TST - INFORMATIVOS 2016 2016 141 - 2 a 15 de agosto

Data da publicação:

Subseção II Especializada em Dissídios Individuais

Douglas Alencar Rodrigues - TST



Ação rescisória. Reintegração por acometimento de doença ocupacional e por ausência de motivação do ato de dispensa. Pretensões autônomas. Inexistência do óbice da Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II. A diretriz consagrada na Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II, no sentido de ser necessário invocar causas de rescindibilidade que infirmem a fundamentação dúplice da decisão rescindenda, não se aplica ao caso em que houve o deferimento de duas pretensões autônomas. Na hipótese, o acórdão rescindendo não adotou motivação dúplice em relação a um único direito, mas reconheceu duas pretensões distintas, quais sejam, o direito à reintegração decorrente da doença ocupacional e o direito à reintegração em virtude da ilegalidade da dispensa por ausência de motivação do ato, as quais, inclusive, geram diferentes consequências. Assim sendo, não há qualquer obstáculo a que o autor dirija a pretensão desconstitutiva apenas contra a ilegalidade da dispensa por ausência de motivação, apontando violação dos arts. 5º, II, 7º, II e III, 37, II, 41 e 173, § 1º, II, da CF. Sob esse fundamento, a SBDI-II, por unanimidade, conheceu do recurso ordinário e, no mérito, deu-lhe provimento para determinar o retorno dos autos à origem a fim de que, afastado o óbice da Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II, examine o pedido de corte rescisório. (TST-RO-889-94.2011.5.09.0000, SBDI-II, rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues, 2.8.2016).



Resumo do voto.

Ação rescisória. Reintegração por acometimento de doença ocupacional e por ausência de motivação do ato de dispensa. Pretensões autônomas. Inexistência do óbice da Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II. A diretriz consagrada na Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II, no sentido de ser necessário invocar causas de rescindibilidade que infirmem a fundamentação dúplice da decisão rescindenda, não se aplica ao caso em que houve o deferimento de duas pretensões autônomas. Na hipótese, o acórdão rescindendo não adotou motivação dúplice em relação a um único direito, mas reconheceu duas pretensões distintas, quais sejam, o direito à reintegração decorrente da doença ocupacional e o direito à reintegração em virtude da ilegalidade da dispensa por ausência de motivação do ato, as quais, inclusive, geram diferentes consequências. Assim sendo, não há qualquer obstáculo a que o autor dirija a pretensão desconstitutiva apenas contra a ilegalidade da dispensa por ausência de motivação, apontando violação dos arts. 5º, II, 7º, II e III, 37, II, 41 e 173, § 1º, II, da CF. Sob esse fundamento, a SBDI-II, por unanimidade, conheceu do recurso ordinário e, no mérito, deu-lhe provimento para determinar o retorno dos autos à origem a fim de que, afastado o óbice da Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-II, examine o pedido de corte rescisório.

A C Ó R D Ã O

RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, V, DO CPC. ACÓRDÃO RESCINDENDO EM QUE DEFERIDA A REINTEGRAÇÃO POR ACOMETIMENTO DE DOENÇA OCUPACIONAL E POR AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DO ATO DE DISPENSA. INEXISTÊNCIA DO ÓBICE DA OJ 112 DA SBDI-2 DO TST.

1. O órgão prolator do acórdão rescindendo deferiu a reintegração da trabalhadora no emprego (i) porque dispensada enquanto submetida a tratamento de doença ocupacional e (ii) porque não motivada a ruptura contratual (pois a empregada fora contratada pelo Banco do Estado do Paraná, sociedade de econômica mista sucedida pelo Banco Itaú S.A.).

2. Na ação rescisória, o Autor dirigiu a pretensão desconstitutiva apenas contra o segundo fundamento, apontando violação dos arts. 5º, II, 7º, II e III, 37, II, 41 e 173, § 1º, II, da Constituição Federal, ao argumento de que as empresas integrantes da Administração indireta submetem-se ao regime próprio das empresas privadas.

