Data da publicação:
Subseção II Especializada em Dissídios Individuais
Douglas Alencar Rodrigues - TST
07 -Mandado de segurança. Cabimento. Execução provisória. Redirecionamento da execução contra sócio. Não observância do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Arts. 133 a 137 do CPC de 2015. Aplicação ao Processo do Trabalho. Art. 6º da IN nº 39/2016 do TST e art. 855-A da CLT.
Resumo do voto
Mandado de segurança. Cabimento. Execução provisória. Redirecionamento da execução contra sócio. Não observância do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Arts. 133 a 137 do CPC de 2015. Aplicação ao Processo do Trabalho. Art. 6º da IN nº 39/2016 do TST e art. 855-A da CLT. O art. 6º da IN nº 39/2016 do TST e o art. 855-A da CLT (incluído pela Lei nº 13.467/2017) estabelecem a aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137 do CPC de 2015) ao Processo do Trabalho. Assim, se na vigência do CPC de 2015 a execução provisória é redirecionada contra a representante legal da pessoa jurídica sem a observância do referido incidente, cabe mandado de segurança para discutir a extensão dos efeitos da obrigação contida no título executivo aos bens particulares da administradora da empresa. Sob esse fundamento, a SBDI-II, por unanimidade, conheceu do recurso ordinário e, no mérito, deu-lhe provimento para, reformando a decisão que indeferira a petição inicial do mandamus, determinar o retorno dos autos à Corte de origem a fim de que o mandado de segurança seja processado e julgado.
A C Ó R D Ã O
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. NÃO INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE DE DESCOSNIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA PARA REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO CONTRA TITULAR DO EMPREENDIMENTO. CF, ART. 5º, LIV /C OS ARTS. 133 A 137 DO CPC DE 2015. ART. 6º DA IN 39/2016 DO TST. CABIMENTO DA AÇÃO MANDAMENTAL.
1. Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado em face de ato mediante o qual o Juízo de primeira instância, em decisão exarada ainda em execução provisória (pendente de julgamento agravo de instrumento em recurso extraordinário), desconsiderou a personalidade da pessoa jurídica executada e incluiu a Impetrante no polo passivo da execução, determinando sua citação para pagamento da quantia apurada em liquidação. A decisão impugnada no mandamus foi exarada em 16/6/2017, ou seja, já na vigência do CPC de 2015.
2. Ao apreciar o mandado de segurança, o TRT indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo sem resolução do mérito, concluindo pelo não cabimento do mandado de segurança.
3. Na forma do artigo 5º, II, da Lei 12.016/2009, o mandado de segurança não representa a via processual adequada para a impugnação de decisões judiciais passíveis de retificação por meio de recurso, ainda que com efeito diferido (OJ 92 da SBDI-2 do TST).
4. No entanto, direcionada a execução provisória contra a pessoa física titular do empreendimento sem observância das normas dos arts. 133 a 137 do CPC de 2015, que disciplinam o incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, deve ser permitida, na ação mandamental, a discussão acerca da possibilidade de, em execução ainda não definitiva, estender os efeitos da obrigação contida no título executivo aos bens particulares da administradora da pessoa jurídica.
5. A partir da vigência do CPC de 2015, a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica deve ser levada a efeito, necessariamente, com a instauração do incidente de que cuidam os arts. 133 a 137 do referido diploma legal, conforme orienta, aliás, o art. 6º da IN 39/2016 do TST. 6. Não sendo possível examinar a pretensão mandamental, porquanto ainda não oficiada a autoridade apontada como coatora nem notificado o Litisconsorte passivo, determina-se o retorno dos autos à Corte de origem a fim de que o mandado de segurança seja processado e julgado. Recurso ordinário conhecido e provido. (TST-RO-406-27.2017.5.10.0000, SBDI-II, rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues, 9.11.2018).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n° TST-RO-406-27.2017.5.10.0000, em que é Recorrente MARIA LINDALVA DE SOUZA e são Recorridas JULIANA ALVES e MARIA LINDALVA DE SOUZA - ME e é Autoridade Coatora JUIZ DA 12ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - CARLOS ALBERTO OLIVEIRA SENNA.
