TST - INFORMATIVOS 2017 2017 168 - 17 outubro a 20 novembro

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

João Batista Brito Pereira - TST



03 -Dispensa decorrente do ajuizamento de reclamação trabalhista. Prática discriminatória. Art. 1º da Lei nº 9.029/1995. Rol exemplificativo. Reintegração devida. O rol de práticas consideradas discriminatórias previsto no art. 1º da Lei nº 9.029/1995 sempre foi meramente exemplificativo, mesmo antes da alteração introduzida pela Lei nº 12.146/2015, que somente acrescentou a expressão “entre outros”. Ao efetuar a referida modificação, o objetivo do legislador foi apenas deixar evidente o que já estava estabelecido na redação original do dispositivo, ou seja, a vedação a qualquer atitude discriminatória que impeça o acesso ou a manutenção de relação de trabalho. Assim, na hipótese dos autos, em que houve a comprovação da ocorrência de dispensa retaliatória em razão de ajuizamento de reclamatória trabalhista anterior, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, deu-lhes provimento para determinar a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período de afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros (art. 4º, I, da Lei nº 9.029/1995). Vencidos os Ministros Guilherme Augusto Caputo Bastos e Renato de Lacerda Paiva, os quais entendiam que, em razão da dispensa do autor ter se dado em julho de 2013, a ele se aplica a redação original do art. 1º da Lei nº 9.029/1995, que não comportava interpretação extensiva, na medida em que apresentava rol taxativo referente a condições pessoais do empregado (sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade), não englobando, portanto, o caso da dispensa em razão de ajuizamento de ação. (TST-E-RR–807-35.2013.5.09.0892, SBDI-I, rel. Min. Brito Pereira, 16.03.2018).



Resumo do voto.

Dispensa decorrente do ajuizamento de reclamação trabalhista. Prática discriminatória. Art. 1º da Lei nº 9.029/1995. Rol exemplificativo. Reintegração devida. O rol de práticas consideradas discriminatórias previsto no art. 1º da Lei nº 9.029/1995 sempre foi meramente exemplificativo, mesmo antes da alteração introduzida pela Lei nº 12.146/2015, que somente acrescentou a expressão “entre outros”. Ao efetuar a referida modificação, o objetivo do legislador foi apenas deixar evidente o que já estava estabelecido na redação original do dispositivo, ou seja, a vedação a qualquer atitude discriminatória que impeça o acesso ou a manutenção de relação de trabalho. Assim, na hipótese dos autos, em que houve a comprovação da ocorrência de dispensa retaliatória em razão de ajuizamento de reclamatória trabalhista anterior, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, deu-lhes provimento para determinar a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período de afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros (art. 4º, I, da Lei nº 9.029/1995). Vencidos os Ministros Guilherme Augusto Caputo Bastos e Renato de Lacerda Paiva, os quais entendiam que, em razão da dispensa do autor ter se dado em julho de 2013, a ele se aplica a redação original do art. 1º da Lei nº 9.029/1995, que não comportava interpretação extensiva, na medida em que apresentava rol taxativo referente a condições pessoais do empregado (sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade), não englobando, portanto, o caso da dispensa em razão de ajuizamento de ação.