3. O TRT julgou improcedente o pedido, com fulcro na diretriz da OJ 112 da SBDI-2 do TST (necessidade de que se invoquem causas de rescindibilidade que infirmem a fundamentação dúplice da decisão rescindenda), anotando que o Autor não se insurgiu contra a determinação de reintegração amparada no acometimento de doença ocupacional.

4. Diferentemente do decidido pela Corte de origem, o caso examinado não atrai a aplicação da diretriz da OJ 112 da SBDI-2 do TST. É que na decisão que o Autor pretende rescindir foram deferidas duas pretensões autônomas: a reintegração decorrente do acometimento de doença ocupacional e a reintegração por ausência de motivação do ato de dispensa. Não se trata de motivação dúplice em relação a um único direito. Cuida-se, na verdade, do reconhecimento de dois direitos distintos (duas pretensões): o direito à reintegração decorrente da doença ocupacional e o direito à reintegração em virtude da ilegalidade da dispensa por ausência de motivação do ato. Note-se, a propósito, que o deferimento das duas pretensões impõe diferentes consequências: a determinação de reintegração baseada em doença ocupacional é, ao menos em princípio, temporária, limitada pelo art. 118 da Lei 8.213/1991, ao passo que a reintegração fundada na impossibilidade de dispensa imotivada impede a ruptura contratual sem motivação ao longo de todo o vínculo empregatício. Assim, não há obstáculo para que a parte condenada na reclamação trabalhista invista apenas contra uma das pretensões deferidas pelo órgão prolator da decisão rescindenda. Recurso ordinário conhecido e provido para determinar o retorno dos autos à origem a fim de que, afastado o óbice da OJ 112 da SBDI-2 do TST, a Corte a quo examine o pedido de corte rescisório. (TST-RO-889-94.2011.5.09.0000, SBDI-II, rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues, 05.08.2016).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n° TST-RO-889-94.2011.5.09.0000, em que é Recorrente ITAÚ UNIBANCO S.A. e Recorrida LUCIANE DO CARMO DE FREITAS WANDEMBRUCK.

ITAÚ UNIBANCO S.A. ajuizou ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC (fls. 3/19) para desconstituir o acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região nos autos da reclamação trabalhista nº 2323640-87.2001.5.09.0009 (fls. 321/353).

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região julgou improcedente a pretensão rescisória (fls. 627/647).

Foram opostos embargos de declaração às fls. 650/652, que não foram providos (fls. 656/659).

O Autor interpôs recurso ordinário às fls. 661/677.

O recurso foi admitido à fl. 680.

Contrarrazões às fls. 683/688.

Os autos não foram encaminhados ao Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

O recurso ordinário é tempestivo (fls. 660/661), a representação processual é regular (fls. 20/34), foram recolhidos o depósito prévio (fl. 35) e as custas processuais (fls. 679).

Processo submetido ao sistema de tramitação eletrônica PJE-JT.

CONHEÇO.

2. MÉRITO

RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, V, DO CPC. ACÓRDÃO RESCINDENDO COM DUPLO FUNDAMENTO PARA UMA MESMA QUESTÃO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE AMBOS OS FUNDAMENTOS. INVIABILIDADE. OJ 112 DA SBDI-2/TST.

O Tribunal Regional, ao julgar a ação rescisória, assim se posicionou (fls. 644/648):

"2. MÉRITO

RESCISÃO DO V. ACÓRDÃO Nº 31286/2006

A pretensão rescisória desmerece acolhida.

Consta, na v. Decisão rescindenda:

‘Desse modo, o laudo pericial considerado demonstra de forma inequívoca, que a Reclamante era portadora de doença decorrente das funções exercidas no Banco Banestado.

...

... comprovado nos autos, pelas demais provas, que a Reclamante estava acometida da doença mencionada na inicial e que, pelas condições de trabalho analisadas pelo perito havia nexo causal entre a doença que era portadora na época da dispensa e o desempenho das atividades nos Reclamados.

...

E não é só. Tenho que a empregada, enquanto em tratamento de saúde, sobretudo decorrente de doença profissional ou acidente de trabalho, não pode ser dispensada’.

O Itaú Unibanco S/A, na Petição Inicial, da Ação Rescisória, nada fala, quanto a tais fundamentos, os quais, por si só (como alega o Parquet), são suficientes à reintegração determinada.

