TST - INFORMATIVOS 2016 2016 141 - 2 a 15 de agosto

Data da publicação:

Tribunal Pleno

Maurício Godinho Delgado - TST



Dissídio coletivo de natureza jurídica. Dispensa em massa. Adequação da via eleita. Matéria suspensa para apreciação pelo Tribunal Pleno. A SDC decidiu, por maioria, nos termos do art. 77, II, do RITST, suspender a proclamação do resultado do julgamento e remeter ao Tribunal Pleno os autos do processo em que se discute se o dissídio coletivo de natureza jurídica é o meio adequado para analisar questões relativas à dispensa coletiva. Na espécie, enquanto os Ministros Mauricio Godinho Delgado, relator, e Kátia Arruda Magalhães inclinavam-se no sentido de que os casos de dispensa em massa podem ser dirimidos no âmbito do dissídio coletivo de natureza jurídica, os Ministros Ives Gandra da Silva Martins Filho, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Maria de Assis Calsing e Dora Maria da Costa negavam provimento ao recurso ordinário, mantendo a extinção do processo sem resolução do mérito, por inadequação da via eleita, nos termos do art. 220, II, do RITST. Vencidas, quanto à remessa dos autos ao Tribunal Pleno, as Ministras Maria Cristina Irigoyen Peduzzi e Dora Maria da Costa. (TST-RO-10782-38.2015.5.03.0000, SDC, rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, 16.04.2018).



Resumo do voto.

Dissídio coletivo de natureza jurídica. Dispensa em massa. Adequação da via eleita. Matéria suspensa para apreciação pelo Tribunal Pleno. A SDC decidiu, por maioria, nos termos do art. 77, II, do RITST, suspender a proclamação do resultado do julgamento e remeter ao Tribunal Pleno os autos do processo em que se discute se o dissídio coletivo de natureza jurídica é o meio adequado para analisar questões relativas à dispensa coletiva. Na espécie, enquanto os Ministros Mauricio Godinho Delgado, relator, e Kátia Arruda Magalhães inclinavam-se no sentido de que os casos de dispensa em massa podem ser dirimidos no âmbito do dissídio coletivo de natureza jurídica, os Ministros Ives Gandra da Silva Martins Filho, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Maria de Assis Calsing e Dora Maria da Costa negavam provimento ao recurso ordinário, mantendo a extinção do processo sem resolução do mérito, por inadequação da via eleita, nos termos do art. 220, II, do RITST. Vencidas, quanto à remessa dos autos ao Tribunal Pleno, as Ministras Maria Cristina Irigoyen Peduzzi e Dora Maria da Costa.

A C Ó R D Ã O

RECURSO ORDINÁRIO – DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA – INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA – DISPENSA EM MASSA

O Dissídio Coletivo não é a via adequada para tratar da dispensa coletiva de trabalhadores, já que não há pedido de interpretação de normas autônomas ou heterônomas específicas da categoria. Hipótese de Dissídio Individual para tutelar interesse concreto do trabalhador. Inteligência do art. 220, II, do RITST e da Orientação Jurisprudencial nº 7 da C. SDC.

Recurso Ordinário conhecido e desprovido. (TST-RO-10782-38.2015.5.03.0000, SDC, rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 16.04.2018).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n° TST-RO-10782-38.2015.5.03.0000, em que é Recorrente SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDUSTRIAS METALURGICAS MECANICAS E DE MATERIAL ELETRICO DE BELO HORIZONTE E CONTAGEM e Recorrido VALLOUREC TUBOS DO BRASIL S.A.

Adoto o relatório da Exma. Ministra Relatora, Kátia Magalhães Arruda:

"O Sindicato dos Metalúrgicos de Belo Horizonte, Contagem e Região instaurou "Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica", com pedido de liminar, em face da empresa Vallourec Tubos do Brasil S.A. (fls. 7/12). Narrou que se encontrava em processo de negociação com a empresa para a implantação de um banco de horas, a fim de evitar a dispensa em massa e preservar os empregos, quando foi surpreendido com a dispensa de trezentos trabalhadores, e a previsão de que outros tantos seriam, igualmente, dispensados. Afirmou que as dispensas, além de não terem sido precedidas de acordo com o sindicato, não tiveram qualquer critério (a exemplo de idade, tempo de serviço, situação familiar, condição de saúde, condição de reabilitação pelo INSS, proximidade de aposentadoria).

