TST - INFORMATIVOS 2019 2019 200 - 02 de agosto

Data da publicação:

Acordãos na integra

Breno Medeiros - TST



Supervisão de estágio. Atividade de docência. Não configuração. Período anterior à Lei nº 11.788/2008.



RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. DIFERENÇAS SALARIAIS. SUPERVISÃO DE ESTÁGIO. ATIVIDADE DE DOCÊNCIA. Extrai-se do acórdão recorrido que o reclamante laborou para a reclamada, na função de "supervisor de estágio", de 1º/3/2004 a 1º/2/2010, mas que apenas em 28/10/2007 a referida atribuição, antes considerada administrativa pela instituição de ensino, foi incorporada à atividade acadêmica, momento em que passou a ser remunerado por horas-aula. O TRT reformou a sentença que declarou a nulidade da contratação na função de "supervisor de estágio" de 1º/3/2004 a 28/10/2007, por entender que as atividades desempenhadas pelo autor, nesse período, não se relacionam com as de docência. A Corte local, conquanto tenha reconhecido tratar-se de uma "prática inegável e intrínseca na vida profissional do professor", afirmou que a supervisão de estágio não se equipara à atividade exercida em classe e remunerada por hora-aula, e que "nem mesmo o contato direto com alunos é suficiente para se concluir pelo exercício da docência, tendo em vista que não há o ministério de aulas em turmas regulares". Ao contrário da fundamentação adotada pelo Tribunal de origem, a Justiça do Trabalho tem entendido que a supervisão do estágio se insere no exercício da docência. Isso porque, a Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, a qual dispõe sobre o estágio de estudantes, e revoga as Leis nº 6.494/1977 e nº 8.859/1994, preconiza, em seu art. 1º, § 1º, que "o estágio faz parte do projeto pedagógico do curso, além de integrar o itinerário formativo do educando". Na hipótese dos autos, contudo, vê-se que o contrato em questão (de 1º/3/2004 a 28/10/2007) é anterior à vigência da aludida lei que passou a integrar o estágio no projeto pedagógico, e que as normas vigentes àquela época não dispunham ser a supervisão de estágio uma atividade docente. Desse modo, ente à ausência de previsão legal, não se há falar em nulidade do primeiro do contrato de trabalho do reclamante, porquanto a instituição de ensino não estava obrigada a pagá-lo por hora-aula naquele período, a despeito de suas atividades como "supervisor de estágio" não terem sofrido alterações a partir de 28/10/2007. Recurso de revista conhecido e não provido. (TST-RR-716-64.2010.5.03.0132, Breno Medeiros, DEJT, 28.06.19).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-716-64.2010.5.03.0132, em que é Recorrente FREDERICO DE MIRANDA COELHO e Recorrida FUNDAÇÃO PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS - FUPAC.

Trata-se de recurso de revista interposto pelo reclamante, com fulcro no art. 896 da CLT, contra acórdão regional proferido em sede de recurso ordinário.

O recurso de revista foi admitido pela autoridade local por divergência jurisprudencial.

Sem contrarrazões.

Sem remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

I - CONHECIMENTO

Satisfeitos os pressupostos genéricos de admissibilidade, passo ao exame dos específicos do recurso de revista.

DIFERENÇAS SALARIAIS. SUPERVISÃO DE ESTÁGIO. ATIVIDADE DE DOCÊNCIA

O e. TRT deu parcial provimento ao recurso da reclamada para excluir da condenação as diferenças salariais decorrentes da declaração de nulidade do contrato de trabalho de "supervisor de estágio", consignando os seguintes fundamentos:

Quanto ao contrato de estágio, cumpre-me adiantar que, apesar de haver o contato direto com o aluno, não se ministram aulas, não havendo turmas regulares a justificar a inserção de tal atividade como sendo docência Por isso, diferentemente da magistrada a quo, entendo regular a contratação havida no período de 01.03.2004 a 28.10.2007. Porém, não há prescrição a declarar, visto que o preposto da reclamada afirmou que a partir de 2008 o reclamante continuou exercendo a atividade de supervisor de estágio (fls. 1052, 6ºv).

(...)

