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Acordão - STF

Rosa Weber - STF



Associação sindical de empregados de entidades sindicais - ADI 3890/DF. Os empregados de entidades sindicais podem associar-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria.



Resumo do voto.

Associação sindical de empregados de entidades sindicais - ADI 3890/DF.

Os empregados de entidades sindicais podem associar-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria.

A liberdade de associação sindical, em sua dimensão coletiva, assegura aos trabalhadores em geral o direito à criação de entidades sindicais [Constituição Federal (CF), art. 8º, caput, I e II)] (1), bem assim, em sua dimensão individual, consagra a liberdade dos interessados em aderirem ou não ao sindicato ou desfiliar-se conforme sua vontade.

A Lei 11.295/2006, ao garantir o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais, nada mais fez do que explicitar uma liberdade conferida àquele grupo de trabalhadores pelo próprio texto constitucional.

Cabe destacar que o parágrafo único do art. 526 da CLT, em sua redação original (2), não foi recepcionado pela CF/1988, motivo pelo qual esse dispositivo normativo já estava tacitamente revogado antes mesmo da edição da Lei 11.295/2006.

Com base nesse entendimento, o Plenário julgou improcedente o pedido de declaração de inconstitucionalidade da Lei 11.295/2006.

(1) CF/1988: “Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical; II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;”

(2) CLT: “Art. 526 (…) Parágrafo único. Aplicam-se aos empregados dos sindicatos os preceitos das leis de proteção do trabalho e de previdência social, excetuado o direito de associação em sindicato.”

ADI 3890/DF, relatora Min. Rosa Weber, julgamento virtual finalizado em 7.6.2021 (segunda-feira), às 23:59.

 

 

08/06/2021 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.890 DISTRITO FEDERAL

RELATORA :MIN. ROSA WEBER

REQTE.(S) :CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO - CNC

ADV.(A/S) :LIDIANE DUARTE NOGUEIRA

INTDO.(A/S) :PRESIDENTE DA REPÚBLICA

PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) :CONGRESSO NACIONAL

AM. CURIAE. :SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ENTIDADES SINDICAIS DE MINAS GERAIS - SITESEMG

ADV.(A/S) :RENATO LUIZ PEREIRA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 11.295/2006. DIPLOMA LEGISLATIVO QUE ALTERA A CLT, PARA ESTABELECER O DIREITO DE SINDICALIZAÇÃO DOS EMPREGADOS DE ENTIDADES SINDICAIS. LIBERDADE CONSAGRADA PELO TEXTO CONSTITUCIONAL COMO DIREITO TITULARIZADO POR TODOS OS TRABALHADORES, COM EXCEÇÃO APENAS QUANTO AOS MILITARES (CF, ART. 8º, I E II). CLÁUSULA CONSTITUCIONAL IMPEDITIVA DA CRIAÇÃO PELO PODER PÚBLICO DE OBSTÁCULOS AO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO SINDICAL. ATO LEGISLATIVO IMPUGNADO EM PLENA CONFORMIDADE COM O TEXTO CONSTITUCIONAL.

1. A Constituição Federal de 1988 assegura o direito de associação sindical a todos os trabalhadores (CF, art. 8º, caput), inclusive aos servidores públicos (CF, art. 37, VI), com exceção apenas dos militares (CF, art. 142, § 3º, IV).

2. A liberdade de associação sindical, em sua dimensão coletiva, garante aos trabalhadores em geral o direito à criação de entidades sindicais (CF, art. 8º, caput, I e II), bem assim, em sua dimensão individual, consagra a liberdade conferida aos interessados de aderirem ou não ao sindicato ou de desfiliarem-se conforme suas vontades.

3. O direito de constituir entidades sindicais consubstancia vedação à estipulação de obstáculos pelo Poder Público à criação de organismos sindicais . Essa garantia legitima a fundação de entidades sindicais, sem prévia submissão a juízo discricionário ou político do Estado, mediante inscrição do ato constitutivo no registro civil de pessoas jurídicas (CC, art. 45) e posterior registro perante o órgão gestor do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (Súmula nº 677/STF), a quem incumbe a fiscalização quanto ao cumprimento do postulado da unicidade sindical (CF, art. 8º, II).

