TST - INFORMATIVOS 2021 243 - de 30 de agosto a 10 de setembro

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Lelio Bentes Corrêa - TST



Gratificação de função. Percepção por mais de 10 anos. Reversão ao cargo efetivo antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017. Irretroatividade. Incorporação devida. Aplicação da Súmula nº 372, I, do TST.



EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS –ECT. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 372, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. DIREITO ADQUIRIDO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.467/2017. 1. Discute-se nos autos acerca da aplicabilidade do artigo 468, § 2º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017 – que afasta o direito à incorporação da gratificação de função exercida pelo empregado por mais de dez anos, quando revertido ao cargo efetivo sem justo motivo –, a hipótese em que o empregado já havia implementado os requisitos contidos na Súmula nº 372, I, do TST, quando da entrada em vigor do referido diploma legal (11/11/2017). 2. A jurisprudência desta Corte superior tem-se posicionado no sentido da inaplicabilidade do disposto no artigo 468, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho a hipóteses em que os empregados já tenham completado dez anos de exercício da função gratificada quando do advento da reforma trabalhista introduzida pela Lei nº 13.467/2017. 3. No caso em tela, resulta incontroverso que a reclamante percebeu gratificação de função no período de 31/12/1993 a 2/8/2018, tendo sido preenchido o requisito da percepção da gratificação por dez anos em 2003 – antes, portanto, da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 – circunstância que atrai a incidência da Súmula nº 372, I, do TST. 4. Recurso de Embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e a que se dá provimento para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional. (TST-E-ED-RR-43-82.2019.5.11.0019, SBDI-I, rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, 22/10/2021).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-43-82.2019.5.11.0019, em que é Embargante JULIA EMILIA MACIEL DA CUNHA e Embargada EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT.

A egrégia 4ª Turma do TST, mediante acórdão prolatado às fls. 633/649 do eSIJ (Sistema de Informações Judiciárias), complementado às fls. 679/682 do eSIJ, deu provimento ao Agravo de Instrumento interposto pelo ente público para mandar processar a Revista. Examinando o Recurso de Revista, a Turma dele conheceu por violação dos artigos 5º, II, da Constituição da República e 468, § 2º, da CLT e, no mérito, deu-lhe provimento para julgar improcedente a reclamação trabalhista, em que se postulava a incorporação da gratificação de função ao salário e as diferenças salariais daí decorrentes.

Inconformada, a reclamante interpõe o presente Recurso de Embargos (fls. 684/703).

O recurso foi admitido por meio da decisão monocrática proferida à fl. 711.

Impugnação aos Embargos apresentada às fls. 713/715.

Dispensada a remessa dos autos à douta Procuradoria-Geral do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

I - CONHECIMENTO

1 - PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL.

O apelo é tempestivo (fls. 683 e 709) e a representação processual é regular (procuração juntada à fl. 249 e substabelecimentos trazidos às fls. 628 e 704). A reclamante é beneficiária da justiça gratuita.

2 - PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL.

EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE 10 ANOS. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 372, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. DIREITO ADQUIRIDO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.467/2017.

A egrégia 4ª Turma do TST, mediante acórdão prolatado às fls. 633/649 do eSIJ (Sistema de Informações Judiciárias), complementado às fls. 679/682 do eSIJ, deu provimento ao Agravo de Instrumento interposto pelo ente público para mandar processar a Revista. Examinando o Recurso de Revista, a Turma dele conheceu por violação dos artigos 5º, II, da Constituição da República e 468, § 2º, da CLT e, no mérito, deu-lhe provimento para julgar improcedente a reclamação trabalhista, em que se postulava a incorporação da gratificação de função ao salário e as diferenças salariais daí decorrentes. Consignou, na ocasião, o douto Órgão fracionário, os seguintes fundamentos, declinados às fls. 638/649 (os destaques constam do original):

(...)

Como a discussão em torno do princípio da legalidade é o cerne da questão referente à possibilidade, ou não, de incorporação da gratificação de função ocupada por mais de 10 anos e suprimida pela empresa, quando da reversão do empregado ao cargo efetivo, tem-se que é possível o conhecimento da revista por violação do art. 5º, II, da CF.

Com efeito, sem base em norma legal específica, mas apenas invocando o princípio constitucional da irredutibilidade salarial, insculpido no inciso VI do art. 7º da CF, que, por sua vez, é passível de flexibilização, o TST editou a Súmula 372, cujo inciso I assim dispõe:

"GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO. LIMITES (conversão das Orientações Jurisprudenciais 45 e 303 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira (ex-OJ nº 45 da SBDI-1 - inserida em 25.11.1996).

II - Mantido o empregado no exercício da função comissionada, não pode o empregador reduzir o valor da gratificação (ex-OJ nº 303 da SBDI-1 - DJ 11.08.2003)" (grifos nossos).

Antes da reforma trabalhista de 2017, o art. 468 da CLT, que alberga o princípio da inalterabilidade contratual, de modo a impedir a alteração contratual unilateral e prejudicial ao empregado, já admitia a exceção da reversão ao cargo efetivo, naturalmente com a perda da gratificação de função, nos seguintes termos:

"Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Parágrafo único. Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança" (grifos nossos).

Tal dispositivo constava da redação original da CLT, desde 1943, sendo que apenas em 1996, após a Constituição de 1988 elencar como direito trabalhista o da irredutibilidade salarial, é que o TST veio a editar orientação jurisprudencial e limitar a norma contida no parágrafo único do art. 468 da CLT, admitindo a reversão ao cargo efetivo, mas vedando a perda da gratificação de função.

O leading case que encabeça os precedentes fundantes do inciso I da Súmula 372 do TST, da lavra do saudoso Min. Orlando Teixeira da Costa, elencava as seguintes razões para assegurar a manutenção da gratificação, mesmo em face da reversão ao cargo efetivo:

"Amparam essa compreensão, vários fundamentos importantes. Primeiro - O que se ampara no princípio da habitualidade. Numerosos são os enunciados que adotam o princípio da habitualidade como gerador de direitos, no que pertine a horas extraordinárias (Verbetes de números 24, 45, 94, 115, 151, 172). Segundo - O princípio da irredutibilidade salarial, outrora reconhecido apenas pela lei ordinária, mas atualmente consagrado pela Carta Magna vigente (art. 7º, inciso VI). É que os hábitos reiterados de consumo não podem ser suprimidos de um momento para o outro. A destituição da função (sanção) poderia autorizar essa supressão. Quando, entretanto, a gratificação é suprimida por motivos outros que não decorrem da culpa do empregado, não pode ele ser apenado com a redução do seu ganho e, consequentemente, ver reduzido injustificadamente o seu poder aquisitivo. Terceiro - O princípio da analogia, cuja aplicação é autorizada pelo art. 8º da CLT. Os servidores públicos, que são trabalhadores como os empregados das empresas privadas, tiveram reconhecido pela legislação ordinária (Lei nº 6.732/79 e hoje artigo 62, § 2º da Lei nº 8112/90) o direito de incorporação da gratificação pelo exercício de função de Direção, Chefia ou Assessoramento. Nada demais, pois, que se reconheça, também, esse direito, aos empregados das empresas privadas, quando exerceram, por longo tempo, gozando da confiança do empregador e sem nunca a terem perdido, função de confiança, mormente quando o legislador, dispondo sobre a espécie (art. 468, parágrafo único da CLT), esqueceu-se de explicitar se a reversão ao cargo efetivo, quando o trabalhador deixar o exercício de função de confiança, importa na perda da gratificação respectiva, mesmo tendo prestado relevantes serviços ao empregador, naquela situação, por longo tempo. Quarto - O princípio da constância da jurisprudência, expresso nos acórdãos que a seguir enumeraremos, representativos de mais de uma década de decisões: Ac 1ª T.-2742/77, referente ao processo nº TST-RR-1237/77, Relator Ministro Hildebrando Bisaglia; Ac. 1ª T.-1810/82, referente ao processo nº TST-RR-922/81, Relator Ministro Coqueijo Costa; Ac. 1ª T. - 915/83, referente ao processo TST-RR-2.616/82, Relator Ministro Ildélio Martins; Ac. 3ª T. - 2327/84, referente ao processo TST-RR-2723/83, Relator Ministro Orlando Teixeira da Costa; Ac. TP - 1762/86, referente ao processo nº TST-E-RR-1928/81 Relator Ministro Orlando Teixeira da Costa; Ac. TP - 611/87, referente ao processo nº TST-E-RR-2.648/84, Relator Ministro Coqueijo Costa; Ac. TP - 02272/87, referente ao processo nº TST-E-RR-0334/82, Relator Ministro Ranor Barbosa; Ac. TP-2289/87, referente ao processo TST-E-RR-2525/84, Relator Ministro Hermínio Mendes Cavaleiro; Ac. TP - 02340/87, referente ao processo nº TST-E-RR-7388/83, Relator Ministro Ranor Barbosa; Ac. 3ª T. - 2365/87, referente ao processo nº TST-RR-6562/86, Relator Ministro Orlando Teixeira da Costa; Ac. SDI-02459/89, referente ao processo nº TST-E-RR-1445/87.4, Relator Ministro Orlando Teixeira da Costa e Ac. 5ª T. - 1533/92, referente ao processo nº TST-RR-28.383/91.9, Relator Ministro Antônio Amaral" (ERR-01944/1989, Ac. 2155/1992 - Red. Min. Orlando Teixeira da Costa, DJ 12.02.1993 - Decisão por maioria) (grifos nossos). 

Como se percebe, a orientação jurisprudencial do TST foi calcada basicamente em princípios e não em normas legais, tanto que o voto condutor do Min. Orlando Costa fala expressamente em esquecimento do legislador e na necessidade de suprir a lacuna para os casos de longos anos de serviço.

Ora, o ilustre relator desse leading case não cogitou de silêncio eloquente do legislador, quando a não inclusão de exceção significa que a regra não as admite. Por outro lado, a fixação de parâmetro concreto pela jurisprudência constitui nítida invasão da esfera legislativa, como no caso do estabelecimento da incorporação da gratificação de função pelo seu exercício por mais de 10 anos. Por quê não 5 anos, como constava antes no Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União? Tal concretização de parâmetro não previsto em lei é a prova maior de se estar legislando através de decisão judicial e não apenas suprindo lacuna.

Cabe destacar também que o referido precedente louvou-se na analogia como princípio hermenêutico, diante do que entendeu tratar-se de lacuna da lei, louvando-se no art. 62, § 2º da Lei 8.112/90, de modo a contemplar os trabalhadores celetistas com igual direito previsto para os servidores públicos da União, quando se dispunha, verbis:

"Art. 62. Ao servidor investido em função de direção, chefia ou assessoramento é devida uma gratificação pelo seu exercício.

(...)

§ 2º A gratificação prevista neste artigo incorpora-se à remuneração do servidor e integra o provento da aposentadoria, na proporção de 1/5 (um quinto) por ano de exercício na função de direção, chefia ou assessoramento, até o limite de 5 (cinco) quintos" (grifo nosso).

Ora, o próprio legislador ordinário, diante da falta de razoabilidade do benefício concedido aos servidores da União, fazendo com que desde o exercício de função comissionada por apenas um ano já pudesse ter incorporado 20% dela aos vencimentos, veio a cancelar a vantagem dos denominados "quintos" (substituição, nos termos da Lei 9.527/97, dos 5 parágrafos do art. 62 pelo seu atual parágrafo único) e transformá-los em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – VPNI quando já incorporados por aqueles que tivessem cumprido com os requisitos legais ao tempo da edição da nova lei (Medida Provisória 2.225-45/01).

Ou seja, desde 1997 a então Orientação Jurisprudencial 45 da SBDI-1 do TST já se encontrava sem respaldo sequer analógico, pois o direito não existia mais para os servidores públicos. E, assim sendo, mais patente se mostrava a conclusão de que a concessão do direito aos empregados celetistas decorria de nítido voluntarismo jurídico, ou seja, da vontade do juiz de que o direito fosse assegurado, mesmo sem previsão legal.

E mais. Ao tempo da edição do multicitado precedente, ainda vigia o CPC de 1973, que previa expressamente a analogia e os princípios gerais de direito como fontes de exegese nos casos de lacuna no ordenamento jurídico, tal como explicitamente esgrimidos pelo julgado, verbis:

"Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito" (grifos nossos).

No entanto, justamente em face dos excessos do ativismo judiciário, veio o CPC de 2015 a não mais mencionar as referidas fontes, mas apenas manter, como parágrafo único, o antigo art. 127 do CPC de 1973, nos seguintes termos, verbis:

"Art. 140. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico.

Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei" (grifos nossos).

A mesma preocupação teve a reforma trabalhista (Lei 13. 467/17) em relação à hermenêutica jurisprudencial, de modo a coibir seus excessos, especialmente na edição de verbetes sumulados, quando dispôs:

"Art. 8º. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

(...)

§ 2º Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei" (grifos nossos).

Em nossas "Reflexões com Vistas à Modernização da Legislação Trabalhista por Ocasião dos 75 Anos da Justiça do Trabalho no Brasil", já alertávamos para o perigo do crescente ativismo judiciário que vinha tomando conta da jurisprudência de nossas Cortes Trabalhistas e especialmente do TST, na edição e revisão de súmulas, verbis:

"Se nas origens do Direito do Trabalho está a ideia de proteção do trabalhador frente à exploração desmedida do empresário, por outro essa proteção tem um limite, naquilo que é a justa retribuição dos frutos da produção entre o capital e o trabalho.

A concessão de direitos ao trabalhador, quer pela via legislativa, quer pela via judiciária, tem um limite de elasticidade, qual seja, a capacidade de assimilação de novos encargos trabalhistas pelas empresas, que não encareçam de tal modo o custo da mão-de-obra a ponto de tornar o produto não mais comercializável e a empresa não mais competitiva no mercado nacional ou internacional, fazendo com que venha a fechar suas portas.

Uma das vertentes do presente estudo será apresentar um panorama do que se tem ampliado o rol dos encargos trabalhistas apenas com base na interpretação das leis laborais, elastecendo além do razoável o patrimônio jurídico do trabalhador.

As duas principais vertentes do estudo serão ligadas à flexibilização da legislação trabalhista:

uma sob tutela sindical, que tem sido repetidamente desautorizada, pela anulação sistemática de cláusulas de acordos e convenções coletivas de trabalho;

a outra, que tem sido amplamente utilizada pela Justiça do Trabalho, que poderíamos chamar de tutela judicial, com o elastecimento de direitos trabalhistas baseados unicamente na aplicação de princípios gerais para se criarem novas vantagens de conteúdo econômico para o trabalhador, não previstas em lei.

Ou seja, só se admite a flexibilização da legislação para ampliação de direitos trabalhistas, não para sua adequação à realidade econômica, social e tecnológica.

O que chama mais a atenção não é a concessão desta ou daquela vantagem isoladamente, prática perfeitamente assimilável, mas a tendência geral e constante na exegese que amplie sistematicamente o rol dos direitos trabalhistas, optando-se por deferir quase tudo e quase sempre o que o trabalhador venha a postular em juízo, a que título seja" (Ives Gandra da Silva Martins Filho, in 1º Caderno de Pesquisas Trabalhistas, IDP – Lex-Magister, 2017 – Porto Alegre, págs. 17-18, grifos do original).