Disse que, ao tomar conhecimento do fato, buscou a empresa a fim de evitar novas dispensas, relembrando que estavam em plena negociação acerca do banco de horas, conforme reivindicado pelo próprio empregador. Entretanto, a empresa limitou-se a afirmar que se utilizara de regular direito potestativo de gerência e comando da atividade industrial.

Sustentou o sindicato que não poderia aceitar tal situação, pois havia vários mecanismos que poderiam ser utilizados a fim de evitar as dispensas, como o Plano de Proteção ao Emprego, aprovado pela MP n.º 680/2015, que permite a redução de jornada e de salário.

Descreveu todas as tentativas de resolver negocialmente a situação, inclusive mediante reuniões perante a Superintendência Regional do Ministério do Trabalho e Emprego, e também perante o Ministério Público do Trabalho, tudo em vão.

Afirmou que, diante disso, não teve outra  alternativa, senão ajuizar o dissídio coletivo. Requereu o deferimento de tutela de urgência, com concessão de liminar, em face do que consta no § 3° do art. 461 do CPC c/c o inciso I do art. 273 do CPC, para reintegrar os empregados dispensados pela ré, assegurando-lhes a fruição do plano de saúde, bem como para impedir novas demissões. Em juízo definitivo, postulou a confirmação da liminar, a declaração de nulidade das demissões praticadas pela empresa, com a consequente reintegração dos demitidos, com direito a salários e todas as demais vantagens de seus contratos de trabalho, notadamente o restabelecimento do plano de saúde, além de estipulação de "astreintes", caso a ré volte a incidir no mesmo comportamento narrado na petição inicial.

Por meio de decisão monocrática da Vice-Presidência do TRT da 3.ª Região, foi deferida liminarmente "a suspensão das futuras dispensas, sem prévia negociação com o Sindicato Suscitante, até o julgamento do presente Dissídio Coletivo pelo Órgão Colegiado, sob pena de aplicação de multa no importe de R$20.000,00 por empregado dispensado sem observância de tal comando" (fls. 138/139).

Contestação às fls. 151/166 e agravo regimental interposto pela empresa às fls. 222/233.

Contrarrazões apresentadas pelo sindicato ao agravo  regimental interposto pela empresa às fls. 278/282.

Decisão da Vice-Presidência do TRT de origem tornando sem efeito a liminar concedida, e declarando prejudicado o agravo regimental interposto pela empresa, à fl. 310.

O sindicato interpôs agravo regimental (fls. 317/323, e fls. 324/331).

Parecer do Ministério Público do Trabalho, às fls. 338/347, pelo "conhecimento do presente Dissídio Coletivo; rejeição das preliminares e procedência parcial do feito para - diante da prova dos autos - reconhecer o direito da empresa às dispensas efetivadas, assegurando, todavia, aos trabalhadores dispensados preferência para admissão. Sugerimos também seja assegurada a manutenção dos trabalhadores dispensados no Plano de Saúde da empresa, pelo período mínimo de doze meses contados da dispensa".

A revogação da liminar foi mantida, com determinação de distribuição do feito (fls. 349/350).

O Tribunal Regional do Trabalho, por meio do acórdão às fls. 357/363, extinguiu o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC de 2015, por inadequação da via eleita.

O Sindicato interpôs recurso ordinário, às fls. 368/380.

Contrarrazões às fls. 385/392, e também às fls. 399/406.

O recurso foi admitido, à fl. 394.