MARIA LINDALVA DE SOUZA impetrou mandado de segurança, com pedido liminar, contra ato do Juízo da 12ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, que, nos autos da reclamação trabalhista nº 001447-32.2013.5.10.0012, desconsiderou a personalidade jurídica da empresa reclamada e direcionou a execução contra o seu patrimônio, determinando a sua citação para pagamento do crédito obreiro no prazo de 48 horas, sob pena de penhora de bens.
A Desembargadora Relatora indeferiu a petição inicial, extinguindo o processo sem resolução de mérito, nos termos dos artigos 10 da Lei 12.016/2009 e 485, I e IV, do CPC de 2015 (fls. 539/542).
Da referida decisão, a Impetrante interpôs agravo regimental (fls. 550/566), que foi desprovido no acórdão lavrado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região às fls. 594/598.
Inconformada, a Impetrante interpôs recurso ordinário às fls. 608/619, admitido à fl. 626.
Não foram apresentadas contrarrazões.
O Ministério Público do Trabalho não se manifestou.
É o relatório.
V O T O
1. CONHECIMENTO
O recurso ordinário é tempestivo, pois o acórdão foi publicado em 27/10/2017 e a interposição do recurso em 31/10/2017 (fls. 606 e 608). Regular a representação processual (fl. 537). Comprovado o pagamento de custas (fl. 624).
CONHEÇO.
2. MÉRITO
Ao julgar o agravo regimental, a Corte Regional decidiu com os seguintes fundamentos:
(...)
MÉRITO
Recurso da parte
MARIA LINDALVA DE SOUZA ajuizou o presente mandado de segurança, direcionado contra ato do Exmo. Juiz da MM. 12ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, Dr. Carlos Alberto de Oliveira Sena, praticados nos autos da reclamação trabalhista nº 001447-32.2013.5.10.0012, que se encontra em fase de execução e na qual, por força da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, figura como parte executada e tem como exequente JULIANA ALVES.
O ato impugnado no mandamus consiste na decisão que desconsiderou a personalidade jurídica da empresa reclamada e direcionou a execução contra o patrimônio da impetrante, determinando a sua citação para pagamento do crédito obreiro no prazo de 48 horas, nos seguintes termos:.
"Vistos.
Tendo em vista que não são conhecidos bens de propriedade da empresa executada, desconsidero a sua personalidade jurídica e determino a inclusão no polo passivo da lide do(s) sócio(s) constante(s) do espelho de dados do CNE/Receita Federal.
Após, cite-o(s) pela via postal, com aviso de recebimento, conforme autorizado pelo § 1º do art. 238 do Provimento Geral Consolidado do TRT da 10ª Região, para pagar a execução, no prazo de 48 horas, sob pena de penhora de bens, ou ainda, sendo sócio da pessoa jurídica devedora principal, indicar bens da sociedade para constrição (art. 795 do NCPC).
Decorrido o prazo para pagamento, prossiga-se a partir do item 2 do comando de fl.102."
Exarei a decisão de ID d413056 no sentido de indeferir a petição inicial e extinguir o processo, sem resolução de mérito, na forma do permissivo inscrito nos incisos I e IV do art.
485 do NCPC, porquanto concluí que a pretensão da impetrante não encontra guarida em sede de mandado de segurança, porque esbarra no impeditivo constante do inciso II do artigo 5º da Lei nº 12.016/2009, que veda a impetração de mandado de segurança contra decisão judicial que possa ser modificada por recurso próprio.
Contra essa decisão o autor interpõe o presente agravo interno, defendendo o cabimento da ação mandamental, pois, segundo entende, "não há recurso próprio para recorrer da decisão que determinou a despersonalização da pessoa jurídica na EXECUÇÃO PROVISÓRIA e o prosseguimento da execução em face da pessoa física." Prossegue sua irresignação insistindo nos mesmos argumentos já veiculados na exordial.
Verifica-se, contudo, que os argumentos expendidos em agravo interno não levam à conclusão de modificação do entendimento adotado em juízo monocrático.