Após a entrada em vigor da Lei 13.467/17, era editado o 2º Caderno de Pesquisas Trabalhistas do IDP, que coordenamos com o Min. Gilmar Mendes, do STF, no qual registramos, já na apresentação, algumas das constatações subjacentes aos resultados da reforma, verbis:

"Se o 1º Caderno teve a virtude de fornecer subsídios para a reforma trabalhista que se promoveu no Brasil em 2017, este 2º Caderno vem para analisa-la, decifrá-la e comentá-la, procurando extrair dela suas potencialidades.

(...)

Ao olhar para o processo da reforma trabalhista, como observador privilegiado, surpreso com sua amplitude, vem-me à cabeça, imediatamente, a terceira lei de Newton: a toda ação corresponde uma reação, de igual intensidade e de sentido contrário. Comparando o número de súmulas do TST que tiveram sua sinalização alterada nas duas semanas do tribunal, de 2011 e 2012, com aquelas mesmas e algumas outras que foram recolocadas na posição original pela reforma da CLT de 2017, não deixo de ver no ativismo judiciário da Justiça do Trabalho uma das principais causas da reforma laboral. Para mim, uma mera constatação. A reação foi tão forte quanto as mudanças da jurisprudência. Se houve excessos de um lado, também se verificam alguns do lado oposto" (Ives Gandra da Silva Martins Filho, IDP-Paixão Editores – 2017 – Porto Alegre, págs. 7-8, grifos nossos de agora).

E no artigo específico que escrevemos para o referido caderno, registrávamos novamente, até em termos numéricos, o impacto da reforma no direito sumular, verbis:

"Como se viu, a reforma representou uma reação ao ativismo judiciário da Justiça do Trabalho, em face das lacunas que havia na CLT em relação a muitos temas que careciam de disciplina legal, decorrentes de avanços tecnológicos e novas formas de contratação, a par do silêncio da legislação consolidada a respeito de todo o campo dos danos morais, utilizando-se a legislação civil. Assim, a guinada da jurisprudência trabalhista ocorrida nas denominadas "Semanas do TST" de 2011 e 2012, com a alteração de 34 súmulas para ampliar direitos trabalhistas sem supedâneo legal, teve como reação a superação de 38 súmulas do TST com a reforma trabalhista, prevendo-se em moldes mais modestos os direitos que haviam sido conferidos originariamente pela jurisprudência" (Ives Gandra da Silva Martins Filho, "A Reforma Trabalhista no Brasil", in 2º Caderno de Pesquisas Trabalhistas, op. cit., pág. 16, grifos do original).

Pois bem, um dos verbetes sumulados do TST que foi tratado especificamente pela Lei 13.467/17 foi justamente a Súmula 372, com a inclusão do § 2º ao art. 468 da CLT, com a seguinte redação, verbis:

"Art. 468. (...)

§ 1º Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

§ 2º A alteração de que trata o § 1º deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função" (grifos nossos).                  

O que se verifica no caso concreto é que o § 2º do art. 468 da CLT superou a Súmula 372, I, do TST, deixando claro agora que a reversão ao cargo efetivo não assegura ao empregado a manutenção da gratificação que recebia no cargo comissionado, independentemente do número de anos que o tenha exercido.

Como já se referiu, o item I da Súmula 372 do TST não conta com respaldo legal, mas apenas principiológico, da estabilidade financeira do empregado, sendo absolutamente discricionário o verbete, inclusive nos seus parâmetros, de 10 anos e de não reversão por justa causa, em nítida manifestação de ativismo judiciário, oportunamente reformado pela Lei 13.467/17.

Tal verbete sumulado só não foi cancelado até o momento em face da discussão em torno da constitucionalidade do art. 702, I, "f", da CLT (modificado justamente para evitar fenômenos como as "Semanas do TST", de mudança de súmulas sem publicidade das sessões e sem precedentes que as respaldassem), suscitada perante o STF (ADC 62, Rel. Min. Ricardo Lewandowski) e TST (ArgInc-696-25.2012.5.05.0463, Rel. Min. Márcio Eurico), o qual dispõe sobre o procedimento de edição e cancelamento de súmulas do TST, nos seguintes termos, verbis:

"Art. 702. Ao Tribunal Pleno compete:                   

I - em única instância:

(...)

f) estabelecer ou alterar súmulas e outros enunciados de jurisprudência uniforme, pelo voto de pelo menos dois terços de seus membros, caso a mesma matéria já tenha sido decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, dois terços das turmas em pelo menos dez sessões diferentes em cada uma delas, podendo, ainda, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial" (grifos nossos).

Retomando o caso concreto, temos que a decisão recorrida vem calcada não apenas no princípio da irredutibilidade salarial (CF, art. 7º, VI, da CF), mas, após a edição da Lei 13.467/17, na garantia do direito adquirido (CF, art. 5º, XXXVI), entendendo que a súmula deve se aplicar aos empregados que já tivessem a gratificação incorporada. Também se tem discutido o direito daqueles que, mesmo não suprimida a gratificação, teriam garantida sua incorporação desde já, por implementarem o requisito sumular antes da entrada em vigor da nova lei, de modo a impedir o descenso salarial.

Ora, a clássica definição de direito adquirido de Gabba, ilustre jurista italiano que influenciou diretamente nosso Código Civil de 1916, e que é repetida unissonamente pela doutrina pátria, expressa-se nos seguintes termos:

"É adquirido cada direito que: a) é consequência de um fato idôneo a produzi-lo, em virtude de a lei do tempo no qual o fato se consumou, embora a ocasião de fazê-lo valer não se tenha apresentado antes da atuação de uma lei nova em torno do mesmo; e que b) nos termos da lei sob cujo império ocorre o fato do qual se origina, passou imediatamente a fazer parte do patrimônio de quem o adquiriu". (Carlo Francesco Gabba, "Teoria della Retroattività delle Leggi", Utet – 1891 - Torino, 3ª ed., pág.191, grifos nossos).

Como se percebe, a questão do direito adquirido é uma questão de direito intertemporal, no sentido do confronto entre lei antiga e lei nova, sob o prisma do cumprimento dos elementos que, segundo a lei antiga, eram aptos a gerar o direito previsto na lei antiga e que serão antepostos frente à lei nova, em nome da segurança jurídica.

No caso do pretenso direito à incorporação da gratificação de função, o que se contrapõe é a lei nova frente a verbete sumulado do TST que, indevidamente, criou vantagem trabalhista sem base legal. Portanto, não há de se falar em direito adquirido.

Se, por um lado, a jurisprudência é fonte de direito, quando interpreta legitimamente o ordenamento jurídico, explicitando o que não estava claro, por outro, não cabe ao Poder Judiciário se substituir ao Legislativo, em detrimento do princípio republicano e democrático da separação dos Poderes do Estado.

Por derradeiro, também não cabe aqui se cogitar de modulação de decisão judicial que venha a cancelar expressamente súmula que conflita com a lei nova, mormente se já conflitava com o ordenamento jurídico anterior, inovando na ordem jurídica ao criar direito sem respaldo legal.

Assim, ante a possível ofensa dos arts. 5º, II, da CF e 468, § 2º, da CLT, sendo reconhecida a transcendência jurídica da questão, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento da Reclamada para determinar o processamento de seu recurso de revista.

B) RECURSO DE REVISTA.

