Data da publicação:
Acordão - TST
Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira - TST
ATIVIDADE INSALUBRE. INTERVALO DO ART. 384 DA CLT - CONSTITUCIONALIDADE. CONTRATO DE TRABALHO EM CURSO QUANDO DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. IRRETROATIVIDADE.
RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. DIREITO INTERTEMPORAL. HORAS EXTRAS. REGIME DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA - ATIVIDADE INSALUBRE. INTERVALO DO ART. 384 DA CLT - CONSTITUCIONALIDADE. CONTRATO DE TRABALHO EM CURSO QUANDO DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. IRRETROATIVIDADE. A Lei nº 13.467/2017 não retroage para alcançar fatos ocorridos antes de sua vigência, nem seus efeitos futuros. Caso fosse intenção do legislador a aplicação das normas materiais da Reforma Trabalhista aos contratos em curso, o que implica retroatividade mínima, haveria norma expressa em tal sentido. A anomia quanto à vigência da Lei para esses contratos, entretanto, inviabiliza a aplicação imediata pretendida. Recurso de revista não conhecido. (TST-RR-0020577-22.2020.5.04.0661, Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 01/10/2021).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de RR-0020577-22.2020.5.04.0661, em que é Recorrente ASSOCIAÇÃO HOSPITALAR BENEFICENTE SÃO VICENTE DE PAULO e é Recorrida MARLI DUARTE DOS SANTOS.
O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, pelo acórdão de fls. 365/377, deu parcial provimento ao recurso ordinário da autora e negou provimento ao apelo adesivo da ré.
Inconformada, a reclamada interpôs recurso de revista, com base no art. 896, “a” e “c”, da CLT (fls. 380/389).
O apelo foi admitido por meio do despacho de fls. 416/420.
Sem contrarrazões.
Os autos não foram encaminhados ao d. Ministério Público do Trabalho (RI/TST, art. 95).
É o relatório.
V O T O
Tempestivo o apelo (fl. 427), regular a representação (fl. 89), recolhidas as custas processuais (fls. 392/393) e efetuado o depósito recursal (fls. 390/391), estão preenchidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade.
1 - DIREITO INTERTEMPORAL. HORAS EXTRAS. REGIME DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA - ATIVIDADE INSALUBRE. INTERVALO DO ART. 384 DA CLT - CONSTITUCIONALIDADE. CONTRATO DE TRABALHO EM CURSO QUANDO DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. IRRETROATIVIDADE.
1.1 – CONHECIMENTO.
Atendendo ao disposto no art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a ré transcreveu os seguintes trechos do acórdão regional (fls. 385/386):
“A relação contratual já constituída no advento da Reforma Trabalhista não é alterada pelas inovações legislativas materiais supervenientes que causam prejuízo ao empregado, sob pena de alteração contratual lesiva e violação ao art. 468 da CLT. É entendimento desta Turma, em sua maioria, que as alterações legais materiais, quando lesivas, alcançam apenas os contratos firmados a partir da vigência da nova lei, mantendo-se os contratos anteriormente firmados regidos pela lei anterior.
Portanto, não se aplica aos autos o disposto no art. 611-A, XIII, da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017, que dispõe que a norma coletiva pode autorizar a adoção de regimes compensatórios para atividades insalubres, independentemente da autorização de autoridade competente em matéria de higiene e segurança do trabalho, porque o contrato de trabalho do reclamante teve início em período anterior à sua vigência.” (Voto do relator Desembargador Manuel Cid Jardon).
“No entanto, ressalvado o meu posicionamento a respeito, passo a acompanhar o entendimento majoritário desta Turma julgadora, de modo a manter a estabilidade da jurisprudência, segundo o qual as alterações promovidas pela Lei 13.467/2017 atingem somente os contratos de trabalho celebrados a partir de sua vigência. Logo, como o contrato existente entre as partes vigeu desde data anterior, é devido intervalo do art. 384 da CLT durante todo o período contratual, uma vez que sua supressão representaria alteração contratual lesiva, o que é vedado pelo art. 468 da CLT.” (Voto da Desembargadora Angela Rosi Almeida Chapper).