4. O ato legislativo impugnado, ao garantir o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais, nada mais fez do que explicitar uma liberdade conferida àquele grupo de trabalhadores pelo próprio texto constitucional (CF, art. 8º, I e II).

5. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida. Pedido julgado improcedente.  (STF-ADI-3890, Rosa Weber, DJE 17.06.2021).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em conhecer da ação direta e, no mérito, julgar improcedente o pedido, nos termos do voto da Relatora e por unanimidade de votos, em sessão virtual do Pleno de 28 de maio a 7 de junho de 2021, na conformidade da ata do julgamento.

Brasília, 8 de junho de 2021.

Ministra Rosa Weber

Relatora

 

 

08/06/2021 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.890 DISTRITO FEDERAL

RELATORA :MIN. ROSA WEBER

REQTE.(S) :CONFEDERACAO NACIONAL DO COMERCIO - CNC

ADV.(A/S) :LIDIANE DUARTE NOGUEIRA

INTDO.(A/S) :PRESIDENTE DA REPUBLICA

PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA UNIAO

INTDO.(A/S) :CONGRESSO NACIONAL

AM. CURIAE. :SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ENTIDADES SINDICAIS DE MINAS GERAIS - SITESEMG

ADV.(A/S) :RENATO LUIZ PEREIRA

R E L A T Ó R I O

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora):

1. Trata-se de acao direta de inconstitucionalidade proposta pela Confederacao Nacional do Comercio – CNC em face da Lei no 11.295,de 09 de maio de 2006, que “Altera o art. 526 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, estabelecendo o direito de sindicalização para o empregado de entidade sindical”.

2. O Diploma legislativo impugnado possui o seguinte teor:

Art. 1º O art. 526 da Consolidacao das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, passa a vigorar acrescido do seguinte § 2o :

‘Art. 526 (...)

Paragrafo unico. (revogado)

......................................................................................

§ 2o Aplicam-se ao empregado de entidade sindical os preceitos das leis de protecao do trabalho e de previdencia social, inclusive o direito de associação em sindicato.’

Art. 2º E revogado o paragrafo unico do art. 526 da Consolidacao das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicacao.”

3. Sustenta-se a incompatibilidade com o texto constitucional (CF, art. 8o, II) do direito assegurado pela Lei no 11.295/2006 aos empregados de entidades sindicais, consistente da possibilidade dos trabalhadores em questao associarem-se entre si para a criação de entidades de representação sindical próprias.

4. Alega-se, para tanto, a incompatibilidade da figura dos sindicatos de empregados de entidades sindicais com o modelo constitucional de representacao sindical estruturado em torno das categorias profissionais e econômicas (CF, art. 8o, II). Segundo a entidade autora, os empregados de entidades sindicais nao configuram categoria profissional, tampouco os orgaos sindicais para os quais esses trabalhadores prestam servico qualificam-se como entidades integrantes de uma categoria econômica. Nessa linha, afirma nao ser possivel aos sindicatos de empregados de entidades sindicais o exercicio das prerrogativas inerentes a atividade sindical, como a negociação coletiva, pois essas entidades sindicais não teriam com quem celebrar acordos e convencoes coletivas de trabalho, uma vez que as entidades sindicais nao formam uma categoria economica, nem possuem representacao sindical.

5. Por fim, acena com interferencia do Estado na organizacao sindical, ao criar categoria profissional, em afronta ao caput do art. 8° da Constituicao Federal.

6. Postula o acolhimento do pedido e requer a declaracao de inconstitucionalidade da Lei no 11.295/2006.

7. Adotado o rito do art. 12 da Lei 9.868/93, o Presidente da Republica e o Presidente do Congresso Nacional, em suas informacoes oficiais, manifestam-se pela improcedencia do pedido. Sustentam que o diploma legislativo assegurou aos empregados de entidades sindicais o direito a liberdade de associacao sindical titularizado por todos os trabalhadores (CF, art. 8o, caput). Asseveram nao existir qualquer restricao constitucional a sindicalizacao de grupos nao identificados como categoria profissional ou economica, bastando a mera existencia de interesses comuns decorrentes das condicoes de trabalho, a exemplo das entidades sindicais representantes dos empregados de entidades sem fim lucrativos, beneficentes e filantropicas, aos quais tambem e conferido o direito a sindicalizacao.