I) CONHECIMENTO

Nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT, reconheço a transcendência jurídica da matéria concernente à ausência de direito adquirido à incorporação do valor de função comissionada, ainda que exercida por mais de 10 anos, e, com lastro no art. 896, "c", da CLT, CONHEÇO do recurso de revista da Reclamada por violação do art. 5º, II, da CF e arts. 5º, II, da CF e 468, § 2º, da CLT (conforme a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 13.467/2017 – reforma trabalhista).

II) MÉRITO

Por todas as razões aqui expostas, tendo a decisão recorrida violado os arts. 5º, II, da CF e 468, § 2º, da CLT, DOU PROVIMENTO ao recurso de revista patronal, para julgar improcedente a reclamação trabalhista em que se postulavam a incorporação da gratificação de função e as diferenças salariais daí decorrentes, restabelecendo a sentença, no particular.

Contra essa decisão insurge-se a autora. Ressalta que o exercício da gratificação de função se deu no período de 31/12/1993 a 2/8/2018, tendo sido preenchido o requisito dos 10 anos de efetivo exercício em 2003, antes, portanto, da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017. Afirma que não se pode atribuir efeito retroativo à referida lei, em observância ao princípio de direito intertemporal (tempus regit actum), a teor do disposto no artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Assevera, ainda, que, segundo entendimento desta Corte superior, a Lei nº 13.467/2017 não deve atingir as situações pretéritas – não apenas as consolidadas, mas também as iniciadas sob a égide da lei revogada –, como no presente caso, em que a autora recebeu a função gratificada por mais de 24 anos, perfazendo os 10 anos necessários à incorporação no final de 2003. Reputa demonstrada a contrariedade à Súmula nº

 372, I, do TST, bem como transcreve arestos para confronto de teses.

O modelo transcrito no apelo, às fls. 691/692, oriundo da 7ª Turma, erige o seguinte fundamento jurídico na ementa (grifos acrescidos):

RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI 13.467/2017. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA SUPRESSÃO POR JUSTO MOTIVO. ESTABILIDADE FINANCEIRA. DIREITO ADQUIRIDO. CONTRARIEDADE À SÚMULA Nº 372 DO TST. IRRETROATIVADADE DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA DA CAUSA CONSTATADA. A discussão dos autos se refere à incorporação de funções exercidas no período de 27/01/1987 a 05/02/2017, ou seja, trata-se de situação constituída anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017. No tema em particular, esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que, para as situações constituídas anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017 (preenchimento do requisito necessário ao reconhecimento da pretensão em período anterior à novel legislação), será mantido o direito do empregado à incorporação das funções exercidas. Entendimento contrário implicaria violação da garantia constitucional da irretroatividade da lei (artigo 5º, XXXVI), que assegura proteção ao direito adquirido (artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Ou seja, tendo recebido as referidas gratificações por dez ou mais anos, considerando a data limite de 11/11/2017 (vigência da lei), deverá ser observado o entendimento contido na Súmula nº 372 do TST, vigente à época dos fatos. O verbete sumular traz consigo posicionamento firmado por esta Corte Superior - antes das alterações provenientes da Lei nº 13.467/2017 - que visou materializar o princípio da estabilidade econômica nas relações de trabalho. Tal preceito, oriundo do Direito Administrativo, representa a possibilidade de manutenção dos ganhos do empregado, quando convive, durante longo período - fixado pela jurisprudência em dez anos -, com determinado padrão remuneratório e representa exceção à regra geral de retorno ao cargo efetivo, consubstanciada no artigo 499 da CLT. Acrescente-se que nada impede que se assegure esse direito ao empregado público, pois os entes integrantes da Administração Pública devem seguir integralmente a legislação trabalhista, quanto à proteção dos servidores celetistas. No caso, a Corte Regional concluiu que, "embora o autor tenha exercido diversas funções de confiança por muito mais de dez, não faz jus à incorporação da média das gratificações percebidas em seu salário, em face do previsto no § 2º do art. 468 da CLT, entendendo assim que tal parcela antes percebida consagra-se no rol das espécies de salário-condição, pago apenas e enquanto perdurar a condição que o fundamenta". A decisão comporta reforma. Recurso de revista conhecido e provido. (RR-428-21.2017.5.06.0122, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 02/10/2020).

Observa-se, do acórdão paradigma transcrito, que, naquela hipótese, a Turma do TST entendeu que, para as situações constituídas anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017, deve ser reconhecido o direito do empregado à incorporação da gratificação correspondente às funções de confiança exercidas.

Na hipótese vertente dos autos, ao contrário, a Quarta Turma, examinando hipótese idêntica, concluiu que a autora não tem jus à incorporação da gratificação que recebia no cargo comissionado, independentemente do número de anos que o tenha exercido, ao entendimento de que o § 2º do artigo 468 da CLT superou o disposto na Súmula nº 372, I, do TST.

Num tal contexto, resulta caracterizado o dissenso de teses, acerca da aplicabilidade do artigo 468, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho às hipóteses em que configurado o requisito temporal para a incorporação da gratificação de função antes da vigência da Lei nº 13.467/2017. Plenamente atendida, assim, a diretriz consagrada na Súmula n.º 296, I, do TST.

Conheço dos Embargos, por divergência jurisprudencial.

II – MÉRITO

EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE 10 ANOS. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 372, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. DIREITO ADQUIRIDO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.467/2017.

Controverte-se nos autos acerca da aplicabilidade do artigo 468, § 2º, da CLT, introduzido no ordenamento jurídico pela Lei nº 13.467/2017 – que afasta o direito à incorporação da gratificação de função exercida pelo empregado por mais de dez anos, quando revertido ao cargo efetivo sem justo motivo –, à hipótese em que a empregada já havia implementado os requisitos contidos na Súmula nº 372, I, do TST quando da entrada em vigor do referido diploma legal (11/11/2017).

     Eis o teor do artigo 468 da Consolidação das Leis do Trabalho, após a alteração introduzida pela Lei nº 13.467/2017 (grifos acrescidos):

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

§ 1º Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

§ 2º A alteração de que trata o § 1º deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função.

No caso em tela, é incontroverso que a reclamante percebeu gratificação de função no período de 31/12/1993 a 2/8/2018, tendo sido preenchido o requisito da percepção da gratificação por dez anos em 2003 – antes, portanto, da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, circunstância que atrai a incidência da Súmula nº 372, I, do TST.

Ressalte-se que esta Corte superior tem-se posicionado no sentido de que, nas hipóteses em que os empregados completaram 10 anos de exercício da função gratificada anteriormente à entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, não se aplica o disposto no artigo 468, § 2º, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017.

Nesse sentido, observem-se os seguintes precedentes da SBDI-2 e das 8 (oito) Turmas do Tribunal Superior do Trabalho (os destaques não constam do original):

RECURSO ORDINÁRIO DO LITISCONSORTE. MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO PROFERIDA NA VIGÊNCIA DO CPC/15. INDEFERIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA PLEITEADA NA RECLAMAÇÃO TRABALHISTA BUSCANDO O RESTABELECIMENTO DO PAGAMENTO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO CONCEDIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE FINANCEIRA. INAPLICABILIDADE DO § 2º DO ART. 468 DA CLT. SÚMULA 372, I, DO TST . 1. Ato coator que indefere pedido de tutela de urgência visando o restabelecimento do pagamento do valor correspondente à gratificação de função recebida por mais de dez anos. 2. Em exame ao mérito da ação mandamental, o eg. Tribunal Regional concedeu a segurança. 3. A alteração perpetrada ao art. 468 da CLT pela Lei n° 13.467/2017, que introduziu o § 2º ao referido dispositivo, não alcança a reclamação trabalhista em curso, cujos fatos que ensejaram o indeferimento da tutela de urgência foram constituídos antes da entrada em vigor da referida lei, oportunidade em que o autor da reclamação trabalhista postulou a incorporação definitiva da gratificação de função percebida por mais de 10 anos, em conformidade com a diretriz do item I da Súmula n° 372 do TST. 4. Impossibilidade de que seja atribuído à lei efeito retroativo, em observância ao princípio de direito intertemporal tempus regit actum (art. 6º da LINDB). 5. Assim, a pretensão tem por base o disposto na jurisprudência desta Corte - Súmula nº 372. 6. Dessa forma, evidenciada a presença dos elementos que justificam o deferimento da tutela de urgência requerida na ação originária, conforme disposto no artigo 300 do CPC/2015, conclui-se que a concessão da segurança não importou em ofensa ao artigo 468, § 2o, da CLT, impondo-se a manutenção da decisão recorrida. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (RO-21667-45.2019.5.04.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 21/08/2020).

