SINDICATO OU FEDERAÇÃO Enquadramento

Data da publicação:

Acordão - TRT

Hélio Grasselli TRT/Camp



MOTORISTA QUE TRABALHAVA FORA DA SEDE TEM DIREITO A BENEFÍCIO PREVISTO NA CONVENÇÃO COLETIVA DO MUNICÍPIO ONDE PRESTAVA SERVIÇOS



PROCESSO nº 0010077-16.2021.5.15.0026 (ROT)

RECORRENTES: ANTONIO RODRIGUES DA SILVA , EUCLIDES RENATO GARBUIO TRANSPORTES LTDA

RECORRIDOS: ANTONIO RODRIGUES DA SILVA , EUCLIDES RENATO GARBUIO TRANSPORTES LTDA

ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE PRESIDENTE PRUDENTE

JUÍZA SENTENCIANTE: CAMILA TRINDADE VALIO MACHADO

RELATOR: HELIO GRASSELLI

Relatório

Inconformados com a r. sentença de fls. 828, que julgou parcialmente procedente a ação, recorrem as partes, alinhando os fundamentos de suas discordâncias através das razões de fls. 853 e 888.

A reclamada pugna pela inaplicabilidade das normas coletivas carreadas pelo autor, ao fundamento de que deve ser utilizada a norma do sindicato de Rio Claro, que tem base territorial que abrange a sede da reclamada e insurge-se contra a condenação ao pagamento de prêmio por tempo de serviço, de diferenças de comissões, de diferenças de diárias, de horas extras, horas de intervalo e feriados e de restituição da contribuição assistencial. Insurge-se contra o deferimento dos benefícios da justiça gratuita em favor do autor, aduz que a condenação deve ser limitada ao valor dos pedidos constantes da inicial e deve ser afastada a sua condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, com a condenação do autor.

O reclamante pugna pela majoração da condenação ao pagamento de horas extras e pela condenação da reclamada das horas de intervalo entrejornadas, ao fundamento de que deve ser reconhecida como verdadeira a jornada de trabalho descrita na inicial; pela majoração da condenação ao pagamento de diárias, pela não aplicação da OJ 394, do C. TST, pela condenação da reclamada ao pagamento de danos existenciais e pela majoração da condenação ao pagamento dos honorários advocatícios.

Representação processual regular.

Preparo comprovado.

Contrarrazões apresentadas.

 É o breve relatório.

Fundamentação

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Conheço dos recursos interpostos, eis que preenchidos os seus pressupostos de admissibilidade.

NO MÉRITO

DO ENQUADRAMENTO SINDICAL

A reclamada pugna pela inaplicabilidade das normas coletivas carreadas pelo autor, ao fundamento de que deve ser utilizada a norma do sindicato de Rio Claro, que tem base territorial que abrange a sede da reclamada.

Sem razão.

O enquadramento também é regido pelo princípio da territorialidade, segundo o qual o âmbito de eficácia de uma norma coletiva é fixado com base no local em que se deu a relação jurídico-trabalhista, tendo fundamento no art. 8º, II, da Constituição, que consagra o sistema da unicidade sindical. Assim sendo, tenho que tanto os empregados quanto os empregadores ficam obrigatoriamente restritos às cláusulas da convenção coletiva de trabalho vigente no local de em que se desenvolveu a prestação laboral.

Nesse sentido, a jurisprudência do TST:

(...) ENQUADRAMENTO SINDICAL. NORMAS COLETIVAS APLICÁVEIS. BASE TERRITORIAL DO LOCAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. Verifica-se que o Regional entendeu que "apesar de a ré não ter colacionado o seu estatuto social aos autos, o que já atua em seu desfavor, é fato público e notório que esta (art. 374, I, CPC), a par de atuar na industrialização de alimentos, também comercializa produtos, aplicando-se as normas coletivas dos empregados no comércio, de Belo Horizonte e região metropolitana (p. ex. cláusula 1ª, CCT 2009 - f. 194). Tanto é que a entidade foi reconhecida pela própria empregadora como beneficiária das contribuições sindicais nos anos de 2009 a 2011 (f.555)". Consignou que "as normas coletivas apresentadas pela ré têm abrangência territorial limitada a municípios do Estado de São Paulo (p. ex. ACT 2009/2010-f. 621). Aplicáveis, portanto, as cláusulas normativas previstas nas CCT adunadas pelo autor". O enquadramento sindical, conforme posicionamento já consagrado nesta Corte superior, é efetivado em estrita observância ao disposto no artigo 8º, inciso II, da Constituição Federal, que, em que pese garantir o livre exercício sindical, impõe como regra a instituição de apenas um sindicato representante de uma categoria econômica em cada base territorial, mediante a consideração da categoria econômica da empresa, de modo que é indevida qualquer forma de enquadramento de representação sindical balizada em requisito distinto que não o ramo empresarial da respectiva empresa empregadora. Verifica-se que o Regional entendeu aplicáveis ao reclamante as normas coletivas firmadas pelos sindicatos que representam as categorias profissional e econômica de Belo Horizonte e Região Metropolitana, local da prestação dos serviços, e não de São Paulo, onde fica a sede da empresa. Portanto, o Tribunal Regional do Trabalho definiu o enquadramento sindical do reclamante pela regra da base territorial do local de prestação de serviços, nos termos dos artigos 611 da CLT e 8º, inciso II, da Constituição Federal. A pretensão da reclamada à aplicação das normas coletivas firmadas pelo Sindicato patronal de São Paulo às relações empregatícias em curso no Estado de Minas Gerais importaria em favorecer a concorrência desleal na atividade econômica desenvolvida (precedentes). (...) (AIRR-1301-46.2014.5.03.0110, 2ª Turma, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 18/05/2018).

RECURSO DE REVISTA. 1. ENQUADRAMENTO SINDICAL. NORMA COLETIVA APLICÁVEL. BASE TERRITORIAL. LOCAL DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. NÃO CONHECIMENTO. O entendimento desta colenda Corte Superior consolidou-se no sentido de que a representação sindical, inclusive dos empregados integrantes de categoria diferenciada, ocorre de acordo com o local da prestação dos serviços, independentemente da localização da sede da sociedade empresária. Precedentes. Na hipótese vertente, o egrégio Tribunal Regional consignou que o reclamante exercia a função de motorista e desempenhava suas atividades em locais diversos, mas sua base de lotação era o município de Pelotas. Dessa forma, entendeu que se aplicam as normas coletivas pertinentes à região do Extremo Sul, as quais abrangem a referida cidade. O v. acórdão recorrido, portanto, está em conformidade com a atual, iterativa e notória jurisprudência deste Tribunal Superior, razão pela qual o conhecimento do recurso de revista encontra óbice no artigo 896, 7º, da CLT e na Súmula nº 333. Recurso de revista de que não se conhece. 2. ...................... Recurso de revista de que se conhece e ao qual se dá provimento# (RR-1176-15.2013.5.04.0101, 4ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 20/09/2019).

Assim sendo, tenho por correta a sentença de origem, que diante da comprovação pela prova oral produzida que a cidade de Presidente Prudente era o local de predominância da prestação de serviços do autor, entendeu pela aplicação da norma de tal localidade e que por conseguinte fora carreada com a inicial (fls. 56).

Nada a reformar.

DO PRÊMIO POR TEMPO DE SERVIÇO

Mantida a aplicabilidade das normas coletivas carreadas com a inicial, fica mantida a condenação imposta pela origem, de pagamento do prêmio por tempo de serviço.

Mantida a condenação ao pagamento do principal, fica mantida a condenação reflexa, sendo que tal condenação não afronta o disposto em norma coletiva, pois a cláusula 14ª, transcrita pela reclamada em suas razões recursais, veda a natureza salarial do prêmio por tempo de serviço especificamente para fins de equiparação salarial.

