TST - INFORMATIVOS 2018 2018 176 - 10 a 20 de abril

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Márcio Eurico Vitral Amaro - TST



02 -Incompetência da Justiça do Trabalho. Admissão sem concurso público após a Constituição de 1988. Lei do respectivo ente público estabelecendo o regime estatutário. A competência para processar e julgar ação movida por servidor público contratado na vigência da Constituição de 1988, sem prévia aprovação em concurso público, depende da natureza do regime jurídico adotado pelo ente público para seus servidores.



Resumo do voto.

Incompetência da Justiça do Trabalho. Admissão sem concurso público após a Constituição de 1988. Lei do respectivo ente público estabelecendo o regime estatutário. A competência para processar e julgar ação movida por servidor público contratado na vigência da Constituição de 1988, sem prévia aprovação em concurso público, depende da natureza do regime jurídico adotado pelo ente público para seus servidores. Se de natureza administrativa ou estatutária, a competência é da Justiça comum. De outra sorte, se o vínculo for regido pelas disposições da CLT, a competência é da Justiça do Trabalho. Sob esse entendimento, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos do Município de Boa Vista do Tupim/BA, e, no mérito, por maioria, deulhes provimento para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a lide, determinando a remessa dos autos à Justiça comum, nos termos do art. 64, § 3º, do CPC de 2015, visto que registrado na decisão embargada que o regime jurídico adotado pelo Município é o estatutário. Vencidos os Ministros Cláudio Mascarenhas Brandão, relator, e José Roberto Freire Pimenta. 

A C Ó R D Ã O

EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA – REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.015/2014 - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ENTE PÚBLICO. CONTRATAÇÃO APÓS A PROMULGAÇÃO DA ATUAL CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATO NULO. A competência para processar e julgar ação movida por servidor público contratado na vigência da atual Constituição da República, sem prévia aprovação em concurso, define-se em função do regime jurídico adotado pelo ente público para seus servidores em geral: se celetista, a competência é da Justiça do Trabalho; se administrativo/estatutário, da Justiça Comum. No caso dos autos, em que demandado o Município de Boa Vista do Tupim, a competência para o exame do feito é da Justiça Comum, já que o regime jurídico adotado no âmbito municipal, segundo se infere do acórdão embargado, é o estatutário. Recurso de embargos conhecido e provido. (TST-E-ED-RR-1114-36.2013.5.05.0201, SBDI-I, rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, red. p/ acórdão Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, 11.05.2018).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-1114-36.2013.5.05.0201, tendo por Embargante MUNICÍPIO DE BOA VISTA DO TUPIM e Embargada ADRIANA DA SILVA GOMES SANTOS.

Na forma regimental, adoto o relatório aprovado em Sessão:

"A Egrégia 2ª Turma deste Tribunal não conheceu do recurso de revista interposto pelo réu quanto aos temas: ‘competência da Justiça do Trabalho’ e ‘contrato nulo – efeitos’ (fls. 496/503).

Aos embargos de declaração que se seguiram (fls. 505/519) negou-se provimento por meio do acórdão às fls. 525/529.

O réu interpõe os presentes embargos, em que aponta violação de dispositivos constitucionais, bem como indica dissenso pretoriano (fls. 531/573).

O recurso foi admitido pelo Ministro Presidente da Turma julgadora, diante de possível divergência jurisprudencial (fls. 576/582).

Impugnação ausente, conforme certidão à fl. 584.

O Ministério Público do Trabalho opinou pelo não conhecimento dos embargos (fl. 588)."

É o relatório.

V O T O

1 – CONHECIMENTO

Preliminarmente, peço vênia para adotar o voto do Relator no tocante aos pressupostos de admissibilidade extrínsecos dos embargos:

"Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passo à análise dos pressupostos intrínsecos do recurso de embargos, que se rege pela Lei nº 13.015/2014, tendo em vista que o acórdão embargado foi publicado em 1º/07/2016."

1.1 - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ENTE PÚBLICO. CONTRATAÇÃO APÓS A PROMULGAÇÃO DA ATUAL CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATO NULO

Peço vênia para adotar a fundamentação do voto do Relator, neste particular:

"A Egrégia 2ª Turma não conheceu do recurso de revista do réu quanto ao tema em epígrafe. Consignou, para tanto, os seguintes fundamentos:

‘O Tribunal Regional do Trabalho decidiu a controvérsia com os seguintes fundamentos:

DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO

Inconformado com a sentença prolatada, que declarou a competência da Justiça do Trabalho para julgar os pedidos relativos ao vínculo laboral entre as partes, busca o Município réu a reforma do julgado.