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DITO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.105/2015. 1. RESTABELECIMENTO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INDEFERIMENTO NA RECLAMAÇÃO TRABALHISTA ORIGINÁRIA. CONCESSÃO PARCIAL DA SEGURANÇA. RECEBIMENTO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO POR MAIS DE DEZ ANOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº. 13.467/17. DIREITO ADQUIRIDO. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. Esta Corte Superior tem firmado sua jurisprudência no sentido de que o obreiro que já completara dez anos de exercício em função gratificada no início da vigência da Lei nº. 13.467/17, se descomissionado sem justo motivo, tem direito a continuar percebendo a gratificação, tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. Ademais, tem-se consolidado o entendimento de que não se configura justo motivo, apto a autorizar os descomissionamentos com redução de remuneração, a mera reestruturação nas dependências do empregador. II. No caso presente, o Tribunal Regional reconheceu a violação do direito líquido e certo do impetrante, reclamante na ação principal, na decisão proferida pelo magistrado que indeferiu o reestabelecimento liminar da gratificação de função percebida pelo obreiro há mais de dez anos quando da entrada em vigor da Lei nº. 13.467/17. III. O banco recorrente pretende a reforma da decisão regional sob os argumentos de que a nova redação do art. 468 da CLT, inaugurada pela Lei nº. 13.467/17, teria esvaziado por completo a Súmula nº 372, I, deste Tribunal Superior do Trabalho, e que a aplicação do referido dispositivo legal deveria se dar de forma imediata e retroativa. IV. Ora, considerando-se que o reclamante completara o decênio no exercício da função gratificada em 17.10.2015, e que a Lei nº. 13.467/17 entrou em vigor somente em 11.11.2017, em virtude do princípio da estabilidade financeira, deve ser mantido o acórdão recorrido que aplicou o entendimento firmado na Súmula 372, I, do TST ao caso vertente, sob o fundamento de violação de direito adquirido pelo impetrante (art. 5º, XXXVI, da Constituição da República). V. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento. (RO-248-12.2019.5.06.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 15/05/2020).

AGRAVO INTERNO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO EXERCIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. DIREITO ADQUIRIDO. TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA CONFIGURADA. Verificado que o debate travado nos autos - "incorporação da gratificação de função percebida por mais de 10 anos, alteração legislativa, direito adquirido" - não é pacífico entre as Turmas que compõem esta Corte Superior, e, ainda, abarca questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista, é prudente o reconhecimento da transcendência jurídica da causa, nos termos do art. 896-A, § 1.º, IV, da CLT. Agravo conhecido e provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO EXERCIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. DIREITO ADQUIRIDO. O Regional, verificando que o reclamante recebeu gratificação de função por mais de dez anos, adotou como razão de decidir a ratio contida no item I da Súmula n.º 372 desta Corte. Na hipótese, os requisitos para o recebimento do direito postulado foram preenchidos em período anterior à vigência da Lei n.º 13.467/17, razão pela qual as inovações legislativas não se aplicam ao caso em comento, estando o direito incorporado ao patrimônio jurídico do autor. Agravo de Instrumento conhecido e não provido. (Ag-ED-AIRR-2022-71.2017.5.11.0012, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 04/08/2021).

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. INTEGRAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO RECEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE FINANCEIRA. INAPLICABILIDADE DO § 2º DO ART. 468 DA CLT. SÚMULA 372, ITEM I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (SÚMULA 333 DO TST). Pelo que se extrai do acórdão recorrido, a reclamante exerceu funções gratificadas desde julho de 2004, evidenciando que, quando do advento da Lei 13.467/2017, já havia completado mais de dez anos do recebimento da gratificação de função. Dessa forma, a questão deve ser solucionada de acordo com a legislação em vigor naquela época, ou seja, levando-se em consideração o disposto no art. 468 da CLT, sem a introdução do § 2º, e na Súmula 372, I, do TST. O acórdão recorrido apresenta-se em total consonância com entendimento pacificado por este Tribunal Superior. Incidência da Súmula 333 do TST. Não merece ser provido agravo de instrumento que visa a liberar recurso que não preenche os pressupostos do art. 896 da CLT. Agravo de instrumento não provido. (AIRR-100183-74.2018.5.01.0040, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, DEJT 26/02/2021).

AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO - PERCEPÇÃO POR MAIS DE DEZ ANOS - SUPRESSÃO - AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE. A ação diz respeito a fatos ocorridos antes da Lei nº 13.467/2017, que não retroage para alcançar situações anteriores à sua vigência. Na hipótese de exercício de função gratificada por período superior a 10 anos, é vedada a sua supressão ou redução, salvo se comprovada a justa causa, em observância aos princípios da estabilidade econômico-financeira e da irredutibilidade salarial (Súmula 372 do TST). Agravo conhecido e desprovido. (Ag-AIRR-1888-28.2018.5.22.0101, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 28/05/2021).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEI Nº 13.467/2017. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. EXERCÍCIO POR MAIS DE DEZ ANOS. INCORPORAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. NÃO PROVIMENTO. É pacífico o entendimento desta Corte Superior no sentido de não ser possível ao empregador suprimir gratificação percebida pelo empregado pelo período de dez anos, ou mais, sob pena de ofensa ao princípio da estabilidade financeira do trabalhador, não existindo restrição quanto ao exercício da função gratificada, se de forma ininterrupta ou intercalada, bastando que o empregado tenha exercido o referido encargo por, no mínimo, dez anos, para que seja vedada a supressão da parcela. É entendimento desta colenda Corte Superior também que o justo motivo a que se refere a Súmula nº 372, I, não se trata de reestruturação de um departamento da empresa, pois esta traduz responsabilidade única e exclusiva do próprio empregador, em obediência ao princípio basilar da alteridade/assunção dos riscos do empreendimento, de acordo com o disposto no artigo 2º, caput, da CLT. Ressalte-se que o artigo 468, §2º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, o qual afasta o direito à incorporação da gratificação de função, não se aplica à hipótese dos autos, pois não pode retroagir para alcançar situação pretérita já consolidada sob a égide da lei antiga (Princípio do tempus regit actum), sob pena de ofensa ao direito adquirido do autor, cujo contrato de trabalho, conforme consignado no acórdão regional, é anterior a citada lei. Incidência dos artigos 5º, XXXVI, da Constituição Federal e 6º da LINDB. No presente caso, extrai-se do v. acórdão recorrido que o reclamante exerceu diversas funções de confiança, de forma intercalada, cujos períodos somados perfazem mais de 10 anos. Registrou-se, ainda, que a reestruturação dos cargos da instituição bancária não é considerada justo motivo a afastar a pretensão do reclamante à percepção da gratificação de função. Assim, estando a decisão em sintonia com o entendimento deste Tribunal, o processamento do apelo esbarra nos óbices da Súmula nº 333 e do artigo 896, § 7º, da CLT, suficientes a afastar a transcendência da causa. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR - 711-90.2016.5.06.0021, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/09/2019).