Nada a reformar,

DA COMISSÃO/PRÊMIO TRANSPORTE

A reclamada insurge-se contra a condenação ao pagamento de diferenças de comissão/prêmio transporte, ao fundamento de que, ao contrário do que constou na r. sentença teria carreado toda a documentação necessária e que para o pagamento de comissão havia regra fixada em acordo coletivo de trabalho apresentado com a defesa. Lado outro, aduz que os pagamentos devem ser validados na forma da CCT do autor.

Sem razão.

No caso em tela, a tese inicial é no sentido de que seria devida em favor do autor uma comissão de 07%, a incidir sobre a produção mensal do caminhão, que não era observado pela reclamada que quitava os valores em índices inferiores ao devido.

Em sede de contestação a reclamada alegou que não havia ajustado tal percentual e que as comissões seguiam o regramento previsto em norma coletiva, no caso o ACT carreado com a defesa.

Contudo, além de ser afastada a aplicação das normas coletivas carreadas com a defesa, o preposto da reclamada confessou que o cálculo das comissões era efetuado com base em 07% sobre o valor líquido do faturamento mensal.

Assim sendo, tenho que está correto o posicionamento da origem que condenou a reclamada ao pagamento de diferenças, pois além dos critérios supostamente alegados pela reclamada e com base no ACT carreado com a contestação, não serem aplicados aos presentes, não há nos autos prova ou demonstração de como a reclamada teria feita tal cálculo, ou seja, caberia a ela provar a correta quitação dos valores devidos, por se tratar de fato impeditivo do direito do autor, o que não foi feito.

Não cabe se falar que a norma coletiva carreada com a inicial serviria de amparo para validar os pagamentos que foram efetuados, pois ela trata do assunto de forma genérica.

Nada a reformar.

DAS HORAS EXTRAS E DOS INTERVALOS ENTRE E INTRAJORNADA

A reclamada insurge-se contra a condenação ao pagamento de horas extras, horas de intervalo intrajornada, ao fundamento de que deve ser reconhecida a veracidade dos horários lançados em controle eletrônico sem assinatura do autor, eis que amparados nas normas coletivas carreadas com a contestação, onde todos os horários de trabalho fora devidamente registrados inclusive o intervalo intrajornada de uma hora e tudo foi devidamente pago.

O reclamante pugna pela majoração da condenação ao pagamento de horas extras e pela condenação da reclamada ao pagamento das horas de intervalo entrejornadas, ao fundamento de que deve ser reconhecida a veracidade da jornada de trabalho descrita na inicial, ante a imprestabilidade dos controles de horário praticados pela ré.

Sem razão.

Primeiramente é de se salientar que a lei 12.619/2012 foi expressa ao determinar o controle de jornada do motorista, reportando-me, neste ato, ao art.1º, inciso V. O trecho foi revogado pela lei 13.103/2015, todavia, a última norma igualmente estabeleceu o controle de jornada (art.2º, inciso V, alínea "b").

Lado outro, é bom frisar que a aplicabilidade das normas coletivas carreadas com a contestação fora afastada em tópico anterior.

Ainda que o Código de Processo Civil contenha regra própria para o embate das provas documentais e orais (art. 443, I, do CPC), esta deve ser transportada com os cuidados devidos (art. 769 da CLT), tendo em vista que esta Justiça Especializada alberga o princípio do contrato realidade.

In casu, a prova documental, no caso os relatórios de viagem carreados pela reclamada, contudo em referidos documentos (fls. 433/567), que foram impugnados pelo autor, não contém os horários de labor específicos do autor, mas somente contam com a movimentação do veículo e não especificavam as paradas quanto ao seu tipo se eram de carga e descarga, fila ou intervalo.

