TST - INFORMATIVOS 2018 0186 - 29 de outubro a 09 de novembro de 2018

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Márcio Eurico Vitral Amaro - TST



04 -EMBARGOS. CONTRATO DE TRABALHO EXTINTO EM 2011. HORAS "IN ITINERE". LOCAL DE TRABALHO NÃO SERVIDO POR TRANSPORTE PÚBLICO REGULAR. VEÍCULO DA EMPRESA À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADO. "DISTINGUISHING"



Resumo do voto

Horas in itinere. Local de trabalho não servido por transporte público regular. Automóvel fornecido pela empresa para que o empregado realize seu próprio deslocamento. Situação diversa da prevista no item I da Súmula nº 90 do TST. Pagamento indevido. Na hipótese em que o empregado, exercente do cargo de supervisor, tem à sua disposição veículo exclusivo, fornecido pela empresa, para que efetue seu próprio deslocamento até o local de trabalho não servido por transporte público regular, não há falar em direito a horas in itinere. Tal situação não se insere na expressão “condução fornecida pela empregador”, a que se refere o item I da Súmula nº 90 do TST, que pressupõe a condução do empregado pela própria empresa ou por alguém por ela contratado e, consequentemente, a sujeição a horários mais rígidos e mais prolongados, que vão além daqueles efetivamente despendidos no serviço. Aplica-se, no caso, a regra geral do art. 58, § 2º, da CLT (na redação anterior à Lei nº 13.467/2017), que exclui da jornada de trabalho as horas de percurso. Sob esse entendimento, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, deu-lhes provimento para restabelecer o acórdão do Tribunal Regional. Vencidos os Ministros José Roberto Freire Pimenta, Augusto César Leite de Carvalho, Hugo Carlos Scheuermann e Cláudio Mascarenhas Brandão. 

A C Ó R D Ã O

EMBARGOS. CONTRATO DE TRABALHO EXTINTO EM 2011. HORAS "IN ITINERE". LOCAL DE TRABALHO NÃO SERVIDO POR TRANSPORTE PÚBLICO REGULAR. VEÍCULO DA EMPRESA À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADO. "DISTINGUISHING". O art. 58 da CLT e a Súmula 90, I, do TST, estabelecem como requisitos para o direito às horas "in itinere" a condução fornecida pelo empregador até o local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. A circunstância de o próprio empregado, por exercer cargo de supervisor, contar com veículo fornecido pela empresa à sua inteira disposição para ele mesmo efetuar o deslocamento, não se insere na expressão "condução fornecida pela empregadora", que pressupõe que a própria empresa ou outra por ela contratada conduza o empregado, a implicar uma sujeição bem maior a horários mais rígidos e mais prolongados para além daqueles efetivamente despendidos no serviço. Essa específica situação assemelha-se muito mais à hipótese de veículo próprio, em relação à qual não há o direito a horas "in itinere". Nesse contexto, subsume-se o caso à regra geral insculpida no art. 58 da CLT, qual seja, "o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho." Embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-E-ARR-766-85.2013.5.18.0191, SBDI-I, rel. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, 07.12.2018).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista com Agravo n° TST-E-ARR-766-85.2013.5.18.0191, em que é Embargante BRENCO - COMPANHIA BRASILEIRA DE ENERGIA RENOVAVEL e Embargado(a) ANTÔNIO BRAZ CORRÊA.

A egrégia Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, em acórdão da lavra da Desembargadora Cilene Ferreira Amaro Santos, conheceu do recurso de revista interposto pelo reclamante, por violação do art. 58, § 2º, da CLT, e, no mérito, deu-lhe provimento para condenar a Reclamada ao pagamento das horas "in itinere", restabelecendo a sentença no particular, inclusive quanto às repercussões (fls. 600/612).

A reclamada interpõe embargos (fls. 614/625), admitidos pela decisão do Ministro Presidente da egrégia Quarta Turma (fls. 640/642).

Não foi apresentada impugnação aos embargos (fls. 643).

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

Satisfeitos, portanto, os pressupostos recursais extrínsecos, passo ao exame dos pressupostos intrínsecos dos embargos.

HORAS "IN ITINERE". LOCAL DE TRABALHO NÃO SERVIDO POR TRANSPORTE PÚBLICO REGULAR. VEÍCULO DA EMPRESA À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADO

O egrégio TRT da 18ª Região julgou improcedente o pedido de horas "in itinere", sob os seguintes fundamentos:

"Para o deferimento das horas de trajeto é necessário que o empregador forneça condução ao empregado em razão de a empresa estar localizada em local de difícil acesso ou não servido por transporte público (CLT, art.58, § 2º).

Restou incontroverso que durante todo o período do contrato de trabalho não havia transporte público regular.

Como visto, a tese da defesa é de que desde a contratação até seu término, o reclamante dispunha de veículo à sua disposição.

Na própria inicial o reclamante admite que 'utilizava-se diariamente no decorrer de todo o contrato de trabalho, de transporte gratuito fornecido pela Reclamada, seja veículo colocado à disposição ou ônibus fretado pela Reclamada', fl. 13.