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR PERÍODO SUPERIOR A DEZ ANOS. INCORPORAÇÃO DEVIDA. IMPLEMENTO DA CONDIÇÃO ANTES DA REFORMA TRABALHISTA. NÃO APLICAÇÃO DO ART. 468, §2º, DA CLT. APLICAÇÃO DA SÚMULA 372, I, DO TST. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Discute-se a aplicabilidade do art. 468, § 2º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, à hipótese na qual o empregado já havia implementado os requisitos contidos na Súmula nº 372, I, do TST quando da entrada em vigor do referido diploma legal (11/11/2017). Trata-se de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista, o que evidencia a transcendência jurídica da matéria, autorizando o exame dos demais pressupostos do recurso de revista. No caso dos autos, o e. TRT, com base no conjunto fático probatório dos autos, consignou ter restado demonstrado o exercício de função gratificada por mais de 10 anos. Assim, em que pese a transcendência reconhecida, o artigo 468, § 2º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, o qual afasta o direito à incorporação da gratificação de função, não se aplica à hipótese dos autos, posto que o requisito à incorporação, qual seja, mais de 10 anos no exercício da função gratificada, já havia sido implementado antes de 11/11/2017, não podendo retroagir para alcançar situação pretérita já consolidada sob a égide da lei antiga, sob pena de ofensa ao direito adquirido do autor. Desta maneira, a decisão regional está em consonância com a jurisprudência desta Corte, firme no sentido de que o item I da Súmula nº 372/TST não faz a exigência de que o empregado exerça a função gratificada de forma ininterrupta, tampouco a de que o exercício ocorra na mesma função, bastando, face o princípio da estabilidade financeira, a efetiva percepção de gratificação de função por 10 (dez) ou mais anos. Precedentes. Ademais, tal entendimento é aplicável aos empregados da ECT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Precedentes. Nesse contexto, em que pese a transcendência jurídica reconhecida, deve ser desprovido o agravo. Agravo não provido. (Ag-AIRR-10435-62.2017.5.18.0082, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/05/2021).

II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. LEI Nº 13.467/2017. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PERCEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. SUPRESSÃO. IMPOSSIBILIDADE. JUSTO MOTIVO A QUE ALUDE A SÚMULA N° 372, I, DO TST NÃO CONFIGURADO. FATOS ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. Os fatos constitutivos relativos à percepção da gratificação por período superior a dez anos ocorreram em data anterior à vigência da Lei 13.467/2017. Dessa forma, a questão deve ser solucionada de acordo com a legislação em vigor à época, ou seja, levando-se em consideração o disposto no art. 468 da CLT - sem a introdução do § 2º - e na Súmula nº 372, I, do TST. Nos termos da Súmula nº 372, I, do TST, "percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira". No caso é incontroversa a percepção da gratificação de função pelo reclamante por mais de dez anos. Contudo, o TRT concluiu que o processo de reestruturação interna da reclamada configuraria justo motivo para a reversão do empregado ao seu cargo efetivo sem a continuidade do pagamento da referida gratificação. Esta Corte tem entendido que a mera reestruturação interna da reclamada, não configura o justo motivo a que se refere o item I da Súmula nº 372 do TST. O justo motivo a que se refere a Súmula 372 do TST está relacionado à existência de conduta faltosa praticada pelo empregado, e não à reversão ao cargo efetivo determinada pelo empregador no uso do seu poder diretivo. Julgados. Recurso de revista a que se dá provimento. (RR-102477-05.2016.5.01.0482, 6ª Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 07/05/2021).

RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO RECEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS - ESTABILIDADE FINANCEIRA - IRRETROATIVADADE DA LEI Nº 13.467 DE 2017 - DIREITO ADQUIRIDO - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA (alegação de violação aos artigos 5º, XXXV e XXXVI, 7º, VI, da Constituição Federal e 6º da LINDB, por contrariedade à Súmula 372, I e II, do TST e por divergência jurisprudencial). Tratando-se de recurso de revista interposto em face de decisão regional que analisou questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista, revela-se presente a transcendência jurídica da causa, a justificar o prosseguimento do exame do apelo. Cinge-se a controvérsia dos autos sobre a possibilidade de incorporação da gratificação de função exercida pelo empregado no período de 01/10/1993 até 03/02/2019. Verifica-se, portanto, que a problemática envolve o direito intertemporal em face do advento da Lei nº 13.467/17, que introduziu o § 2º ao artigo 468 da Consolidação das Leis do Trabalho. Por ser o contrato de trabalho um pacto de trato sucessivo, a discussão dos autos envolve a possibilidade da lei nova gerar efeitos sobre os fatos ocorridos e consolidados antes da sua vigência, o que implica a análise do direito adquirido. Nessa perspectiva, verifica-se que o contrato celebrado entre empregado e empregador, quando consolida a aquisição de direito decorrente de situação pretérita constituída sob a égide da lei antiga, já aperfeiçoou o direito no passado, razão pela qual não há que se pensar em expectativa de direito, mas sim em direito adquirido. No presente caso, a causa se reporta à situação constituída anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017 (preenchimento do requisito necessário ao reconhecimento da pretensão em período anterior à novel legislação), consoante se verifica do cenário fático descrito na decisão de origem. Nota-se que o empregado, na data de 11 de novembro de 2017, início de vigência da Reforma Trabalhista, já implementava as condições para a incorporação da gratificação, de modo que a supressão desta, não enseja a aplicação da reforma, mas sim o entendimento contido na Súmula nº 372 do TST (o qual, interpretando a legislação trabalhista, observa os princípios da estabilidade econômico-financeira e da irredutibilidade salarial), aplicada à época dos fatos, em observância a garantia constitucional da irretroatividade da lei (artigo 5º, XXXVI), que assegura proteção ao direito adquirido (artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). No mesmo sentido são os precedentes desta 7ª Turma e da SBDI-II desta Corte. Ultrapassada esta questão, cabe referir que esta Corte tem entendido que o valor da aludida gratificação que deve ser incorporada ao salário é obtido pela média ponderada dos valores das gratificações percebidas em período superior a dez anos. Precedentes. Ademais, esta Corte também entende que, caso o empregado passe a exercer nova função comissionada após ter um valor de gratificação incorporado ao seu salário, não terá direito ao pagamento cumulativo dos valores, porquanto ausente previsão legal para tanto ou mesmo entendimento jurisprudencial nesse sentido e também porque tal cumulação acaba por desvirtuar a finalidade de conservação do padrão remuneratório do trabalhador, proporcionando o seu enriquecimento ilícito. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. (RR-170-85.2019.5.06.0010, 7ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 14/05/2021).

AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. EXERCÍCIO POR MAIS DE DEZ ANOS. PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. SÚMULA Nº 372, I, DO TST. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. Conforme destacado na decisão agravada, deneguei seguimento ao agravo de instrumento em recurso de revista por ausência de transcendência da causa em relação à matéria impugnada, nos moldes do artigo 896-A da CLT. Contudo, a reforma trabalhista promovida pela Lei nº 13.467/2017 alterou de forma expressiva a questão alusiva à incorporação da gratificação e gerou sensíveis debates acerca da aplicação do entendimento sedimentado na Súmula nº 372 do TST, inclusive no tocante ao período contratual anterior à vigência da norma em referência, tornando prudente o reconhecimento da transcendência jurídica, dado o caráter inédito da discussão. Não obstante, é cediço que as alterações legislativas introduzidas na Norma Celetista não atingem situações já consolidadas sob a égide da lei anterior. No caso, o Regional manteve a sentença que determinou a incorporação da função de confiança ante a comprovação do exercício de funções comissionadas por prazo superior a dez anos em período anterior à vigência da Lei nº 13.467/2017, sendo perfeitamente aplicável à hipótese dos autos o entendimento pacificado pelo item I da Súmula nº 372 desta Corte. Precedente da SDI-2. Assim, por fundamento diverso, fica mantida a decisão agravada. Agravo conhecido e não provido. (Ag-AIRR-48-61.2020.5.23.0108, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 02/07/2021).

