Data da publicação:
Acordão - TST
Marcelo Lamego Pertence - TRT/MG
Sócio de oficina consegue anular penhora da casa em que mora
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. PROCESSO EM FASE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA.
1. Tendo em vista a relevância da discussão jurídica envolvendo a impenhorabilidade do bem de família, bem como o valor econômico do imóvel sobre cuja constrição se controverte, impõe-se, em melhor exame, reconhecer a transcendência econômica da matéria deduzida em recurso.
2. No presente caso, o Tribunal Regional consignou que o executado comprovou que reside no imóvel objeto da penhora, mas não reconheceu a impenhorabilidade do bem, sob o fundamento de que "não houve, por parte do agravante, a efetiva prova de ser o bem penhorado o único de sua propriedade, não juntou declaração de imposto de renda, que poderia comprovar a existência de somente este bem para que pudesse ser considerado como bem de família".
3. Contudo, esta Corte Superior firmou jurisprudência no sentido de que se considera bem de família o imóvel utilizado como residência pela entidade familiar, sendo irrelevante o fato de não ser este o único imóvel do executado.
4. Nesse contexto, ao manter a penhora sobre o imóvel utilizado pelo executado como residência de sua família, o Tribunal Regional violou o art. 5º, XXII, da Constituição da República.
Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-RR-63400-92.2004.5.02.0316, Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 29/11/2021).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-63400-92.2004.5.02.0316 (convertido de agravo de instrumento de mesmo número), em que é Recorrente MOABE HERIBAN FEREIRA e são Recorridos LUIZ BERGANDIO DE ARAÚJO DA SILVA e MAMONAS SERVIÇOS AUTOMOTIVOS LTDA.
Trata-se de agravo interposto à decisão monocrática do Relator, que exerceu juízo negativo de transcendência no julgamento do agravo de instrumento interposto pelo terceiro embargante.
É o relatório.
V O T O
I - AGRAVO
1. CONHECIMENTO
Satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade recursal, pertinentes à tempestividade e à regularidade de representação, CONHEÇO do agravo.
2. MÉRITO
BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA
Mediante decisão singular, o Relator, em razão da não demonstração de transcendência da matéria impugnada no recurso de revista, negou seguimento ao agravo de instrumento.
O terceiro embargante interpõe agravo. Afirma que "o Recurso apresentado oferece total transcendência, na medida que os decisum violam frontalmente a Constituição e jurisprudência desse Sodalício e do STF em especial a redação dos artigos 1º, III, 5º, XXII e artigo 6º, ambos da Constituição Federal". Sustenta que a impenhorabilidade do bem de família não depende do registro dessa condição de na matrícula do imóvel ou da sua caracterização inequívoca como único de propriedade do terceiro.
Ao exame.
Tendo em vista a relevância da discussão jurídica envolvendo a impenhorabilidade do bem de família, bem como o valor econômico do imóvel sobre cuja constrição se controverte, em melhor exame, RECONHEÇO A TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA da matéria deduzida em recurso.
Consta do acórdão regional:
"Do bem de família
Alega o agravante que o imóvel situado à Rua São Pedro, 331, antigo 329, Vila Ares – Guarulhos/SP, cep. 07032-010 e que foi penhorado às f.244/244v., é único imóvel de sua propriedade e deve ser considerado como bem de família de acordo com o previsto na Lei 8009/90.
Examinando-se os autos, verifica-se que no auto de penhora de f. 244/244v., embora não haja a assinatura do auto de depósito, há certidão firmada pela Sra. Oficiala de Justiça informando que foi dada ciência ao sócio, ora agravante, bem como à sua esposa, Juliana Boschetti Ferreira, da penhora que recaiu sobre imóvel de propriedade de ambos. Regular e válida a penhora.
O juízo de primeiro grau não considerou as alegações do agravante e manteve a penhora que recaiu sobre o bem, pois não houve a efetiva comprovação de ser o imóvel em questão – bem de família.