8. O Advogado-Geral da Uniao pronunciou-se pelo nao conhecimento da acao, por ilegitimidade ativa ad causam da entidade requerente, e, quanto ao merito, pela improcedencia do pedido, em manifestacao assim ementada:

“Direito a associacao sindical. Lei na 11.295, de 09 de maio de 2006, que altera o artigo 526 da Consolidacao das Leis do Trabalho – CLT, reconhecendo aos empregados de entidades sindicais o direito de associacao em sindicato. Preliminares. Ilegitimidade ativa da autora. Ausencia de pertinencia tematica entre seus objetivos institucionais e o objeto da acao direta. Falta de interesse de agir. O direito a sindicalizacao decorre diretamente do Texto Constitucional. Merito. Ausencia de violacao ao artigo 8o, caput e incisos II e VI, da Constituicao da Republica. Nao subsiste, no ordenamento juridico vigente, a necessidade de paralelismo entre entidades sindicais. O principio da liberdade sindical assegura a associacao sindical por todas as categorias de trabalhadores. A norma hostilizada nao determina a criacao de sindicatos nem interfere no funcionamento de entidades sindicais existentes. Manifestacao pelo nao conhecimento da acao direta e, no merito, pela improcedencia do pedido formulado pela requerente.”

9. O Procurador-Geral da Republica manifesta-se, preliminarmente, pelo nao conhecimento da acao, lastreado na alegacao de ilegitimidade da requerente. No merito, opina pela improcedencia do pedido, em parecer assim ementado:

“CONSTITUCIONAL. ACAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 11.295/2006. DIREITO DE SINDICALIZACAO DOS EMPREGADOS DE ENTIDADES SINDICAIS. ART. 8o–CAPUT–II–IV DA CR/1988. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE ATIVA. AUSENCIA DE PERTINENCIA TEMATICA. NO MERITO. PRINCIPIO DA LIBERDADE FUNDAMENTAL DE ASSOCIACAO SINDICAL. PRINCIPIO DA IGUALDADE. CONSTITUCIONALIDADE. IMPROCEDENCIA.

1. A diretriz jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal impoe a comprovacao de pertinencia tematica na hipotese de ajuizamento de acao de controle abstrato de normas por confederacao sindical. Precedente.

2. Nao se verifica a congruencia entre os objetivos institucionais perseguidos pela autora – que consistem na representacao do comercio brasileiro – com o ato normativo ora impugnado – o qual consagra liberdade fundamental, aos empregados de agremiacoes sindicais, de associarem-se em sindicato representativo de sua propria categoria.

3. O proposito do Constituinte de 1988 foi garantir a liberdade sindical aos trabalhadores frente ao Poder Publico. A liberdade sindical do artigo 8o harmoniza-se com o principio constitucional insculpido no artigo 5o, caput, formando um bloco coeso em favor da garantia de liberdade em geral. Alias, o primado da liberdade norteia a Constituicao da Republica, funcionando como esteio dos direitos e garantias fundamentais, a exemplo da liberdade de associacao, preceituada especialmente no art. 5o, XVII, da Carta.

4. O direito fundamental a liberdade, para alem dos classicos efeitos verticais, tem eficacia horizontal nas relacoes juridico-privadas. Assim, alem de entendido como direito subjetivo publico destinado a inibir acoes do Poder Publico que possam ofender ou inibir a liberdade de associacao sindical, tem importante atuacao na esfera entre os sujeitos privados; trabalhadores, empregadores e associacoes sindicais. A liberdade de associacao sindical e importante instrumento para assegurar a isonomia nas relacoes de trabalho e peca fundamental para obter-se, coletivamente, condicoes contratuais e sociais mais favoraveis aos trabalhadores (art. 7o caput), para elevacao do status juridico da dignidade da pessoa humana; pedra angular da Constituicao da Republica.