Como ressaltei na Sessão de julgamento:

(...) o que se discute no presente caso é a incorporação da gratificação de função percebida por mais de dez anos, cujo requisito para a aplicação da tese da estabilidade financeira implementou-se antes do advento da Lei n.º 13.467/17. Há anotação na instância ordinária de que a reclamante percebeu a gratificação por vinte e sete anos. O processo foi julgado pela egrégia 4.ª Turma, que conheceu do recurso de revista empresarial, por violação dos arts. 5.º, II, da Constituição da República, 468, § 2.º, da CLT, e, no mérito, deu-lhe provimento, basicamente com o entendimento de que, na hipótese, não se aplicaria o princípio da irretroatividade da lei superveniente, considerando que o entendimento consagrado na Súmula n.º 372 do TST origina-se de interpretação baseada em analogia. Daí a conclusão da egrégia Turma no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso. (...) Conheço do recurso por dissenso jurisprudencial e, no mérito, Sr.ª Presidente, entendo, com a devida vênia da egrégia Turma, que houve a percepção da gratificação por mais de dez anos - os dez anos foram implementados em 2003, ou seja, quatorze anos antes da edição da Lei n.º 13.467/17. Logo, a aplicação da lei nova, em prejuízo desse direito adquirido e consagrado na jurisprudência deste Tribunal Superior, contraria, sim, o princípio da irretroatividade e da proteção ao direito adquirido, valendo lembrar que a jurisprudência é fonte de direito e que, como relatado pela Turma, o leading case que ensejou a edição da Súmula n.º 372, da lavra do saudoso Ministro Orlando Teixeira da Costa, é de 1993, ou seja, trata-se de jurisprudência estabelecida e inquestionada ao longo de décadas neste Tribunal Superior. Vale a pena também ressaltar que o voto da Turma consigna, de forma genérica, a justificativa da então chamada Reforma Trabalhista, em face do "perigo do crescente ativismo judiciário que vinha tomando conta da jurisprudência de nossas Cortes Trabalhistas e especialmente do TST", e, repito, isso em relação ao entendimento adotado em 1993. Data venia, aplicação de princípios não se confunde com ativismo judiciário. Na verdade, o Tribunal Superior do Trabalho, em respeitabilíssima composição, concluiu pela proteção da estabilidade financeira, fixando o prazo de dez anos como o prazo razoável para a incorporação desse direito à gratificação percebida pelo empregado. No sentido, portanto, do entendimento de que a aplicação da lei nova encontra limites no direito adquirido e, por isso, não pode retroagir para prejudicá-lo, transcrevo dois precedentes da SDI-2: um de 2020, da lavra do Ministro Alexandre Agra Belmonte; e, outro, também de 2020, da lavra do Ministro Evandro Pereira Valadão. Também arestos de sete [rectius: oito, em face do precedente da Primeira Turma, da lavra do Ministro Luiz José Dezena da Silva, transcrito acima] Turmas do Tribunal Superior do Trabalho, todos recentes: Ministra Delaíde Miranda Arantes, 2.ª Turma, de 2021; Ministro Alberto Bresciani, 3.ª Turma, de 2021; Ministro Caputo Bastos, 4.ª Turma, de setembro de 2019; Ministro Breno Medeiros, 5.ª Turma, de maio de 2021; Ministra Kátia Magalhães, 6.ª Turma, de maio de 2021; Ministro Renato de Lacerda Paiva, 7.ª Turma, de maio de 2021; e, por fim, Ministra Dora Maria da Costa, 8.ª Turma, de julho de 2021. Portanto, Sra. Presidente, forte no princípio da proteção do direito adquirido e da irretroatividade das leis e prestigiando a jurisprudência que prevalece por décadas nesta Corte Superior, conheço do recurso de embargos e, no mérito, dou-lhe provimento para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional, que condenou a reclamada à incorporação da função gratificada à remuneração da reclamante desde a data da dispensa da função.

Peço vênia ao Exmo. Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, que me honrou com voto convergente, para transcrever, incorporando à minha fundamentação, as densas razões aduzidas por S. Exa. (os destaques são meus):

(...) Eu gostaria de trazer um escólio muito interessante da doutrina; uma doutrina mais moderna sobre esse tema que está implícito no art. 5.º da Constituição Federal e tão preconizado nos nossos julgamentos, que é o princípio da segurança jurídica. Diz o Professor Antônio Cortez que, tradicionalmente, a filosofia do Direito reconhece duas dimensões distintas ao princípio da segurança jurídica: a segurança do Direito, certeza jurídica, e a segurança por meio do Direito, segurança efetiva. Nessa linha – diz o professor –, pensamos que é possível distinguir três tipos de segurança: segurança por meio das normas, segurança por meio da congruência da atuação dos sujeitos jurídicos e, ainda, a segurança efetiva dos bens e interesses das pessoas e comunidade. Essa função de estabilização de expectativas exige normatividade, portanto, certa indiferença em face das contingências para o futuro. O Direito deve definir com o possível rigor a moldura de comportamento de forma a gerar confiança e reduzir os custos inerentes à incerteza, incluindo os custos para a liberdade. Dentre essas três, só nos interessa uma: a congruência da atuação dos sujeitos jurídicos. E a ela ele define da seguinte maneira: a segurança logra-se também por outros meios que são mais congruentes com a ideia de que o Direito não pode ser apenas constituído por normas prévias fixas, mas também por decisões de conteúdo, ainda indeterminado, que nem por isso deixam de ser legítimas. A certeza jurídica é sempre, ainda que em grau variável, uma certeza flexível. Ela não pode decorrer apenas da existência de normas garantísticas. Exige princípios amplos de proteção da confiança e da estabilização de expectativas. Por que fiz questão de me referir ao Professor Antônio Cortez, um doutrinador da filosofia do Direito e da teoria do Direito? Porque estamos tratando, além de uma questão de Direito intertemporal, da constituição de uma situação jurídica absolutamente estável no tempo. Essa questão relativa à estabilidade econômica surge na década de 70, até com um livro famoso do Professor Antero de Carvalho. Desde a década de 70, o Tribunal Superior do Trabalho sustenta a estabilidade econômica. E agora, a partir da edição da lei, pretende-se dar um efeito retroativo para desconstituir a situação jurídica que as partes cumpriram espontaneamente em decorrência da fixação e da estabilização da jurisprudência do Tribunal Superior. Quer dizer, o comportamento da parte, naquela altura, sim. Existe esse referencial na súmula. Vou cumprir. Ainda que ele retorne ao cargo efetivo, ele continuou com a sua estabilidade. O que estamos dizendo agora? Nem essas situações passadas estariam mais garantidas porque houve uma lei agora e se é súmula persuasiva, estamos determinando que nada do que foi do passado deveria ser cumprido. Portanto, pedindo vênia, acompanho o voto do eminente Ministro Relator.