Sustenta que a relação em apreço tem natureza jurídica-administrativa, pois foi instituído o regime jurídico estatutário para regulamentar a relação contratual com seus servidores.

Pugna assim pelo reconhecimento da competência da Justiça Comum para apreciar e dirimir o feito, devendo a presente reclamação ser extinta sem julgamento de mérito.

A razão não ampara o Município recorrente. Explico.

De fato, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que levou ao cancelamento da Orientação Jurisprudencial n. 205 da SD11/TST, não cabe à Justiça do Trabalho, mas sim à Justiça Comum, estadual ou federal, dirimir conflitos da relação jurídico-administrativa entre o Poder Público e seus servidores, inclusive aqueles admitidos mediante contratos especiais temporários.

Não é esta, contudo, a hipótese dos autos, já que não consta nos autos qualquer prova da submissão da obreira a concurso público, ou ainda, qualquer contrato por prazo determinado celebrado entre as partes. Aliás, a própria peça contestatória confirma que a reclamante começou a prestar serviços ao ente municipal sem ter realizado concurso público prévio (fls. 18/19).

Desta forma, o que se vislumbra in casu é que a autora foi contratada pela parte ré sem a realização de concurso público para exercer a função de auxiliar de professora. Em face de sua admissão após a vigência da atual Carta Magna, existia exigência absoluta de prestação de concurso para ingresso, motivo pelo qual a referida contratação encontra-se eivada de nulidade, não se revestindo de regime jurídico-administrativo.

Ademais, é irrelevante a existência de Lei municipal prevendo o regime jurídico estatutário, eis que sua aplicação se restringe às hipóteses de regular contratação mediante concurso público.

Assim, diante da ausência de qualquer indício de contratação temporária, bem como da ausência à submissão da reclamante a concurso público (fato incontroverso nos autos), constata-se que o contrato celebrado entre as partes é nulo, ensejando a aplicação da Súmula n° 363 do TST.

Oportuno salientar que a situação aqui descrita não se confunde com aquela enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do Agravo Regimental em Reclamação Constitucional tombada sob o n° 4489/PA e que levou o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho a cancelar a OJ n°. 205 da SDI-1. Senão veja-se: ‘RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. AUTORIDADE DE DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ARTIGO 102, INCISO I, ALÍNEA L, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3.395. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDORES PÚBLICOS: ARTIGO 37, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÕES AJUIZADAS POR SERVIDORES TEMPORÁRIOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. CAUSA DE PEDIR RELACIONADA A UMA RELAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO E RECLAMAÇÃO PROCEDENTE. 1. O Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395 que ‘o disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação juridico-estatutária’. 2. Apesar de ser da competência da Justiça do Trabalho reconhecer a existência de vínculo empregatício regido pela legislação trabalhista, não sendo lícito à Justiça Comum fazê-lo, é da competência exclusiva desta o exame de questões relativas a vínculo jurídico-administrativo. 3. Se, apesar de o pedido ser relativo a direitos trabalhistas, os autores da ação suscitam a descaracterização da contratação temporária ou do provimento comissionado, antes de se tratar de um problema de direito trabalhista a questão deve ser resolvida no âmbito do direito administrativo, pois para o reconhecimento da relação trabalhista terá o juiz que decidir se teria havido vicio na relação administrativa a descaracterizá-la. 4. No caso, não há qualquer direito disciplinado pela legislação trabalhista a justificar a sua permanência na Justiça do Trabalho. 5. Agravo regimental a que se dá provimento e reclamação julgada procedente’. (Rcl-AgR 4489/PA. Tribunal Pleno. Rel. Min. Marco Aurélio. Relatora p/ Acórdão, Min. Cármen Lúcia. DJ. 21/8/2008). (...).

