TRT 02/SP - BOLETIM DE JURISPRUDÊNCIA - 2020 13 - 03/07/2020

Data da publicação:

Acordão - TRT

Maria Elizabeth Mostardo Nunes - TRT/SP



Suspensão da exigibilidade. Levantamento da suspensão da exigibilidade. Beneficiário da justiça gratuita. Revogação dos benefícios da justiça gratuita.



PROCESSO TRT/SP Nº 1001387-52.20018.5.02.0703 12ª Turma

ORIGEM: 03ª VT DE SÃO PAULO - ZONA SUL

AGRAVO DE PETIÇÃO

AGRAVANTE: ANTONIO CARLOS ALVES DE MORAES

AGRAVADOS: 1 - MB MORUMBI RESTAURANTE LTDA - ME

    2 - CAROLINA VIEIRA DAS NEVES

RELATOR: MARIA ELIZABETH MOSTARDO NUNES

EMENTA

HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. LEVANTAMENTO DA SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. REVOGAÇÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. MEIO DE IMPUGNAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA FIXADA EM SENTENÇA DE LIQUIDAÇÃO OU SENTENÇA DE HOMOLOGAÇÃO DE CÁLCULOS. LEGITIMIDADE. VIA ADEQUADA. IMPUGNAÇÃO À SENTENÇA DE LIQUIDAÇÃO. FUNGIBILIDADE PROCESSUAL. RAZOABILIDADE.

O advogado tem legitimidade para insurgir-se contra o decidido acerca do seu crédito de honorários de sucumbência na sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos. A Impugnação à Sentença de Liquidação é a via adequada. A Impugnação à Sentença de Liquidação também é a via adequada para o caso de requerimento de levantamento da suspensão da exigibilidade declarada ou reafirmada na sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos ao beneficiário da justiça gratuita, se os fundamentos do requerimento forem anteriores ou contemporâneos à sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos. Se posteriores os fundamentos/ fatos, a manifestação para levantamento da suspensão da exigibilidade, à similitude do que ocorre com o levantamento ou concessão da gratuidade da justiça, pode vir aos autos a qualquer tempo (até o limite temporal do art. 791-A, § 4º, da CLT) e em simples petição. O levantamento da suspensão da exigibilidade depende do levantamento/ revogação da concessão dos benefícios da justiça gratuita, de modo que se deve demonstrar a alteração dos fatos que autorizaram a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Valores de crédito de pouca expressão, ainda que, matematicamente, comportem a dedução do valor da verba honorária, não são suficientes para dedução de que trata o art. 791-A, § 4º, da CLT. (PJe TRT/SP 1001387- 52.2018.5.02.0703 - 12ª Turma - AP - Rel. Maria Elizabeth Mostardo Nunes - DeJT 13/03/2020)

RELATÓRIO

O exequente insurge-se contra a decisão que, retificando a sentença de liquidação, afastou a suspensão da exigibilidade dos honorários sucumbenciais do reclamante, beneficiário da justiça gratuita, determinando a dedução do valor de seu crédito.

Contrarrazões sob ID nº b289273.

É o breve relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

Juízo de Admissibilidade. Correção do Polo Passivo.

Resolve-se superar a incorreção do polo recursal, corrigindo-se o agravado, para fazer constar o advogado, tendo em vista que se discute crédito relativo aos honorários de sucumbência, que pertencem ao causídico. Corrija-se a autuação.

Conhece-se, dado que presentes os requisitos de admissibilidade.

Nulidade. Inadequação. Honorários. Suspensão da Exigibilidade.

Na sentença de liquidação/ homologação dos cálculos (ID nº 1744625), o Juízo de origem, afirmando a suspensão dos honorários de sucumbência de responsabilidade do reclamante, pois beneficiário da justiça gratuita; deixou de determinar a dedução do valor do crédito apurado.

Em simples petição, a reclamada (e não o advogado em causa própria) manifestou-se no sentido de que o crédito apurado comportava a dedução dos valores de honorários de sucumbência de responsabilidade do reclamante, alterou/ "reformou" a sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos, levantou a suspensão da exigibilidade da verba honorária e determinou a dedução do seu valor do crédito apurado ao reclamante.

Chama-se a atenção ao fato de que foi fixado valor bruto ao reclamante no importe de R$ 2.723,92 (a deduzir o valor da contribuição previdenciária de R$ 134,11). Os honorários, a serem descontados, foram fixados em R$ 1.991,89.

Relatados os fatos processuais acima, tem-se que a decisão de ID nº b10677, que levantou a suspensão da exigibilidade dos honorários de responsabilidade do reclamante e determinou a execução pela dedução do crédito apurado, não pode prosperar. É nula, embora, no mérito, também não possa prosperar. O Juiz proferiu decisão interlocutória para estabelecer espécie de "reforma"/ "alteração" da própria sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos em resposta, sem estabelecimento de contraditório, à simples petição da parte.

