TST - INFORMATIVOS 2017 2017 161 - 13 a 30 de junho

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Aloysio Corrêa da Veiga - TST



03 -Acidente de trabalho com óbito. Cortador de cana. Queda de raio. Caso fortuito externo. Ausência de responsabilidade civil objetiva. Indenização por dano moral. Indevida. A indenização por dano moral somente é devida quando houver dano, culpa e nexo de causalidade entre o dano e a conduta antijurídica, conforme o art. 186 do CC. Assim, não há como atribuir à reclamada conduta culposa ou dolosa em relação à morte de empregado cortador de cana atingido por um raio durante o exercício de sua atividade laboral, visto que o acidente decorreu unicamente de caso fortuito externo. De igual modo, não há falar em responsabilidade objetiva da empregadora, pois a atividade desenvolvida pela vítima não ensejava risco de morte inerente à descarga elétrica. Sob esses fundamentos, a SBDI-I, pelo voto prevalente da presidência, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, deu-lhes provimento para restabelecer a sentença que indeferira o pedido de indenização por danos morais. Vencidos os Ministros Alexandre Agra Belmonte, João Oreste Dalazen, Renato de Lacerda Paiva, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta, Hugo Carlos Scheuermann e Cláudio Mascarenhas Brandão. (TST-E-EDRR-195-49.2011.5.19.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 22.6.2017).



Resumo do voto.

Acidente de trabalho com óbito. Cortador de cana. Queda de raio. Caso fortuito externo. Ausência de responsabilidade civil objetiva. Indenização por dano moral. Indevida. A indenização por dano moral somente é devida quando houver dano, culpa e nexo de causalidade entre o dano e a conduta antijurídica, conforme o art. 186 do CC. Assim, não há como atribuir à reclamada conduta culposa ou dolosa em relação à morte de empregado cortador de cana atingido por um raio durante o exercício de sua atividade laboral, visto que o acidente decorreu unicamente de caso fortuito externo. De igual modo, não há falar em responsabilidade objetiva da empregadora, pois a atividade desenvolvida pela vítima não ensejava risco de morte inerente à descarga elétrica. Sob esses fundamentos, a SBDI-I, pelo voto prevalente da presidência, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, deu-lhes provimento para restabelecer a sentença que indeferira o pedido de indenização por danos morais. Vencidos os Ministros Alexandre Agra Belmonte, João Oreste Dalazen, Renato de Lacerda Paiva, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta, Hugo Carlos Scheuermann e Cláudio Mascarenhas Brandão. (TST-E-EDRR-195-49.2011.5.19.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 06.10.2017).

A C Ó R D Ã O

EMBARGOS. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CORTADOR DE CANA. QUEDA DE RAIO. CASO FORTUITO EXTERNO. ACIDENTE DE TRABALHO COM ÓBITO. RESPONSABILIDADE CIVIL. FORÇA MAIOR.  A reparação a ser conferida em decorrência de acidente de trabalho decorre da responsabilidade civil da parte que coloca o empregado em atividade de risco. A aplicação da responsabilidade objetiva, pelo acidente, todavia, deve decorrer da atividade realizada, o que não alcança o caso fortuito externo, quando não verificada a culpa por conduta omissiva ou comissiva do empregador. In casu, havendo excludente de culpa, por se tratar de caso fortuito externo à atividade e à conduta do agente, não há se falar em indenização por dano moral. Embargos conhecidos e providos. (TST-E-EDRR-195-49.2011.5.19.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 06.10.2017).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-195-49.2011.5.19.0000, em que é Embargante USINA CANSANCAO DE SINIMBU SA e Embargados JOSE ALVES FILHO E OUTROS.

O r. despacho da Presidência da 1.ª Turma desta c. Corte, não admitiu os Embargos do ora agravante, que interpõe Agravo Regimental, insistindo na admissibilidade do seu recurso, quanto à indenização por dano moral.

Não foram apresentadas impugnação e contraminuta, conforme certificado.

Sem remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

AGRAVO REGIMENTAL

CONHECIMENTO

Conheço do agravo regimental, porque regular e tempestivo.

MÉRITO

RESPONSABILIDADE. FORÇA MAIOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CORTADOR DE CANA. RAIO. ACIDENTE DE TRABALHO COM ÓBITO

A c. 1ª Turma desta Corte, mediante o v. acórdão da lavra do Exmo. Ministro Hugo Carlos Scheuermann, por decisão da maioria, vencido o Ministro Walmir Oliveira Costa, após prover o agravo de instrumento dos reclamantes, conheceu do seu recurso de revista, por violação dos artigos 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da constituição Federal e, no mérito, deu-lhe provimento para:

"a) indenização pelos danos morais sofridos pelos genitores do falecido, no montante de R$100.000,00 (cem mil reais), corrigida monetariamente a partir desta decisão, na forma da Súmula 439 do TST;

b) pensão mensal – a título de danos materiais-, devida desde a data do óbito até a data em que o trabalhador vitimado completaria 60 anos, no importe correspondente a 2/3 da remuneração percebida pelo empregado à época do infortúnio – a ser aferida nos termos dos arts. 457 e 458 da Consolidação das Leis do Trabalho -, integrada pelo duodécimo do 13º salário e o duodécimo do 1/3 de férias, devendo ser majorada a cada  alteração do piso da categoria a que pertencia a vítima, com atualização monetária desde a extinção do contrato de trabalho - tomada a última remuneração do de cujus como base para o pensionamento;

c) honorários periciais, pela inversão da sucumbência no objeto da pericia. A reclamada deverá proceder à constituição de capital suficiente ao pagamento da pensão. Não incidem descontos fiscais ou previdenciários sobre a indenização por danos morais. A pensão mensal deferida não se sujeita à incidência de descontos previdenciários nem aos fiscais. Juros moratórios de 1% ao mês, na conformidade com os arts. 883 da CLT e 39, § 1º, da Lei 8.177/91, com incidência desde a propositura da demanda trabalhista. Condenação provisoriamente acrescida para R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), com custas de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pela reclamada." (fls. 495/496).