Pois bem, passo a análise das provas juntadas aos autos.
O agravante quando apresentou a petição de embargos à execução juntou aos autos apenas documentos de cunho pessoal, quais sejam certidões de casamento, nascimento dos filhos, carteiras de vacinação, contas de luz, matrículas em escolas, afim de comprovar que o imóvel é utilizado para residência da família.
Juntou ainda, boleto de financiamento do imóvel junto à Caixa Econômica Federal, pois o imóvel é hipotecado junto a referido banco, conforme cópia da certidão do imóvel, registrada em cartório (f. 267v.).
Comprovado que o agravante reside no imóvel penhorado com sua família. No entanto, não houve, por parte do agravante, a efetiva prova de ser o bem penhorado o único de sua propriedade, não juntou declaração de imposto de renda, que poderia comprovar a existência de somente este bem para que pudesse ser considerado como bem de família.
O agravante, também, não indicou qualquer outro bem apto a garantir a execução, seja de sua propriedade, de propriedade da executada ou de qualquer um dos outros sócios.
Por estes motivos, considero que o bem penhorado deve permanecer gravado para garantia da presente execução.
Quanto a falta de inscrição de referido bem como bem de família conforme previsto no art. 1714 do CC, considero não ser este o motivo essencial da prova do bem de família, pois a Lei nº 8.009/90, assegura proteção especial ao bem de família" (fls. 403).
Como se observa, o Tribunal Regional consignou que o executado comprovou que reside no imóvel objeto da penhora, mas não reconheceu a impenhorabilidade do bem, sob o fundamento de que "não houve, por parte do agravante, a efetiva prova de ser o bem penhorado o único de sua propriedade, não juntou declaração de imposto de renda, que poderia comprovar a existência de somente este bem para que pudesse ser considerado como bem de família".
Esta Corte Superior firmou jurisprudência no sentido de que se considera bem de família o imóvel utilizado como residência pela entidade familiar, sendo irrelevante o fato de não ser este o único imóvel do executado.
Nesse sentido:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EXECUÇÃO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. Evidenciada a existência de violação do artigo 6º da Constituição da República, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento para determinar o processamento do Recurso de Revista. RECURSO DE REVISTA EXECUÇÃO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. No presente caso, alegam os executados que o bem penhorado é seu único imóvel, que é destinado a sua residência e de sua família. Depreende-se da leitura do acórdão recorrido que o Tribunal Regional adotou como fundamento para manter a penhora o fato de os executados não terem comprovado que o imóvel em discussão é o único de sua propriedade. Exigir prova de que o bem onde os executados afirmam residir é de família é o mesmo que exigir prova negativa de que não possuem outros bens. Tal exigência não é juridicamente razoável, razão por que extrapola os limites do artigo 6º da Constituição da República. Cabe ao exequente provar que o imóvel em discussão não constitui bem de família, indicando outros bens de propriedade dos executados. Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-11036-38.2015.5.03.0185, 1ª Turma, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 16/10/2017).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. UTILIZAÇÃO PARA FINS DE MORADIA DO EXECUTADO. No caso, observa-se que o Regional manteve a penhora sobre o imóvel, ao fundamento de que, embora demonstrado que o bem se destinava à moradia do então recorrente, o sócio executado não comprovou que o imóvel penhorado é o único de sua propriedade, tampouco provou, mediante escritura pública ou testamento, a qualidade de bem de família do imóvel. A Corte a quo concluiu que "Os documentos colacionados aos autos pelo agravante às fls.361/364 indicam que o agravante reside no imóvel, mas não são suficientes para demonstrar que é o único imóvel que possui, pois deixou de instruir os autos com as certidões negativas de cartório da região e com a última declaração de