Os autos foram remetidos a esta Corte Superior, e encaminhados ao Ministério Público do Trabalho, que se manifestou pelo conhecimento e provimento do recurso ordinário. Ressaltou que as dispensas coletivas realizadas de maneira desregrada, sem a prévia negociação e sem o estabelecimento de critérios objetivos e justos, devem ser consideradas abusivas, devendo ser coibidas pelo Poder Judiciário. Ponderou que a decisão empresária de efetuar demissões não é razoável ou proporcional, se havia outras medidas de menor impacto social que poderiam ter sido adotadas. Lembrou que o ordenamento jurídico impõe limites éticos ao exercício do direito potestativo de dispensar os trabalhadores, em especial se tais dispensas forem coletivas, lembrando que em momento de grave crise econômica, com índices de desemprego elevados, os trabalhadores dispensados sofrerão inúmeros prejuízos e dificilmente conseguirão outro emprego.

O processo foi incluído em pauta.

Conforme certidão à fl. 422, a Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, decidiu, por maioria: "I) acompanhar divergência aberta pelo Exmo. Ministro Ives Gandra Martins Filho e negar provimento ao recurso ordinário, por inadequação da via processual eleita, com fundamento na Orientação Jurisprudencial nº 7 da SDC, por entender incabível o dissídio coletivo de natureza jurídica para apreciar matéria atinente a despedida em massa, quando se interpreta norma legal não específica de determinado setor. Ficaram vencidos os Exmos. Ministros Maurício Godinho Delgado, relator, e Kátia Magalhães Arruda, que votavam no sentido de dar provimento ao recurso ordinário para, afastada a inadequação da via processual eleita, devolver os autos ao TRT da 3ª Região, para prosseguir no julgamento do dissídio coletivo ajuizado pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Belo Horizonte e Contagem; II) suspender a proclamação do resultado do julgamento, haja vista que a maioria do Colegiado votou em sentido oposto à tese até então prevalecente, ainda que contrária a orientação jurisprudencial da SDC, e remeter o processo ao Tribunal Pleno para pronunciamento, ante a relevância da questão jurídica, nos termos do art. 77, II, do RITST, vencidas as Exmas. Ministras Maria Cristina Irigoyen Peduzzi e Dora Maria da Costa. O processo deverá ser remetido à Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos para emissão de parecer quanto à eventual revisão das Orientações Jurisprudenciais nºs 7 da SDC e 130 da SbDI- 2".

Parecer da Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos às fls. 453/460 que, por maioria, opinou pelo "reconhecimento do dissídio coletivo de natureza jurídica como meio hábil para solucionar controvérsia em torno da dispensa em massa de empregados".

O Exmo. Sr. Ministro João Oreste Dalazen juntou voto vencido (fls. 461/463).

Sorteada relatora no âmbito do Tribunal Pleno, os autos vieram-me conclusos. 

É o relatório."

V O T O

DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA – INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA – DISPENSA EM MASSA

O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, em acórdão de fls. 357/363, acolhendo a preliminar de inadequação da via eleita, extinguiu o processo sem resolução do mérito, nestes termos:

PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA

Erige a suscitada a preliminar em tela, ao fundamento de que o dissídio coletivo é impróprio para o fim pretendido pelo suscitante.

Examino.

Os dissídios coletivos de natureza jurídica possuem caráter declaratório e destinam-se à interpretação de normas coletivas preexistentes, ao passo que os dissídios de natureza econômica visam à criação de novas condições de trabalho e possuem natureza constitutiva, visto que resultarão na criação de novas normas.

No caso em apreço, o suscitante pretende a declaração de nulidade das demissões praticadas pela suscitada, com reintegração dos demitidos, em virtude da realização de demissões em massa pela empresa demandada (ID 7b6ce06), sem que tenha havido prévia negociação coletiva.

Pois bem. A dispensa coletiva pode ser conceituada como aquela realizada em virtude de um mesmo motivo para vários empregados. Não se confunde com a dispensa individual, em que para cada trabalhador há uma razão específica para a dispensa.

A causa da dispensa coletiva é comum a todos os empregados alcançados pelo ato empresarial, normalmente atrelada a uma necessidade de ordem econômica, estrutural ou tecnológica da empregadora.