Assinalo, por fim, que o Pleno deste Tribunal Regional do Trabalho, analisando o Incidente de Uniformização de Jurisprudência n° 0000122-28.2015.5.05.0000IUJ relativo à competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar demandas em que se discute a natureza da relação jurídica mantida entre o ente integrante da Administração Pública Direta e seus contratados, aprovou verbete para compor Súmula de Jurisprudência predominante de n° 15, com o seguinte teor: ‘A Justiça do Trabalho tem competência material para processar e julgar os processos em que se discute a natureza da relação jurídica mantida entre ente integrante da administração pública direta e seus servidores nas situações em que a causa de pedir constante da petição inicial é a existência de vinculo de natureza celetista e as pretensões nela formuladas têm por lastro a legislação trabalhista, ainda que o ente público, em sede de defesa, conteste a natureza alegada ao argumento de que mantinha com o servidor relação jurídica de natureza estatutária ou administrativa’ (Resolução Administrativa TRT5 N° 042, divulgada no Diário da Justiça do dia 13 de julho de 2015, Súmula TRT5 n° 15, considerando o julgamento do de Jurisprudência N° 0000122-28.2015.5.05. OOOOIUJ).

Ante o exposto, correta a decisão originária que declarou a competência material desta Justiça Especializada para o exame da lide e aplicou o Enunciado da Corte Superior Trabalhista acima indicado. Preliminar rejeitada’ (págs. 365-368, ...).

Nas razões de recurso de revista, o reclamado reafirma a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho para analisar a demanda, por se tratar de relação jurídico-administrativa e não relação de emprego.

Argumenta que a lei municipal que instituiu o regime jurídico dos servidores não autoriza outra forma de vinculação que não seja a estatutária. Assim, ‘mesmo sendo o contrato mantido entre o Recorrido e o Recorrente nulos de pleno direito, pelo óbice imposto pelo art. 37, II, da Constituição da República, ainda assim, não seria possível reverte-lo à natureza de celetistas para, sob a égide da CLT, se disciplinar os direitos remanescentes ao contratado’ (pág. 440).

Aponta violação dos artigos 30, inciso I, 39, caput, 114, inciso I, da Constituição Federal e transcreve arestos para o confronto de teses.

Sem razão o reclamado, ora recorrente.

Discute-se, no caso, a competência da Justiça do Trabalho para julgar ação proposta por servidor do Município, contratado após a Constituição Federal de 1988, sem a prévia aprovação em concurso público.

O Supremo Tribunal Federal - no julgamento da ADI nº 3.395-6, de relatoria do Ministro Cezar Peluso, que referendou a medida liminar concedida pelo Ministro Nelson Jobim - pacificou o entendimento de não cabe a esta Corte especializada o julgamento de ações que envolvam o Poder Público e os servidores a ele vinculados por típica relação jurídico-administrativa.

Por sua vez, esta Corte superior, para se alinhar às decisões reiteradas do Supremo Tribunal Federal – de que as causas que envolvam relações de natureza jurídico-administrativas, incluídas as contratações temporárias, previstas no artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, inserem-se na competência da Justiça Comum –, cancelou a Orientação Jurisprudencial nº 205 da SBDI-1, segundo a qual as controvérsias acerca do vínculo empregatício entre o trabalhador e o ente público seriam dirimidas pela Justiça do Trabalho.

Na hipótese dos autos, o Regional expressamente consignou que ‘não consta nos autos qualquer prova da submissão da obreira a concurso público, ou ainda, qualquer contrato por prazo determinado celebrado entre as partes. Aliás, a própria peça contestatória confirma que a reclamante começou a prestar serviços ao ente municipal sem ter realizado concurso público prévio’ (pág. 366).

Destacou que, ‘em face de sua admissão após a vigência da atual Carta Magna, existia exigência absoluta de prestação de concurso para ingresso, motivo pelo qual a referida contratação encontra-se eivada de nulidade, não se revestindo de regime jurídico-administrativo’. Assim, é ‘irrelevante a existência de Lei municipal prevendo o regime jurídico estatutário, eis que sua aplicação se restringe às hipóteses de regular contratação mediante concurso público’ (pág. 366).

Portanto, isso significa que o Município não se desincumbiu do ônus probatório em relação à contratação da reclamante pelo regime estatutário.

Com efeito, do quadro fático delineado pelo Regional, não há comprovação de que a reclamante tenha sido contratada pelo regime jurídico único ou tenha sido reenquadrada em regime estatutário instituído pelo Ente Público.