Da mesma forma, e com igual pedido de vênia, transcrevo e adoto os brilhantes fundamentos declinados pelo Exmo. Ministro Augusto César Leite de Carvalho (os grifos foram acrescidos) :

(...) Parece-me que a divergência – se me permite o Ministro Alexandre – procura desautorizar a própria Súmula n.º 372. A divergência se abre não em relação a direito adquirido propriamente, mas aos fundamentos da Súmula n.º 372 do Tribunal Superior do Trabalho, que é uma súmula que, não obstante se tenha inspirado, em determinado momento, em normas de Direito Público que asseguravam a estabilidade econômica de servidores que recebiam gratificação de função por mais de dez anos, na verdade, ela contemporiza uma regra – como disse há pouco o Ministro Philippe, vem desde a década de 70 – que, a partir da leitura do art. 457 da CLT, compreende que todas as parcelas, que são parcelas pagas pelo empregador e que se tornam iterativas, habituais, incorporam-se ao salário. E essa gratificação de função, que gratificação propriamente não seria, mas essa gratificação, assim chamada gratificação de função, quando é paga por mais de dez anos... Neste caso, há uma contemporização, e essa contemporização se dá porque, tanto no serviço público quanto na empresa privada, a investidura em cargo comissionado é sempre uma investidura precária, mas isso não alcança a estabilidade econômica, a preservação do padrão salarial. Essa é a nossa jurisprudência. Não está apenas na Súmula n.º 372. Isso tem referência, isso faz alusão, na verdade, a todas as parcelas salariais que se tornam habituais; todas as parcelas remuneratórias, que se tornam habituais, sendo pagas pelo empregador, passam a se constituir salário. A jurisprudência contemporizou em determinado momento que, neste caso, especificamente, haveria necessidade de se aguardar dez anos, como na Súmula n.º 76 que se falava em dois anos. Depois, a Súmula n.º 291, que revogou a Súmula n.º 76, trata de um ano. Não há previsão legal específica. Aplica-se, por analogia, a Lei n.º 5.811/72. Penso que, se desautorizarmos hoje a Súmula n.º 372, na verdade, estaremos colocando em cheque, em debate, toda essa construção jurisprudencial que leva em consideração a habitualidade para que se entenda incorporada uma parcela que, paga pelo empregador, tornou-se habitual. Eu pediria vênia até ao Ministro Lelio para dizer que, se há um direito exigível e que se tornou exigível antes da Lei n.º 13.467/17, esse direito implica um padrão salarial mais elevado para além da violação do art. 5.º, XXXVI, da Constituição. Teríamos também a possível, virtual e potencial violação do art. 7.º, VI, da Constituição, porque não assegurar esse padrão salarial que esse trabalhador conquistou pelo fato de ele estar a exercer uma função de confiança por mais de dez anos, significa reduzir o seu salário em detrimento da garantia constitucional. Então, pedindo vênia ao Ministro Alexandre Ramos e àqueles que eventualmente seguem na mesma linha, a minha compreensão é de que a jurisprudência citada pelo Ministro Lelio, oriunda de sete das oito Turmas do Tribunal Superior do Trabalho, caminha bem no sentido de entender que há, sim, direito adquirido. Acompanho S. Ex.ª, portanto.

Peço vênia, outrossim, para incorporar à minha fundamentação, o percuciente e judicioso voto do Exmo. Ministro José Roberto Freire Pimenta (os destaques foram acrescidos):

Sr.ª Presidente, este caso é muito importante, por razões óbvias (...) é um caso relativamente recente, de 2020, em que se adotou o entendimento de que não haveria direito adquirido aqui porque a Lei n.º 13.467/17 teria apenas interpretado os dispositivos legais anteriores, e esse direito da reclamante seria de natureza meramente jurisprudencial nascida da aplicação de uma súmula de natureza persuasiva. Só quero salientar que este é um excelente caso para se discutir o alcance do direito adquirido, lembrando o que o eminente Ministro Lelio já disse e consta de sua ementa: essa reclamante completou o requisito dos dez anos que a nossa Súmula n.º 372, item I, pacificamente assentou como suficiente para ensejar a impossibilidade da perda do valor salarial da gratificação de função nos casos de reversão de que trata o art. 469 da CLT. Ela completou esse requisito em 2003 e recebeu essa gratificação de função, no caso concreto, de 1993 a 2018, sendo que, em 2003, segundo o nosso entendimento jurisprudencial de aplicação da lei e das normas jurídicas aplicáveis e princípios também, são normas jurídicas. Não há nenhuma dúvida quanto a isso. Então, de 2003 em diante, esse direito se incorporou ao patrimônio jurídico da reclamante e ele foi cumprido, ele continuou sendo respeitado pela empresa reclamada até 2 de agosto 2018. A mudança da lei pelo novo § 2.º, acrescentado pela Reforma Trabalhista ao art. 469, ocorreu a partir de 11 de novembro de 2017. Ainda assim, o empregador continuou pagando essa gratificação à reclamante até agosto do ano seguinte, e suprimiu. Se essa situação não configura situação jurídica consolidada, direito adquirido constitucionalmente protegido até contra a lei nova, sinceramente, não sei mais o que é direito adquirido, não sei mais o que é situação jurídica consolidada constitucionalmente protegida, com todas as vênias. Esse não é só o meu entendimento; é o entendimento de sete [rectius, oito] das Turmas, segundo os precedentes trazidos pelo Ministro Lelio Bentes Corrêa, a quem homenageio pelo seu profundo voto como Relator. Também acrescento os fundamentos muito bem expostos, adiro aos fundamentos do Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello. A Ministra Dora também falou da situação juridicamente consolidada, e o Ministro Augusto, agora, invocando também o princípio da irredutibilidade do salário. Essa pessoa recebeu os salários acrescidos da gratificação de função de 1993 a 2018 e, a partir de 2003, o nosso entendimento jurisprudencial, aplicando a lei e a Constituição, era no sentido de que não poderia mais ser retirado. Não criamos, data venia, essa situação. É preciso dizer em alto e bom som que a lei da Reforma Trabalhista, neste caso, não foi meramente interpretativa; ela retirou um direito que já era pacificamente respeitado pelo ordenamento jurídico brasileiro e, como lembrou muito bem o Ministro Lelio, a jurisprudência também é fonte do Direito. Essa é exatamente a teoria dos precedentes, que foi incorporada expressamente ao nosso ordenamento jurídico pelo legislador processual comum, em 2015, com aplicação subsidiária ao processo do trabalho. Então, por tudo isso, peço todas as vênias à divergência para acompanhar o eminente Relator.

Oportuno, ainda, transcrever a lúcida fundamentação declinada pelo Exmo. Ministro Breno Medeiros, que incorporo a este acórdão, com a devida vênia (os grifos são meus):

(...) Eu só gostaria de acrescentar - e acho que isso é importante - pelo voto do Ministro Vistor, em que S. Ex.ª citou a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, dispõe o art. 6.º: "A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada". E se estabelece no § 2.º o seguinte: "Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer". Parece-me que não havia dúvida nenhuma de que esse direito poderia ser exercido antes da vigência da lei trabalhista, da Reforma Trabalhista. Então, ele insere e coloca: "(...) como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem". Parece, sem dúvida nenhuma, que são dez anos estabelecidos na súmula. Esse era o direito exercido que foi feito e reconhecido pelo Judiciário Trabalhista, como muito bem colocado há muitos anos. Então, parece-me que estamos realmente diante do direito adquirido. Somente com esse adendo, peço todas as vênias ao Ministro Vistor para acompanhar o Relator.

Ante o exposto, dou provimento ao Recurso de Embargos interposto pela reclamante para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional, que condenou a reclamada à incorporação da função gratificada à remuneração da reclamante desde a data da dispensa da função.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Recurso de Embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional, que condenou a reclamada à incorporação da função gratificada à remuneração da reclamante desde a data da dispensa da função, vencido o Exmo. Ministro Alexandre Luiz Ramos.

Brasília, 9 de setembro de 2021.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Lelio Bentes Corrêa

Ministro Relator

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