Contudo, não há no ordenamento jurídico normas legais que regulamentem e disciplinem o referido instituto da despedida coletiva.

Como visto, os dissídios coletivos de natureza jurídica destinam-se a interpretar normas jurídicas preexistentes, o que não ocorre in casu, diante da completa ausência de regulamentação da matéria questionada. Além disso, a finalidade vislumbrada na petição inicial do suscitante é condenatória, o que também não se amolda à classificação jurídica dos dissídios coletivos.

Por outro lado, entendo que o caso dos autos também não se adequa ao dissídio coletivo de natureza econômica, o qual tem como finalidade última a criação de novos direitos aos empregados representados pelo sindicato profissional.

Com efeito, a pretensão formulada na presente demanda não é de interpretar norma preexistente, tampouco criar novas condições de trabalho, mas sim a declaração de nulidade da dispensa em massa ocorrida e a condenação da suscitada em obrigação de fazer, consubstanciada na reintegração dos empregados dispensados, o que revela a inadequação da via eleita.

Nesse sentido, já decidiu a Seção de Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho – TST:

 "RECURSO ORDINÁRIO. GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA. DISPENSA DE TRABALHADORES CONTRATADOS POR PRAZO DETERMINADO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. Dissídio coletivo de natureza jurídica ajuizado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região perante a General Motors do Brasil Ltda., em que, a pretexto de buscar a interpretação de instrumento coletivo, suscitou debate a respeito de suposta dispensa abusiva e em massa de número predeterminado de trabalhadores (seiscentos trabalhadores admitidos pela Suscitada no ano de 2008, por meio de contrato por prazo determinado), com a finalidade de obter, afinal, a anulação dos correspondentes atos de dispensa formalizados. Ação em que evidentemente se busca a tutela de interesse concreto de trabalhadores, facilmente identificáveis, com o propósito de reparação de lesão de direito individual consumada, a acarretar, conforme pretensões deduzidas, sentença de natureza desconstitutiva (nulidade dos atos de dispensa coletiva). Hipótese de dissídio individual, de competência da Vara do Trabalho, o qual comporta pretensões cumulativas de naturezas diversas, inclusive de antecipação de tutela de mérito (CPC, art. 461), ajuizável pelo sindicato profissional, na qualidade de substituto processual, e não de dissídio coletivo, tampouco de dissídio coletivo de natureza jurídica, de competência originária dos Tribunais Regionais do Trabalho, que se presta especificamente à interpretação e declaração do alcance de normas heterônomas, convencionais e regulamentares com regência para as categorias profissionais e econômicas, cuja sentença advinda é de natureza preponderantemente declaratória, não comportando, portanto, provimentos de natureza constitutiva/desconstitutiva ou condenatória. Inadequação da via processual eleita. Acórdão recorrido, em que, de todo modo, a pretexto de se conferir interpretação a normas insertas no instrumento coletivo em questão, não somente se proferiu provimento jurisdicional de natureza condenatória, incompatível com o dissídio coletivo de natureza jurídica ajuizado, como também se incorreu em julgamento extra petita. Recurso ordinário a que se dá provimento, a fim de se decretar a extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC. (RODC-9100-25.2009.5.15.0000, Relator Ministro: Fernando Eizo Ono; data de julgamento: 12/12/2011; Seção Especializada em Dissídios Coletivos; data de publicação: DEJT 19/12/2011)";

"RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. DISPENSA COLETIVA DE EMPREGADOS. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. REINTEGRAÇÃO DE EMPREGADOS DISPENSADOS. 1. A doutrina clássica distingue os dissídios obreiro-patronais em dois gêneros: dissídios individuais e dissídios coletivos. No dissídio individual há conflito de interesses concretos, tendo por escopo a aplicação de norma jurídica preexistente, ao passo que no dissídio coletivo está em jogo o interesse geral e abstrato de grupo ou categoria, OU com vistas à criação de condições de trabalho genericamente consideradas, com caráter normativo (dissídio coletivo de natureza econômica), OU com vistas à interpretação de norma jurídica preexistente (dissídio coletivo de natureza jurídica). O dissídio coletivo de natureza jurídica, portanto, não se destina ao acertamento de qualquer questão jurídica controvertida, mas exclusivamente revelar o alcance de norma preexistente. 2. Assim, o dissídio coletivo de natureza jurídica não é o remédio processual idôneo para a anulação do ato de dispensa coletiva, nem tampouco para se impor ao empregador a obrigação de reintegrar, com base em suposta violação de direito já consumada. Interesses concretos de pessoas determinadas, referentes a lesões a direitos já consumadas, não são passível de dissídio coletivo de natureza jurídica. Pedidos desse jaez comportam reclamação trabalhista típica dirigida à Vara do Trabalho territorialmente competente, sob a forma de dissídio individual plúrimo, ou do sindicato, na qualidade de substituto processual. 3. Não é preciosismo formal a prevalência do processo adequado para a tutela postulada porquanto questão estreitamente vinculada à competência funcional absoluta: em caso de dissídio coletivo de natureza jurídica, há competência funcional originária dos Tribunais do Trabalho, distintamente do dissídio individual em que a causa deve ingressar em Vara do Trabalho. Logo, permitir que um dissídio individual típico, como aqui, ingresse diretamente em Regional significa suplantar, "per saltum", um grau de jurisdição da Justiça do Trabalho. 4. Recurso Ordinário provido para extinguir o processo, sem resolução de mérito, em face da inadequação da via eleita. (RODC-2005800-86.2006.5.02.0000, Redator Ministro: João Oreste Dalazen; data de julgamento: 14/09/2009; Seção Especializada em Dissídios Coletivos; data de publicação: DEJT 29/10/2009)";

Isso posto, acolho a preliminar erigida e, na forma do art. 267, III, do Código de Processo Civil - CPC, extingo o processo, sem resolução do mérito, por inadequação da via eleita. (fls. 359/361 – destaquei)

No Recurso Ordinário, o Sindicato Suscitante afirmou não postular provimento condenatório ou a reintegração de trabalhadores demitidos, mas apenas a declaração de nulidade das dispensas. Alegou que a C. SDC reconhece a adequação da via eleita. Asseverou a importância social do litígio, que seria incompatível com o excesso de formalismo na aplicação das normas processuais.

A C. SDC, por maioria, decidiu suspender a proclamação do resultado do julgamento, pela prevalência do entendimento de inadequação da via eleita, determinando a remessa do processo ao Tribunal Pleno para pronunciamento nos termos do art. 77, II, do Regimento Interno do TST - RITST (certidão à fl. 442).

Desse modo, a única matéria a ser decidida pelo Tribunal Pleno refere-se à adequação de Dissídio Coletivo para discutir a dispensa coletiva de trabalhadores.

A transcrição dos pedidos da petição inicial indica que o Suscitante ajuizou o Dissídio para o reconhecimento da nulidade das dispensas e a condenação da Suscitada a reintegrar os trabalhadores demitidos, com pagamento de salários e reflexos:

FACE O EXPOSTO,

após deferida a TUTELA JURISDICIONAL DE URGÊNCIA, mediante LIMINAR, requer a notificação da Ré para vir responder aos termos deste dissídio coletivo, podendo apresentar proposta de solução para o impasse ou defesa, querendo, devendo, ao final, ser julgada procedente a pretensão ora deduzida para, confirmando a liminar, declarar nulas as demissões praticadas pela Ré, com a conseqüente reintegração dos demitidos, com direito a salários e todas as demais vantagens de seus contratos de trabalho, sejam legais, convencionais ou consuetudinárias, notadamente o restabelecimento do plano de saúde, além de firmar preceito cominatório, com estipulação de "astreintes", caso volte a incidir no mesmo comportamento. (fl. 12 – destaquei)

A análise do ajuizamento de Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica para versar sobre dispensa coletiva deve ter como base três aspectos: (i) normativo, (ii) doutrinário e (iii) jurisprudencial.