Assim, é desnecessário tecer comentários sobre a alegada violação aos diplomas constitucionais e legais, invocados na Exordial, pois ainda que hipoteticamente se reconhecesse o fato, isso não alteraria o v. Julgado rescindendo, pois a argumentação do Autor não enfrenta todos os fundamentos deste.

Nesse sentido, a OJ 112, da SBDI-II, do TST:

TST OJ SBDI-2 N0 112. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI. DECISÃO RESCINDENDA POR DUPLO FUNDAMENTO. IMPUGNAÇÃO PARCIAL. DJ 29.04.03. Para que a violação da lei dê causa à rescisão de decisão de mérito alicerçada em duplo fundamento, é necessário que o Autor da ação rescisória invoque causas de rescindibilidade que, em tese, possam infirmar a motivação dúplice da decisão rescindenda’.

Assim, julgo IMPROCEDENTE a pretensão.

BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA (PEDIDO FORMULADO PELA RÉ, EM DEFESA)

Em Defesa (fl. 317), Luciane do Carmo de Freitas Wandembruck alegou que ‘não tem condições de pagar custas e honorários de advogado sem prejuízo de seu sustento e de sua família, na forma do que dispõem as Leis nº 1.060/50 e 5.584/70’, e pediu o benefício da Justiça Gratuita.

Com razão.

A Ré preencheu o requisito do art. 4º, caput, da Lei nº 1.060/50. Faz jus aos benefícios da Justiça Gratuita.

DEFIRO.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Luciane do Carmo de Freitas Wandembruck, em Defesa (fl. 317), pediu a condenação do Itaú Unibanco S/A ao pagamento de honorários advocatícios de 15% sobre o valor dado à causa, ‘eis que assistida pelo sindicato da categoria’.

Com, parcial, razão.

A Ação restou improcedente.

O TST, em 26-04-2010, editou a Súmula 425:

JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ALCANCE. O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho’.

Outrossim, em 27-05-2011, restou publicada, no DEJT, a alteração do item II da Súmula 219/TST:

‘É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista’.

A E. Seção Especializada, em 05-07-2010, resolveu adotar tal entendimento para as Ações Rescisórias de competência originária desta Corte. Aplicáveis, então, os dispositivos do CPC referentes à sucumbência (art. 20 do CPC, c/c art. 769 da CLT), inclusive, ex officio.

À vista do grau de zelo do Profissional, Subscritor da Defesa; o lugar de prestação do serviço; a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo Advogado e o tempo exigido para o seu serviço, CONDENO o Itaú Unibanco S/A a pagar, a Luciane do Carmo de Freitas Wandembruck, honorários de sucumbência, de 15% (limite do pedido) sobre o valor da causa (R$ 28.283,38), atualizado." (grifos do original).

Os embargos de declaração foram desprovidos pelo TRT da 9ª Região, em razão da inexistência da omissão apontada.

Nas razões recursais, o Recorrente sustenta, preliminarmente, nulidade do acórdão recorrido por não ter havido manifestação sobre o tema "rescisão do acórdão rescindendo por violação do art. 173, § 1º, II, da Constituição Federal", não obstante a oposição de embargos de declaração para suprir a suposta omissão.

Afirma ser desnecessário hostilizar os dois fundamentos da decisão rescindenda, sendo inaplicável a OJ 122 da SBDI-2/TST "... vez que a pretensão visa extirpar a v. decisão rescindenda que viola o artigo 173, § 1º, inciso II da CF" (fl. 668).

Cita precedente desta Corte no qual, segundo alega, o TST entendeu ser possível a rescisão parcial.

Ao exame.

A alegação preliminar de nulidade do acórdão recorrido confunde-se com o mérito do recurso, razão pela qual será analisada em conjunto.

Conforme se constata, a controvérsia limita-se a verificar a possibilidade de julgamento da ação rescisória fundada em violação legal, quando ajuizada para desconstituição de julgado que, em relação a um único tema, adota duplo fundamento jurídico.

No caso, ao julgar a rescisória, o TRT da 9ª Região decidiu (fls. 325/345):

"(...)