Pautando-se na prova testemunhal, a sentenciante declarou a nulidade da contratação na função de supervisor de estágio no período de 01.03.2004 a 28.10.2007, considerando as atividades desempenhadas pelo autor, nesse período, como de efetiva docência. Por isso, não há prescrição a ser declarada, visto que a função de supervisor de estágio continuou a ser exercida pelo demandante até a efetiva ruptura contratual ocorrida em 01.02.2010.

Inconformada, a reclamada afirma que contratou o autor para prestar serviços de supervisão de estágio de 01.03.2004 a 27.10.2007, com carga horária de 5 horas semanais. Não se conforma, portanto, com a declaração de que tal função era de docência, visto que não havia o exercício de atividades típicas (não há turmas regulares, projeto pedagógico, diários de classe, planos de aulas), mas apenas o exercício de atividades complementares/administrativas, pelo que nada mais é devido ao reclamante, por ter sido remunerado corretamente. Subsidiariamente, requer que a condenação se limite aos dias em que o autor lecionava à noite, devendo ser considerado que a partir de novembro/2007 a carga horária foi devidamente registrada nos cartões de ponto que demonstram a inexistência de horas extras.

Quanto às aulas de dependência, a sentenciante registrou que não eram quitadas em conformidade com as convenções coletivas, uma vez que não integravam a base de cálculo do adicional extraclasse. Por isso, deferiu as diferenças salariais decorrentes das aulas eventuais que deverão ser apuradas com base no salário-hora base previsto nas convenções coletivas.

Tomando por base a prova testemunhal, a magistrada a quo deferiu ao autor horas extras pela extrapolação da jornada de trabalho decorrente da função de supervisor de estágio no período de 07/07/2005 a dezembro de 2005 (8 horas-aula semanais) e a partir de 2006 até o final do contrato de trabalho (14 horas-aula semanais); pelas aulas ministradas aos sábados, sendo 04 sábados por ano (total de 16 horas); 24 horas extras nos anos de 2008 e 2009 (total de 48 horas extras) pela prestação de serviços na "Onda Científica" e 24 horas extras no ano de 2009 pela prestação de serviços na "Semana da Computação"; 36 (trinta e seis) horas extras por ano decorrentes das reuniões e 14 (quatorze) horas extras pela participação nas bancas para seleção de professores.

Quanto às reuniões de colegiado, a reclamada afirma que não há comprovação da ocorrência de 10 reuniões por ano com duração de 3 horas cada uma. Afirma que o autor participava apenas de 2 reuniões semestrais com duração de 1h30min que se inseriam nas atividades extraclasse.

Quanto às aulas de dependência (aulas eventuais), discorda a reclamada dos argumentos do reclamante, tendo em vista que não há se falar em reflexos de tais aulas em RSR nem em pagamento do adicional extraclasse de 20%.

Por fim, quanto às horas laboradas na "VIII Semana da Computação" (16 a 20/11/2009), aduz que não há aulas em referida semana, sendo certo que o labor de qualquer funcionário é diferente do habitual, mas jamais pode ser considerado como labor extra, uma vez que ocorre em carga horária idêntica sendo remunerado de forma correta. Além disso, tal labor deve ser valorado como administrativo e não como docente.

Por sua vez, o reclamante requer o pagamento de 24 horas aulas extras, com reflexos, pelo labor na "VIII Semana da Computação" ocorrida de 16 a 20 de novembro de 2009.

Examino.

Inicialmente, registro que a sentenciante deferiu 24 horas extras no ano de 2009 pela prestação de serviços do autor na "Semana da Computação" (fls.1062 e fls. 1066). No entanto, o autor interpôs embargos declaratórios, aduzindo que não "houve deferimento nem indeferimento" da parcela (fls. 1069) e, em sede de decisão dos referidos embargos, a sentenciante consignou que não deferiu porque não houve prova cabal da participação do autor em referido evento (fls. 1112). Nesse contexto, considero que, efetivamente, há interesse recursal de ambas as partes, pelo que passo à análise do mérito.

O reclamante, na inicial, afirmou que o contrato de trabalho como supervisor de estágio é nulo, pois realizava tarefas de docente. Alegou que a partir de 28.10.2007 passou a receber horas-aula, uma vez que a supervisão de estágio passou a ser considerada tarefa acadêmica, não obstante realizasse as mesmas atividades do período anterior (supervisão de estágio e orientação de monografias).