Quanto ao aspecto normativo, o art. 220, II, do RITST estabelece expressamente o objeto de Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica, que é a interpretação de:

a) cláusulas de sentenças normativas;

b) cláusulas de instrumentos autônomos;

c) disposições legais particulares de categoria profissional ou econômica;

d) atos normativos.

Portanto, não há menção à dispensa em massa.

Pelo RITST, o objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica é a interpretação de uma norma.

Antes da Lei nº 13.467/2017, não havia qualquer regra jurídica específica sobre a necessidade de negociação coletiva prévia à dispensa coletiva, o que indica que a matéria não é própria de Dissídio Coletivo.

Esta conclusão é reforçada pelo advento da referida lei, que afirmou a desnecessidade de autorização prévia de sindicato ou de instrumento coletivo autônomo para a efetivação da dispensa coletiva. Transcrevo o art. 477-A da CLT:

Art. 477-A.  As dispensas imotivadas individuais, plúrimas ou coletivas equiparam-se para todos os fins, não havendo necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação.

O argumento deve ser considerado, já que o entendimento adotado por esta Corte Superior será aplicado em casos futuros.

Em relação ao segundo aspecto, a doutrina majoritária entende que o objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica restringe-se à interpretação de normas autônomas ou heterônomas específicas da categoria.

Nesse sentido, cito os seguintes autores: Carlos Henrique Bezerra Leite (Manual de Processo do Trabalho, 2ª edição, São Paulo: Atlas, 2015, p. 433), Gustavo Filipe Barbosa Garcia (Curso de Direito do Trabalho, 11ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 1403), Ministro Pedro Paulo Teixeira Manus (Direito do Trabalho, 16ª edição, São Paulo: Atlas, 2015, p. 231), Desembargador Sergio Pinto Martins (Direito Processual do Trabalho, 38ª edição, São Paulo: Saraiva, 2016, p. 917) e Amador Paes de Almeida (Curso Prático de Processo do Trabalho, 24ª edição, São Paulo: Saraiva, p. 459).

A posição é muito influenciada pela evolução das decisões desta Corte Superior.

A Orientação Jurisprudencial nº 7 da C. SDC assevera que o Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica não é a via adequada para obter interpretação de alcance genérico, pois seu objeto se limita à interpretação de norma legal ou coletiva específica de certa categoria:

ORIENTAÇÃO JURUSPRUDENCIAL Nº 7 - DISSÍDIO COLETIVO. NATUREZA JURÍDICA. INTERPRETAÇÃO DE NORMA DE CARÁTER GENÉRICO. INVIABILIDADE.

Não se presta o dissídio coletivo de natureza jurídica à interpretação de normas de caráter genérico, a teor do disposto no art. 313, II, do RITST.

Em outras palavras, o objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica restringe-se à interpretação de normas autônomas ou heterônomas específicas da categoria.

A título exemplificativo da doutrina nacional, cito as lições do Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho e do Professor Raimundo Simão de Melo:

Tal orientação restou cristalizada no art. 216, II, do Regimento Interno do TST (ora revogado) [atual art. 220, II, do RITST], que apenas admite o dissídio coletivo interpretativo de lei quando esta for particular da categoria, e na Orientação Jurisprudencial n. 7 da SDC, que veda a interpretação de norma de caráter genérico em dissídio coletivo de natureza jurídica. (MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva, Processo Coletivo do Trabalho, 4. ed., São Paulo: LTr, 2009, p. 71 - destaquei)

O dissídio coletivo jurídico ou de direito destina-se à busca de interpretação ou declaração do alcance de uma norma jurídica existente, que pode ser uma lei, uma convenção coletiva, um acordo coletivo, um contrato coletivo, uma sentença normativa, um laudo arbitral ou um ato normativo qualquer. Quando se tratar de uma lei formalmente considerada, esta, para legitimar o ajuizamento do dissídio coletivo jurídico, precisa ser de aplicação particular de determinada categoria profissional, o que é um tanto quanto raro, v. g., a lei dos portuários. (...) (MELO, Raimundo Simão de, Processo Coletivo do Trabalho, 2. ed., São Paulo: LTr, 2011, p. 70-71 - destaquei)

