2013.5.12.0051, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 20/09/2019).

Pelo exposto, não constatados os vícios de procedimento previstos nos arts. 1.022 do CPC/2015 e 897-A da CLT, rejeito os embargos de declaração.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I - admitir a intervenção do Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga nos Portos do Estado do Espírito Santo, na qualidade de “amicus curiae”, com poderes específicos para apresentar razões, manifestações por escrito, documentos e memoriais, sendo-lhe vedado apresentar recurso no curso deste processo, ressalvada a oposição de embargos de declaração; II - julgar parcialmente procedente este dissídio coletivo jurídico para, conferindo interpretação sistêmica aos arts. 1º e 13 da Lei nº 9.719/98, e, 32, 33, 39, 41 e 43 da Lei 12.815/13, declarar que o órgão de gestão de mão de obra - OGMO detém exclusiva atribuição para gerir e intermediar o fornecimento de mão de obra de trabalhador avulso; III - não receber a reconvenção proposta pela Federação Nacional dos Portuários - FNP, a teor da referida norma regulamentar (art. 4° do Ato SEGJUD.GP 32/2017); IV - Julgar parcialmente procedente a reconvenção proposta pelas entidades FNE e FENCCOVIB, a fim de declarar que as funções típicas portuárias, previstas no art. 40 da Lei 12.815/13, devem ser exercidas exclusivamente por trabalhadores portuários registrados ou cadastrados no OGMO, tanto no regime jurídico de emprego ou no regime de trabalho avulso, seja dentro ou fora do porto organizado, sempre que existir o órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário constituído na localidade em que ocorrer a contratação; V - rejeitar os embargos de declaração opostos pela ATP - Associação de Terminais Portuários Privados.

Brasília, 18 de outubro de 2021.

KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA

Ministra SDC

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