Eis os fundamentos da decisão da c. Turma:

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário dos autores, mantendo a sentença pelo indeferimento do pedido de indenização por danos morais decorrente da morte do filho que sofreu acidente de trabalho. Externou, para tanto, os seguintes fundamentos:

‘Consta na inicial, f. 3/23, que no dia 28.2.2008 o filho dos reclamantes trabalhava para reclamada, exercendo a função de trabalhador rural (cortador de cana), quando, no exercício de sua atividade laboral, foi atingindo por um raio que causou sua morte imediata.

Em sua contestação, f. 51/68, a reclamada alegou que não era o caso de se aplicar a responsabilidade objetiva (art. 927, do CC) pelo fato da atividade de cortador de cana não ser considerada de risco.

Afirmou que o acidente ocorreu em decorrência de uma ação da natureza (força maior), ainda, que ‘não cometeu nenhum ato ilícito, não cometeu omissão, não negligenciou e não agiu com imprudência, de forma que não violou direito, consequentemente não causou dano a outrem’.

Cabe analisar, inicialmente, se é o caso de aplicação da responsabilidade objetiva ou subjetiva.

Pois bem, a responsabilidade objetiva, por conta da 'Teoria do Risco Criado' insculpida no art. 927, parágrafo único, do CCB/2002, dispõe que: 'Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.'

Não se pode esquecer que o disposto na norma jurídica acima transcrita também se aplica ao empregador em relação a seus empregados.

Segundo a doutrina (Revista LTr, abril de 2005, São Paulo, pág. 69-04/460), a 'Teoria do Risco Criado' fixa-se na idéia de que '... se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que essa atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamante, o dano é devido à imprudência, a um erro de conduta.'

E a lei substantiva não diz quais as atividades de risco são alcançadas pelo art. 927, parágrafo único, do CCB/2002, cabendo ao magistrado no caso concreto aquilatar se a atividade é de risco ou não.

Para De Plácido e Silva (na obra Vocabulário Jurídico, volumes III e V, Ed. Forense, pág.149), '... Risco. Na linguagem jurídica, o vocábulo exprime simplesmente o sentido de perigo ou do mal receado: é o perigo de perda ou de prejuízo ou o receio de mal, que cause perda, dano ou prejuízo.'

IN CASU, entendo que a atividade do filho dos reclamantes, cortador de cana, não se enquadra no conceito de 'atividade de risco' acima mencionado, ou seja, a atividade de cortador de cana, por sua natureza, não coloca o trabalhador ou outrem em situação excepcional de risco.

Assim, cabe verificar se o fato ocorreu por culpa da empresa (responsabilidade subjetiva) ou excludente de responsabilidade (força maior).

Como se sabe, para a configuração da responsabilidade subjetiva não basta somente a existência de acidente de trabalho para gerar direito à indenização por danos materiais ou morais, mas é imprescindível restar configurado o nexo de causalidade entre o ato praticado e o resultado danoso, a fim de apurar-se a responsabilidade oriunda da culpa.

É o que diz o art. 7º, inciso XXVIII, da CF/88, ao dispor que é direito dos trabalhadores urbanos e rurais seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que o empregador está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa, bem como o art. 159, do CCB.

Já o art. 5º, inciso V, da CF/88, assegura o direito à indenização por dano material, moral ou à imagem, oriundo do agravo sofrido e o inciso X, do art.5º, da CF/88, aduz que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

IN CASU, tenho que não há como imputar qualquer ato (omissivo ou comissivo) à empregadora que tenha influenciado no acidente de trabalho sofrido.

Restou comprovado, através do laudo pericial (f. 229/239, 254/257 e 261/262), que o 'de cujus', no momento do acidente de trabalho, estava utilizando botas adequadas para o serviço executado, com Certificado de Aprovação (CA) emitido pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Consta também no laudo, f. 262, que o abrigo (ônibus com lona) enquadra-se na hipótese de 'abrigo rústico', exigido pela NR 21 e também na NR 31.

Frise-se, ainda, que não há recomendação nas Normas Regulamentadoras para que o trabalho seja suspenso ou interrompido, tanto que o ‘expert’ afirmou, f. 255, que é 'o bom senso em prol da segurança do trabalhador nos indica que em dias de chuva com emissão de raios é prudente que se paralise as atividades a fim de se evitar possíveis acidentes e até mesmo a morte de empregados, como é o caso dos autos'. Portanto, não há nenhuma recomendação contida nas NR's para que haja suspensão ou interrupção do serviço durante intempéries.

É de se destacar, como bem mencionou o juízo de origem, f. 282, 'o réu tomou todas as medidas de segurança exigidas por lei para tentar minimizar os riscos de acidente trabalho, seja com o fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual adequados, seja com a previsão de abrigo no moldes recomendados pelas normas de segurança'.

Forçoso, assim, é reconhecer que não há nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e qualquer ato praticado pela empregadora.

Com isso, mantém-se a sentença que reconheceu que 'o acidente não guarda relação com qualquer conduta omissiva ou comissiva da reclamada, de modo que está faltando um dos elementos para a caracterização da responsabilidade civil subjetiva, qual seja, a culpabilidade do agente'.

Portanto, como visto acima, não há falar, no presente caso, em responsabilidade objetiva ou subjetiva.

