Data da publicação:
Seção Especializada em Dissídios Coletivos
Maria de Assis Calsing - TST
01 -Portuários. Greve. Abusividade. Paralisação por motivação política. A greve realizada por explícita motivação política, mesmo que por curto período de tempo, é abusiva, visto que o empregador não dispõe de poder de negociação para pacificar o conflito.
Resumo do voto.
Portuários. Greve. Abusividade. Paralisação por motivação política. A greve realizada por explícita motivação política, mesmo que por curto período de tempo, é abusiva, visto que o empregador não dispõe de poder de negociação para pacificar o conflito. Sob esse fundamento, a SDC, por unanimidade, decidiu conhecer do recurso ordinário do Sindicato dos Operadores Portuários de São Paulo, e, no mérito, por maioria, deu-lhes parcial provimento para declarar abusivo o movimento de paralisação das atividades dos portuários, que teve como propósito abrir espaço para a negociação do novo marco regulatório implantado pela MP nº 595/2012, a qual passou a dispor acerca da exploração direta e indireta, pela União, dos portos e instalações portuárias e sobre as atividades dos operadores portuários, entre outras providências. Vencidos os Ministros Maurício Godinho Delgado e Kátia Magalhães Arruda.
A C Ó R D Ã O
RECURSO ORDINÁRIO. GREVE. PORTUÁRIOS. PARALISAÇÃO DAS ATIVIDADES POR CURTO PERÍODO. PROTESTO COM MOTIVAÇÃO POLÍTICA. 1. A mobilização levada a efeito pela categoria dos trabalhadores portuários teve como propósito abrir espaço à negociação do novo marco regulatório implantado pela Medida Provisória n.º 595, de 6 dezembro de 2012, que dispunha sobre a exploração direta e indireta, pela União, de portos e instalações portuárias e sobre as atividades desempenhadas pelos operadores portuários, entre outras providências (MP atualmente convertida na Lei n.º 12.815, de 5 de junho de 2013). 2. Firme, nesta Seção, o entendimento segundo o qual a greve com nítido caráter político é abusiva, na medida em que o empregador, conquanto seja diretamente por ela afetado, não dispõe do poder de negociar e pacificar o conflito. Recurso Ordinário parcialmente provido. (TST-RO-1393-27.2013.5.02.0000, SDC, rel. Min. Maria de Assis Calsing, 29.05.2017).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n.º TST-RO-1393-27.2013.5.02.0000, em que é Recorrente SINDICATO DOS OPERADORES PORTUÁRIOS DE SÃO PAULO e são Recorridos SINDICATO DOS ESTIVADORES DE SANTOS, SÃO VICENTE, GUARUJÁ E CUBATÃO e SINDICATO DOS CONFERENTES DE CARGA, DESCARGA E CAPATAZIA DO PORTO DE SANTOS, SÃO VICENTE, GUARUJÁ, CUBATÃO E SÃO SEBASTIÃO E OUTROS.
R E L A T Ó R I O
O Sindicato dos Operadores Portuários de São Paulo – SOPESP ajuizou Dissídio Coletivo de Greve em desfavor do Sindicato dos Conferentes de Carga e Descarga e Capatazia do Porto de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebastião e Outros, com vistas ao reconhecimento de que a operação portuária consiste em atividade essencial e à declaração de abusividade da greve, realizada das 7 horas às 13 horas do dia 22/2/2013, bem como, por conseguinte, à constituição de responsabilidade civil e criminal dos Suscitados relativamente aos fatos decorrentes da greve.
Ata de audiência a fls. 82/87.
O Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão e o Sindicato dos Conferentes de Carga, Descarga e Capatazia do Porto de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebastião e Outros apresentaram defesa a fls. 90/98 e 160/176, respectivamente.
Réplica a fls. 424/448.
A Procuradoria Regional do Trabalho da 2.ª Região, por meio do parecer a fls. 583/586, opina pela rejeição das preliminares, declaração de abusividade da greve e procedência parcial das reivindicações.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região, mediante o acórdão a fls. 804/812, rejeitou as preliminares arguidas e, no mérito, julgou improcedentes os pedidos, por entender não se tratar de greve abusiva.
O Sindicato dos Operadores Portuários de São Paulo – SOPESP apresenta Recurso Ordinário a fls. 822/849, o qual foi recebido a fls. 885.
O Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão e o Sindicato dos Conferentes de Carga, Descarga e Capatazia do Porto de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebastião e Outros apresentaram contrarrazões a fls. 890/894 e 896/914.
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos moldes do art. 83, § 2.º, do RITST.
É o relatório.
V O T O
CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO
O Recurso Ordinário é tempestivo (acórdão publicado na vigência do CPC de 1973, em 10/9/2013, terça-feira, conforme certidão lavrada a fls. 818, e Apelo interposto em 1.º/9/2013), regular a representação, a fls. 18, e custas recolhidas, a fls. 824.