Em interpretação histórica da Orientação Jurisprudencial nº 7 da C. SDC, transcrevo trecho do voto da C. SDC no RODC 315233/1996, de relatoria do Exmo. Ministro Moacyr Tesch, DJ 7/8/1998, um dos precedentes que deram origem ao entendimento jurisprudencial:

O Poder Normativo consagrado à Justiça do Trabalho não permite seja declarada a eficácia ou ineficácia de lei a esta ou aquela categoria profissional ou econômica, ficando essa tarefa a cargo e competência dos juízes e tribunais quando invocada a tutela jurisdicional do estado por meio do devido processo legal, seja em reclamação individual ou plúrima, em mandado de segurança, em medida cautelar ou em ação direta de inconstitucionalidade. (destaquei)

Não havendo norma autônoma ou heterônoma específica da categoria a ser interpretada, não há falar em Dissídio Coletivo Jurídico para analisar dispensa coletiva.

Saliente-se que todos os dispositivos normativos mencionados pelo Suscitante na petição inicial possuem caráter genérico:

Esclarece o Autor que estas dispensas foram e estão sendo procedidas sem prévia negociação com o Sindicato e sem qualquer critério, isto é, sem levar em conta a idade do empregado, o tempo de serviço, a situação familiar, a condição de saúde e de reabilitação pelo INSS e a proximidade de aposentadoria, ferindo os princípios do valor social do trabalho e do emprego, da dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade além de contrariar os dispositivos constitucionais e legais que vedam a dispensa arbitrária (art. 1º, III e VI, art. 5º, XXIII, art. 6º, 7º, I, e art. 170, III e VIII, todos da CRF/88 e art. 187 do CCB/02) e exigem a participação obrigatória do sindicato na negociação coletiva (art. 8º, III e VI, da CRF/88). (fl. 8 – destaquei)

Especificamente quanto ao aspecto jurisprudencial, os julgados mais recentes da C. SDC autorizam a análise da dispensa coletiva em Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica.

Entretanto, em 2 (dois) julgados, utilizados como base pela Corte de origem (fls. 360/361), a referida Seção Especializada extinguiu o processo sem resolução do mérito por inadequação da via eleita:

1) RODC-2005800-86.2006.5.02.0000, Relator Ministro João Oreste Dalazen, DEJT 29/10/2009;

2) RODC-9100-25.2009.5.15.0000, Relator Ministro Fernando Eizo Ono, DEJT 19/12/2011.

Eis os principais fundamentos das referidas decisões:

1) a anulação das dispensas relaciona-se à tutela de interesse concreto de trabalhadores;

2) o objetivo do Dissídio era reparar lesão de direito individual;

3) a sentença teria natureza desconstitutiva (nulidade dos atos de dispensa coletiva);

4) a hipótese é de dissídio individual plúrimo, de competência da Vara do Trabalho;

5) não se trata de Dissídio Coletivo;

6) Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica se restringe à interpretação de norma preexistente.

Ante o exposto, mantendo a extinção do processo sem resolução do mérito por inadequação do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica em matéria de dispensa coletiva, nego provimento ao Recurso Ordinário.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, vencidos os Exmos. Ministros Kátia Magalhães Arruda, Relatora, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta, Delaíde Miranda Arantes, Hugo Carlos Scheuermann, Cláudio Mascarenhas Brandão, Maria Helena Mallmann, Lelio Bentes Corrêa, Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Walmir Oliveira da Costa e Maurício Godinho Delgado, negar provimento ao Recurso Ordinário, mantendo a extinção do processo sem resolução do mérito por inadequação do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica em matéria de dispensa coletiva.

Brasília, 18 de dezembro de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Maria Cristina Irigoyen Peduzzi

Ministra Redatora Designada

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