A Autora, na inicial, informou que laborou de 01.04.82 até 16.11.01, exercendo a função de escrituraria, sendo em 08.10.87 promovida à caixa. Afirmou haver laborado sempre em atividades de repetição, em jornadas elastecidas. A partir do segundo semestre de 1997, começou a sentir dores no braço e ombro esquerdos, surgindo a tendinite de Supra espinhoso e túnel do carpo, submetendo-se desde então a tratamento com médico ortopedista e fisioterápico. Ainda, em 22.09.97 afastou-se por 15 dias para tratamento, atendida pelo Dr. Lúcio Sérgio Ernlund. Alegou que após seu afastamento continuou com o tratamento, havendo recomendação médica para mudança de atividades, o que, entretanto não foi acatado pelos Reclamados. Alegou que o departamento médico dos Reclamados deixou de encaminhar a CAT.

Alegou, ainda, que em razão das providências não tomadas pelos Reclamados, seu estado de saúde teria se agravado e, em 21.11.2001, foi emitida a CAT pelo sindicato de sua categoria. Em 12.12.2001, durante a projeção do aviso prévio, sustentou que foi submetida à perícia médica perante o INSS, o qual concluiu pela sua incapacidade para o trabalho por LER (fls. 04/05).

A Reclamante foi dispensada, com aviso prévio indenizado, em 16.11.2001.

Os atestados de fls. 50/51 indicam que a Autora permaneceu afastada, por motivo médico, de 22.09.97 a 06.10.97 e, a partir desta data, por mais dez dias. O documento de fl. 52 confirma que os referidos afastamentos decorreram de tendinite de supra espinhoso à esquerda. À fl. 53 consta CAT subscrito pelo mesmo médico ortopedista que emitiu os atestados de fls. 50/52, encaminhado pelo Reclamado (fl 54), mas não subscrito pelo mesmo.

Os atestados de fls. 54/64 constam atestados médicos indicando que a moléstia perpetuou-se, pois compreendem o interregno de 20.10.97 a 23.10.2001.

Às fls. 65/66 consta CAT emitida em 21.11.2001 pela entidade sindical da categoria, sendo descrita pelo médico a moléstia como sendo "tendinite em membro superior esquerdo", com diagnóstico provável de "tendinite (LER).

Às fls. 67/68 atestados indicam afastamento do trabalho por trinta dias a partir de 21.11.2001, em face da mesma moléstia. O INSS, conforme documento de fl. 69, reconheceu a incapacidade para o trabalho até 18.12.2001.

Os documentos de fls. 762/767, obtidos após a prolação da sentença, confirmam que o INSS reconheceu o acidente de trabalho, concedendo auxílio-doença por acidente de trabalho a partir de 14,05-2005.

O Banco trouxe atestado de saúde demissional, no qual a Autora fora considerada apta, com data de 04.12.01 (fl. 70).

Através da decisão liminar de fls. 140/142 foi determinada a reintegração no emprego após a alta médica do INSS. A reintegração efetivou-se no dia 08.04.2002 conforme certidão de fl. 274, sendo que os Reclamados dispensaram a Autora do comparecimento diário ao trabalho, em caráter provisório, conforme comunicação de fl. 275.

A perícia médica realizada nos autos, pela Dra. Keli Stylianos Patasis, juntado às fls. às fls. 531/552, concluiu:

"1) As funções da autora na ré não envolviam qualquer fator - como força, repetitividade, ritmo intenso, uso de ferramentas vibratórias ou posturas inadequadas - capazes de gerar lesões por sobrecarga biomecânica em seus membros superiores.

2) Esta perita concorda com o INSS, que considerou as dores da reclamante, em dezembro de 2001, sem nexo causai com suas atividades na ré e por isto concedeu4he o beneficio auxílio doença previdenciário - espécie B31- até 18.12.2001.

3) à época em que trabalhou na reclamada, a autora não recebeu auxílio doença previdenciário (espécie B 31), nem auxilio doença acidentário (espécie B 91), em decorrência de dores em membro superior esquerdo.

Argüida a nulidade do laudo pericial pela Reclamante, sob o argumento de que o local onde foi realizada a perícia não teria qualquer semelhança com as condições em que a Autora laborou, foi a mesma acolhida e destituída a Sra. Perita, determinando-se nova perícia (fls. 608/609).