Por regular, conheço do Apelo.
MÉRITO DO RECURSO ORDINÁRIO
O Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região julgou improcedentes os pedidos deduzidos pelo Sindicato dos Operadores Portuários de São Paulo – SOPESP, por entender não abusiva a greve. Valeu-se, para tanto, dos seguintes fundamentos:
"Requer o Suscitante seja declarada a abusividade da greve ocorrida no Porto de Santos no dia 22/2/2013, alegando tratar-se de ‘greve política como forma de pressão para impedir que o Governo Federal implemente um novo regulamento portuário (MP 595/2012) ‘.
Depreende-se da análise dos autos que a greve foi deflagrada sem observância dos requisitos previstos na Lei n.º 7.783/89 e que teve como causa motivadora a edição da Medida Provisória n.º 595/2012, convertida na Lei n.º 12.815/2013, que regulamenta a atividade portuária.
Este fato foi, inclusive, confessado pelos suscitados em sua defesa, ao afirmar, à fls. 138, que ‘a alteração da legislação em prejuízo do trabalhador portuário ofende seus interesses’. Verifica-se, ademais, que o acordo mencionado pelos suscitados (termo de compromisso a fls. 163), firmado com representantes de Órgãos do governo (Secretaria Geral da Presidência, Ministério do Trabalho e Emprego e Secretaria de Portos), o qual pôs fim à paralisação, corrobora o caráter político do movimento ao estabelecer que:
‘III- durante o período dos trabalhos e negociação da Mesa de Diálogo:
a) não serão adotadas medidas pelo Governo para abreviar o prazo de apreciação da MPV 595 no Congresso Nacional;
b) não será encaminhado pela Secretaria de Portos à Presidência da República proposta de decreto para regulamentar a MPV 595;
c) não serão licitados pela União novos arrendamentos de terminais- portuários ou concessões portuárias;
(omissis)’
Ressalte-se, entretanto, que o artigo 9.º, da Constituição Federal, é claro ao assegurar o direito de greve e garantir ao trabalhador o momento oportuno para a paralisação e os interesses a serem defendidos.
Dessa forma, a greve é um instrumento de pressão por conquista de direitos trabalhistas, sociais, econômicos e políticos. Aliás, a greve é um fato social e, também, político.
No caso em tela, há de se ressaltar, outrossim, que o movimento paredista teve por intuito impedir a promulgação da Lei dos Portos, com vistas a preservar o mercado de trabalho onde os representados do Suscitado buscam colocação, ante a nova regulamentação sobre as condições de trabalho dos trabalhadores avulsos.
Dessa forma, não há de se falar em abusividade do presente movimento paredista."
Persegue o Sindicato patronal a declaração de abusividade da greve, tecendo minuciosos argumentos tendentes a comprovar a inobservância dos requisitos formais e o caráter político de sua motivação.
À análise.
Não há o que investigar no campo probatório, já que a demanda envolve dois aspectos incontroversos: inobservância dos aspectos formais para a deflagração da greve e a sua motivação política. Ambos os fatos são suficientes para, em conjunto ou separadamente, revelarem a abusividade do movimento grevista.
Enfatize-se, de todo modo, que a mobilização levada a efeito pela categoria dos trabalhadores portuários teve como propósito abrir espaço à negociação do novo marco regulatório implantado pela Medida Provisória n.º 595, de 6 dezembro de 2012, que dispunha sobre a exploração direta e indireta, pela União, de portos e instalações portuárias e sobre as atividades desempenhadas pelos operadores portuários, entre outras providências (MP atualmente convertida na Lei n.º 12.815, de 5 de junho de 2013).
Os documentos dos autos, destacando-se as atas de reuniões (a fls. 146/148), de assembleia geral e do termo de audiência lavrada no âmbito do Ministério Público do Trabalho (a fls. 250/256) dão conta, de forma inequívoca, dessa realidade.
Não é nova, inclusive, a situação aqui delineada no âmbito desta Seção Especializada, tanto que já deferida liminar pela então Vice-Presidente deste Tribunal Superior, Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, para determinar que as Rés se abstivessem de paralisar os serviços, nos autos da Ação Cautelar n.º TST-CauInom-1445-77.2013.5.00.0000, movida pela União e Outra, e que, por fim, foi extinta sem resolução de mérito, por ilegitimidade das Autoras, conforme reconhecido nos autos principais, de minha relatoria (DC-2581-12.2013.5.00.0000). A liminar teve lastro no seguinte fundamento: "A motivação exclusivamente política, destituída de conteúdo profissional, torna o movimento paredista abusivo, pois não se coaduna com os objetivos da Lei n.º 7.783/89."