imposto de renda, documentos aptos para demonstrar tal fato". Entretanto, a decisão regional merece reparo. A impenhorabilidade do bem de família está prevista na Lei nº 8.009/90, que assim dispõe: "Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei" (grifou-se) Trata-se de norma de ordem pública, de cunho eminentemente social, e que tem, por escopo, resguardar o direito à residência ao devedor e à sua família, assegurando-lhes condições dignas de moradia, indispensáveis à manutenção e à sobrevivência da célula familiar. Ademais, de acordo com o disposto no artigo 5º da Lei n° 8.009/90, "para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta Lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente". Portanto, consoante se extrai dos dispositivos mencionados, a impenhorabilidade do bem de família, prevista na Lei nº 8.009/90, independe de manifestação de vontade do seu proprietário, bastando, para tanto, tratar-se de imóvel utilizado como moradia pelo casal ou entidade familiar, sendo esse requisito objetivo e absoluto, admitindo-se apenas as exceções listadas pela lei de forma taxativa. Na espécie, ficou registrado, no acórdão regional, que o imóvel penhorado serve de residência permanente da entidade familiar. Dessa forma, como o imóvel penhorado é utilizado pela família do executado para moradia, é imperioso reconhecer a condição de bem de família do imóvel e a sua impenhorabilidade, nos termos da Lei n° 8.009/90. Deve-se preservar, sempre, em casos como este, o direito à moradia do executado e de sua família, previsto no artigo 6º da Constituição Federal, já que não constatadas as exceções à impenhorabilidade de que trata a lei. Cumpre esclarecer que, consoante o disposto no artigo 5º, parágrafo único, da Lei n° 8.009/1990, só haverá necessidade de constituição voluntária de um bem de família, mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis, nos casos em que o casal ou entidade familiar utilizar mais de um imóvel de sua propriedade como moradia, ou seja, na hipótese de pluralidade de residências, situação não delineada no caso dos autos. Desse modo, para efeito de caracterização do bem de família sobre o que preconiza a Lei nº 8.009/90, é suficiente que o imóvel objeto da constrição judicial seja destinado à residência familiar. Logo, ao contrário do que concluiu a Corte a quo, não é preciso que a parte comprove a ausência de outros bens imóveis de sua propriedade nem que demonstre, mediante escritura pública, a qualidade de bem de família do imóvel. Assim, o Regional, ao confirmar a sentença em que se determinou a penhora do bem que se destinava à moradia do sócio executado, porque não comprovado que o imóvel constrito era o único de sua propriedade, violou o disposto nos artigos 5º, inciso XXII, e 6º, caput, da Constituição Federal. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido para reconhecer a condição de bem de família do imóvel e a sua impenhorabilidade, desconstituindo a penhora realizada sobre o imóvel do recorrente" (destaquei)(RR-75800-50.2006.5.15.0141, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 02/09/2016).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. FASE DE EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. PROTEÇÃO QUE NÃO SE AFASTA EM RAZÃO DE PLURALIDADE DE IMÓVEIS. OFENSA AO ARTIGO 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROVIMENTO. Por prudência, ante possível afronta ao artigo 6º da Constituição Federal, o processamento do recurso de revista é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA. FASE DE EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. PROTEÇÃO QUE NÃO SE AFASTA EM RAZÃO DE PLURALIDADE DE IMÓVEIS. OFENSA AO ARTIGO 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROVIMENTO. O legislador pátrio, com o propósito de assegurar o direito de moradia previsto no artigo 6º da Constituição Federal, estabeleceu regra de proteção ao imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar, elevando-o à condição de bem de família não sujeito à penhora (artigo 1º, caput , da Lei nº 8.009/1990). Da exegese do citado preceito, é possível extrair que a lei apenas impõe que o devedor seja o