Insurge-se a reclamada, sustentando a aplicação imediata das alterações trazidas pela Lei nº 13.467/2017, especialmente no que concerne aos arts. 384 (revogado) e 611-A, XIII (incluído), da CLT. Ressalta que a referida lei “garante a plena validade da prorrogação de jornada de trabalho em ambiente insalubre quando previsto em instrumento coletivo de trabalho”, bem com revogou a regra prevista no art. 384 da CLT, razão pela qual se revela indevida a condenação ao pagamento das horas extras pretendidas pela reclamante. Aponta violação dos arts. 5º, II, e 7º, XIII e XXVI, da Constituição Federal e 912 da CLT. Colaciona arestos ao dissenso.
À análise.
A teor do art. 896, § 9º, da CLT, na decisão apreciada sob o rito sumaríssimo, o recurso de revista está limitado à contrariedade a súmula do TST ou súmula vinculante do STF e à ofensa à Constituição Federal.
Trata-se de questão de direito intertemporal, focada na aplicação imediata do art. 611-A, XIII, da CLT e no direito às horas extras decorrentes da não concessão do intervalo da mulher, ante as alterações introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, em relação aos contratos celebrados sob a norma anterior e que se encontravam em curso quando de sua entrada em vigor, em 11.11.2017.
O art. 611-A, XIII, da CLT, que autoriza a “prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho”, quando há previsão em norma coletiva, bem como o revogado art. 384 da norma celetista, que previa a concessão à empregada de um intervalo de quinze minutos, antes da jornada extraordinária, consagram normas de direito material, razão pela qual não se aplica à questão o art. 1º da Instrução Normativa nº 41/2018 desta Corte.
Sendo o contrato de trabalho pacto de trato sucessivo, emerge a discussão se poderia a Lei nova alcançar seus efeitos futuros, o que implica o exame do direito adquirido, que não se confunde com direito consumado, e da aplicação imediata da norma.
Surgem, então, as seguintes correntes:
1)A primeira, pela inexistência de direito adquirido, determinando a aplicação imediata de todas as normas de direito material, independentemente da data de celebração do contrato, ressalvados os direitos previstos em cláusulas contratuais previamente estabelecidas, pela aplicação do princípio da condição mais benéfica (lembrando que o art. 2º da MP 808/2017 perdeu eficácia);
2)A segunda, que entende aplicáveis apenas as regras da Reforma que não colidam com os princípios da proteção e do não retrocesso social; e
3)A terceira, segundo a qual as novas regras são aplicáveis apenas aos contratos celebrados a partir de sua entrada em vigor, resguardando o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.
O direito intertemporal regula o choque entre a temporalidade estática (norma jurídica) e a temporalidade dinâmica (plano ontológico).
Segundo a máxima latina, tempus regit actum, os atos jurídicos são regidos pela lei da época em que ocorrem.
Em nosso ordenamento, a Constituição consagra a irretroatividade como direito fundamental e cláusula pétrea, no art. 5º, XXXVI, quando preceitua que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Já o art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro dispõe que “a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
Nesse ponto, conforme ensina Paulo Nader, o legislador brasileiro “[...] recorreu à teoria dos direitos adquiridos, de Gabba, e à do efeito imediato, de Paul Roubier” (Curso de direito civil. Parte geral, v. 1, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 160).
Não se pode olvidar que estamos no campo dos contratos, em que a concepção de direito adquirido e de ato jurídico perfeito é ainda mais arraigada. O próprio Roubier os excepciona da aplicação imediata da norma.
A regra é a irretroatividade da lei e a retroatividade, a exceção.
Isso se dá em respeito ao princípio da segurança jurídica e da estabilidade do Direito.
A doutrina distingue a retroatividade das leis em máxima (quando atinge fatos consumados), média (quando atinge os chamados “efeitos pendentes”) e mínima (quando atinge efeitos futuros de fatos pretéritos).
Caso fosse intenção do legislador a aplicação das normas da Reforma Trabalhista aos contratos em curso, o que implica retroatividade mínima, haveria norma expressa nesse sentido. A anomia quanto à vigência da Lei para esses contratos, entretanto, inviabiliza a aplicação imediata. Note-se que não se está a falar de norma constitucional, mas de norma infraconstitucional.