A C Ó R D Ã O

RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014. INDENIZAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PERÍODO DE AFASTAMENTO. LEI 9.029/1995. ROL EXEMPLIFICATIVO. O art. 1º da Lei 9.029/1995, com a redação vigente ao tempo do ajuizamento da reclamação trabalhista, dispunha ser "proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal". Resta claro, pois, que o legislador quis coibir a adoção de qualquer prática discriminatória para acesso a emprego, trazendo, no corpo do dispositivo, mero rol exemplificativo. Essa intenção fica mais evidente quando se percebe que, após alguns questionamentos, a redação do art. 1º da Lei 9.029/1995 foi alterada pela Lei 12.146/2015, para explicitar o que já era evidente, acrescentando-se apenas o termo "entre outros" após os motivos que já citava na redação anterior. Constata-se, portanto, que o legislador, ao elencar alguns motivos, "entre outros", não pretendeu restringir àqueles pelos quais poderia ser configurada prática discriminatória limitativa de acesso ou manutenção do emprego. Ao contrário, quis deixar evidente o que já tinha estabelecido na redação original do dispositivo, que havia prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso ou manutenção da relação de trabalho por aqueles motivos citados (sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade), sem prejuízo de outros mais que configurassem situação discriminatória. Dessa forma, tem-se, sem sombra de dúvida, que o art. 1º da Lei 9.029/1995 nunca trouxe rol restritivo, mas apenas exemplificativo, o que conduz à conclusão de que, sendo comprovada conduta discriminatória na dispensa do empregado, tem aplicação o diploma legal sob análise. Por outro lado, o art. 4º da referida Lei 9.029/1995 faculta ao empregado o direito de optar pela reintegração ou percepção em dobro da remuneração do período de afastamento. No caso, restou comprovado que a dispensa foi retaliatória, pelo fato de o reclamante ter ajuizado ação contra a empresa, e o reclamante insiste no Recurso de Embargos em sua reintegração aos quadros da reclamada, com o restabelecimento do pagamento de seus vencimentos mensais. Assim, havendo perfeita adequação aos ditames da Lei 9.029/1995, determina-se a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período do afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros. Recurso de Embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-E-RR–807-35.2013.5.09.0892, SBDI-I, rel. Min. Brito Pereira, 16.03.2018).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista n° TST-E-RR-807-35.2013.5.09.0892, em que é Embargante ERNANI KLUPPEL LOURENÇO e Embargada JTEKT AUTOMOTIVA BRASIL LTDA.

A Quarta Turma, a fls. 949/966, não conheceu do Recurso de Revista interposto pelo reclamante quanto ao tema "Indenização. Dispensa Discriminatória. Período de Afastamento. Danos Morais. Valor da Indenização".

Irresignado, o reclamante interpõe Recurso de Embargos (fls. 968/978), em que busca reformar a decisão quanto ao tema indicado. Transcreve arestos para confronto de teses.

O Recurso de Embargos foi admitido pelo despacho de fls. 1.017/1.019.

Foi oferecida impugnação (fls. 1.021/1.023).

O Recurso não foi submetido a parecer do Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

Satisfeitos os pressupostos genéricos de admissibilidade.

1. CONHECIMENTO

1.1. INDENIZAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PERÍODO DE AFASTAMENTO. LEI 9.029/1995

A Turma não conheceu do Recurso de Revista com relação ao tema em destaque, deixando seus fundamentos registrados na seguinte ementa:

"INDENIZAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PERÍODO DE AFASTAMENTO. Diante dos termos do art. 1.º da Lei n.º 9.029/95, os atos discriminatórios nele previstos não guardam relação com aqueles descritos nos presentes autos, porquanto não se referem à discriminação por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade. Apesar de evidenciado o abuso de direito da Reclamada, entendo incabível a interpretação extensiva requerida pelo Autor, de forma a lhe deferir a indenização postulada. Nota-se que o dispositivo em questão, conquanto se refira a qualquer prática discriminatória, possui o claro objetivo de proteger as características pessoais do trabalhador que limitariam o acesso ou a manutenção do contrato de trabalho, não podendo amparar o pedido de indenizações decorrentes da dispensa sem justa causa, mesmo que arbitrária. Recurso de Revista não conhecido" (fls. 949/950).

O reclamante sustenta que as hipóteses de discriminação elencadas na referida legislação são meramente exemplificativas. Argumenta que, ante a dispensa discriminatória, é devida a reintegração no emprego com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais, ou com o pagamento de indenização por danos materiais e danos morais. Transcreve arestos para cotejo de teses.

Os arestos de fls. 970/972 revelam divergência jurisprudencial ao concluírem que o rol previsto na Lei 9.029/1995 não é taxativo, sendo possível a aplicação da referida lei no caso em que comprovado o caráter retaliatório da dispensa.

CONHEÇO.