A testemunha Luiz Augusto Mattos Mendes confirmou a tese da inicial, no sentido de que "houve mudança na função de supervisor de estágio de administrativa para acadêmica, sendo que as atividades foram incorporadas à atividade acadêmica", mas informou que não havia aulas neste estágio, mas, sim, encontros de supervisão (fl. 1053).

De início, registro que não comungo do entendimento esposado pela sentenciante no sentido de que a atividade de supervisão de estágio se relaciona com atividade de docência.

Muito embora seja uma prática inegável e intrínseca na vida profissional do professor, é diversa daquela exercida em classe e remunerada por hora/aula. Nem mesmo o contato direto com alunos é suficiente para se concluir pelo exercício da docência, tendo em vista que não há o ministério de aulas em turmas regulares.

Ademais, o fato de a reclamada ter passado a remunerar o autor por hora/aula a partir de 28.10.2007 não é capaz de ensejar o reconhecimento de que o autor, de fato, exercesse atividade de docência.

Portanto, tenho que nada é devido ao autor no tocante às suas atividades como supervisor de estágio.

Quanto à participação do reclamante em bancas para seleção de professores, o preposto da reclamada nada sabia a respeito, incidindo, então, em confissão ficta, nos termos do art. 843, §1º, da CLT, razão pela qual se mantém a condenação ao pagamento de 14 horas extras pela participação nas bancas para seleção de professores.

Em relação às reuniões, a testemunha Luiz Augusto informou que havia uma reunião, das 16h às 19h, por mês, enquanto a testemunha Alexandre afirmou que havia reuniões duas vezes por semestre, das 13h às 17h, além de uma por mês, do horário de término das aulas (22h30min) até 23h30min (fls. 1054/1055).

Com base no princípio da razoabilidade e diante da prova oral, reformo a sentença para fixar as horas extras decorrentes da participação em reuniões nos limites do depoimento da testemunha Alexandre, razão pela qual limito a condenação a 20 horas extras por ano.

Em relação ao exercício de labor no Projeto "Onda Científica", o documento de fls. 109/100 indica a participação do reclamante no evento de 2009 e a prova oral corroborou a tese da exordial, tendo a testemunha do autor afirmado que:

O depoente participou de um projeto chamado Onda Científica, que consistia em expor para a comunidade os cursos da universidade e foi feito um sábado no horário de 08h00min as 12h00min; que o depoente e o reclamante participaram desse projeto como organizadores do evento; que isso aconteceu no ano de 2008 e em 2009 dentro da própria instituição, no mesmo horário, de 08h00min às 12h00min; que a organização do curso demandou um trabalho de cerca de 25 horas. (Testemunha Luiz Augusto Mattos Mendes, fl.1053).

Destarte, deve ser mantida a condenação ao pagamento de 24 horas extras pelo labor nos anos de 2008 e 2009 no Projeto "Onda Científica".

Também deve ser mantida a condenação ao pagamento das horas extras pelo labor nos sábados, porquanto a testemunha Luiz Augusto confirmou o labor em tais dias e a ausência de pagamento (fls. 1053/1054).

No que diz respeito à "VIII Semana da Computação", a prova documental não ampara a pretensão do reclamante e apesar de a testemunha Luiz Augusto Mattos Mendes ter afirmado que o reclamante organizou e participou do evento, informou também que neste período não havia aulas, o que demonstra que não houve a extrapolação da jornada durante a semana (fls. 1053/1054).

A testemunha foi clara quanto à inexistência de aula durante a "Semana da Computação", o que não ocorreu no Projeto "Onda Científica".

Quanto às diferenças salariais, a magistrada a quo entendeu que seriam devidas diante do descumprimento das convenções coletivas, visto que as aulas eventuais não serviram de base de cálculo para adicional extraclasse, incidindo apenas sobre as aulas normais (fls. 1059, 6ºv).

Entretanto, data venia, a norma coletiva determina que o adicional por atividade extraclasse incida sobre o salário mensal (fls. 119, 1ºv), e este, por sua vez, também é composto pelas aulas eventuais (fls. 117, 1ºv). Dessarte, como o autor não comprovou que o pagamento foi feito de maneira errônea, não há que se deferir as diferenças pleiteadas.

Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso do autor e dou parcial provimento ao recurso da reclamada para excluir da condenação as horas extras decorrentes da supervisão de estágio, as diferenças salariais decorrentes das horas-aula eventuais, as horas extras pela participação na "VIII Semana da Computação" e para adequar as horas extras por participação em reuniões, declarando que são devidas apenas 20 horas extras por ano. (destacou-se)

Nas razões da revista, o recorrente aponta divergência jurisprudencial no sentido de que a supervisão de estágio não pode ser classificada como etapa administrativa, mas docente. Requer seja restabelecida a decisão de primeira instância.

Destaque-se, de início, que o reclamante indicou, à fl. 30 do recurso de revista (doc. seq. 14), o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto da insurgência, atendendo ao disposto no art. 896, § 1º-A, I, da CLT.

O recurso de revista merece conhecimento por divergência jurisprudencial, na medida em que o aresto de fls. 31/32 (doc. seq. 14), proveniente do TRT da 1ª Região, transcrito em conformidade com a Súmula nº 337 desta Corte, sufraga entendimento no sentido contrário ao consignado pelo v. acórdão recorrido.

Vejamos:

PROFESSOR. ENQUADRAMENTO. ORIENTAÇÃO E SUPERVISÃO DE ESTÁGIO EM DIREITO. ATIVIDADE DOCENTE. O estágio, como ato educativo escolar supervisionado, consiste na transmissão de conhecimentos prático e teórico. É elemento importante senão mesmo fundamental, para a formação profissional. Se assim é, não pode ser classificado como etapa ‘administrativa’, mas sim, docente, a ensejar a aplicação das normas coletivas da categoria própria, a dos professores. Apelo patronal improvido.

Conheço, por divergência jurisprudencial.

II - MÉRITO

DIFERENÇAS SALARIAIS. SUPERVISÃO DE ESTÁGIO. ATIVIDADE DE DOCÊNCIA

Extrai-se do acórdão recorrido que o reclamante laborou para a reclamada, na função de "supervisor de estágio", de 1º/3/2004 a 1º/2/2010, mas que apenas em 28/10/2007 a referida atribuição, antes considerada administrativa pela instituição de ensino, foi incorporada à atividade acadêmica, momento em que passou a ser remunerado por horas-aula.

O TRT reformou a sentença que declarou a nulidade da contratação na função de "supervisor de estágio" de 1º/3/2004 a 28/10/2007, por entender que as atividades desempenhadas pelo autor, nesse período, não se relacionam com as de docência.

A Corte local, conquanto tenha reconhecido tratar-se de uma "prática inegável e intrínseca na vida profissional do professor", afirmou que a supervisão de estágio não se equipara à atividade exercida em classe e remunerada por hora-aula, e que "nem mesmo o contato direto com alunos é suficiente para se concluir pelo exercício da docência, tendo em vista que não há o ministério de aulas em turmas regulares".

Ao contrário da fundamentação adotada pelo Tribunal de origem, a Justiça Trabalhista tem entendido que a supervisão do estágio se insere no exercício da docência.

Isso porque, a Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, a qual dispõe sobre o estágio de estudantes, e revoga as Leis nº 6.494/1977 e nº 8.859/1994, preconiza, em seu art. 1º, § 1º, que "o estágio faz parte do projeto pedagógico do curso, além de integrar o itinerário formativo do educando".

Na hipótese dos autos, contudo, vê-se que o contrato em questão (de 1º/3/2004 a 28/10/2007) é anterior à vigência da aludida lei que passou a integrar o estágio no projeto pedagógico, e que as normas vigentes àquela época não dispunham ser a supervisão de estágio uma atividade docente.

Desse modo, ente à ausência de previsão legal, não se há falar em nulidade do primeiro do contrato de trabalho do reclamante, porquanto a instituição de ensino não estava obrigada a pagá-lo por hora-aula naquele período, a despeito de suas atividades como "supervisor de estágio" não terem sofrido alterações a partir de 28/10/2007.

Desse modo, nego provimento ao recurso de revista.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista por divergência jurisprudencial e, no mérito, negar-lhe provimento.

Brasília, 26 de junho de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

BRENO MEDEIROS

Ministro Relator

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