Note-se que quando da apresentação à impugnação à defesa, o autor nada disse acerca do veículo colocado à sua disposição, silenciando-se.

Como se vê, o reclamante durante todo o período do pacto laboral não se utilizava do ônibus coletivo fornecido pela empresa aos seus empregados, mas, sim, tinha à sua disposição um veículo individual fornecido pela empresa, e por ele conduzido, para o deslocamento da casa para o local de trabalho e seu retorno.

Benefício pelo trabalho e não para o trabalho, portanto. Uma distinção; e a circunstância de ter o autor essa prerrogativa até se justifica em razão de ter ele exercido cargos de Supervisor ao longo do contrato de trabalho. No documento de fl. 169, intitulado "Informações Gerais" consta que da sua admissão até final de outubro/2008 exerceu o cargo de Supervisor de Plantio mecanizado; de 01.11.2008 até dezembro/2009, exerceu o cargo de Supervisor de Plantio/colheita mecanizada; e, a partir de 01.01.2010, o cargo de Supervisor Agrícola.

Esclareço que embora tenha ficado constatado no tópico precedente que, no período de 01.01.2011 até o final do contrato, o autor exerceu a função de Bombeiro Civil, o fornecimento do veículo decorreu dos cargos por ele desempenhados, conforme nominados no documento ora mencionado.

Ora, quando a empresa fornece condução a sua obrigação é a de transportar, com as cláusulas acessórias às de um contrato de transporte, o que não ocorreu nos autos, haja vista que o autor tinha à sua disposição veículo específico para se locomover até os locais de trabalho, o que denoto que o veículo era conduzido pelo próprio reclamante.

(...)

Destaco que o fato de o autor ter ao seu dispor um automóvel colocado à sua disposição pela empregadora proporcionou-lhe conforto, privilegiando-o em relação aos outros empregados.

Logo, reformo a sentença e excluo a condenação ao pagamento de horas ‘in itinere’ e reflexos." (fls. 482)

A egrégia Quarta Turma deu provimento ao recurso de revista, assim decidindo:

"Extrai-se acórdão que durante todo o período do contrato de trabalho não havia transporte público regular no trajeto casa-trabalho-casa e que a condução (no caso, individual para o Reclamante) era fornecida pelo empregador. A Corte Regional, no entanto, considerou que o fato de o Reclamante dispor de um automóvel exclusivo oferecido pela empregadora proporcionou-lhe conforto, privilegiando-o em relação aos outros empregados e, por isso, reformou a sentença para excluir da condenação o pagamento de horas ‘in itinere’ e reflexos.

O pagamento das horas ‘in itinere’ está relacionado com o interesse do empregador em viabilizar o seu empreendimento em local de difícil acesso ou não servido por transporte regular público. Nesse sentido, estabelece o art. 58, §2º, da CLT o seguinte:

Art. 58 - A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.

(...) § 2° - O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução.

Interpretando este dispositivo e abordando o tema com o enriquecimento das especificidades analisadas nos diversos casos submetidos a esta Corte, a Súmula 90 do TST estabelece o seguinte:

HORAS "IN ITINERE". TEMPO DE SERVIÇO

I - O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho. (ex-Súmula nº 90 - RA 80/1978, DJ 10.11.1978)

II - A incompatibilidade entre os horários de início e término da jornada do empregado e os do transporte público regular é circunstância que também gera o direito às horas "in itinere". (ex-OJ nº 50 da SBDI-1 - inserida em 01.02.1995)

III - A mera insuficiência de transporte público não enseja o pagamento de horas "in itinere". (ex-Súmula nº 324 – Res. 16/1993, DJ 21.12.1993)

IV - Se houver transporte público regular em parte do trajeto percorrido em condução da empresa, as horas "in itinere" remuneradas limitam-se ao trecho não alcançado pelo transporte público. (ex-Súmula nº 325 – Res. 17/1993, DJ 21.12.1993)

V - Considerando que as horas "in itinere" são computáveis na jornada de trabalho, o tempo que extrapola a jornada legal é considerado como extraordinário e sobre ele deve incidir o adicional respectivo. (ex-OJ nº 236 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)

Nota-se que nem o art. 58, § 2º, da CLT nem a Súmula 90 do TST estabelecem distinção acerca do tipo de condução fornecida pelo empregador hábil a caracterizar o cômputo das horas de percurso na jornada de trabalho.

Com efeito, seja ela individual ou coletiva, permanece hígido o objetivo principal do fornecimento de transporte pelo empregador: o interesse em viabilizar o seu empreendimento em local de difícil acesso ou não servido por transporte regular público.

Nessa medida, a decisão regional, ao afastar o pagamento das horas de percurso por entender que o fornecimento de veículo individual ao empregado as descaracteriza, viola o art. 58, § 2º, da CLT." (fls. 609)

A reclamada, nas razões de embargos, argumenta que o fato de o reclamante dispor de veículo por ela fornecido para chegar ao trabalho, ainda que não servido por transporte público, afasta o direito às horas "in itinere". Transcreve arestos.