O laudo da nova perícia, realizada pelo Dr. Erico Marques Figueira (fls. 629/638), concluiu:

"Examinamos a Sra. Luciane do Carmo de Freitas Vandenbruck, com história de dor crônica em seu punho esquerdo e ombro esquerdo, que apareceram na época do seu labor e permanece com queixas até hoje.

(...) A autora apresenta dor subjetiva em seu punho esquerdo e discreta reação à manobra de Phalen para processo inflamatório, por tendinite do punho esquerdo, com dor em seu ombro esquerdo, à movimentação ativa e passiva.

NR 17 ergonomia.

Posto de trabalho Caixas: Conforme NR 17 - os guichês atendem parcialmente o recomendado....

O PCMSO - NR 7 (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) desenvolvido pelo Banco do Estado do Paraná - SESMT, no período de setembro/1999 à dezembro/2000.

(...)

Segundo estatística do Banco Banestado, efetuou pelo SESMT, incluído no PCMSO, 'uma amostragem recente realizada por ocasião dos exames periódicos, identificou que, de trezentos funcionários avaliados, aproximadamente cinqüenta destes (16%) apresentaram sintomas de LER/DORT e que possivelmente desenvolverão a doença, caso não forem orientados a tempo ".

(...)

Avaliando os PPRA e PCMSO da empresa, na sua avaliação ergonômica indica a presença de riscos ocupacionais: Movimentos repetitivos na função de Caixa.

(...)

A autora atualmente está afastada pela Previdência Social, em auxílio-doença, recebendo seus salários pela reclamada.

Faz tratamento fisioterápico, acupuntura e medicamentoso.

Diante do exposto concluímos que a autora apresentou a doença alegada na época do seu labor, pelos laudos e atestados médicos anexados nos autos (negritei).

Atualmente apresenta sinais e sintomas de Bursite Subdeltóidea, sem nexo técnico entre suas queixas e a função que exercia na época do seu labor.

A Síndrome do Túnel do Carpo, compressão do nervo mediano com nível do punho esquerdo:

Ao exame clínico apresentou dor à digitopressão com discreta reação à manobra de Phalen -positiva.

Concluímos que ao exame clínico, é compatível ao nexo causai entre as dores do punho esquerdo relatada pela autora (negritci).

O nexo causal correlaciona a clínica com a etiologia, enquanto o nexo técnico relaciona o diagnóstico com o trabalho"

Desse modo, o laudo pericial considerado demonstra de forma inequívoca, que a Reclamante era portadora de doença decorrente das funções exercidas no Banco Banestado.

Ainda evidenciam que Reclamado Banestado não cumpriu com as recomendações constantes na NR-17 (fl. 633).

Ademais, o próprio Banco concluiu que 16% dos seus empregados, na amostragem de 300, apresentam sintomas de LER/DORT e possivelmente desenvolverão a doença, não havendo orientação adequada a tempo.

O fato de o perito utilizar a expressão "Que atualmente a autora apresenta sinais e sintomas de bursite sem nexo técnico entre suas queixas e a função que exercia na época do seu labor", não tem a extensão pretendida pelos Reclamados, mormente porque comprovado nos autos, pelas demais provas, que a Reclamante estava acometida da doença mencionada na inicial e que, pelas condições de trabalho analisadas pelo perito havia nexo causai entre a doença que era portadora na época da dispensa e o desempenho das atividades nos Reclamados.

Também, a concessão do auxílio-doença pelo INSS somente em 12.12.01 não é condição sem a qual não se possa reconhecer o direito à estabilidade acidentaria prevista no art. 118 da Lei 8.213/1991, como pretendem fazer crer os Reclamados. Veja-se que a expressão "após a cessação do auxílio-doença acidentário" constante do referido artigo, somente integra a norma com o fim específico de definir o dies a quo ou início do período de estabilidade. A condição essencial para aquisição do direito à estabilidade é o direito ao benefício de auxílio doença acidentário, que se consubstancia tão somente com a ocorrência de acidente de trabalho ou da doença profissional e no conseqüente afastamento por mais de quinze dias. Desta forma, se o empregado tinha o direito ao benefício e não pôde usufrui-lo por culpa do seu empregador, eis que deixou de emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho. Evidentemente que não se pode, por este motivo, afastar o direito do empregado.