5. In casu, o intento direcionado a excluir, de forma discriminatoria, os empregados de entidades sindicais do gozo da liberdade fundamental de associacao sindical viola principios fundamentais da Constituicao da Republica. A Lei 11.295/2006 harmoniza-se com a natureza jusfundamental da liberdade de associacao.

6. Com efeito, a liberdade de associacao sindical foi solidificada por diversas declaracoes internacionais de direitos humanos, em decorrencia de uma evolucao historica em prol da internacionalizacao dos principios do Estado Democratico de Direito e direcionado ao fortalecimento juridico e social dos trabalhadores.

7. O ordenamento constitucional deve caracterizar-se como uma unidade harmonica (principio da unidade normativa da Constituicao), o que tambem se reflete para todo o Ordenamento Juridico. As normas infraconstitucionais precisam manter compatibilidade formal e material com as normas constitucionais (principio da supremacia constitucional).

8. Nao se afigura interpretacao constitucionalmente adequada aquela que condiciona a liberdade de constituicao de sindicato a existencia de uma previa, especifica ou paralela categoria economica. Tanto assim que sindicalizacao dos servidores publicos foi expressamente garantida no art. 37-VI da Carta Magna.

9. A Constituicao Republica, ao dispor, no art. 8o–VI, sobre a obrigatoriedade de participacao sindical nas negociacoes coletivas, atentou para a importancia dos sindicatos profissionais (ou de categorias profissionais) para a dignificacao  dos trabalhadores, em harmonia com o principio da protecao social do trabalho e com o inciso XXVI do artigo 7o, o qual reconhece o valor juridico das convencoes e os acordos coletivos de trabalho, desde que elaborados com a imprescindivel intervencao dos respectivos sindicatos profissionais.

10. Portanto, e constitucionalmente adequada e mesmo necessaria a inovacao normativa trazida pela Lei 11.295/2006. ‒ Parecer pelo nao conhecimento da acao; no merito, pela improcedencia do pedido, declarando a constitucionalidade da lei atacada.”

10. Substituicao da relatoria, em 19.12.2011, nos termos do art. 38, VI, “a”, do RISTF, vieram-me conclusos os autos.

11. Admitido na qualidade de amicus curiae, o Sindicato dos Trabalhadores em Entidades Sindicais de Minas Gerais (SITESEMG) defende a constitucionalidade da Lei no 11.295/2006.

É o relatório.

 

 

08/06/2021 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.890 DISTRITO FEDERAL

V O T O

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Senhor Presidente, a controvérsia posta diz respeito à possibilidade, ou não, de os empregados de entidades sindicais associarem-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria.

1. Legitimidade ativa ad causam

Reconheço legitimidade ad causam à Confederação Nacional do Comércio – CNC, forte nos arts. 103, IX, da Constituição da República e 2º, IX, da Lei 9.868/1999.

Trata-se de entidade integrante da estrutura sindical brasileira em grau máximo – confederação –, representativa, em âmbito nacional, dos interesses corporativos das categorias econômicas do comércio, a abranger os segmentos de bens, serviços e turismo. Assim já decidiu esta Suprema Corte em diversos precedentes: ADI 2006-MC/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, Pleno, j. 01.7.1999; ADI 1075-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. em 17.6.1998, DJ 24.11.2006; ADI 1003-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. Em 01.8.1994; ADI 4171/DF, Red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, j. Em 20.5.2015; entre outros.

Presente, ainda, o vínculo de afinidade temática entre o conteúdo da lei impugnada e as finalidades institucionais da entidade autora, pois a modificação legislativa em questão impacta diretamente a atividade das entidades sindicais associadas à autora, criando em relação a estas, inclusive, o dever de recolhimento das contribuições sindicais dos seus empregados em favor dos respectivos sindicatos a que vierem se associar.

Nesse contexto, rejeito as preliminares suscitadas pelo Advogado- Geral da União e pelo Procurador-Geral da República.

Atendidos, ainda, os demais pressupostos de admissibilidade, conheço desta ação direta de inconstitucionalidade.

Passo ao exame do mérito.