Consequentemente, tem-se que o acidente de trabalho ocorreu em decorrência de 'acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente', conforme art. 501, caput, da CLT, que trata de força maior.

Para a caracterização do caso da força maior é imprescindível a ocorrência de uma situação cujos efeitos não são possíveis de evitar ou impedir.

O direito pátrio admite que o caso fortuito e a força-maior como excludentes da responsabilidade civil.

Caso dos autos.

Por fim, registre-se que os autos dão conta de que a empresa prestou toda a assistência necessária aos parentes do 'de cujus' naquele momento tão difícil.

Desta forma, nada a alterar na sentença que indeferiu o pedido de indenização por danos morais e materiais em decorrência do acidente de trabalho que vitimou o filho dos reclamantes, assim como não reconhecimento a rescisão indireta de trabalho, eis que o acidente de trabalho decorreu de acontecimento inevitável (queda de um raio).’

Os recorrentes sustentam, em síntese, que o acidente que vitimou o seu filho - cortador de cana atingido por um raio - não foi um ‘acontecimento inevitável’, nem se trata de ‘força maior’, como decidido pelo Tribunal Regional. Entendem que o acidente decorreu da imprevidência da reclamada que não cumpriu com o seu dever de interromper as atividades na condição climática verificada na ocasião do acidente, nem deu orientações sobre procedimentos a serem adotados na ocorrência de chuva. Citam o § 1º do art. 501 da CLT, destacando que a imprevidência do empregador exclui a força maior. Indicam violação dos arts. 5º, V e X e, 7º, XXVIII, da Constituição Federal e 159 e 186 do CC, 501 e 504 da CLT e da NR 31 do MTE. Transcrevem aresto para comprovar divergência.

Pois bem. Por divergência jurisprudencial o recurso de revista não lograva conhecimento. O único aresto colacionado é imprestável para comprovar o conflito jurisprudencial, nos termos do item III da Súmula 337, segundo o qual ‘A mera indicação da data de publicação, em fonte oficial, de aresto paradigma é inválida para comprovação de divergência jurisprudencial, nos termos do item I, ‘a’, desta súmula, quando a parte pretende demonstrar o conflito de teses mediante a transcrição de trechos que integram a fundamentação do acórdão divergente, uma vez que só se publicam o dispositivo e a ementa dos acórdãos’.

Da leitura da decisão recorrida percebe-se o equívoco em que incorreu o Tribunal Regional ao consignar que ‘não há nenhuma recomendação contida nas NR's para que haja suspensão ou interrupção do serviço durante intempéries’ (fl. 372). Ao contrário, consta da NR 31 - Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura - normatização específica a ser observada com relação a fatores climáticos, in litteris:

31.19. Fatores Climáticos e Topográficos

31.19.1. O empregador rural ou equiparado deve:

a) orientar os seus empregados quanto aos procedimentos a serem adotados na ocorrência de condições climáticas desfavoráveis;

b) interromper as atividades na ocorrência de condições climáticas que comprometam a segurança do trabalhador.

Além dessa regra específica, há os deveres de o empregador rural ou equiparado: ‘a) garantir adequadas condições de trabalho, higiene e conforto, definidas nesta Norma Regulamentadora, para todos os trabalhadores, Segundo as especificidade de cada atividade’, e mais ‘h) assegurar que se forneça aos trabalhadores instruções compreensíveis em matéria de segurança e saúde, bem como toda orientação supervisão necessárias ao trabalho seguro’ (31.3.3).

Acrescente-se o óbvio, todo empregador tem o DEVER GERAL DE CAUTELA, significa dizer, tem o DEVER de proteger o patrimônio físico, psicológico e moral de seu empregado, tal e qual estabelece a Consolidação das Leis do Trabalho em seu art. 157, nem se diga que esse princípio não se aplica ao empregador rural, porque o dever geral de cautela faz parte do chamado ‘patamar mínimo civilizatório’, expressão cunhada pelo Ministro Maurício Godinho Delgado, estabelecido no art. 7º da Constituição da República, dando máxima efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana. De qualquer sorte, na dicção do art. 13 da Lei n. 5.889/1979, ‘nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em portaria do ministro do Trabalho e Previdência Social’, como não poderia deixar de ser.

Na hipótese vertente, a vítima, cortador de cana, durante sua atividade diuturna no canavial, fora atingido por um raio e falecera instantaneamente, denotando a ausência da previdência devida pela reclamada, por não ter determinado a suspensão da atividade como determina expressamente a NR31 e por não ter cumprido seu dever geral de cautela.

Incontrastável a conduta culposa da reclamada nasce o dever de indenizar, conforme preconizam os artigos 186 e 927 do Código Civil. Dessa forma, tendo em vista que a perda do ente querido decorreu da imprudência da reclamada que não determinara a interrupção do serviço em razão das condições climáticas perigosas, conforme ordena a NR 31, acabando por ceifar uma vida humana, é devida a indenização por dano moral aos seus pais.

À vista de tais considerações, é evidente a violação dos arts. 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República, expressamente indicada pelos recorrentes nas razões de recurso de revista à fl. 389 - PDF seq. 1.

Ante o exposto, conheço do recurso de revista, por violação dos arts. 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República.

II - MÉRITO.

A consequência lógica do conhecimento do recurso de revista por violação de lei é o seu provimento.

Dou provimento ao recurso de revista para, reformando a decisão regional, reconhecer a responsabilidade civil subjetiva da ré. Inverte-se o ônus da sucumbência, no tocante aos honorários periciais. Passa-se ao exame dos pedidos de indenizações por danos morais e materiais, bem como de rescisão indireta."

Os embargos de declaração opostos pela reclamada foram desprovidos, com aplicação de multa de 1% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do CPC.