Conforme bem frisou a origem:

"De fato, analisando a prova oral produzida, observo que, de fato, o mecanismo utilizado pela empregadora, consistente no instrumento de inserção pendrive, não é capaz de demonstrar, fidedignamente, a jornada executada. Isso porque, como declinou a testemunha ouvida pela própria reclamada, Sr. DIOGO DOS SANTOS, o sistema de controle via pendrive permitia que o caminhão só fosse ligado mediante sua inserção, quando passava a fazer o registro e monitoramento do veículo. Logo, ele registrava o início e término (ligar e desligar o caminhão), bem como eventuais paradas (sem condução veicular), contudo, não era capaz de fazer distinção entre essas paradas, isto é, se estavam sendo para fins de carga e descarga, para aguardo de fila ou para intervalo para refeição e descanso. Outrossim, a testemunha ainda esclareceu que posteriormente o sistema de pendrive foi trocado pelo sistema de macros, no qual é possível o condutor lançar exatamente a tarefa realizada, ou seja, se está em carga ou descarga, em espera na fila ou em refeição. Friso que o sistema de macros não foi contemplado durante o contrato do autor, sendo recurso mais recente aos trabalhadores da reclamada. Assim, constatado que a reclamada não cumpriu seu dever de anexar aos autos os diários de bordo ou outra forma fidedigna contendo as informações acerca da jornada de trabalho do reclamante presumo verdadeira a jornada de trabalho declinada pelo autor, transferindo à reclamada o ônus de comprovar que autor tivesse trabalhado em jornada diversa daquela constante na peça inicial. "

Quanto à jornada de trabalho fixada pela origem, qual seja: de segunda à sexta-feira, das 06h às 19h, com trinta muitos de intervalo intrajornada e tempo de espera de 02 horas diárias e aos sábados das 06h às 12h, sem intervalo, tenho que ela não carece de reparos, pois a imprestabilidade do sistema de controle de horários da reclamada não induz automaticamente à aplicação da jornada de trabalho descrita na inicial, devendo o julgador sopesar a prova oral conforme foi bem feito pelo juízo de origem que fixou a jornada com base na média dos depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo e considerando os fatos alegados pelo autor na inicial.

Assim correta a sentença de origem, que condenou a reclamada ao pagamento de horas extras, assim entendidas como as excedentes à oitava diária e quadragésima quarta semanal, com base nos horários lançados nos cartões de ponto, não havendo se falar que deveria se observar a sistematica de cômputo da reclamada, pois as verbas salariais devem ser pagas no mês seguinte ao laborado.

Ficando comprovado nos presentes que o reclamante não usufruía do intervalo destinado ao repouso e alimentação, devida é a condenação ao pagamento do período integral de uma hora, com fulcro no § 4º, do artigo 71, da CLT e na Súmula 437, do C. TST, abaixo transcritos, relativamente ao período anterior à data de entrada em vigor da Lei 13.46/2017

Art. 71 - Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.

(...)

§ 4º - Quando o intervalo para repouso e alimentação, previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.

Nesse sentido também dispõe a Súmula 437 do C. TST:

INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais n.os 307, 342, 354, 380 e 381 da SBDI-1)

I - Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.

(...)

III - Possui natureza salarial a parcela prevista no art. 71, § 4º, da CLT, com redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de 1994, quando não concedido ou reduzido pelo empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras parcelas salariais.

Sendo que, com relação ao período posterior à entrada em vigor da Lei 13.467/2017, é devido apenas o período suprimido de 30 minutos, conforme já fixou a r. sentença.

Nunca sendo demais ressaltar que, em relação ao direito material, a alteração legislativa aplica-se aos fatos ocorridos a partir de sua vigência. Ou seja, é pacífico o entendimento de que somente se aplicam as novas regras às relações jurídicas não consumadas na data de início da sua vigência (artigo 5º, XXXVI, da CF/88; artigo 912, da CLT e artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Trata-se, pois, da estrita observância do princípio da segurança jurídica, essencial à concretização da finalidade primordial do ordenamento jurídico.

Assim, a cada novo fato deve ser aplicada a legislação então vigente.

Nesse mesmo sentido, a recente Instrução Normativa nº 41/2018 aprovada pelo C. TST, orientando sobre a aplicabilidade das normas processuais da Consolidação das Leis do Trabalho alteradas pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017.