Quanto ao tema, observe-se o que já decidiu o STF:
“Agravo regimental. - As normas constitucionais federais é que, por terem aplicação imediata, alcançam os efeitos futuros de fatos passados (retroatividade mínima), e se expressamente o declararem podem alcançar até fatos consumados no passado (retroatividades média e máxima). Não assim, porém, as normas constitucionais estaduais que estão sujeitas à vedação do artigo 5º, XXXVI, da Carta Magna Federal, inclusive a concernente à retroatividade mínima que ocorre com a aplicação imediata delas. Agravo a que se nega provimento.” (AI 258.337 AgR, Ac. 1ª Turma, Relator Ministro Moreira Alves, in DJ 4.8.2000.)
Essa regra é antiquíssima e remonta mesmo ao Código de Justiniano, que já proclamava, em seu Livro I, tít. XIV, fr. 7: “O certo é darem as leis regra aos negócios futuros, não retrocederem a fatos passados, a não ser que tratem nominalmente de negócios de tempo anterior ainda em curso”. Antes dela, a Constituição de Theodosius I, do ano de 393, estabeleceu regra similar, no sentido de que a aplicação imediata a negócios pendentes depende de lei.
Lecionam Antônio Umberto de Souza Júnior, Fabiano Coelho de Souza, Ney Maranhão e Platon Teixeira de Azevedo Neto:
“Fazendo um estudo comparativo de dispositivos acrescidos à CLT, introdutórios de alterações potencialmente lesivas ao trabalhador, constata-se que o legislador, quando pretendeu a interferência da nova norma sobre os contratos em curso à data de sua vigência, tratou explicitamente procedimento de transição para possibilitar o fenômeno da eficácia imediata plena da lei nova sobre as relações preestabelecidas. É o que ocorreu nos contratos a tempo parcial (CLT, art. 58-A, § 2º), quando da regulamentação do instituto pela Med. Prov. Nº 2.164/2001. Também foi este o caminho trilhado pela recente Lei n 13.429/2017, que trouxe profundas mudanças nos contratos de prestação de serviços (terceirização) e de trabalho temporário, oportunidade em que foi editada norma expressa no sentido de que ‘os contratos em vigência, se as partes assim acordarem, poderão ser adequados aos termos dessa lei’ (art. 19-C). Ou seja, quando o legislador vislumbrou a aplicabilidade da norma legal nova, mesmo potencialmente prejudicial (redução do tempo de trabalho e redução proporcional do salário), nas relações de emprego velhas, teve o cuidado de engendrar um mecanismo de adaptação contratual para assimilação da novidade.
Assim, o silêncio legislativo eloquente em matéria de direito intertemporal autoriza a ilação de que, como regra, os dispositivos de direito material que criem novas figuras, eliminem direitos ou criem restrições desfavoráveis aos trabalhadores somente valham para as relações de emprego inauguradas no novo ambiente normativo da Lei nº 13.467/2017.” (Reforma Trabalhista – análise comparativa e crítica da Lei nº 13.467/2017. 2. ed. São Paulo: Rideel, 2018, p. 600).
Quanto ao tema, afigura-se-nos segura a lição de Caio Mário da Silva Pereira, citando Henri de Page:
“Os contratos nascidos sob o império da lei antiga permanecem a ela submetidos, mesmo quando os seus efeitos se desenvolvem sob o domínio da lei nova. O que a inspira é a necessidade da segurança em matéria contratual. No conflito dos dois interesses, o do progresso, que comanda a aplicação imediata da lei nova, e o da estabilidade do contrato, que conserva aplicável a lei antiga, tanto no que concerne às condições de formação, de validade e de prova, quanto no que alude aos efeitos dos contratos celebrados na vigência da lei anterior, preleva este sobre aquele.” (Atual. Maria Celina Bodin de Moraes. Instituições de direito civil, vol. I, 31. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, pp. 130-131).
O contrato firmado entre empregado e empregador, e que é fato aquisitivo de todos os direitos dele decorrentes, já se aperfeiçoou no passado, razão pela qual não há que se pensar em expectativa de direito, tão somente porque ainda gera efeitos continuados.
Nesse contexto, não há dúvida quanto à incidência da lei anterior (irretroatividade) aos contratos já extintos quando da vigência da Lei nº 13.467/2017. Em relação às normas da Reforma, o mesmo se dá quanto aos contratos em curso. São inaplicáveis.
Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. [...]. 2. DIREITO INTERTEMPORAL - CONTRATO DE TRABALHO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 - IRRETROATIVIDADE. Segundo a máxima latina, ‘tempus regit actum’, os atos jurídicos são regidos pela lei da época em que ocorrem. Quanto ao tema, os arts. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e 6º da LINDB consagram o princípio da retroatividade restrita das Leis, recorrendo à teoria subjetiva de Gabba, quanto ao direito adquirido, e à teoria objetiva de Roubier, quanto à incidência imediata da lei nova sobre os fatos pendentes. Para que a Lei retroaja, no direito brasileiro, há de haver disposição expressa nesse sentido. Na hipótese, a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) institui, apenas, a sua entrada ‘em vigor após decorridos cento e vinte dias de sua publicação oficial’ (art. 6º). Partindo-se dessas premissas, não como se entender pela aplicabilidade imediata das regras de direito material previstas na Lei nº 13.467/2017. [...]. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (AIRR-12261-94.2016.5.15.0130, Ac. 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, in DEJT 4.12.2020).
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DAS LEIS Nos 13.015/2014, 13.105/2015 E 13.467/2017 - DESCABIMENTO. [...]. 4. INTERVALO INTRAJORNADA. SÚMULA 437/TST. APLICABILIDADE. INOVAÇÕES INTRODUZIDAS NA CLT PELA LEI Nº 13.467/2017. IRRETROATIVIDADE. A Lei nº 13.467/2017 não retroage para alcançar fatos ocorridos antes de sua vigência, nem seus efeitos futuros. Caso fosse intenção do legislador a aplicação das normas materiais da Reforma Trabalhista aos contratos em curso, o que implica retroatividade mínima, haveria norma expressa nesse sentido. A anomia quanto à vigência da lei para esses contratos, entretanto, inviabiliza a aplicação imediata pretendida. Na hipótese, a concessão parcial do intervalo implica o pagamento do período total correspondente e a natureza salarial da parcela refletem a inteligência da Súmula 437, I e II/TST. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (AIRR-1000987-10.2016.5.02.0444, Ac. 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, in DEJT 4.10.2019).
“AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. HORAS IN ITINERE E INTERVALO DO ARTIGO 384 DA CLT. VERBAS DE NATUREZA SALARIAL. INAPLICABILIDADE DA LEI 13.467/2017 (REFORMA TRABALHISTA) AOS CONTRATOS DE TRABALHO FIRMADOS ANTES DA SUA VIGÊNCIA E AINDA EM CURSO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS. Impõe-se confirmar a decisão monocrática proferida pelo Ministro Relator, no aspecto, tendo em vista não se constatar haver equívoco na decisão. Agravo conhecido e não provido.” (Ag-RRAg-1627-03.2018.5.12.0017, Ac. 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, in DEJT 22.3.2021).
“[...]. II- RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. HORAS EXTRAS DECORRENTES DA INOBSERVÂNCIA DO INTERVALO DO ART. 384 DA CLT. PRETENSÃO DE LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO PERÍODO CONTRATUAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. DIREITO INTERTEMPORAL 1 - Há transcendência jurídica quando se constata em exame preliminar a controvérsia sobre questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista. 2 - Cinge-se a controvérsia acerca da incidência do art.384 da CLT, revogado pela Lei nº 13.467/2017, ao contrato de trabalho iniciado antes da vigência da referida lei e que permaneceu em vigor até 16/08/2018. 3 - A questão já foi apreciada por essa Turma, no julgamento do RR-1556-35.2017.5.12.0017, de minha relatoria, com acórdão publicado no DEJT em 21/02/2020: ‘Tratando-se de parcela salarial, devida se configuradas determinadas circunstâncias, a alteração legislativa que suprimiu o direito à parcela não alcança os contratos daqueles trabalhadores que já possuíam o direito a seu pagamento, enquanto aquelas circunstâncias não forem alteradas. Do contrário, estaríamos albergando a redução da remuneração do trabalhador, embora não alterada a situação de fato que a amparava, o que é vedado pelo art. 7º, VI, da Constituição Federa’. 4 - Sob a ótica do direito intertemporal, aplicam-se as normas de Direito Material do Trabalho do tempo dos fatos, em respeito ao princípio da irretroatividade da lei ‘tempus regit actum’ (art. 5º, XXXVI, da CF/88). 5 - E, quando contrato já se encontra em curso quando da inovação legislativa, tratando-se de parcela salarial, a alteração legislativa que suprimiu ou alterou o direito à parcela não alcança os contratos daqueles trabalhadores que já possuíam o direito a seu pagamento, enquanto aquelas circunstâncias não forem alteradas, sob pena de se chancelar a redução da remuneração do trabalhador e ferir direito adquirido. 6 - Recurso de revista de que não se conhece.” (Ag-ARR-1000777-04.2018.5.02.0374, Ac. 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, in DEJT 9.4.2021).