No recurso de embargos, às fls. 524/543, a reclamada sustenta que "o acidente de trabalho não guarda relação com qualquer conduta omissiva ou comissiva" por parte do empregador. Assevera que o acórdão turmário partiu da premissa de que a embargante não teria determinado a suspensão ou interrupção dos serviços, circunstância fática não delimitada pelo v. acórdão regional. Sustenta que, pelo contrário, "no acórdão regional resulta clara a observância pela embargante de todas as normas de segurança e do dever geral de cautela, concluindo que a fatalidade decorreu de um evento da natureza (raio), externo à atividade, portanto, uma causa excludente de ilicitude". Aduz que "mesmo se houvesse sido provado – o que não foi – que a empresa omitiu-se em ordenar que o empregado paralisasse as suas atividades em razão da chuva – NR31, esse fato não permite a responsabilização da Embargante pelo acidente, uma vez que a situação em cotejo é tipificada como motivo de FORÇA MAIOR vale dizer, decorrente de evento da natureza e imprevisível, mormente na região Nordeste – Estado de Alagoas – onde a emissão de raios não é a regra". Aponta contrariedade à Súmula 126 do TST. Indica violação dos artigos 186 e 393 do Código Civil, 501 da CLT c/c 21, inciso II, alínea "e" da Lei n.º 8.213/91 e 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição Federal. Transcreve um único aresto ao cotejo de teses.

A Presidência da c. 1ª Turma denegou seguimento ao recurso de embargos, nos seguintes termos:

"Cumpre salientar, inicialmente, que o recurso não alcança conhecimento quanto as preliminares arguidas, pois, tendo sido o presente recurso de embargos interposto na vigência da Lei n.º 11.496/2007, o seu cabimento fica adstrito à configuração de divergência entre decisões proferidas por Turmas desta Corte superior, ou destas com julgados da Seção de Dissídios Individuais, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com orientação jurisprudencial ou súmula do Tribunal Superior do Trabalho, ou ainda Súmula do Supremo Tribunal Federal. Resulta inviável, dessa forma, o exame do recurso quanto à apontada violação de dispositivos de lei e da Constituição da República.

Não há falar, de outro lado, em contrariedade à Súmula n.º 126 do TST, uma vez que, na presente hipótese, a egrégia Turma não enveredou no exame de matéria fática, apenas deu novo enquadramento jurídico a matéria, considerando, para tanto, apenas o quadro fático-probatório delineado pela Corte de origem.

O recurso igualmente não se viabiliza por divergência jurisprudencial. O aresto trazido à colação, às pp. 15/19, emanado da egrégia Sexta Turma desta Corte, é inservível ao confronto, porque inespecífico. A Sexta Turma, examinando caso em que o empregado faleceu ‘enquanto laborava na colocação de vidro em janela, tendo como causa fulminação por energia natural, decorrente de fenômeno da natureza (eletricidade atmosférica)’, registrou tese no seguinte sentido: ‘A legislação previdenciária, no art. 21, II, ‘e’, da Lei 8213/91, equipara ao acidente de trabalho o ‘desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de ‘força maior’. Contudo, os acidentes ocorridos em tais circunstâncias não geram o dever de indenizar do empregador por faltar-lhe o nexo de causalidade, se efetivamente forem imprevisíveis e de consequências inevitáveis e não estiverem intrinsecamente ligados à atividade de risco do empregador’. Tal situação fática não se identifica com aquela revelada no acórdão embargado, que trata de trabalhador rural e registra a não observância pela empregadora do disposto na NR 31 - Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura. Imperioso lembrar que, nos termos da Súmula n.º 296, I, do Tribunal Superior do Trabalho, reputam-se divergentes arestos que revelam ‘a existência de teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal, embora idênticos os fatos que as ensejaram’ (os grifos foram acrescidos).

Forçoso concluir, daí, pela plena aplicabilidade à hipótese da jurisprudência sedimentada no referido verbete sumular, impeditivo da veiculação do recurso de embargos por divergência jurisprudencial.

Diante do exposto, não se afigura caracterizada a divergência jurisprudencial, não se justificando o processamento do recurso." (fl.

Nas razões de agravo regimental, a reclamada sustenta a admissibilidade de seu recurso de embargos, insistindo na especificidade da divergência colacionada para exame, além da contrariedade à Súmula nº 126 do c. TST.

A especificidade do aresto colacionado nas razões de recurso de embargos, novamente reproduzido no agravo regimental, transcrito às fls. 553/557, originário da c. 6ª Turma deste Tribunal encontra-se configurada, na medida em que em ambos os casos se discute direito à indenização por danos morais do espólio de empregado falecido durante a prestação de trabalho, em virtude de evento fortuito, no caso, descarga elétrica natural (raio).

Ante ao exposto, dou provimento ao agravo regimental, a fim de admitir o recurso de embargos por divergência jurisprudencial, determinando que seja o feito processado, na forma do art. 3º da instrução Normativa nº 35/2012.