Como visto, a egrégia Quarta Turma fundamentou que nem o art. 58, § 2º, da CLT nem a Súmula 90 do TST estabelecem distinção acerca do tipo de condução fornecida pelo empregador hábil a caracterizar o cômputo das horas de percurso na jornada de trabalho, porquanto, seja ela individual ou coletiva, permanece hígido o objetivo principal do fornecimento de transporte pelo empregador: o interesse em viabilizar o seu empreendimento em local de difícil acesso ou não servido por transporte regular público.

Revela divergência jurisprudencial o aresto paradigma da Sétima Turma de fls. 624, com indicação de publicação no DJ 6/2/2009, segundo o qual é indevido o pagamento de horas "in itinere" porquanto a hipótese de veículo individual fornecido pela empresa conduzido pelo empregado para a locomoção até o local de trabalho não se insere na Súmula 90 do TST:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. HORAS ‘IN ITINERE’. CONTRARIEDADE À SÚMULA Nº 90. NÃO CONFIGURAÇÃO. NÃO PROVIMENTO. 1. Inviável o destrancamento do recurso de revista, por contrariedade à Súmula nº 90, quando se trata de hipótese em que o reclamante tinha, à sua disposição, veículo fornecido pela empresa para se locomover individualmente ao local de trabalho, como se fosse proprietário do veículo, hipótese essa diversa da constante na aludida súmula, sendo indevido, assim o pagamento de horas -in itinere-. 2. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

Conheço por divergência jurisprudencial.

2 – MÉRITO

Cumpre definir se "condução fornecida pelo empregador" abrange a hipótese de veículo individual posto à disposição do empregado que o conduz, ele próprio, até o local de trabalho e no seu retorno.

Eis o art. 58 da CLT, com a redação anterior à vigência da Lei nº 13.467/2017:

Art. 58 - A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.

(...) § 2° - O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução.

A Súmula 90, I, do TST assim estabelece:

HORAS "IN ITINERE". TEMPO DE SERVIÇO

I - O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho. (ex-Súmula nº 90 - RA 80/1978, DJ 10.11.1978)

É certo que da leitura dos dispositivos verifica-se que ao estabelecerem como requisito para o direito às horas "in itinere" condução fornecida pelo empregador até o local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público regular, em princípio, não distingue a súmula ou a lei entre transporte coletivo ou veículo à disposição do empregado para efetuar os trajetos.

Todavia, a meu juízo, essa específica situação assemelha-se muito mais à hipótese de veículo próprio, em relação à qual não há o direito a horas "in itinere".

Com efeito, se a locomoção se faz por veículo próprio não está presente um dos requisitos para o nascimento do direito, ainda que o trajeto não seja servido por transporte público. Isso porque o empregado pode controlar o tempo de deslocamento porque se encontra em seu poder a condução até o local de trabalho.

Na espécie, o Regional consignou que restou incontroverso que durante todo o período do contrato de trabalho não havia transporte público regular. Registrou, também, que o reclamante durante todo o período do pacto laboral não se utilizava do ônibus coletivo fornecido pela empresa aos seus empregados, mas, sim, tinha à sua disposição um veículo individual fornecido pela empresa, e por ele conduzido, para o deslocamento da casa para o local de trabalho e seu retorno. Consignou que o fornecimento do veículo decorreu dos cargos desempenhados pelo reclamante, de Supervisor de Plantio mecanizado; de 01.11.2008 até dezembro/2009, de Supervisor de Plantio/colheita mecanizada; e, a partir de 01.01.2010, o cargo de Supervisor Agrícola.

Ao fim, reformou a sentença que havia condenado a reclamada ao pagamento ao reclamante de duas horas "in itinere" por dia trabalhado no período em que o autor laborou em Morro Vermelho e uma hora e trinta minutos "in itinere" por dia trabalhado, no período em que laborou em Alto Taquari-MT.

Penso que a circunstância de o próprio empregado, por exercer cargo de supervisor, contar com veículo à disposição para o deslocamento, não se insere na expressão "condução fornecida pela empregadora", que pressupõe que a própria empresa ou outra por ela contratada conduza o empregado, a implicar uma sujeição bem maior a horários mais rígidos e mais prolongados para além daqueles efetivamente despendidos no serviço.

Nesse contexto, subsume-se o caso à regra geral insculpida no art. 58 da CLT, qual seja, "o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho."

Ante o exposto, dou provimento aos embargos para restabelecer o acórdão regional.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer dos embargos por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, dar-lhes provimento para restabelecer o acórdão regional, vencidos os Exmos. Ministros José Roberto Freire Pimenta, Augusto César Leite de Carvalho, Hugo Carlos Scheuermann e Cláudio Mascarenhas Brandão.

Brasília, 08 de novembro de 2018.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Márcio Eurico Vitral Amaro

Ministro Relator

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