Mesmo porque, nos termos do art. 120 do Código Civil Brasileiro, em vigor à época, presume-se realizada a condição sempre quando for obstada por aquele a quem a desfavorecer. Neste sentido, faz-se oportuno o comentário de SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA:

"O prejuízo mais visível desse procedimento surge guando o trabalhador é dispensado sem justa causa e toma conhecimento que tinha garantia de emprego, peto prazo mínimo de doze meses, em razão do que estabelece o art. 118 da Lei 8.213/91. Isto porque o reconhecimento da estabilidade provisória depende da caracterização prévia do acidente do trabalho, cujo período de afastamento tenha sido superior a 15 dias. Não se trata de prejuízo irrecuperável, porém o caminho para o reconhecimento da estabilidade provisória passa a ter um obstáculo.

Então, como superar esse empecilho, ou seja, como deferir a garantia de emprego se o seu pressuposto lógico da caracterização do acidente do trabalho foi obstado? A resposta é simples e direta porque o art. 120 do Código Civil dá a solução: "Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição, cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte, a quem desfavorecer.

Assim, antes de apreciar o pedido de reintegração no emprego ou indenização equivalente ao período, ê necessário verificar se realmente ocorreu o acidente do trabalho, de modo que, se houvesse a comunicação oficial sonegada pelo patrão, o empregado teria recebido à garantia de emprego". (In: Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador. São Paulo: LTR, 2002, pág. 228).

E não é só. Tenho que a empregada, enquanto em tratamento de saúde, sobretudo decorrente de doença profissional ou acidente de trabalho, não pode ser dispensada.

Do contrário, seria inútil a previsão do art. 168 da CLT, que torna obrigatório o exame médico na ‘demissão’ (art. 168, II, CLT). Somente o empregado que goza de sua saúde pode ser dispensado sem justa causa. Caso apresente moléstia, deverá ser encaminhado para perícia médica (art. 60, § 4º, da Lei nº 8.213/91), tratamento ou mesmo reabilitação profissional (art. 62, Lei nº 8.213/91).

A impossibilidade de dispensa do empregado durante tratamento médico encontra suporte na Constituição Federal, que dispensa à saúde a proteção de direito fundamental (art. 196: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação’), regulando especialmente a proteção à saúde do trabalhador (art. 7°, XXII: ‘redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança’).

Não há dúvida que a dispensa do empregado acometido de moléstia, especialmente quando desencadeada pela atividade desempenhada, retira-lhe o meio de subsistência e reduz (ou anula) a possibilidade de obter novo emprego, obstando tratamento condigno e impedindo a sua recuperação.

Ainda, dispensa de empregado com seqüelas decorrentes de doença profissional, ofende ao princípio fundamental da dignidade humana e a função social do trabalho, transformando a mão-de-obra em mera mercadoria, passível de ser simplesmente descartada quando se mostra debilitada.

Ofenderia, assim, o art. 170 da Constituição Federal, que ao regular os princípios gerais da atividade econômica, estabelece que "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social".

Nesta mesma linha já decidiu este E. Tribunal Regional do Trabalho, através de sua Seção Especializada, por unanimidade, acolhendo o voto paradigmático do E. Juiz NACIF ALCURE NETO, sintetizado na seguinte ementa:

"MANDADO DE SEGURANÇA - LESÃO POR ESFORÇO REPETITIVO - RESILIÇÃO - A matéria dos autos coloca em confronto, de um lado, o direito à saúde, que só será possível com a manutenção do vínculo e a filiação ao plano de saúde e, de outro, o direito potestativo de resilição do empregador. A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República, conforme está positivado no artigo 1º, III, da Constituição Federal e não deve ser entendida como mera figura de retórica, desprovida de efetividade no plano da realidade. A saúde, por certo, integra-se ao conceito mais amplo de dignidade humana. Diante desta, o direito de resilir se apequena, até porque é contrária à consciência jurídica, que alguém que dedicou longos anos de sua vida à atividade empresarial e, em decorrência desta, se vê acometida de doença profissional (LER) possa ser livremente despedida. Mandado de Segurança denegado por unanimidade". (TRT 9a R. - MS 127/2000 - (24500/2000) - SE - Rel. Juiz Nacif Alcure Neto - DJPR 27.10.2000).