Assim sendo, tenho que as regras de direito material devem ser aplicadas de imediato, atingindo inclusive os contratos em curso.

Mantida a jornada fixada pela origem, não há violação ao intervalo entre duas jornadas de trabalho, consoante o previsto nos artigos 66 e 67, da CLT.

Quanto à OJ 394, correta a sentença que determinou a sua aplicação, eis que a decisão proferida pelo C. TST, no 0010169-57.2013.5.15.0013 fora suspensa e seus efeitos postergados para período posterior ao julgamento.

Nada a reformar.

DAS DIFERENÇAS DE DIÁRIAS

A reclamada insurge-se contra a condenação ao pagamento de diferenças de diárias, ao fundamento de que os valores foram corretamente adimplidos e em conformidade com a norma coletiva carreada com a contestação.

O reclamante pugna pela majoração da condenação ao pagamento das diárias, para que sejam acrescidas as diárias inerentes ao pernoite e café da manhã, em razão do reconhecimento da veracidade da jornada descrita na inicial.

Sem razão.

Mantida a aplicabilidade das normas coletivas carreadas com a inicial e a jornada de trabalho fixada pela origem, fica mantida a condenação da reclamada ao pagamento das diárias relativas ao almoço e jantar. Insta salientar que o juízo de origem, já fixou a natureza indenizatória da verba em questão.

Nada a reformar.

DOS DANOS EXISTENCIAIS

O dano existencial, nas relações de trabalho, é aquele sofrido pelo trabalhador ao ser privado de seus projetos de vida e de suas relações, quando impedido de usufruir o seu tempo livre.

Decorre das exigências exacerbadas do empregador, que o coloca em situação de trabalho extenuante, seja por excesso de sobrejornada, pela exigência além das forças de trabalho, pela não concessão de férias ou qualquer outro ato que impeça o trabalhador de poder realizar um projeto de vida ou mesmo de viver suas relações sociais.

Em relação ao assunto, explica Amaro Alves de Almeida Neto:

"toda pessoa tem o direito de não ser molestada por quem quer que seja, em qualquer aspecto da vida, seja físico, psíquico ou social. Submetido ao regramento social, o indivíduo tem o dever de respeitar e o direito de ser respeitado, porque ontologicamente livre, apenas sujeito às normas legais e de conduta. O ser humano tem o direito de programar o transcorrer de sua vida da melhor forma que lhe pareça, sem a interferência nociva de ninguém. Tem a pessoa o direito às suas expectativas, aos seus anseios, aos seus projetos, aos seus ideais, desde os mais singelos até os mais grandiosos: tem o direito a uma infância feliz, a constituir uma família, estudar e adquirir capacitação técnica, obter o seu sustento e o seu lazer, ter saúde física e mental, ler, praticar esporte, divertir-se, conviver com os amigos, praticar sua crença, seu culto, descansar na velhice, enfim, gozar a vida com dignidade. Essa é a agenda do ser humano: caminhar com tranquilidade, no ambiente em que sua vida se manifesta rumo ao seu projeto de vida." (in Dano existencial a tutela da dignidade da pessoa humana. Revista de Direito Privado, São Paulo, v. 6, n. 24, mês out/dez 2005 p. 50-51).

Embora tenha ficado demonstrado que o autor se submetia frequentemente a uma jornada extensa diária não restou comprovado que deixou de realizar atividades em seu meio social ou tenha sido afastado do seu convívio familiar para estar à disposição do empregador, de modo a caracterizar a ofensa aos seus direitos fundamentais.

Ademais, a ofensa não pode ser presumida, pois o dano existencial, ao contrário do dano moral, não é "in re ipsa", de forma a se dispensar o empregado do ônus probatório da ofensa sofrida.

Assim, não obstante se tratar de jornada cansativa, não se depreende que o dano social ao empregado, daí decorrente, tenha sido de tal monta que enseje indenização. Com efeito, a prestação de trabalho em regime de sobrejornada já se encontra reparada pela condenação da reclamada ao pagamento de horas extras, com juros e correção monetária.