proprietário do imóvel e que nele resida. A lei não permite a interpretação de que a propriedade de outros imóveis afaste a impenhorabilidade do bem utilizado como moradia pelo devedor. Somente nos casos previstos na própria lei, poderá haver mitigação da cláusula de impenhorabilidade, estando as hipóteses relacionadas no artigo 3º do referido diploma. Ora, se o legislador infraconstitucional fixou, de forma taxativa, as hipóteses em que a impenhorabilidade do bem de família poderia ser flexibilizada, não cabe ao intérprete acrescentar qualquer outra situação, lançando, por exemplo, como outro critério entre as hipóteses de mitigação o fato de o executado ser possuidor de outros imóveis. É bem verdade que, em se tratando de pluralidade de residências, o artigo 5º, caput , da mesma lei restringe a impenhorabilidade a um único imóvel utilizado como residência, estabelecendo em seu parágrafo único que se várias forem as residências utilizadas pelo casal ou entidade familiar a impenhorabilidade recairá sobre o imóvel de menor valor ou outro registrado para esse fim no Registro de Imóveis, podendo os demais ser objeto de constrição. Segundo a letra da lei, ainda, é possível concluir que para se comprovar a pluralidade de residências não basta, como entendeu o Colegiado Regional, que os imóveis sejam passíveis de utilização como residências, sendo necessária a demonstração inequívoca de que estes são efetivamente utilizados para tal destinação. A despeito da compreensão que ora se alcança, o fato é que, no presente caso, de pluralidade de residências não se trata, visto que, em última análise, o que foi levado em conta para se mitigar a cláusula de impenhorabilidade foi a mera "pluralidade de bens" de propriedade do executado, hipótese que não se enquadra no artigo 5º, parágrafo único, tampouco afasta a impenhorabilidade garantida pelo artigo 1º, caput . O Tribunal Regional, contudo, mesmo constatando que o imóvel penhorado serve de moradia para a unidade familiar do executado, manteve a penhora sobre o referido imóvel, ao fundamento de que a tão só utilização do imóvel como residência, pelo executado, não constitui óbice intransponível à penhorabilidade, porquanto comprovada a propriedade de outros bens. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-109200-26.1996.5.01.0002, 4ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 01/02/2019).
"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. Em razão de provável caracterização de ofensa aos artigos 5º, XXII, e 6º da Constituição, dá-se provimento ao agravo para melhor exame do agravo de instrumento. Agravo conhecido e provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. Em razão de provável ofensa aos artigos 5º, XXII, e 6º da Constituição, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a Lei nº 8.009/1990 não retira o benefício do bem de família daqueles que possuem mais de um imóvel, isso porque o parágrafo único do artigo 5º da aludida lei dispõe expressamente que a impenhorabilidade recairá sobre o bem de menor valor na hipótese em que a parte possuir vários imóveis utilizados como residência. Segundo aquela Corte, para que seja reconhecida a impenhorabilidade do bem de família não é necessária a prova de que o imóvel em que reside a família do devedor seja o único. Ainda conforme o STJ, "Como a ninguém é dado fazer o impossível (nemo tenetur ad impossibilia), não há como exigir dos devedores a prova de que só possuem um único imóvel, ou melhor, de que não possuem qualquer outro, na medida em que, para tanto, teriam eles que requerer a expedição de certidão em todos os cartórios de registro de imóveis do país, porquanto não há uma só base de dados". (REsp 1400342/RJ - DJe 15/10/2013). Conclui-se, portanto, que o Tribunal Regional, ao deixar de caracterizar o imóvel penhorado como bem de família, exclusivamente, por não ter a agravante comprovado que aquele era seu único imóvel residencial, violou os artigos 5º, XXII, e 6º da Constituição, que garantem o direito de propriedade. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-39900-52.1999.5.05.0101, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 23/03/2018).