Da mesma forma, não há que se falar em limitação a doze meses posteriores ao exames complementares. Como visto, a rescisão contratual efetivada encontra-se eivada de nulidade, pois praticada quando a Reclamante não poderia ser dispensada. Nula a dispensa, impõe-se a reintegração no emprego, como determinado na sentença, o que não comporta prazo de eficácia.

A postulação de devolução "dos valores percebidos pela autora" não pode ser acolhida, porque genérica e inespecífica. Quanto ao seguro desemprego, além de não demonstrado o percebimento, carece legitimidade aos Reclamados o pedido de devolução e nem cabe a esta Justiça Especializada a sua determinação.

Diante do exposto, mantenho a sentença.

III - NULIDADE DA DEMISSÃO - NATUREZA JURÍDICA

Os Reclamados entendem que as normas previstas no art. 37 da Constituição Federal, referentes à estabilidade, não são aplicáveis aos empregados de empresas de economia mista. Argumentam que relevante a venda do Banco do Estado do Paraná S/A ao Banco Itaú S/A. Acrescentam desnecessário motivar o ato da dispensa.

Sem razão.

A dispensa da Reclamante não se insere na discricionariedade do empregador, carecendo de clara motivação, sendo incontroverso nos autos que o ato da dispensa não foi motivado.

Neste sentido oportuna se faz a transcrição da lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, na obra "A Dispensa nas Estatais": "Posto que não é livre a admissão de pessoal nas entidades de direito público, também não é irrestritamente livre o desligamento de seus servidores. (...) Para serem desligados é preciso que haja uma cama de interesse público demonstrável".

No caso, incontroverso que a dispensa da Reclamante foi arbitrária, pelo que não pode ser reputada válida, justificando sua reintegração.

As ementas a seguir transcritas reforçam este entendimento:

"REINTEGRAÇÃO. DISPENSA IMOTIVADA POR ÓRGÃO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA POR OUTROS FUNDAMENTOS. A resilição dos contratos de trabalho de empregados de sociedade de economia mista municipal, que integra a administração pública indireta, não deve ser feita com base no chamado direito potestativo. Inobservados os princípios da legalidade, moralidade e publicidade, a demissão arbitrária é nula, levando à reintegração do empregado. Aplicação do art. 37 'caput', da CF/88, art. 145, III, do Código Civil e 9o, da CLT." (TRT-PR-RO 4.657/95 – AC. 2ª T. 8285/96 - Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther-DJPr 26/04/96)

"DESPEDIDA. EMPRESA DE ECONOMIA MISTA. MOTIVAÇÃO DO ATO. À empresa de economia mista impõe-se a motivação do ato de despedida. A análise pelo Judiciário da motivação indicada restringe-se a perquirir se a conveniência inseriu-se nos limites da razoabilidade ou, ao contrário, se está revestida de arbitrariedade" (TRT 9aR-RO 12.067/97 - Ac. 9.401/98 -3aT.- Rel. Juíza Wanda Santi Cardoso da Silva - DJPR 08.05.1998.)

A tese de defesa no sentido de que, com a privatização, teria o Reclamado Banestado deixado de compor a Administração Pública Indireta, não mais se submetendo ao princípio da motivação não obsta o reconhecimento do direito da Reclamante.

Consoante estabelecem os artigos 10 ("qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados") e 448 ("a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados") da CLT, qualquer alteração na estrutura ou na propriedade do empregador não afeta os contratos de trabalho. Ainda, estabelece o art. 468 da CLT, que as condições do contrato de trabalho não podem ser alteradas sem mútuo consentimento e, ainda que conte com este, se gerarem prejuízo ao empregado, direto ou indireto.