Para se ter direito ao pagamento de indenização por dano existencial (espécie de dano moral), deve haver comprovação do efetivo dano, o que não ocorreu "in casu". A realização de horas extras em excesso, por si só, enseja apenas o pagamento das verbas próprias, mas não repercutem em ofensa à honra, à imagem ou à dignidade profissional do reclamante, não havendo afronta aos incisos V e X, do artigo 5º, da Constituição Federal.

Nesse sentido, vem decidindo o C. TST, in verbis:

"RECURSO DE REVISTA - INDENIZAÇÃO POR DANOS EXISTENCIAIS. JORNADA EXCESSIVA. A prorrogação da jornada de trabalho, ainda que em excesso, não enseja, por si só, direito ao pagamento de indenização, cabendo ao empregado comprovar a lesão efetiva , visto tratar-se de fato constitutivo do direito postulado. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido". (TST - RR: 18828420165120031, Relator: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 12/09/2018, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/09/2018)

"RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL EXISTENCIAL. JORNADA EXCESSIVA. Na hipótese dos autos, a indenização foi deferida pelo excesso da jornada de trabalho. Apesar de constar no acórdão regional que o Autor chegava a laborar 13 horas em um dia, não ficou demonstrado que ele tenha deixado de realizar atividades em seu meio social ou tenha sido afastado do seu convívio familiar para estar à disposição do Empregador. No caso destes autos, não se pode afirmar, genericamente, que houve dano moral in re ipsa, isto é, independentemente de prova da efetiva lesão à honra, à moral ou à imagem do empregado. Não houve demonstração cabal do prejuízo, tampouco foi comprovada a prática de ato ilícito por parte da empregadora. Logo, não é devida a indenização. Recurso de Revista conhecido e provido". (TST-RR-20439-04.2015.5.04.0282, 4ª Turma, Rel.ª Min.ª Maria de Assis Calsing, DEJT de 09/02/2018)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. REGIDO PELA LEI 13.015/2014. 1. DANOS MORAIS. JORNADA DE TRABALHO EXCESSIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Esta Corte, analisando casos como o dos autos, em que se postula indenização decorrente de jornada laboral excessiva, tem entendido tratar-se do denominado 'dano existencial', que, por seu turno, não é presumível - in re ipsa. De fato, para além da ilicitude resultante da superação do limite legal de prorrogação da jornada, cujos efeitos se resolvem com o pagamento correspondente (CLT, art. 59) e com a sanção aplicável pelos órgãos de fiscalização administrativa (CLT, art. 75), o prejuízo causado para o desenvolvimento de outras dimensões existenciais relevantes deve ser demonstrado, não decorrendo, ipso facto, da mera exigência de horas extras excessivas. Na hipótese dos autos, não há registro quanto à existência de elementos que indiquem ter havido a privação de dimensões existenciais relevantes (lazer, cultura, esporte e promoção da saúde, convívio familiar e social etc.), capazes de causar sofrimento ou abalo à incolumidade moral da Reclamante. Nesse contexto, não há que se falar em danos morais. Agravo de instrumento não provido". (TST-AIRR-12-46.2015.5.23.0091, 5ª Turma, Rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues, DEJT de 13/10/2017)

Portanto, reformo a r. decisão de origem, para afastar a condenação ao pagamento do dano existencial.

CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL E CONFEDERATIVA

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, tendo por fundamento o postulado constitucional que garante a liberdade de associação, consagrou que a contribuição confederativa e/ou assistencial, à luz do disposto no artigo 8º, IV, da Carta Magna, por não se revestir de caráter tributário, somente pode cobrada pelas entidades sindicais de seus respectivos filiados.

A Súmula Vinculante nº 40 do STF, assim dispõe :

A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição Federal, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.

Não há, portanto, como acolher a tese do apelo, visto que os seus fundamentos não se sustentam, pois a empresa reclamada não trouxe aos autos elementos que evidenciem que a reclamante era associada ao respectivo grêmio sindical.