Consequentemente, correta a fixação da competência da Justiça do Trabalho para a apreciação do feito. Para decidir em sentido diverso, seria necessário o revolvimento dos elementos probatórios dos autos, procedimento vedado a esta Corte de natureza extraordinária nos termos da Súmula nº 126 do TST.

Não há falar, portanto, em violação dos artigos 30, inciso I, 39, caput, e 114, inciso I, da Constituição Federal, tampouco em divergência jurisprudencial.

Não conheço.’

O réu sustenta que a Justiça do Trabalho não possui competência para apreciar e julgar as pretensões atinentes ao período laborado após a instituição do regime jurídico único estatutário para os servidores do Município, mediante instituição da Lei Municipal nº 295/95. Afirma que em 05/04/90 foi promulgada a Lei Orgânica Municipal, a qual, em seu artigo 82, dispõe sobre o Regime Jurídico Único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta. Alega, ainda, que, ‘mesmo sendo o contrato mantido entre o Recorrido e o Recorrente nulos de pleno direito, pelo óbice imposto pelo art. 37, II, da Constituição da República, ainda assim, não seria possível reverte-lo à natureza de celetistas para, sob a égide da CLT, se disciplinar os direitos remanescentes ao contratado’, pois a vinculação do ente público à relação jurídico-estatutária afasta a competência da Justiça do Trabalho para apreciar as lides que envolvem seus servidores. Aponta violação dos artigos 30, I, 39, caput, e 114, I, da Constituição Federal. Transcreve arestos para o confronto de teses.

A Egrégia 2ª Turma adotou tese no sentido de que a contratação do autor pelo Município, sem prévia aprovação em concurso público, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, configura a nulidade do contrato de trabalho e atrai a competência desta Justiça Especializada para julgar o feito. Registrou que não consta nos autos nenhuma prova da existência de contrato por prazo determinado, na forma do artigo 37, IX, da Constituição da República. Concluiu ser irrelevante a existência de Lei Municipal instituidora de regime jurídico-estatutário, uma vez que sua aplicação se restringe às hipóteses de regular contratação mediante concurso público.

Por sua vez, o aresto transcrito à fl. 533, oriundo da Egrégia 4ª Turma e que possui no polo passivo o ora embargante, adota a seguinte tese:

‘RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMADO (MUNICÍPIO DE BOA VISTA DO TUPIM). CONTRATAÇÃO EM PERÍODO POSTERIOR À CF/88 E À INSTITUIÇÃO DO REGIME JURÍDICO ÚNICO. AUSÊNCIA DE PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. CONTROVÉRSIA QUANTO À NATUREZA DA CONTRATAÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. I. Trata-se de empregado admitido depois da Constituição da República e da instituição de Regime Jurídico Único no âmbito do Município, sem concurso público. II. No julgamento do AgReg 9625/RN, o Pleno do Supremo Tribunal Federal decidiu que compete à Justiça Comum decidir sobre a existência, validade e eficácia das relações jurídico-administrativas entre servidor e Administração Pública. Além disso, ao apreciar a Reclamação nº 7633, Agr/MG, o Supremo Tribunal Federal concluiu que ‘não descaracteriza a competência da Justiça Comum, em tais dissídios, o fato de se requerer verbas rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação jurídico-administrativa, posto que desvirtuada ou submetida a vícios de origem, como fraude, simulação ou ausência de concurso público’. III. Ante o exposto e extraindo-se do acórdão regional a existência de controvérsia quanto à natureza jurídica da relação mantida entre as partes e quanto à validade da referida contratação, a decisão regional, em que se concluiu pela competência da Justiça do Trabalho para julgar o presente feito, contraria o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria. IV. Recurso de revista de que se conhece, por violação do art. 114, I, da CF/88, e a que se dá provimento.’

Conheço do recurso de embargos por divergência jurisprudencial."

2 - MÉRITO

2.1 - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ENTE PÚBLICO. CONTRATAÇÃO APÓS A PROMULGAÇÃO DA ATUAL CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATO NULO

Discute-se a competência para a análise de feitos que envolvam a admissão de servidor público, sem prévia aprovação em concurso, na vigência da atual Constituição da República.

Esta Subseção, ao examinar o tema, vem proclamando o entendimento de que, em casos como o presente, a competência define-se em função do regime jurídico adotado pelo ente público para seus servidores em geral: se celetista, a competência é da Justiça do Trabalho; se administrativo/estatutário, da Justiça Comum.