Como conseqüência, as alterações que revoguem ou alterem direitos ou garantias somente geraram efeitos para os empregados contratados posteriormente. Neste sentido a jurisprudência já se consolidou através da Súmula nº 51 do E. TST.

No caso, a privatização do Reclamado Banestado ocorreu no curso do vínculo de emprego da Reclamante, portanto, não poderia atingir as garantias e direitos que já haviam integrado ao seu contrato de trabalho.

Logo, se a Reclamante, antes da privatização, não poderia ser dispensada sem motivação, ante a contratação por empresa da administração pública indireta, a alteração promovida na estrutura jurídica do seu empregador não pode afetar esta garantia, já integrada ao contrato de trabalho.

"Não observado este pressuposto, a dispensa da Reclamante se encontra eivada de nulidade, justificando a sua reintegração no emprego, com o pagamento de salários e vantagens desde a rescisão reputada irrita.

Frise-se que o artigo 173, § 1º, inciso II, da Carta Constitucional, quando estabelece a sujeição das empresas públicas ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias, de forma alguma está afastando a aplicação dos princípios gerais da administração pública, ou obstando que através de regulamento interno assegure garantias trabalhistas além do piso legal. Por sinal, nesse sentido este E. Tribunal pacificou a matéria, através da edição da Súmula nº 3 que assim dispõe: ‘Administração indireta (empresas públicas e sociedades de economia mista) subordina-se às normas de direito público (art. 37, da CF/88), vinculada à motivação da dispensa de empregado público’.

Da mesma forma, não há prova do exercício de cargo de confiança. Quanto às férias, o afastamento compulsório imposto por deliberação exclusiva dos Reclamados não substituem o referido direito, que inclusive pressupõe pagamento antecipado e com o terço constitucional. Logo, também o pedido sucessivo não pode ser acolhido.

Mantenho."

Como se nota, O órgão prolator do acórdão rescindendo deferiu a reintegração da trabalhadora no emprego porque (i) dispensada enquanto submetida a tratamento de doença ocupacional e (ii) porque não motivada a ruptura contratual (pois a empregada fora contratada pelo Banco do Estado do Paraná, sociedade de econômica mista sucedida pelo Banco Itaú S.A.).

Na ação rescisória, o Autor dirigiu a pretensão desconstitutiva apenas contra o segundo fundamento, apontando violação dos arts. 5º, II, 7º, II e III, 37, II, 41 e 173, § 1º, II, da Constituição Federal, ao argumento de que as empresas integrantes da Administração indireta submetem-se ao regime próprio das empresas privadas.

Diferentemente do decidido pela Corte de origem, o caso examinado não atrai a aplicação da diretriz da OJ 112 da SBDI-2 do TST.

É que na decisão que o Autor pretende rescindir foram deferidas duas pretensões autônomas: a reintegração decorrente do acometimento de doença ocupacional e a reintegração por ausência de motivação do ato de dispensa.

Não se trata de motivação dúplice em relação a um único direito.

Cuida-se, na verdade, do reconhecimento de dois direitos distintos (duas pretensões): o direito à reintegração decorrente da doença ocupacional e o direito à reintegração em virtude da ilegalidade da dispensa por ausência de motivação do ato.

Note-se, a propósito, que o deferimento das duas pretensões impõe diferentes consequências. A determinação de reintegração baseada em doença ocupacional é, ao menos em princípio, temporária, limitada pelo art. 118 da Lei 8.213/1991, ao passo que a reintegração fundada na impossibilidade de dispensa imotivada impede a ruptura contratual sem motivação ao longo de todo o vínculo empregatício.

Assim, não há obstáculo para que a parte condenada na reclamação trabalhista invista apenas contra uma das pretensões deferidas pelo órgão prolator da decisão rescindenda.

Portanto, devem os autos retornar à origem a fim de que, afastado o óbice da OJ 112 da SBDI-2 do TST, a Corte a quo examine o pedido de corte rescisório.

DOU PROVIMENTO ao recurso ordinário.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o retorno dos autos à origem a fim de que, afastado o óbice da OJ 112 da SBDI-2 do TST, a Corte a quo examine o pedido de corte rescisório.

Brasília, 2 de Agosto de 2016.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES

Ministro Relator

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