Mantém-se.

DA LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR DOS PEDIDOS

A condenação não pode se limitar ao valor estimado na peça inicial.

Ainda que se considere que, a partir da vigência da Lei n.º 13.467/2017, foi determinado que as ações propostas deverão vir com os pedidos individualizados na petição inicial com a indicação estimada de seu respectivo valor monetário, e que tal se aplique ao caso dos autos, já que a propositura da presente demanda se deu na vigência da referida Lei, têm-se que os valores correspondentes aos pedidos, indicados na petição inicial, são meramente estimativos e servem, ainda, para apurar o valor aproximado da causa, a fim de se determinar o rito a ser seguido, não podendo, todavia, causar prejuízos ao autor, quanto aos direitos reconhecidos em Juízo.

Nem mesmo a partir da nova redação do art. 840 da CLT, dada pela Lei n.º 13.467/17, se cogita de limitação dos valores apurados em liquidação àqueles expressos na petição inicial.

Neste sentido, o art. 12, §2º, da Instrução Normativa n.º 41do C. TST, segundo a qual: "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil."

Nada a reformar.

DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Mantida a sucumbência da reclamada, fica mantida a sua condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, cujo percentual fixado pela origem (10%), reputo condizente com a complexidade do caso e com o labor prestado pelo advogado do autor.

Ante a manutenção do julgado não cabe se falar em imputação ao autor da verba honorária sobre todos os pleitos indeferidos, ficando mantida a sucumbência fixa da na origem.

Nada a reformar.

DA JUSTIÇA GRATUITA

O art. 99 do NCPC em seu § 2º, assim disciplina a matéria:

§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

O artigo 790 da Consolidação das Leis do Trabalho, em seus parágrafos 3º e 4º, já com a nova redação dada pela Lei 13,467/2017, prevê que:

§ 3º - É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 4º - O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

A exegese de tais dispositivos legais à luz do ditame constitucional de acesso à justiça, permite concluir que o trabalhador pode demonstrar a sua impossibilidade de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo para seu sustento e de sua família, por meio de declaração de hipossuficiência.

Nesse sentido, inclusive, o art. 99, §3º do CPC prevê que "Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural." (aplicável aqui por força do art. 769 da CLT).

Bem como o entendimento pacificado no item I, da Súmula 463, do C. TST, que dispõe que: A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015).

Nesse espeque, havendo requerimento de gratuidade processual, sendo firmada a declaração de hipossuficiência pelo autor, e não havendo nenhum elemento nos autos que infirme o que se encontra ali declarado, considero presentes os requisitos previstos no art. 790, § 3º e § 4º, da CLT para a concessão dos benefícios da justiça gratuita ao reclamante.

Nada a reformar.

Dispositivo

Ante o exposto, decido CONHECER DOS RECURSOS DE ANTONIO RODRIGUES DA SILVA E DE EUCLIDES RENATO GARBUIO TRANSPORTES LTDA. E NÃO OS PROVER, mantendo incólume a r. decisão de origem, inclusive o valor da condenação e das custas.

Em sessão realizada em 02 de maio de 2023, a 2ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou o presente processo.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Desembargador do Trabalho Helio Grasselli.

Tomaram parte no julgamento os(as) Srs. Magistrados:

Desembargador do Trabalho Helio Grasselli (relator)

Juíza do Trabalho Dora Rossi Goes Sanches

Juíza do Trabalho Patrícia Glugovskis Penna Martins

Julgamento realizado em Sessão Híbrida, conforme os termos da Portaria Conjunta GP-CR n.º 02/2022 deste E. Regional.

RESULTADO:

ACORDAM os Magistrados da 2ª Câmara - Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região em julgar o processo nos termos do voto proposto pelo (a) Exmo (a). Sr (a). Relator (a).

Votação unânime, com ressalva de fundamentação da Exma. Juíza do Trabalho Dora Rossi Goes Sanches quanto ao dano existencial.

Procurador ciente.

HELIO GRASSELLI

Relator

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