Os fatos narrados na peça de ingresso demonstram que nos autos da reclamação trabalhista noticiada pela impetrante, a ação se encontra em adiantada fase de execução, na qual, ante a impossibilidade de se garantir o crédito obreiro no patrimônio da empresa executada (devedora principal), buscou-se direcionar a execução contra o patrimônio de sua sócia, ora impetrante.
Como bem consignado na decisão que indeferiu a petição inicial, "a decisão que, por força da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, inclui no processo de execução a sócia da empresa então executada, como ocorreu na presente hipótese, soluciona uma questão incidente no curso do procedimento executório, pelo que emerge nítido o seu caráter terminativo em relação a essa matéria, abrindo brecha para a oposição de embargos à execução, seguidos, se for o caso, do competente agravo de petição, nos termos do disposto na letra "a" do artigo 897 da CLT." Assim, consoante os comandos do parágrafo 1º do art. 893 da CLT, resta vedada a interposição de recurso das decisões interlocutórias proferidas pelo Juízo, salvo quando terminativas do feito.
Consultando o andamento processual da reclamação trabalhista em questão, verifica-se que a impetrante chegou a opor embargos à execução naquela ação, todavia, estes não foram conhecidos pelo fato de que o Juízo não está garantido. Assim decidiu o Juiz:
"Vistos.
Compulsando os autos, verifico que houve erro no despacho de fls.519, tendo em vista que a execução não foi garantida, sendo então desconsiderado o referido despacho.
Sendo assim, não conheço os embargos opostos pela executada.
Prossiga-se com a execução conforme despacho de fls. 475, a fim de garantir a execução.
Publique-se.
Brasília, 16 de junho de 2017."
Ou seja, a decisão impugnada não só é passível de recurso como a impetrante assim o fez. Todavia, teve seu seguimento obstado pela ausência de garantia do juízo.
Ressalte-se, por fim, que o Tribunal Superior do Trabalho, em inúmeros julgados, tem preconizado a impossibilidade de utilização do mandamus como sucedâneo de recurso ou de outra medida jurídica apta a coibir o ato coator, o que culminou na edição da OJ nº 92, da Eg. SBDI II, verbis:
"MANDADO DE SEGURANÇA. EXISTÊNCIA DE RECURSO PRÓPRIO (inserida em 27.05.2002. Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial passível de reforma mediante recurso próprio, ainda que com efeito diferido."
Por tais razões, nego provimento ao presente agravo interno e mantenho incólume a decisão agravada, por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Conclusão do recurso Pelo exposto, conheço do agravo interno e, no mérito, nego-lhe provimento, nos termos da fundamentação acima esposada.
É o meu voto. (fls. 596/598)
Nas razões recursais, afirma a Impetrante que o ato coator "... está revestido de conteúdo jurisdicional, que não é passível de ser desafiado por recurso próprio haja vista a fase em que se encontra o processo, em EXECUÇÃO PROVISÓRIA, com determinação de despersonalização da pessoa jurídica, e com intimação postal da representante legal da reclamada para efetuar o pagamento da dívida com seu patrimônio pessoal" (fl. 610).
Sustenta que "Há manifesto obstáculo para se insurgir contra decisão, ante a regra geral da não recorribilidade imediata das decisões interlocutórias..." (fl. 610).
Pondera que "... a impetrante, sócia da executada, corre o risco de ver suas contas bancárias bloqueadas e ver seus bens pessoais penhorados ou bloqueados em execução provisória movida em face da empresa executada" (fl. 612).
Ressalta que "O processo está em EXECUÇÃO PROVISÓRIA e a execução só pode ir até à penhora dos bens da executada, e não os bens dos sócios, porque não há decisão condenatória transitada em julgado" (fl. 615).
Alega que "A determinação judicial viola os artigos 880 e o 883, da CLT" (fl. 617).
Com vários outros argumentos, acrescenta que "... a decisão judicial que determinou a despersonalização da pessoa jurídica na EXECUÇÃO PROVISÓRIA, e antes do trânsito em julgado viola os princípios constitucionais da reserva legal, da propriedade, do devido processo legal, da ampla defesa e da fundamentação das decisões judiciais, insertos nos incisos II, XXII, XXXV, XXXVI, LIV, LV do art. 5º, e artigo 93, IX, da Lei Básica Federal vigente" (fl. 618).