Não se tratou de pedido de levantamento da suspensão da exigibilidade com fundamento em alteração dos fatos ocorrida após a prolação da sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos, caso em que caberia a manifestação por simples petição e a qualquer momento. Em verdade, a parte pretendeu a alteração do quanto fixado e decidido em sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos por simples petição, sem observância, portanto, dos ritos e prazos processuais. Sabidamente, no processo do trabalho, a sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos pode ser objeto de impugnação por meio dos Embargos à Execução/ Embargos do Devedor ou por meio da Impugnação à Sentença de Liquidação, conforme previsão do art. 884, § 3º, da CLT. Não se altera sentença de liquidação, exceto nos casos de cabimento de Embargos de Declaração com efeito modificativos e outras poucas exceções, por meio de decisão interlocutória que responde à simples petição sem estabelecimento do contraditório. A sentença de liquidação deve gozar de certa estabilidade, porque representa importante marco de definições dos rumos da execução trabalhista. Há meios processuais para impugná-la.

A atuação da parte pela via inadequada (simples petição), que gerou decisão eivada de nulidade pelo Juízo de origem (não havia garantia da execução), fez nascer o interesse recursal do reclamante em relação à decisão interlocutória desacertada e em desrespeito à marcha processual e aos institutos processuais vigentes.

Traz-se à luz a impropriedade dos interessados, que se resolve superar, para corrigir outros tantos equívocos processuais e em homenagem ao princípio da simplicidade e ao princípio da superação das nulidades relativas. Os honorários de sucumbência pertencem ao advogado. Assim, a legitimidade para execução e práticas de outros atos processuais é do profissional advogado e não da empresa que representou.

No caso dos honorários de sucumbência, o advogado, interessado e exequente dos valores correspondentes, pode valer-se da Impugnação à Sentença de Liquidação, para insurgir-se contra o decidido acerca do seu crédito de honorários na sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos. Deve valer-se da Impugnação à Sentença de Liquidação também para o caso de requerimento de levantamento da suspensão da exigibilidade declarada ou reafirmada na sentença de liquidação/ de homologação dos cálculos ao beneficiário da justiça gratuita, se os fundamentos do requerimento forem anteriores ou contemporâneos à sentença de liquidação. Se posteriores os fundamentos/ fatos, a manifestação para levantamento da suspensão da exigibilidade, à similitude do que ocorre com o levantamento ou concessão da gratuidade da justiça, pode vir aos autos a qualquer tempo (até o limite temporal do art. 791-A, § 4º, da CLT) e em simples petição. O levantamento da suspensão da exigibilidade depende do levantamento/ revogação da concessão dos benefícios da justiça gratuita, de modo que se deve demonstrar a alteração dos fatos que autorizaram a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

No caso, no momento da manifestação da reclamada acerca dos honorários, não havia garantia do Juízo, de sorte que sequer cabia o recebimento e processamento imediato da peça simples como Impugnação à Sentença de Liquidação, embora pudesse ter sido aplicado o princípio amplo da fungibilidade processual, para receber a simples manifestação como Impugnação à Sentença de Liquidação e postergar o seu conhecimento para quando garantido o Juízo. Em sede recursal, porém, já se pode verificar que houve pagamento pela reclamada dos valores da execução, de sorte que, reconhece-se a nulidade sem determinação de repetição dos atos. Resolve-se pela aplicação da fungibilidade processual, para receber a manifestação da parte como Impugnação à Sentença de Liquidação, superar a ausência de contraditório prévio e entender que, em ID nº b10677, decidiu-se, por sentença, a Impugnação à Sentença de Liquidação, para conhecer do tema no mérito.

O reclamante tem razão quanto à manutenção da suspensão da exigibilidade dos honorários sucumbenciais, nos termos do art. 791-A da CLT, pois continua beneficiário da justiça gratuita, não havendo qualquer fato novo que possa infirmar a continuidade da miserabilidade jurídica que justifica a manutenção dos benefícios em comento.

O novel artigo dos honorários sucumbenciais do Texto Consolidado tem claramente o objetivo de coibir os abusos nas reclamações trabalhistas, mas, com muita certeza, não tem a intenção de empobrecer a parte, que, em geral, busca crédito alimentar, tampouco pode ser intenção do legislador inviabilizar o acesso do trabalhador ao seu crédito de natureza alimentar pelos riscos do processo, já que, como se sabe, não se decai de pedidos unicamente pela ausência efetiva do direito, mas por questões processuais e probatórias, que, não raramente, só estabelecem verdade material e não real. Não se pode perder de vista que o processo é instrumento para a realização do direito material. As formalidades processuais não têm seu valor em si, de sorte que só têm sentido para o estabelecimento de cada um o que, devidamente, é seu.