Exsurge nítido, nesse contexto, o fato de que a mobilização dos trabalhadores dirigiu-se aos Poderes Constituídos (Executivo e Legislativo) e não aos empregadores.
E, sob essa perspectiva, da qual emerge o nítido caráter político da greve, esta Seção Especializada já consagrou o entendimento de que o movimento é abusivo, na medida em que o empregador, conquanto seja diretamente por ele afetado, não dispõe do poder de negociar e pacificar o conflito.
Mutatis mutandis, citem-se, nesse sentido, os seguintes precedentes:
"RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO DE GREVE. NOMEAÇÃO PARA REITOR DA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO - PUC. CANDIDATA MENOS VOTADA EM LISTA TRÍPLICE. OBSERVÂNCIA DO REGULAMENTO. PROTESTO COM MOTIVAÇÃO POLÍTICA. ABUSIVIDADE DA PARALISAÇÃO.
1. A Constituição da República de 1988, em seu art. 9.º, assegura o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e os interesses que devam por meio dele defender. 2. Todavia, embora o direito de greve não seja condicionado à previsão em lei, a própria Constituição (art. 114, § 1.º) e a Lei n.º 7.783/1989 (art. 3.º) fixaram requisitos para o exercício do direito de greve (formais e materiais), sendo que a inobservância de tais requisitos constitui abuso do direito de greve (art. 14 da Lei n.º 7.783). 3. Em um tal contexto, os interesses suscetíveis de serem defendidos por meio da greve dizem respeito a condições contratuais e ambientais de trabalho, ainda que já estipuladas, mas não cumpridas; em outras palavras, o objeto da greve está limitado a postulações capazes de serem atendidas por convenção ou acordo coletivo, laudo arbitral ou sentença normativa da Justiça do Trabalho, conforme lição do saudoso Ministro Arnaldo Sussekind, em conhecida obra. 4. Na hipótese vertente, os professores e os auxiliares administrativos da PUC se utilizaram da greve como meio de protesto pela não nomeação para o cargo de reitor do candidato que figurou no topo da lista tríplice, embora admitam que a escolha do candidato menos votado observou as normas regulamentares. Portanto, a greve não teve por objeto a criação de normas ou condições contratuais ou ambientais de trabalho, mas se tratou de movimento de protesto, com caráter político, extrapolando o âmbito laboral e denotando a abusividade material da paralisação. Recurso ordinário conhecido e provido, no tema." ( Processo: RO - 51534-84.2012.5.02.0000, Data de Julgamento: 9/6/2014, Relator: Ministro Walmir Oliveira da Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 20/6/2014.)
"EMENTA: GREVE. NATUREZA POLÍTICA. ABUSIVIDADE. A greve política não é um meio de ação direta da classe trabalhadora em benefício de seus interesses profissionais e, portanto, não está compreendida dentro do conceito de greve legal trabalhista. Entende-se por greve política, em sentido amplo, a dirigida contra os poderes públicos para conseguir determinadas reivindicações não suscetíveis de negociação coletiva. Correta, portanto, a decisão que declara a abusividade do movimento grevista com tal conotação, máxime quando inobservado o disposto na Lei 7.783/89. Recurso Ordinário conhecido e desprovido." (RODC - 571212-31.1999.5.01.5555 Data de Julgamento: 31/8/2000, Relator: Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 15/9/2000.)
De outro lado, independentemente da discussão acerca de os serviços portuários serem ou não considerados essenciais, o fato é que não houve notificação prévia às entidades patronais. A Circular n.º 2 - em que comunicada a "todas as empresas e Operadora Portuárias e os usuários do Porto de Santos" a paralisação a ser realizada no dia 22, das 7 horas às 13 horas – foi firmada no dia anterior pelo Diretor-Presidente do Sindicato de Conferentes (a fls. 225).
Nem se cogite que paralisação de curta duração descaracteriza o evento greve, pois já superada essa controvérsia no âmbito desta Seção (RO - 177-56.2014.5.07.0000, Relatora Ministra Maria de Assis Calsing, DEJT 22/08/2016).
A greve é, portanto, abusiva. Não é o caso, entretanto, de reconhecer a "constituição da responsabilidade civil e criminal dos suscitados", também postulada, pois, além de ter se revelado pacífico o movimento, essas questões fogem ao âmbito da presente demanda.
Pelo exposto, dou provimento parcial ao Recurso Ordinário para declarar abusiva a greve.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Recurso Ordinário e, no mérito, por maioria, dar-lhe parcial provimento para declarar abusiva a greve. Vencidos os Exmos. Ministros Kátia Magalhães Arruda e Maurício Godinho Delgado, que juntarão justificativa de voto vencido.
Brasília, 24 de abril de 2017.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
Maria de Assis Calsing
Ministra Relatora
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