Nesses termos, requer "... a concessão da liminar inaudita altera pars para suspender a determinação judicial de despersonalização da pessoa jurídica e suspender o prosseguimento da execução provisória em face da impetrante MARIA LINDALVA DE SOUZA, pessoa física, determinando, ainda, a remessa dos autos principais à contadoria judicial para proceder à correta liquidação do r. julgado, a fim de que se tenha parâmetros reais da condenação" (fl. 618).
Não lhe assiste razão.
Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado em face de ato mediante o qual o Juízo de primeira instância, em decisão exarada ainda em execução provisória (pendente de julgamento agravo de instrumento em recurso extraordinário), desconsiderou a personalidade da pessoa jurídica executada e incluiu a impetrante no polo passivo da execução, determinando sua citação para pagamento da quantia apurada em liquidação.
A decisão impugnada no mandamus foi exarada em 16/6/2017 (fl. 506), ou seja, já na vigência do CPC de 2015.
Na expressa dicção do artigo 5º, II, da Lei 12.016/2009, o mandado de segurança não representa a via processual adequada para a impugnação de decisões judiciais passíveis de retificação por meio de recurso, ainda que com efeito diferido, conforme diretriz da OJ 92 da SBDI-2 do TST.
No entanto, direcionada a execução provisória contra a pessoa física titular do empreendimento sem observância das normas dos arts. 133 a 137 do CPC de 2015, que disciplinam o incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, deve ser permitida, na ação mandamental, a discussão acerca da possibilidade de, em execução ainda não definitiva, estender os efeitos da obrigação contida no título executivo aos bens particulares da administradora da pessoa jurídica.
Afinal, a partir da vigência do CPC de 2015, a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica deve ser levada a efeito, necessariamente, com a instauração do incidente de que cuidam os arts. 133 a 137 do referido diploma legal, conforme orienta, aliás, o art. 6º da IN 39/2016 do TST.
Confira-se, a propósito, o disposto no aludido art. 6º da IN 39/2016 do TST:
Art. 6° Aplica-se ao Processo do Trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica regulado no Código de Processo Civil (arts. 133 a 137), assegurada a iniciativa também do juiz do trabalho na fase de execução (CLT, art. 878).
§ 1º Da decisão interlocutória que acolher ou rejeitar o incidente:
I – na fase de cognição, não cabe recurso de imediato, na forma do art. 893, § 1º da CLT;
II – na fase de execução, cabe agravo de petição, independentemente de garantia do juízo;
III – cabe agravo interno se proferida pelo Relator, em incidente instaurado originariamente no tribunal (CPC, art. 932, inciso VI).
§ 2º A instauração do incidente suspenderá o processo, sem prejuízo de concessão da tutela de urgência de natureza cautelar de que trata o art. 301 do CPC. (destaquei)
Conforme destacado na transcrição acima, é possível discutir o cabimento da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica sem garantir a execução, podendo-se, inclusive, interpor agravo de petição.
Vale lembrar que as referidas regras da IN 39/2016 do TST foram incluídas na CLT, por meio da Lei 13.467/2017, encontrando-se no art. 855-A da Consolidação. In casu, a decisão impugnada foi proferida antes da reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467/2017, mas já sob a égide do CPC de 2015.
Diante dessa verdadeira quebra de paradigma no processo de trabalho, iniciada com a vigência do CPC de 2015, na forma do art. 769 da CLT e do art. 15 do próprio NCPC, entendo que o presente mandado de segurança deve ser admitido.
De todo modo, não sendo possível, no momento, examinar a pretensão mandamental, porquanto ainda não oficiada a autoridade apontada como coatora nem notificado o Litisconsorte passivo, determina-se o retorno dos autos à Corte de origem a fim de que o mandado de segurança seja processado e julgado.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso ordinário para determinar o retorno dos autos à Corte de origem a fim de que o mandado de segurança seja processado e julgado.
Brasília, 6 de novembro de 2018.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES
Ministro Relator
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