O acesso à justiça de modo amplo, efetivo, célere, eficiente e, para as pessoas juridicamente pobres, gratuito, é direito fundamental disposto no artigo 5°, LXXIV da Constituição da República. Não há Estado Democrático de Direito sem um Poder Judiciário forte, firme, justo, confiável e, sobretudo, acessível a todos. O preâmbulo da Lei Maior inaugura o texto Supremo apontando que a instituição do Estado Democrático carrega em si o destino de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais a todos, numa sociedade solidária fincada em valores como a igualdade, a justiça e a solução pacífica de conflitos. E esta missão imposta pelo constituinte originário ao Estado estará fadada ao insucesso se a própria Lei criar embaraços ao acesso à ordem jurídica.

O artigo 1° do CPC de 2015, perfeitamente aplicável no processo laboral, por força do artigo 769 da CLT, determina que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código". Ou seja, na aplicação de qualquer norma de ordem processual, seja no âmbito do processo comum, seja no processo do trabalho, o juiz deve ter em mente o filtro proveniente na supremacia das normas constitucionais.

O artigo acima descrito torna expressa e clara a técnica da interpretação do CPC conforme a Constituição Federal, em relação aos fins maiores do processo judicial, que é a entrega do bem da vida, zelando pela efetividade dos direitos fundamentais.

Ainda vou além. A interpretação de qualquer dispositivo de lei deve levar em conta as determinações do artigo 5° da LINDB, ao dispor que "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". Aliás, no âmbito processual, o artigo 8° do CPC, repete o texto em questão e ainda acrescenta a promoção da dignidade da pessoa humana como finalidade do processo judicial.

Ressalte-se que a lei é produto cultural e, como tal, requer interpretação. A norma não está no texto seco da lei, mas sim no resultado da interpretação feita pelo Juiz no caso concreto. O enunciado da norma jurídica não pode ser confundido com a norma em si, esta sim, produto da interpretação, atividade intelectiva feito pelo Poder Judiciário, e não pelo legislador, animada pelos princípios da hermenêutica, sobretudo aqueles da interpretação sistemática, teleológica e finalística.

Pois bem. Diz o § 4° do artigo 791-A, da CLT, trazido pela Lei 13.467/2017, in verbis:

Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. (Grifamos).

Quando a lei diz "crédito capaz de suportar a despesa", esta expressão deve ser lida em conjunto com a parte final do próprio parágrafo, que exige do credor a prova de "que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade".

A questão é, no caso em tela, sendo o reclamante benefício da justiça gratuita, o crédito do processo, que é essencialmente de valores alimentares e de pouca expressão (R$ 2.723,92 - bruto), não tem força suficiente para retirá-lo da situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse constitucional. É de ausência de qualquer razoabilidade entender que pode suportar o pagamento de honorários no importe de R$ R$ 1.991,89 com o crédito de R$ 2.723,92.

Valores de crédito de pouca expressão, ainda que, matematicamente, comportem a dedução do valor da verba honorária, não são suficientes para dedução de que trata o art. 791-A, § 4º, da CLT.

Desse modo, resta muito claro ser aplicável ao caso a manutenção da suspensão de exigibilidade da obrigação de pagar a verba honorária. Diferente seria se o reclamante tivesse auferido valor significativo que viesse a mudar sua condição financeira, pois, aí sim, estaríamos diante da previsão da lei, justificando que se utilizasse parte do crédito trabalhista para pagamento dos honorários sucumbenciais.

Dizendo com outras palavras, somente seria possível a dedução dos honorários sucumbenciais do crédito do obreiro, se o valor destes mesmos créditos fosse capaz de revogar o benefício da justiça gratuita antes concedido ao reclamante. Não é o caso dos autos neste momento processual, tendo em conta o valor do crédito homologado.

Reforma-se, para restabelecer a suspensão da exigibilidade do valor dos honorários de sucumbência.

DISPOSITIVO.

Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Elizabeth Mostardo Nunes.

Tomaram parte no julgamento os Excelentíssimos Senhores Magistrados Federais do Trabalho Maria Elizabeth Mostardo Nunes (Relatora), Sonia Maria Prince Franzini (Revisora) e Marcelo Freire Gonçalves.

Votação: Unânime.

Isto posto, ACORDAM os Magistrados da 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região em CONHECER do AGRAVO DE PETIÇÃO interposto e, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO. Declara-se nulidade sem repetição dos autos. Corrija-se a autuação na forma da fundamentação.

MARIA ELIZABETH MOSTARDO NUNES

Relator

 

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