"I - DA PETIÇÃO AVULSA N.º 109335-09/2017 A discussão quanto à ilegitimidade de parte da pessoa física demandada é totalmente inovatória nesta fase recursal. Indefere-se o pedido. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI N.º 13015/2014. INSTRUÇÃO NORMATIVA N.º 40 DO TST . RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO FISCAL PROMOVIDA PELA UNIÃO. INAPLICABILIDADE DAS RESTRIÇÕES DE QUE TRATA O ART. 896, § 2º, DA CLT 1 - É inaplicável a restrição do art. 896, §2º, da CLT em sede de execução fiscal de dívida ativa, ao contrário do que entendeu o Juízo de admissibilidade a quo . 2 - Segue-se no exame das demais matérias, sem o óbice previsto nesse dispositivo, ante o que dispõe a Orientação Jurisprudencial n.º 282 da SBDI-1 do TST. RECURSO DE REVISTA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA A aplicação do princípio da transcendência, previsto no art. 896-A da CLT, ainda não foi regulamentada no âmbito deste c. Tribunal, providência que se faz necessária em face do comando do art. 2º da Medida Provisória 2.226/2001 (DOU 5/9/2001), que dispõe: "O Tribunal Superior do Trabalho regulamentará, em seu regimento interno, o processamento da transcendência do recurso de revista, assegurada a apreciação da transcendência em sessão pública, com direito a sustentação oral e fundamentação da decisão", razão pela qual o exame da admissibilidade do recurso de revista se restringe aos pressupostos do artigo 896 da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento. NULIDADE DA HASTA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO ADVOGADO DO EXECUTADO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO CÔNJUGE. ERROS MATERIAIS NA PENHORA (AVALIAÇÃO, EDITAL E DESCRIÇÃO). SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO . Quanto aos temas em epígrafe, não foram analiticamente confrontados os fundamentos constantes dos trechos do acórdão do TRT transcritos nas razões de revista, nos termos do art. 896, §1º-A, III, da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento. BEM DE FAMÍLIA. CONFIGURAÇÃO Mostra-se conveniente o processamento do recurso de revista unicamente quanto ao tema em epígrafe (Instrução Normativa n.º 40 do TST), a fim de melhor analisar a alegação de afronta ao art. 1.º da Lei n.º 8.009/90. Agravo de instrumento a que se dá provimento, determinando-se o processamento do recurso de revista, no particular. III - RECURSO DE REVISTA BEM DE FAMÍLIA. CONFIGURAÇÃO 1 - A proteção conferida pela Lei n.º 8.009/90 ao bem de família encontra amparo na Constituição Federal, que em seu art. 1.º, III, estabelece como princípio fundamental da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana, no art. 6º confere à moradia qualidade de direito social, e no art. 226 declara que a família é base da sociedade e tem especial proteção do Estado. Desde sua origem (Lei do Homestead , 1839, na então República do Texas), a finalidade do instituto é, efetivamente, proteger a moradia da entidade familiar, não havendo maiores requisitos para a configuração do bem de família, senão aqueles previstos na lei. 2 - A Lei n.º 8.009/90 define como "bem de família" aquele imóvel utilizado pelo casal ou entidade familiar para moradia permanente, podendo perder essa qualificação apenas se possuir vários imóveis utilizados como residência. Nesse caso, será impenhorável apenas aquele de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado para esse fim. Assim, o fato de os executados residirem no imóvel de sua propriedade gera a presunção iuris tantum de que se trata de bem de família e o torna impenhorável. 3 - No caso dos autos, é incontroverso que os executados residem no imóvel penhorado. No entanto, conforme o trecho do acórdão transcrito nas razões de revista, o TRT considerou a simples existência de outros imóveis de propriedade dos executados fato suficiente para afastar do imóvel em que residem a qualidade de "bem de família". Tal entendimento não se coaduna com o texto da lei, pois para tanto seria necessário que tais imóveis fossem ou pudessem ser utilizados como moradia, ressaltando-se que a prova dessa circunstância é do exequente, conforme julgados desta Corte. 4 - Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (ARR-60200-75.2007.5.14.0401, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 02/06/2017).