2. Em sua redação original, o parágrafo único do art. 526 da CLT vedava aos empregados das entidades sindicais o exercício do direito de associação sindical:

“CLT

Art. 526 (…)

…...................................................................................................

Parágrafo único. Aplicam-se aos empregados dos sindicatos os preceitos das leis de proteção do trabalho e de previdência social, excetuado o direito de associação em sindicato.”

Essa restrição à associação sindical dos empregados de organizações sindicais – autorizada pelo ordenamento constitucional então vigente – apoiava-se na compreensão de faltar àquele grupo de trabalhadores as características próprias a uma categoria profissional, especialmente pela circunstância das entidades sindicais onde atuam não desempenharem atividades voltadas a finalidades econômicas. Além disso, apontavam-se obstáculos à realização de negociações coletivas por entidades sindicais com esse perfil, considerada a discrepância das condições de trabalho verificadas no âmbito de cada uma das unidades sindicais empregadoras.

Para solucionar essa dificuldade, a legislação adotou solução consistente em estender aos empregados das entidades sindicais as mesmas vantagens conquistadas pelas categorias profissionais por elas representadas em dissídios coletivos (ou, por analogia, em acordos e convenções coletivas):

Lei nº 4.725/65

Art. 10. Os ajustamentos de salário fixados em decisões da Justiça do Trabalho, aprovados em julgamento de dissídios coletivos ou em acôrdos homologados, serão aplicados, automàticamente, nas mesmas condições estabelecidas para os integrantes das categorias profissionais litigantes ou interessadas, aos empregados das próprias entidades suscitantes e suscitadas, observadas as peculiaridades que lhes sejam inerentes, ficando, desde logo, autorizado o reajustamento das respectivas verbas orçamentárias.”

Com o advento da Constituição Federal de 1988, no entanto, o direito de associação sindical passa a ser assegurado a todos os trabalhadores (CF, art. 8º, caput), inclusive aos servidores públicos (CF, art. 37, VI), com exceção apenas em relação aos militares (CF, art. 142, § 3º, IV).

Diante desse novo paradigma constitucional, a União edita a Lei nº 11.295/2006, objeto desta ação direta, por meio do qual é expressamente reconhecido o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais.

3. Sob a égide da Constituição Federal de 1988, a liberdade de associação sindical passa a ser contemplada amplamente, abrangendo os aspectos concernentes: (a) à liberdade de fundação de sindicato (CF, art. 8º, I); (b) à liberdade de adesão sindical (CF, art. 8º, V); (c) à liberdade de atuação sindical (CF, art. 8º, I); e (d) à liberdade de filiação sindical (CF, art. 8º, IV).

A liberdade de associação sindical, em sua dimensão coletiva, assegura aos trabalhadores em geral o direito à criação de entidades sindicais (CF, art. 8º, caput, I e II), bem assim, em sua dimensão individual, consagra a liberdade dos interessados em aderirem ou não ao sindicato ou desfiliar-se conforme sua vontade.

O direito de constituir entidades sindicais traduz vedação à estipulação de obstáculos pelo Poder Público à criação de organismos sindicais. Essa garantia legitima a fundação de entidades sindicais, sem prévia submissão a juízo discricionário ou político do Estado, mediante inscrição do ato constitutivo no registro civil de pessoas jurídicas (CC, art. 45) e posterior registro perante o órgão gestor do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (Súmula nº 677/STF) – atualmente, o registro de entidades sindicais cabe ao Ministério da Justiça e Segurança Pública) –, a quem incumbe a fiscalização do cumprimento  do postulado da unicidade sindical (CF, art. 8º, II).

Vale rememorar, no ponto, precedente no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade da criação da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos – CNTM, mesmo diante da previsão legal que vincula aquela categoria profissional à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria – CNTI (CLT, art. 577 e Anexo). Enfatizou-se, naquele julgamento, a consagração pela nova ordem constitucional do chamado livre impulso associativo (CF, art. 8º, II), de modo a encontrarem-se revogadas (não recepcionadas) todas as disposições legislativas veiculadoras de restrições à liberdade de associação sindical, com exceção, unicamente, daquelas voltadas à garantia da unicidade sindical na mesma base territorial:

“Mandado de Segurança.