Especificamente em relação ao Município de Boa Vista do Tupim – ora embargante –, há, inclusive, precedentes unânimes, no sentido de que a competência é da Justiça Comum, já que o regime adotado no âmbito municipal, segundo informações constantes dos próprios acórdãos ali embargados, é o estatutário:

"EMBARGOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO MUNICÍPIO NA VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, SEM SUBMISSÃO A CONCURSO PÚBLICO. REGIME ESTATUTÁRIO OU JURÍDICO ADMINISTRATIVO. PRONUNCIAMENTO DO EXCELSO STF. INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Não se inscreve na competência material da Justiça do Trabalho o caso de reclamante que prestou serviços ao Município, após a Constituição Federal, sem submissão a concurso público, havendo registro no acórdão regional de instituição de regime jurídico administrativo. Corolário da interpretação conferida pelo excelso STF na Medida Cautelar em ADI 3.395 e pronunciamentos subsequentes no sentido de que o art. 114, I, da Constituição Federal não comporta as relações de vínculo jurídico-administrativo entre trabalhador e ente público. Embargos conhecidos e providos." (TST-E-ED-RR-333-14.2013.5.05.0201, SbDI-1, Rel. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT de 22/09/2017 – g. n.)

"EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA FIRMADA COM O MUNICÍPIO. IMPOSSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO DA EXISTÊNCIA DE REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO NO CASO CONCRETO. LEI MUNICIPAL. ARTIGO 376 DO CPC. PRECEDENTES DO STF. 1. Acórdão embargado que, ao transcrever o quadro fático delineado pelo TRT, revela que consta nos autos cópia da Lei Municipal que dispõe sobre o estatuto dos servidores públicos municipais. 2. Tratando-se de contrato de trabalho firmado com ente da Administração Pública direta, autárquica e fundacional após a Constituição Federal de 1988 e sendo o caso de ente público cujo pessoal esteja jungido ao regime jurídico estatutário, impõe-se a competência da Justiça Comum para dirimir controvérsia em torno dessa relação de trabalho, ainda que se discuta vício de ausência de concurso público. Essa é a tese firmada pelo Pleno do STF no julgamento da medida cautelar na ADI nº 3395-DF. Ressalte-se que não se pode presumir a existência do regime jurídico administrativo, porque decorre de lei, sendo certo que, tratando-se de contratação por município, a matéria adquire contornos fáticos, devendo ser provada a existência da lei municipal, a teor do art. 337 do CPC/1973, que encontra correspondência no art. 376 do atual CPC. Destaque-se que o Supremo Tribunal Federal também já assentou o óbice de se rever, em recurso de natureza extraordinária, o quadro fático delineado em instâncias anteriores sobre o regime jurídico da relação de trabalho firmada com município, o que revela a impossibilidade de se presumir a existência de regime jurídico estatutário e esclarece que somente quando constatada no caso concreto a existência de regime jurídico administrativo é que se decide pela competência da Justiça Comum. 3. No caso em exame, a Turma, ao transcrever o quadro fático delineado pelo TRT, consignou que consta nos autos cópia da Lei Municipal que dispõe sobre o regime jurídico estatutário dos servidores públicos. Nesse quadro, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADI nº 3395-DF alcança a controvérsia nestes autos, pois presente o pressuposto fático erigido pelo Pretório Excelso para rechaçar a competência da Justiça do Trabalho, que é a existência de regime jurídico estatutário. Portanto, impõe-se a declaração da incompetência da Justiça do Trabalho, devendo os autos ser remetidos à Justiça Comum. Recurso de embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e provido." (TST-E-ED-RR-454-42.2013.5.05.0201, SbDI-1, Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT de 28/07/2017 – g. n.).

"EMBARGOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO MUNICÍPIO NA VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, SEM SUBMISSÃO A CONCURSO PÚBLICO. PRONUNCIAMENTO DO EXCELSO STF. INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Não se inscreve na competência material da Justiça do Trabalho o caso de trabalhador que prestou serviços ao Município, após a Constituição Federal, sem submissão a concurso público, havendo registro no acórdão regional de lei local instituindo regime jurídico único administrativo vigente desde antes da contratação do reclamante. Corolário da interpretação conferida pelo excelso STF na Medida Cautelar em ADI 3.395 e pronunciamentos subsequentes no sentido de que o art. 114, I, da Constituição Federal não comporta as relações de vínculo jurídico-administrativo entre trabalhador e ente público. Embargos conhecidos e providos." (TST-E-ED-RR-65-57.2013.5.05.0201, SbDI-1, Rel. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT de 29/07/2016 – g. n.).