"I) AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE SENTENÇA - IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE - HIPÓTESE DE ADMISSÃO EXCEPCIONAL DO RECURSO DE REVISTA. Constatada violação excepcional do art. 5º, II, da Constituição Federal, diante do desrespeito ao princípio da legalidade, por ter a decisão regional contrariado expressa disposição de lei no que tange à impenhorabilidade de bem de família(Lei 8.009/90, art. 5º), dá-se provimento ao agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. II) RECURSO DE REVISTA - EXECUÇÃO DE SENTENÇA – IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA- VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE - PROVIMENTO. 1. O art. 5º da Lei 8.009/90, norma legal que disciplina a impenhorabilidade do bem de família, considera como residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente, e não que o Executado tenha um único imóvel. De outra parte, exigir que o terceiro embargante prove que o bem de família penhorado é o seu único imóvel, é o mesmo que obrigar a parte a fazer prova negativa de que não possui outros bens, exigência que não se mostra juridicamente razoável, mormente porque tal comprovação é muito difícil, cabendo ao exequente demonstrar que o bem constitui bem de família. 2. Na hipótese, o Regional, apesar de mencionar a indicação específica de residência continuada, negou a liberação do imóvel de propriedade dos Executados, Terceiros Embargantes, ao fundamento de que não restou comprovado nos autos que o bem sobre o qual recaiu a penhora é, de fato, o único imóvel na composição patrimonial dos Executados, apesar de reconhecer que o imóvel penhorado é a residência destes. 3. Ora, o entendimento da Corte de origem vai contra expresso texto de lei (Lei 8.009/90, art. 5º) ferindo, por conseguinte, o princípio da legalidade (CF, art. 5º, II), o que impõe o provimento do recurso de revista, a fim de determinar a liberação do imóvel de propriedade dos Recorrentes, com o levantamento da penhora. Recurso de revista provido" (TST-RR314300-65.1998.5.02.0006, 7ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra Martins Filho, DEJT 11.10.2012).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. EXECUÇÃO. ART. 896, § 2º, DA CLT. BEM DE FAMÍLIA. Em razão de provável caracterização de ofensa ao art. 6º, caput, da Constituição Federal, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. BEM DE FAMÍLIA. O e. Regional manteve a decisão monocrática que determinou a penhora do imóvel, sob o fundamento de que, conquanto tenha sido demonstrado, por prova documental, tratar-se de imóvel em que família reside, não restou demonstrado ser este o único de propriedade do executado. A proteção ao bem de família, consagrada na Lei nº 8.009/1990, não está condicionada à inscrição do aludido bem no Registro de Imóveis. Exige-se, tão somente, tal medida nos casos em que a entidade familiar seja detentora de vários imóveis, como escopo de se evitar que a impenhorabilidade recaia sobre o bem de menor valor (art. 5º, parágrafo único, Lei nº 8.009/1990). Não há previsão legal de que o executado deva provar não possuir outro bem imóvel. Pelo contrário, incumbe ao exequente demonstrar a existência de outros bens a serem executados para que, assim, possa promover a adequada constrição patrimonial. Precedentes. Assim, o e. Tribunal Regional, ao manter a penhora sobre o bem imóvel de residência do executado, violou os direitos fundamentais à propriedade e à moradia consagrados no ordenamento jurídico pátrio. Recurso de revista conhecido e provido" (RR - 206-37.2013.5.01.0056, Relator Desembargador Convocado: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 23/09/2015, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/09/2015)
Nesse contexto, ao manter a penhora sobre o imóvel utilizado pelo executado como residência de sua família, o Tribunal Regional violou o art. 5º, XXII, da Constituição da República.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo para determinar o exame do agravo de instrumento.
II – AGRAVO DE INSTRUMENTO
1 - CONHECIMENTO
Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade, dele conheço.