Decreto n. 96.469, de 04.08.88 – Validade.

Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos – reconhecimento, como órgão sindical de grau superior, compatível com a constituição em vigor.

A lei já não pode mais obstar o surgimento de entidades sindicais de qualquer grau, senão quando ofensivo do princípio da unicidade, na mesma base territorial. A pretendida ilegalidade da criação da Confederação dos Metalúrgicos, porque não prevista no art. 535, paragrafos 1º e 2º da CLT, não pode subsistir em face da norma constitucional assecuratória de ampla liberdade de associação laboral, sujeita, exclusivamente, a unicidade de representação sindical.”

(MS 20.829/DF, Rel. Min. Célio Borja, Pleno, j. 03.5.1989)

A incompatibilidade com o texto constitucional (CF, art. 8º, I e II) de atos estatais e leis ordinárias criadoras de restrições em relação ao exercício da liberdade de associação sindical – ressalvada a observância do postulado da unicidade sindical – tem sido afirmada por esta Suprema Corte em diversos precedentes:

“(...) A única restrição à liberdade de organização sindical prevista na Constituição Federal é a não sobreposição de base territorial, art. 8º, II.

O órgão encarregado dos registros dos sindicatos, a que se refere o art. 8º, I, da CF, deve zelar para que não haja mais de uma organização sindical do mesmo grau na mesma base territorial, inc. II do mesmo artigo.”

(RE 146.822/DF, Rel. Min. Paulo Brossard, Pleno, j. 14.11.1993)

ORGANIZAÇÃO SINDICAL – LIBERDADE – BASE TERRITORIAL. Uma vez respeitada a unicidade quanto a certa base territorial, descabe impor exigências incompatíveis com a liberdade de associação. Óptica prevalecente, a uma só voz, considerado o voto do relator, lastreado no parecer da Procuradoria Geral da República.

(RMS 21.053/SP, Pleno, Red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, Pleno, j. 24.11.2010).

"O ato de fiscalização estatal se restringe à observância da norma constitucional no que diz respeito à vedação da sobreposição, na mesma base territorial, de organização sindical do mesmo grau. Interferência estatal na liberdade de organização sindical. Inexistência. O Poder Público, tendo em vista o preceito constitucional proibitivo, exerce mera fiscalização"

(RE 157.940/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, Segunda Turma, j. 03.11.1997).

4. O quadro delineado permite concluir que o ato legislativo impugnado, ao garantir o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais, nada mais fez do que explicitar uma liberdade conferida àquele grupo de trabalhadores pelo próprio texto constitucional (CF, art. 8º, I e II).

Na realidade, o parágrafo único do art. 526 da CLT (revogado pelo diploma legislativo questionado) não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, motivo pelo qual esse dispositivo normativo já estava tacitamente revogado antes mesmo da edição da Lei nº 11.295/2006, cujo conteúdo apenas promoveu, no ponto, a atualização do texto da Consolidação das Leis do Trabalho em face do novo paradigma constitucional vigente.

Ante o exposto, conheço da presente ação direta de inconstitucionalidade e, no mérito, julgo improcedente o pedido.

É como voto.

 

 

Extrato de Ata - 08/06/2021

PLENÁRIO

EXTRATO DE ATA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.890

PROCED. : DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. ROSA WEBER

REQTE.(S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO - CNC

ADV.(A/S) : LIDIANE DUARTE NOGUEIRA (89665/RJ)

INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA

PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL

AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ENTIDADES SINDICAIS DE MINAS GERAIS - SITESEMG

ADV.(A/S) : RENATO LUIZ PEREIRA (52084/MG)

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu da ação direta e, no mérito, julgou improcedente o pedido, nos termos do voto da Relatora. Plenário, Sessão Virtual de 28.5.2021 a 7.6.2021.

Composição: Ministros Luiz Fux (Presidente), Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Nunes Marques. Carmen Lilian Oliveira de Souza Assessora-Chefe do Plenário

Terceirização de atividades e equiparação remuneratória.

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