2. MÉRITO

2.1. INDENIZAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PERÍODO DE AFASTAMENTO. LEI 9.029/1995

O art. 1º da Lei 9.029/1995, com a redação vigente ao tempo do ajuizamento da reclamação trabalhista, tinha o seguinte teor:

"Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal." (sem grifos no original)

Resta claro, pois, que o legislador quis coibir a adoção de qualquer prática discriminatória para acesso a emprego, trazendo, no corpo do dispositivo, mero rol exemplificativo.

Essa intenção fica mais evidente quando se percebe que, após alguns questionamentos, a redação do art. 1º da Lei 9.029/1995 foi alterada pela Lei 12.146/2015, para explicitar o que já era evidente, consoante assim se observa:

"Art. 1º  É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal." (sem grifos no original)

Constata-se, portanto, que o legislador, ao elencar alguns motivos, "entre outros", não pretendeu restringir àqueles pelos quais poderia ser configurada prática discriminatória limitativa de acesso ou manutenção do emprego. Ao contrário, quis deixar evidente o que já tinha estabelecido na redação original do dispositivo, que havia prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso ou manutenção da relação de trabalho por aqueles motivos citados (sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade), sem prejuízo de outros mais que configurassem situação discriminatória.

Dessa forma, tem-se, sem sombra de dúvida, que o art. 1º da Lei 9.029/1995 nunca trouxe rol restritivo, mas apenas exemplificativo, o que conduz à conclusão de que, sendo comprovada conduta discriminatória na dispensa do empregado, tem aplicação o diploma legal sob análise.

Nesse sentido são os seguintes precedentes:

"I - RECURSO DE REVISTA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. COMPROVAÇÃO. REINTEGRAÇÃO. APLICABILIDADE DA LEI Nº 9.029/95. ROL EXEMPLIFICATIVO. SÚMULA Nº 443. NÃO CONHECIMENTO. O egrégio Regional manteve a sentença que entendeu que o rol de dispensa considerada discriminatória previsto no artigo 1º da Lei nº 9.029/95 não é taxativo, mas exemplificativo e não exclui o direito de reintegração da reclamante, dispensada em virtude de seu estado de saúde (trauma sofrido, com submissão a tratamento fisioterápico e psicológico). Sobre o tema, esta Corte Superior vem decidindo que o rol constante da Lei nº 9.029/95 não é taxativo, mas apenas exemplificativo, podendo ser aplicado em casos em que fique evidenciada a conduta discriminatória. Acrescente-se, ainda, que por meio da Súmula nº 443, firmou-se entendimento de que a despedida de empregado portador de doença grave faz presumir a dispensa discriminatória, com direito à reintegração do empregado. A Corte Regional proferiu decisão em consonância com a jurisprudência pacífica desta Corte Superior, o que obsta o conhecimento do apelo segundo a diretriz da Súmula nº 333 e do artigo 896, § 7º, da CLT. Recurso de revista de que não se conhece" (RR-447-80.2011.5.20.0014, Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, DEJT 24/6/2016)