Tais julgados, vale frisar, sobrevieram a acórdão lavrado pelo Ministro Renato de Lacerda Paiva, relativo a caso análogo ao presente, no qual demandado o Município do Brejo do Piauí. Na ocasião daquele julgamento, prevaleceu, após intenso debate, o entendimento de que competiria à Justiça Comum o exame da demanda, tendo restado vencidos apenas este Redator – que, como se viu, curvou-se, posteriormente, ao entendimento predominante, sendo de sua lavra o primeiro e o último precedentes acima transcritos – e os Ministros João Oreste Dalazen, João Batista Brito Pereira, Alexandre Agra Belmonte e Cláudio Mascarenhas Brandão. Eis a ementa respectiva:

"RECURSO DE EMBARGOS. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - CONTRATAÇÃO DE SERVIDORA APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 SEM ANTERIOR APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA O PRÉVIO EXAME DE QUESTÕES RELATIVAS AOS ELEMENTOS ESSENCIAIS AO ATO ADMINISTRATIVO - POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Por ocasião do julgamento do AgReg nº 7.217/MG o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal resolveu que ‘compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público, fundadas em vínculo jurídico-administrativo’ e que ‘não descaracteriza a competência da Justiça comum, em tais dissídios, o fato de se requerer verbas rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação jurídico-administrativa, posto que desvirtuada ou submetida a vícios de origem, como fraude, simulação ou ausência de concurso público’. Assim, segundo o STF, cabe à Justiça Comum o prévio exame acerca da existência, da validade e da eficácia do vínculo jurídico-administrativo existente entre servidor e Administração Pública, eis que, para o reconhecimento do liame trabalhista, deverá o julgador, anteriormente, averiguar a presença, ou não, de eventual vício a macular a relação administrativa. Em outras palavras, descabe à Justiça do Trabalho analisar o caráter de nulidade da contratação levada a efeito por ente público com o escopo de enquadrá-la no regime da CLT, posto que, antes de se tratar de questão trabalhista, a discussão está inserida no campo do direito administrativo. Ou seja - diante do posicionamento da Corte Suprema de que, in casu, compete à Justiça Comum o prévio exame de questões relativas aos elementos essenciais ao ato administrativo - , falece competência a esta Justiça Especializada para processar e julgar lide na qual restou caracterizada a contratação de servidor, após a Constituição Federal de 1988, sem a prévia submissão do trabalhador a concurso público. Precedentes do TST. Recurso de embargos conhecido e desprovido." (TST-E-ED-RR-629-39.2011.5.22.0102, SbDI-1, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, DEJT de 08/04/2016 – g. n.).

No caso dos autos, o entendimento do Regional, ratificado pela Segunda Turma, foi no sentido de que "(...) é irrelevante a existência de Lei municipal prevendo o regime jurídico estatutário, eis que sua aplicação se restringe às hipóteses de regular contratação mediante concurso público", o que, como se viu, destoa da jurisprudência desta Subseção, à qual este Redator já se curvou e novamente se curva.

Não se pode olvidar, por certo, a existência de precedentes desta Subseção, também relativos a processos envolvendo o Município de Boa Vista do Tupim, no sentido de que compete à Justiça do Trabalho o exame das respectivas ações. Dois desses julgados foram, inclusive, invocados pelo Relator em seu voto. Não obstante, o quadro ali delineado era diverso, inexistindo nos acórdãos embargados qualquer indicação de que o regime jurídico adotado no âmbito municipal fosse o estatutário.

Por todo o exposto, dou provimento ao recurso de embargos interposto pelo reclamado para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a lide, determinando a remessa dos autos à Justiça Comum, nos termos do artigo 64, § 3º, do CPC.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de embargos por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a lide, determinando a remessa dos autos à Justiça Comum, nos termos do artigo 64, § 3º, do CPC, vencidos os Exmos. Ministros Cláudio Mascarenhas Brandão e José Roberto Freire Pimenta.

Brasília, 12 de abril de 2018.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Márcio Eurico Vitral Amaro

Redator Designado

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