RECURSO DE EMBARGOS

RESPONSABILIDADE. FORÇA MAIOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CORTADOR DE CANA. RAIO. ACIDENTE DE TRABALHO COM ÓBITO

CONHECIMENTO

a c. 1ª Turma desta Corte, mediante o v. acórdão da lavra do Exmo. Ministro Hugo Carlos Scheuermann, por decisão da maioria, vencido o Ministro Walmir Oliveira Costa, após prover o agravo de instrumento dos reclamantes, conheceu do seu recurso de revista, por violação dos artigos 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da constituição Federal e, no mérito, deu-lhe provimento para:

"a) indenização pelos danos morais sofridos pelos genitores do falecido, no montante de R$100.000,00 (cem mil reais), corrigida monetariamente a partir desta decisão, na forma da Súmula 439 do TST;

b) pensão mensal – a título de danos materiais-, devida desde a data do óbito até a data em que o trabalhador vitimado completaria 60 anos, no importe correspondente a 2/3 da remuneração percebida pelo empregado à época do infortúnio – a ser aferida nos termos dos arts. 457 e 458 da Consolidação das Leis do Trabalho -, integrada pelo duodécimo do 13º salário e o duodécimo do 1/3 de férias, devendo ser majorada a cada  alteração do piso da categoria a que pertencia a vítima, com atualização monetária desde a extinção do contrato de trabalho - tomada a última remuneração do de cujus como base para o pensionamento;

c) honorários periciais, pela inversão da sucumbência no objeto da pericia. A reclamada deverá proceder à constituição de capital suficiente ao pagamento da pensão. Não incidem descontos fiscais ou previdenciários sobre a indenização por danos morais. A pensão mensal deferida não se sujeita à incidência de descontos previdenciários nem aos fiscais. Juros moratórios de 1% ao mês, na conformidade com os arts. 883 da CLT e 39, § 1º, da Lei 8.177/91, com incidência desde a propositura da demanda trabalhista. Condenação provisoriamente acrescida para R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), com custas de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pela reclamada." (fls. 495/496).

Eis os fundamentos da decisão da c. Turma:

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário dos autores, mantendo a sentença pelo indeferimento do pedido de indenização por danos morais decorrente da morte do filho que sofreu acidente de trabalho. Externou, para tanto, os seguintes fundamentos:

‘Consta na inicial, f. 3/23, que no dia 28.2.2008 o filho dos reclamantes trabalhava para reclamada, exercendo a função de trabalhador rural (cortador de cana), quando, no exercício de sua atividade laboral, foi atingindo por um raio que causou sua morte imediata.

Em sua contestação, f. 51/68, a reclamada alegou que não era o caso de se aplicar a responsabilidade objetiva (art. 927, do CC) pelo fato da atividade de cortador de cana não ser considerada de risco.

Afirmou que o acidente ocorreu em decorrência de uma ação da natureza (força maior), ainda, que ‘não cometeu nenhum ato ilícito, não cometeu omissão, não negligenciou e não agiu com imprudência, de forma que não violou direito, consequentemente não causou dano a outrem’.

Cabe analisar, inicialmente, se é o caso de aplicação da responsabilidade objetiva ou subjetiva.

Pois bem, a responsabilidade objetiva, por conta da 'Teoria do Risco Criado' insculpida no art. 927, parágrafo único, do CCB/2002, dispõe que: 'Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.'

Não se pode esquecer que o disposto na norma jurídica acima transcrita também se aplica ao empregador em relação a seus empregados.

Segundo a doutrina (Revista LTr, abril de 2005, São Paulo, pág. 69-04/460), a 'Teoria do Risco Criado' fixa-se na idéia de que '... se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que essa atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamante, o dano é devido à imprudência, a um erro de conduta.'

E a lei substantiva não diz quais as atividades de risco são alcançadas pelo art. 927, parágrafo único, do CCB/2002, cabendo ao magistrado no caso concreto aquilatar se a atividade é de risco ou não.

Para De Plácido e Silva (na obra Vocabulário Jurídico, volumes III e V, Ed. Forense, pág.149), '... Risco. Na linguagem jurídica, o vocábulo exprime simplesmente o sentido de perigo ou do mal receado: é o perigo de perda ou de prejuízo ou o receio de mal, que cause perda, dano ou prejuízo.'

IN CASU, entendo que a atividade do filho dos reclamantes, cortador de cana, não se enquadra no conceito de 'atividade de risco' acima mencionado, ou seja, a atividade de cortador de cana, por sua natureza, não coloca o trabalhador ou outrem em situação excepcional de risco.

Assim, cabe verificar se o fato ocorreu por culpa da empresa (responsabilidade subjetiva) ou excludente de responsabilidade (força maior).

Como se sabe, para a configuração da responsabilidade subjetiva não basta somente a existência de acidente de trabalho para gerar direito à indenização por danos materiais ou morais, mas é imprescindível restar configurado o nexo de causalidade entre o ato praticado e o resultado danoso, a fim de apurar-se a responsabilidade oriunda da culpa.

É o que diz o art. 7º, inciso XXVIII, da CF/88, ao dispor que é direito dos trabalhadores urbanos e rurais seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que o empregador está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa, bem como o art. 159, do CCB.

Já o art. 5º, inciso V, da CF/88, assegura o direito à indenização por dano material, moral ou à imagem, oriundo do agravo sofrido e o inciso X, do art.5º, da CF/88, aduz que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

IN CASU, tenho que não há como imputar qualquer ato (omissivo ou comissivo) à empregadora que tenha influenciado no acidente de trabalho sofrido.

Restou comprovado, através do laudo pericial (f. 229/239, 254/257 e 261/262), que o 'de cujus', no momento do acidente de trabalho, estava utilizando botas adequadas para o serviço executado, com Certificado de Aprovação (CA) emitido pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Consta também no laudo, f. 262, que o abrigo (ônibus com lona) enquadra-se na hipótese de 'abrigo rústico', exigido pela NR 21 e também na NR 31.

Frise-se, ainda, que não há recomendação nas Normas Regulamentadoras para que o trabalho seja suspenso ou interrompido, tanto que o ‘expert’ afirmou, f. 255, que é 'o bom senso em prol da segurança do trabalhador nos indica que em dias de chuva com emissão de raios é prudente que se paralise as atividades a fim de se evitar possíveis acidentes e até mesmo a morte de empregados, como é o caso dos autos'. Portanto, não há nenhuma recomendação contida nas NR's para que haja suspensão ou interrupção do serviço durante intempéries.