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. RETALIAÇÃO PELO AJUIZAMENTO DE AÇÃO TRABALHISTA. REINTEGRAÇÃO. A Lei nº. 9.029/95, em seu artigo 1º, proíbe a adoção de práticas discriminatórias quanto ao acesso ou manutenção da relação de emprego. Embora o dispositivo se refira a discriminação por "motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade", doutrina e jurisprudência têm entendido que se trata de menção unicamente exemplificativa, a autorizar a aplicação do art. 8º da CLT, para o efeito de reconhecer outras situações de discriminação. Isso se deve ao fato de que a própria Constituição Federal, em seus artigos 3º, IV, 5º, caput, I, VIII, XVII, XX e XLI, 7º, XXX, XXXI e XXXII, veda outras práticas de discriminação. A CLT, em seu art. 373-A, também repele formas de discriminação ao trabalho da mulher, devendo ser acrescentado que a Súmula nº 443 desta Corte é igualmente exemplo de interpretação ampliativa do art. 1º da Lei n º 9.029/95, ao consolidar o entendimento de ser presumível a dispensa discriminatória de empregado portador de HIV. No caso, ficou constatado o abuso do direito potestativo do empregador em dispensar empregados, como meio de punição/retaliação ao ajuizamento de ação trabalhista. Esta Corte, nessas circunstâncias, tem identificado a dispensa discriminatória, a ensejar o direito do empregado à reintegração, nos termos do art. 4º, I, da Lei nº 9.029/95. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10425-06.2014.5.03.0061, Rel. Des. Conv. Paulo Marcelo de Miranda Serrano, 6ª Turma, DEJT 24/6/2016)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. (...) DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. INDENIZAÇÃO PREVISTA NA LEI Nº 9.029/95. DANO MATERIAL. Restou caracterizada a dispensa discriminatória e abusiva, por estar o reclamante, ainda doente, em tratamento neurológico. A reclamada, ao alegar que no momento da rescisão o obreiro encontrava-se apto para o exercício da função, atraiu para si o ônus probatório, do qual não se desincumbiu. Por outro lado, a tese patronal de que o rol previsto na Lei nº 9.029/95 é taxativo quanto às situações caracterizadoras da dispensa discriminatória não se sustenta, na medida em que esta Corte tem entendido que tal rol é meramente exemplificativo. Precedentes. Desprovido (...)" (AIRR-261-32.2013.5.11.0016, Rel. Min. Emmanoel Pereira, 5ª Turma, DEJT 12/2/2016)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. RETALIAÇÃO AO AJUIZAMENTO DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. LIMITES DA CONDENAÇÃO. O exercício da atividade econômica, legitimado em um sistema capitalista de produção, está condicionado pelo art. 170 da Constituição à observância dos princípios nele enumerados, entre os quais se incluem a valorização do trabalho humano, a existência digna, de acordo com a justiça social (caput) e a função social da propriedade (inciso III), este último perfeitamente lido como função social da empresa. Ademais, estabelece vínculo direto e indissociável com os princípios contidos no art. 1º da Constituição, que fundamentam o Estado Democrático de Direito, entre os quais se incluem os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), sem se falar na dignidade da pessoa humana (inciso III). Informados por princípios basilares da atual ordem constitucional pátria, mormente na centralidade da pessoa humana, que decorre da dignidade que é ostentada por todos os indivíduos, forçoso concluir que o rol de condutas discriminatórias, a que se refere o artigo 1º da Lei nº 9.029/95, é meramente exemplificativo. No caso, o Tribunal Regional considerou que o fato de o autor ter sido despedido em razão de ter ajuizado reclamação trabalhista contra a empresa, caracteriza dano moral passível de indenização. O direito potestativo do empregador, de rescindir o contrato de trabalho, não o legitima para, valendo-se do seu poder diretivo e de sua supremacia econômica, praticar ato destinado a punir o empregado que exerceu o direito constitucional de acesso ao Judiciário. Assim, a dispensa discriminatória do autor, por retaliação ao ajuizamento de reclamação trabalhista, enseja o pagamento de indenização por danos morais. Decisão regional que se mantém. Agravo de instrumento a que se nega provimento" (AIRR-726-66.2014.5.02.0433, Rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, 7ª Turma, DEJT 29/4/2016)