2 - MÉRITO
BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA
O recurso de revista teve seu seguimento denegado pelo Tribunal Regional de origem, nos seguintes termos:
"PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / LIQUIDAÇÃO / CUMPRIMENTO / EXECUÇÃO / CONSTRIÇÃO / PENHORA / AVALIAÇÃO / INDISPONIBILIDADE DE BENS / IMPENHORABILIDADE / BEM DE FAMILIA.
Verifica-se que a solução dada pela E. Turmaa esse item foi obtida mediante o exame dos elementos fáticos dos autos, e para se chegar à conclusão de que esse desfecho teria incidido em violação hábil a propiciar o reexame nos termos do $ 2º do art. 896 da CLT - considerando-se que a hipótese não caracteriza nenhuma das exceções previstas no 810 do art. 896 da CLT -, necessária seria a reapreciação da prova, o que não se compadece com o procedimento do Recurso de Revista.
Verifica-se, do v. acórdão em análise, que o recorrente deixou de comprovar que o imóvel em questão era o único de sua propriedade.
DENEGO seguimento quanto ao tema..
CONCLUSÃO
DENEGO seguimento ao Recurso de Revista" (fls. 424/425).
O agravante renova sua insurgência no tocante à penhora sobre seu imóvel, sob o argumento de que se trata de bem de família, sobretudo porque comprovou sua utilização como residência para a família do executado. Renova indicação de violação do art. 5º, XXII, da CF/88.
Como se observa, o Tribunal Regional consignou que o executado comprovou que reside no imóvel objeto da penhora, mas não reconheceu a impenhorabilidade do bem, sob o fundamento de que "não houve, por parte do agravante, a efetiva prova de ser o bem penhorado o único de sua propriedade, não juntou declaração de imposto de renda, que poderia comprovar a existência de somente este bem para que pudesse ser considerado como bem de família".
Os precedentes colacionados quando do exame do recurso de agravo demonstram a jurisprudência iterativa e notória no sentido de que se considera bem de família o imóvel utilizado como residência pela entidade familiar, sendo irrelevante o fato de não ser este o único imóvel do executado.
Nesse contexto, ao manter a penhora sobre o imóvel utilizado pelo executado como residência de sua família, o Tribunal Regional violou o art. 5º, XXII, da Constituição da República.
Diante do exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista.
III – RECURSO DE REVISTA
1 – CONHECIMENTO
O recurso de revista é tempestivo, está subscrito por advogado regularmente habilitado e cumpre os demais pressupostos extrínsecos de admissibilidade.
1.1 - BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA
Conforme exposto no exame do agravo, o executado demonstrou violação do art. 5º, XXII, da Constituição da República, motivo pelo qual conheço do recurso de revista.
2 - MÉRITO
2.2 - BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA
Diante do conhecimento do recurso de revista, por violação do art. 5º, XXII, da CF, seu provimento é medida que se impõe, para anular a penhora do imóvel em que residem os recorrentes e, por conseguinte, declarar a nulidade da hasta pública e da arrematação desse imóvel, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem a fim de que prossiga a execução, nos termos da lei.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, (a) conhecer do agravo e, no mérito, dar-lhe provimento, para julgar o agravo de instrumento; (b) conhecer do agravo de instrumento e, no mérito, dar-lhe provimento quanto ao tema "BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA", por possível violação do art. 5º, XXII, da CF, para determinar o processamento do recurso de revista; e (c) conhecer do recurso de revista quanto ao tema "BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL UTILIZADO PELO EXECUTADO COMO RESIDÊNCIA DE SUA FAMÍLIA", por violação do art. 5º, XXII, da CF, e, no mérito, dar-lhe provimento, para anular a penhora do imóvel em que residem os recorrentes e, por conseguinte, declarar a nulidade da hasta pública e da arrematação desse imóvel, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem a fim de que prossiga a execução, nos termos da lei.
Brasília, 24 de novembro de 2021.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
MARCELO LAMEGO PERTENCE
Desembargador Convocado Relator
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