É de se destacar, como bem mencionou o juízo de origem, f. 282, 'o réu tomou todas as medidas de segurança exigidas por lei para tentar minimizar os riscos de acidente trabalho, seja com o fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual adequados, seja com a previsão de abrigo no moldes recomendados pelas normas de segurança'.

Forçoso, assim, é reconhecer que não há nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e qualquer ato praticado pela empregadora.

Com isso, mantém-se a sentença que reconheceu que 'o acidente não guarda relação com qualquer conduta omissiva ou comissiva da reclamada, de modo que está faltando um dos elementos para a caracterização da responsabilidade civil subjetiva, qual seja, a culpabilidade do agente'.

Portanto, como visto acima, não há falar, no presente caso, em responsabilidade objetiva ou subjetiva.

Consequentemente, tem-se que o acidente de trabalho ocorreu em decorrência de 'acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente', conforme art. 501, caput, da CLT, que trata de força maior.

Para a caracterização do caso da força maior é imprescindível a ocorrência de uma situação cujos efeitos não são possíveis de evitar ou impedir.

O direito pátrio admite que o caso fortuito e a força-maior como excludentes da responsabilidade civil.

Caso dos autos.

Por fim, registre-se que os autos dão conta de que a empresa prestou toda a assistência necessária aos parentes do 'de cujus' naquele momento tão difícil.

Desta forma, nada a alterar na sentença que indeferiu o pedido de indenização por danos morais e materiais em decorrência do acidente de trabalho que vitimou o filho dos reclamantes, assim como não reconhecimento a rescisão indireta de trabalho, eis que o acidente de trabalho decorreu de acontecimento inevitável (queda de um raio).’

Os recorrentes sustentam, em síntese, que o acidente que vitimou o seu filho - cortador de cana atingido por um raio - não foi um ‘acontecimento inevitável’, nem se trata de ‘força maior’, como decidido pelo Tribunal Regional. Entendem que o acidente decorreu da imprevidência da reclamada que não cumpriu com o seu dever de interromper as atividades na condição climática verificada na ocasião do acidente, nem deu orientações sobre procedimentos a serem adotados na ocorrência de chuva. Citam o § 1º do art. 501 da CLT, destacando que a imprevidência do empregador exclui a força maior. Indicam violação dos arts. 5º, V e X e, 7º, XXVIII, da Constituição Federal e 159 e 186 do CC, 501 e 504 da CLT e da NR 31 do MTE. Transcrevem aresto para comprovar divergência.

Pois bem. Por divergência jurisprudencial o recurso de revista não lograva conhecimento. O único aresto colacionado é imprestável para comprovar o conflito jurisprudencial, nos termos do item III da Súmula 337, segundo o qual ‘A mera indicação da data de publicação, em fonte oficial, de aresto paradigma é inválida para comprovação de divergência jurisprudencial, nos termos do item I, ‘a’, desta súmula, quando a parte pretende demonstrar o conflito de teses mediante a transcrição de trechos que integram a fundamentação do acórdão divergente, uma vez que só se publicam o dispositivo e a ementa dos acórdãos’.

Da leitura da decisão recorrida percebe-se o equívoco em que incorreu o Tribunal Regional ao consignar que ‘não há nenhuma recomendação contida nas NR's para que haja suspensão ou interrupção do serviço durante intempéries’ (fl. 372). Ao contrário, consta da NR 31 - Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura - normatização específica a ser observada com relação a fatores climáticos, in litteris:

31.19. Fatores Climáticos e Topográficos

31.19.1. O empregador rural ou equiparado deve:

a) orientar os seus empregados quanto aos procedimentos a serem adotados na ocorrência de condições climáticas desfavoráveis;

b) interromper as atividades na ocorrência de condições climáticas que comprometam a segurança do trabalhador.

Além dessa regra específica, há os deveres de o empregador rural ou equiparado: ‘a) garantir adequadas condições de trabalho, higiene e conforto, definidas nesta Norma Regulamentadora, para todos os trabalhadores, Segundo as especificidade de cada atividade’, e mais ‘h) assegurar que se forneça aos trabalhadores instruções compreensíveis em matéria de segurança e saúde, bem como toda orientação supervisão necessárias ao trabalho seguro’ (31.3.3).

Acrescente-se o óbvio, todo empregador tem o DEVER GERAL DE CAUTELA, significa dizer, tem o DEVER de proteger o patrimônio físico, psicológico e moral de seu empregado, tal e qual estabelece a Consolidação das Leis do Trabalho em seu art. 157, nem se diga que esse princípio não se aplica ao empregador rural, porque o dever geral de cautela faz parte do chamado ‘patamar mínimo civilizatório’, expressão cunhada pelo Ministro Maurício Godinho Delgado, estabelecido no art. 7º da Constituição da República, dando máxima efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana. De qualquer sorte, na dicção do art. 13 da Lei n. 5.889/1979, ‘nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em portaria do ministro do Trabalho e Previdência Social’, como não poderia deixar de ser.

Na hipótese vertente, a vítima, cortador de cana, durante sua atividade diuturna no canavial, fora atingido por um raio e falecera instantaneamente, denotando a ausência da previdência devida pela reclamada, por não ter determinado a suspensão da atividade como determina expressamente a NR31 e por não ter cumprido seu dever geral de cautela.

Incontrastável a conduta culposa da reclamada nasce o dever de indenizar, conforme preconizam os artigos 186 e 927 do Código Civil. Dessa forma, tendo em vista que a perda do ente querido decorreu da imprudência da reclamada que não determinara a interrupção do serviço em razão das condições climáticas perigosas, conforme ordena a NR 31, acabando por ceifar uma vida humana, é devida a indenização por dano moral aos seus pais.