"RECURSO DE REVISTA - RECURSO ANTES DA ÉGIDE DA LEI 13015/2014 - DANOS MORAIS - EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS - RELAÇÃO DE EMPREGO REFERENTE À PRODUÇÃO DE SAPATOS - AFRONTA AO ARTIGO 5º, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 186 E 927, DO CÓDIGO CIVIL. 1. A exigência de apresentação de certidão de antecedentes criminais não mantém nenhuma relação com o tratamento a ser dispensado ao empregado, não podendo o empregador negar acessibilidade à função pretendida ao candidato que tenha registro ou não de antecedentes criminais, sob pena de incorrer em atitude discriminatória. Isso porque as repercussões de eventual histórico do indivíduo na esfera penal devem circunscrever-se àquelas previstas em lei, sob pena de utilização dos dados para fins de injustificada discriminação. 2. A imposição do fornecimento da certidão em comento importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação (arts. 1º, III e IV, 3º, IV, e 5º da Constituição Federal), ignorando, ainda, a tão difícil possibilidade de ressocialização do condenado à sociedade. 3. Destaco, ainda, que a Lei nº 9.029/95, em seu artigo 1º, proíbe a adoção de condutas discriminatórias para efeitos de admissão ou manutenção do emprego. 4. Conforme vem decidindo esta Corte Superior Trabalhista, ainda que o rol previsto no artigo 1º, da Lei 9.029/95 não contemple expressamente a situação descrita no acórdão Regional, o rol previsto no dispositivo em questão é meramente exemplificativo, podendo ser aplicado em outros casos de condutas discriminatórias. 4. Exigir-se do trabalhador a apresentação de certidão de antecedentes criminais expõe a intimidade e a integridade do trabalhador, devendo estar restrita às hipóteses expressamente autorizadas por lei , sob pena de violar os princípios constitucionais insculpidos nos artigos 1º e 5º, X, da Constituição Federal. 5. A exibição do citado documento, sem que tal providência guarde qualquer pertinência com as condições objetivamente exigíveis para o emprego ofertado, gera inegável constrangimento, pois o empregador põe em dúvida, a priori, a honestidade e o caráter do trabalhador, aviltando a sua dignidade e o direito ao resguardo da intimidade, vida privada e honra, constitucionalmente garantidos. No presente caso, resta incontroverso que a relação de emprego refere-se à atividade de produção de sapatos, ou seja, não exige tratamento diferenciado ao ponto de se necessitar de apresentação de antecedentes criminais. Desta forma, se o cargo não demonstra tal necessidade, o empregador, ao fazer tal exigência, põe em cheque a dignidade, vida privada e honra do futuro empregado. 6. A Constituição Federal fixa a "dignidade da pessoa humana" como fundamento da República e ao mesmo tempo proclama que são "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação." 7. Já a Lei 9.029/95 expressamente veda a "adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, nestes casos, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII, do artigo 7º, da Constituição Federal." E, conforme precedentes desta Corte Superior Trabalhista, embora o rol expresso na Lei 9.029/95 não contemple a situação exposta nos autos, pode ser aplicado analogicamente, a teor do artigo 8º, da CLT, em outros casos que acarretem práticas discriminatórias que violem o princípio da dignidade e intimidade da pessoa humana, previstos nos artigos 1º, III e 5º, X, da Constituição Federal. E, no caso em tela, observa-se que as normas de proteção ao trabalho que vedam a prática discriminatória para contratação não foram observadas, e, portanto, resta caracterizado o dano moral e o direito à indenização diante do ato ilícito e da prática abusiva do empregador. 8. Desta forma, o procedimento patronal de exigir a apresentação de certidão de antecedentes criminais revela conduta discriminatória, destituída de legitimidade jurídica, e que enseja indenização por danos morais, já que se trata de prática que invade a esfera da vida privada e da intimidade do indivíduo, expondo a integridade e a intimidade do trabalhador, devendo estar restritas às hipóteses expressamente autorizadas por lei, na qual a situação descrita nos autos não se inclui. 9. Logo, não tendo sido observadas as normas de proteção ao trabalho que vedam o uso de condutas discriminatórias para a contratação do trabalhador, tem o Reclamante direito à percepção de indenização por danos morais, decorrente da prática abusiva do empregador, inclusive porque a exigência de exibição de certidão de antecedentes criminais, quando ausente situação que a reclame, incorre em potencial afronta ao art. 5º, X, da Constituição Federal e violação aos artigos 186 e 927, do Código Civil. 10. Destaco que a ilicitude do comportamento dispensa prova de dano, que é presumido, estabelecendo-se pronto nexo de causalidade. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-196900-42.2013.5.13.0024, Rel. Des. Conv. Cláudio Armando Couce de Menezes, 2ª Turma, DEJT 25/9/2015)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - GARANTIA CONTRATUAL DE EMPREGO – DISPENSA ARBITRÁRIA - RETALIAÇÃO PELA PROPOSITURA DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA CONTRA O EMPREGADOR - INDENIDADE - NULIDADE DA DISPENSA- REINTEGRAÇÃO AO EMPREGO. A Corte regional registrou que, por meio de norma intitulada -Política de Avaliação e Desenvolvimento-, o reclamado instituiu um rigoroso sistema de avaliação dos trabalhadores, vinculando-se, por conseguinte, à adoção dos critérios ali estabelecidos para dispensa de pessoal. Nesse contexto, diante da evidência fática de que o reclamante obteve o melhor conceito nas avaliações às quais o reclamado se vinculou e, no entanto, foi dispensado arbitrariamente como forma de retaliação pelo exercício do direito constitucional de acesso ao Poder Judiciário, decidiu a Corte a quo reintegrar o trabalhador no emprego. A incorporação de condição mais benéfica estabelecida pela empresa ao contrato de trabalho decorre do princípio protetivo, que determina o caráter prospectivo do contrato de trabalho. Assim, o direito de não ser dispensado arbitrariamente se agrega ao patrimônio jurídico do trabalhador quando a empresa, por liberalidade, institui critérios para dispensados seus empregados. Nesse sentido, não há violação dos arts. 5º, II, da Constituição Federal e 482 da CLT na decisão regional, porquanto a controvérsia foi dirimida em razão do estatuto contratual singular verificado nos autos. E, ainda que assim não fosse, a conduta empresarial de perseguir o trabalhador em razão do exercício regular do direito de ação também pode ser enquadrada no disposto no art. 1º da Lei nº 9.029/95, ensejando, de toda sorte, a reintegração do empregado, nos termos do art. 4º deste diploma legal. O direito do trabalhador de reclamar judicialmente contra as violações dos seus direitos laborais merece ser garantido em face de medidas de retaliação que ameacem a sua permanência no emprego, sob pena de inviabilizar a atuação do Poder Judiciário trabalhista no curso das relações de emprego. Cabe aqui a utilização do direito comparado, nos termos do art. 8º da CLT, a fim de trazer, do direito espanhol, a construção jurídica a partir da qual emergiu a garantia de indenidade, compreendida como - a imunização que previne o trabalhador contra a represália empresarial a partir de quando ele ajuíza uma ação judicial em face do seu empregador-. O art. 7º, I, da Constituição Federal não pode ser interpretado como um direito absoluto do empregador de dispensar imotivadamente, em detrimento dos demais bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. Nesse sentido, a interpretação do art. 1° da Lei n° 9.029/95, à luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho insculpidos no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, bem como à luz do princípio da não discriminação contido no art. 3º, IV, da Lei Maior e amparado internacionalmente pela Convenção nº 111 da OIT, conduz à conclusão de que o rol de discriminações ali contidas não é taxativo, devendo abranger também a decorrente do exercício do direito de ação, porque o objetivo da diretriz constitucional vedatória da discriminação, num Estado Democrático de Direito, é afastar dos cidadãos toda constrição de direitos pautada em critérios ilegítimos, independentemente de quais sejam esses critérios. Agravo de instrumento desprovido" (AIRR-77700-47.2009.5.04.0019, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 4ª Turma, DEJT 28/9/2012).

Cumpre, ainda, registrar que o art. 4º da Lei 9.029/1995 faculta ao empregado o direito de optar pela reintegração ou percepção em dobro da remuneração do período de afastamento, nos seguintes termos:

"Art. 4º O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre:

I - a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais;

II - a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais".

No caso, restou comprovado que a dispensa foi retaliatória pelo fato de o reclamante ter ajuizado ação contra a empresa. Por outro lado, o reclamante insiste no Recurso de Embargos em sua reintegração aos quadros da reclamada, com o restabelecimento do pagamento de seus vencimentos mensais.

Assim, havendo perfeita adequação aos ditames da Lei 9.029/1995, determina-se a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período do afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros.

Ante o exposto, com fundamento nos arts. 1º e 4º, inc. I, da Lei 9.029/95, DOU PROVIMENTO ao Recurso de Embargos para determinar a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período do afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Recurso de Embargos por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para determinar a reintegração do reclamante ao emprego, com o pagamento de todas as verbas devidas no período do afastamento, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros, vencidos os Exmos. Ministros Guilherme Augusto Caputo Bastos e Renato de Lacerda Paiva.

Brasília, 26 de outubro de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

JOÃO BATISTA BRITO PEREIRA

Ministro Relator

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