“[...]. RECURSO DE REVISTA. LEI 13.467/2017. HORAS IN ITINERE. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. EMPREGADO ADMITIDO ANTES DA REFORMA TRABALHISTA. CONTRATO DE TRABALHO VIGENTE. Debate-se acerca dos contratos de trabalho firmados antes de 11/11/2017 e que se encontram em vigor para efeito de aplicação da Lei 13.467/2017. O Tribunal Regional rejeitou a pretensão da reclamada que visava limitar o direito à entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 por entender que a supressão de horas in itinere não alcança os contratos de trabalho em curso. Decidiu, portanto, que, enquanto houver fornecimento de transporte pelo empregador, o empregado admitido antes da vigência da referida lei tem direito às horas in itinere, não havendo que se limitar a condenação até 11/11/2017. São duas as razões pelas quais deve prevalecer a compreensão - adotada pelo Regional - de ser inadmissível restringir o direito a horas in itinere ao período anterior à Lei n. 13.467/2017: a) a lei não pode incidir sobre relações contratuais em curso, sob pena de violar ato jurídico perfeito, e salvo quando sobrevém norma mais favorável (ao titular de direito fundamental) que comporte, por isso, aplicação imediata (art. 5º, §1º, da Constituição); b) a parcela salarial, porque integra o núcleo de irredutibilidade na contraprestação pecuniária devida em razão do trabalho, não pode ter a sua natureza retributiva modificada por lei, sob pena de violar-se direito adquirido. É de se manter a decisão do Tribunal Regional que consignou a tese de que a supressão de horas in itinere não alcança os contratos de trabalho em curso. Agravo de instrumento não provido.” (AIRR-1102-52.2016.5.22.0101, Ac. 6ª Turma, Redator Ministro Augusto César Leite de Carvalho, in DEJT 5.6.2020).
Rememore-se que este eg. Tribunal Superior, quando da alteração da base de cálculo do adicional de periculosidade pela Lei nº 12.740/2012, já aplicou esse mesmo entendimento, delimitando na Súmula 191, item III, do TST, que “a alteração da base de cálculo do adicional de periculosidade do eletricitário promovida pela Lei nº 12.740/2012 atinge somente contrato de trabalho firmado a partir de sua vigência, de modo que, nesse caso, o cálculo será realizado exclusivamente sobre o salário básico, conforme determina o § 1º do art. 193 da CLT” (destaquei).
Na hipótese vertente, extrai-se do acórdão regional que o pacto laboral perdurou de 19.4.1999 a 25.11.2019 e que o trabalho se dava em condições insalubres sem autorização do Ministério do Trabalho para a prorrogação da jornada.
Ainda, o Tribunal Regional registrou a existência de prorrogação da jornada diária da trabalhadora, sem a concessão do intervalo prévio de 15 minutos.
Evidenciado, portanto, o descumprimento dos arts. 60 e 384 da CLT, aplicáveis ao contrato de trabalho da autora, diante do princípio da irretroatividade, devidas são as horas extraordinárias cominadas pelo eg. TRT.
Nesse contexto, impossível vislumbrar-se afronta aos preceitos da Constituição evocados.
À vista do exposto, não conheço do recurso de revista.
Por tudo quanto dito, não cabe exame de transcendência.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista.
Brasília, 1º de setembro de 2021.
ALBERTO LUIZ BRESCIANI DE FONTAN PEREIRA
Ministro Relator
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