À vista de tais considerações, é evidente a violação dos arts. 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República, expressamente indicada pelos recorrentes nas razões de recurso de revista à fl. 389 - PDF seq. 1.

Ante o exposto, conheço do recurso de revista, por violação dos arts. 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição da República.

II - MÉRITO.

A consequência lógica do conhecimento do recurso de revista por violação de lei é o seu provimento.

Dou provimento ao recurso de revista para, reformando a decisão regional, reconhecer a responsabilidade civil subjetiva da ré. Inverte-se o ônus da sucumbência, no tocante aos honorários periciais. Passa-se ao exame dos pedidos de indenizações por danos morais e materiais, bem como de rescisão indireta."

Os embargos de declaração opostos pela reclamada foram desprovidos, com aplicação de multa de 1% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do CPC.

No recurso de embargos, às fls. 524/543, a reclamada sustenta que "o acidente de trabalho não guarda relação com qualquer conduta omissiva ou comissiva" por parte do empregador. Assevera que o acórdão turmário partiu da premissa de que a embargante não teria determinado a suspensão ou interrupção dos serviços, circunstância fática não delimitada pelo v. acórdão regional. Sustenta que, pelo contrário, "no acórdão regional resulta clara a observância pela embargante de todas as normas de segurança e do dever geral de cautela, concluindo que a fatalidade decorreu de um evento da natureza (raio), externo à atividade, portanto, uma causa excludente de ilicitude". Aduz que "mesmo se houvesse sido provado – o que não foi – que a empresa omitiu-se em ordenar que o empregado paralisasse as suas atividades em razão da chuva – NR31, esse fato não permite a responsabilização da Embargante pelo acidente, uma vez que a situação em cotejo é tipificada como motivo de FORÇA MAIOR vale dizer, decorrente de evento da natureza e imprevisível, mormente na região Nordeste – Estado de Alagoas – onde a emissão de raios não é a regra". Aponta contrariedade à Súmula 126 do TST. Indica violação dos artigos 186 e 393 do Código Civil, 501 da CLT c/c 21, inciso II, alínea "e" da Lei n.º 8.213/91 e 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da Constituição Federal. Transcreve um único aresto ao cotejo de teses.

A Presidência da c. 1ª Turma denegou seguimento ao recurso de embargos, nos seguintes termos:

"Cumpre salientar, inicialmente, que o recurso não alcança conhecimento quanto as preliminares arguidas, pois, tendo sido o presente recurso de embargos interposto na vigência da Lei n.º 11.496/2007, o seu cabimento fica adstrito à configuração de divergência entre decisões proferidas por Turmas desta Corte superior, ou destas com julgados da Seção de Dissídios Individuais, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com orientação jurisprudencial ou súmula do Tribunal Superior do Trabalho, ou ainda Súmula do Supremo Tribunal Federal. Resulta inviável, dessa forma, o exame do recurso quanto à apontada violação de dispositivos de lei e da Constituição da República.

Não há falar, de outro lado, em contrariedade à Súmula n.º 126 do TST, uma vez que, na presente hipótese, a egrégia Turma não enveredou no exame de matéria fática, apenas deu novo enquadramento jurídico a matéria, considerando, para tanto, apenas o quadro fático-probatório delineado pela Corte de origem.

O recurso igualmente não se viabiliza por divergência jurisprudencial. O aresto trazido à colação, às pp. 15/19, emanado da egrégia Sexta Turma desta Corte, é inservível ao confronto, porque inespecífico. A Sexta Turma, examinando caso em que o empregado faleceu ‘enquanto laborava na colocação de vidro em janela, tendo como causa fulminação por energia natural, decorrente de fenômeno da natureza (eletricidade atmosférica)’, registrou tese no seguinte sentido: ‘A legislação previdenciária, no art. 21, II, ‘e’, da Lei 8213/91, equipara ao acidente de trabalho o ‘desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de ‘força maior’. Contudo, os acidentes ocorridos em tais circunstâncias não geram o dever de indenizar do empregador por faltar-lhe o nexo de causalidade, se efetivamente forem imprevisíveis e de consequências inevitáveis e não estiverem intrinsecamente ligados à atividade de risco do empregador’. Tal situação fática não se identifica com aquela revelada no acórdão embargado, que trata de trabalhador rural e registra a não observância pela empregadora do disposto na NR 31 - Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura. Imperioso lembrar que, nos termos da Súmula n.º 296, I, do Tribunal Superior do Trabalho, reputam-se divergentes arestos que revelam ‘a existência de teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal, embora idênticos os fatos que as ensejaram’ (os grifos foram acrescidos).

Forçoso concluir, daí, pela plena aplicabilidade à hipótese da jurisprudência sedimentada no referido verbete sumular, impeditivo da veiculação do recurso de embargos por divergência jurisprudencial.

Diante do exposto, não se afigura caracterizada a divergência jurisprudencial, não se justificando o processamento do recurso." (fl.

Nas razões de agravo regimental, a reclamada sustenta a admissibilidade de seu recurso de embargos, insistindo na especificidade da divergência colacionada para exame, além da contrariedade à Súmula nº 126 do c. TST.

A especificidade do aresto colacionado nas razões de recurso de embargos, transcrito às fls. 553/557, originário da c. 6ª Turma deste Tribunal encontra-se configurada, na medida em que em ambos os casos se discute direito à indenização por danos morais do espólio de empregado falecido durante a prestação de trabalho, em virtude de evento fortuito, no caso, descarga elétrica natural (raio).

Conheço, por divergência jurisprudencial.

MÉRITO

O dano moral decorre de ato (ou omissão) voluntário ou culposo, não abalizado em exercício regular de direito, atentatório aos valores  íntimos da personalidade humana, juridicamente protegidos.

Trata-se, assim, do bem da vida, aferível subjetivamente, para os quais se exige da vítima a comprovação inequívoca dos elementos: dolo ou culpa do agente e o nexo causal entre eles (artigo 818 da CLT e inciso I artigo 333 do CPC).

Nesse contexto, Maria Helena Diniz[1] preleciona que, para a configuração do ilícito a ensejar reparação por danos morais, revelam-se como indispensáveis os seguintes elementos:

"1º) fato lesivo voluntário, ou imputável, causado pelo agente por ação ou omissão voluntária (dolo), negligência, imprudência ou imperícia (culpa), que viole um direito subjetivo individual. É necessário, portanto, que o infrator tenha conhecimento da ilicitude de seu ato, agindo com dolo, se intencionalmente procura prejudicar outrem, ou culpa, se, consciente dos prejuízos que advêm de seu ato, assume o risco de provocar o dano, sem qualquer deliberação de violar um dever;

2º) ocorrência de um dano (...)

3º) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente (...).’ (In Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais, 3º volume. 15. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000. p. 586/587)

Na mesma linha, Sérgio Cavalieri Filho[2], registra que "só deve ser reputado dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico e em seu bem estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazer parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são tão intensas e duradouras a ponto de romper o equilíbrio do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca da indenização pelos mais triviais aborrecimentos".

Dessarte, a indenização por dano moral somente será devida quando houver dano, culpa e nexo de causalidade entre o dano e a conduta antijurídica, nos termos do artigo 186 do Código Civil.

No caso em exame, todavia, não há como se atribuir à reclamada conduta culposa ou dolosa em relação ao dano sofrido pela vítima, eis que decorrente unicamente de evento imprevisível (descarga natural de energia elétrica) que atingiu o empregado durante a prestação de trabalho.

Nesse sentido o art. 393, parágrafo único, do CPC:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

De outro lado, também não há como se identificar, no caso, a responsabilidade objetiva da reclamada, na medida em que a atividade desenvolvida pelo empregado falecido (cortador de cana-de-açúcar) não enseja risco de morte inerente à descarga elétrica. Por conseguinte, também se tem por inaplicável o artigo 927 do Código Civil.

Peço vênia, por ultimo, para citar o Professor Antônio José Levenhagen no comentário do Código Civil, na vigência da antiga redação do art. 393 do Código Civil (art. 1058), que tão bem elucida o conceito de força maior e caso fortuito:

"(...) a culpa é a base da responsabilidade advinda da inexecução total ou parcial das obrigações. Tal conseqüência, entretanto, poderá deixar de existir se o descumprimento da obrigação ocorreu por força de um acontecimento de tal forma poderoso e que tenha ocorrido à revelia da vontade do devedor, que, por isso, lhe exclua qualquer culpa. Esse acontecimento é que, em direito, vem a ser o caso fortuito ou força maior.

É de se levar em consideração, no exame da responsabilidade em que se fundamentou o pedido da vítima se a responsabilidade indicada pela parte autora veio com base na culpa, sendo ela decorrente do caso fortuito é de se afastar a pretensão de reparação do dano, pois evidente que inexistente a culpa.

O eg. TRT deixou claro que não houve comprovação da culpa, porque o de cujus, no momento do acidente de trabalho estava utilizando botas adequadas para o serviço executado, que o abrigo rústico sobre o qual se encontrava (lona) estava dentro das exigências da NR 21 e também 31, além de a eg. Corte ter asseverado o fundamento da r. sentença no sentido de que "o réu tomou todas as medidas de segurança exigidas por lei para tentar minimizar os riscos de acidente' trabalho, seja com o fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual adequados, seja com a previsão de abrigo no moldes recomendados pelas normas de segurança".

Também restou assinalado que "não há nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e qualquer ato praticado pela empregadora".

Não há, portanto, que se falar em responsabilidade por culpa objetiva, no presente caso, nem se depreende do teor do julgado que houve culpa por conduta omissiva ou comissiva da reclamada que tenha determinado o acidente que vitimou o autor, que ocorreu em face de caso fortuito externo.

Aplica-se, portanto, o art. 501 da CLT, que em seus parágrafos dispõem:

Art. 501 - Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

§ 1º - A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior.

§ 2º - A ocorrência do motivo de força maior que não afetar substâncialmente, nem for suscetível de afetar, em tais condições, a situação econômica e financeira da empresa não se aplicam as restrições desta Lei referentes ao disposto neste Capítulo.

In casu, retratado o caso fortuito externo, pela queda do raio que ocasionou o falecimento do empregado, não há se falar em reparação por dano moral, eis que afastado o requisito relativo à culpa do empregador.

Nestes termos, dou provimento ao recurso de embargos da reclamada para excluir da condenação a indenização por danos morais que lhe foi imputada, restabelecendo a r. sentença.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, dar provimento ao agravo regimental para determinar o processamento dos embargos, vencidos os Exmos. Ministros Delaíde Miranda Arantes, relatora, Lelio Bentes Corrêa, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta e Alexandre de Souza Agra Belmonte. Pelo voto prevalente da Presidência, conhecer do recurso de embargos por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer a r. sentença, vencidos os Exmos. Ministros Alexandre de Souza Agra Belmonte, João Oreste Dalazen, Renato de Lacerda Paiva, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta, Hugo Carlos Scheuermann e Cláudio Mascarenhas Brandão.

Brasília, 22 de junho de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Aloysio Corrêa da Veiga

Ministro Relator


[1] In Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais, 3º volume. 15. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000. p. 586/587.

[2] Cavalieri Filho. Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Editora Malheiros. 1996. p. 76

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