TST - INFORMATIVOS 2019 2019 200 - 02 de agosto

Data da publicação:

Acordãos na integra

Luiz Philippe Vieira de Mello Filho - TST



Estabilidade provisória. Cipeiro. Demissão após o registro da candidatura, mas antes da eleição posteriormente anulada.



RECURSO DE REVISTA - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Deixo de apreciar a presente arguição de nulidade em face da possibilidade de julgamento favorável à parte a quem interessaria a declaração de nulidade, nos termos do art. 249, § 2º, do CPC/73.

RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/73 E ANTERIORMENTE À ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 13.015/2014 – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – EMPREGADO DEMITIDO APÓS O REGISTRO DE SUA CANDIDATURA PARA A CIPA MAS ANTERIORMENTE À ELEIÇÃO EM VIRTUDE DE ANULAÇÃO DA ELEIÇÃO – CONDUTA OBSTATIVA DE DIREITO.

1. É incontroverso nos autos que a reclamante candidatou-se a integrar a CIPA e que a eleição realizada em 16/6/2009 foi anulada por decisão da comissão eleitoral em virtude de irregularidades havidas no dia da eleição, como, por exemplo, a ausência do quórum de 50% dos empregados da reclamada, além da denúncia de que as urnas teriam ficado desguarnecidas de supervisão e controle, permitindo-se que os empregados votassem quantas vezes quisessem. É incontroverso, ainda, que a reclamante foi demitida sem justa causa em 11/9/2009 e que a nova eleição para a CIPA ocorreu em junho de 2010.

2. A reclamante, ao registrar sua candidatura a membro da CIPA, tinha a legítima expectativa de participar do processo eleitoral até o seu desfecho. Surgidas intercorrências no curso do processo eleitoral – o que é natural e previsível – deveriam elas ter sido superadas pela comissão eleitoral a fim de que o processo eleitoral tivesse seguimento e chegasse a bom termo. Registre-se que a comissão eleitoral é integrada por trabalhadores indicados pelos empregados e pelo empregador e o seu âmbito de atuação é o próprio ambiente de trabalho. Neste contexto, a conduta patronal de demitir a reclamante, logo após a anulação da eleição e antes mesmo que o processo eleitoral pudesse ser retomado, configurou prática obstativa de aquisição de direito, conforme previsto no art. 129 do Código Civil. Trata-se, ainda, de inequívoco rompimento da boa-fé objetiva, pois a expectativa despertada na reclamante, de participar do processo eleitoral a membro da CIPA até a proclamação do resultado, encontra respaldo no art. 422 do Código Civil, que prevê o dever de as partes contratantes agirem umas com as outras com lealdade e transparência, respeitando os legítimos interesses e expectativas que naturalmente defluem das várias situações surgidas no curso das relações contratuais mantidas entre as partes. Registre-se que a lentidão da comissão eleitoral em definir os rumos do processo eleitoral não pode afetar os direitos da reclamante. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-1351-89.2010.5.02.0482, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, dejt, 01.07.19).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1351-89.2010.5.02.0482, em que é Recorrente PAULA REGINA DIAS VIEIRA e Recorrido FORTEF ASSESSORIA E TREINAMENTO EDUCACIONAL LTDA.

O 2º Tribunal Regional do Trabalho, a fls. 165-169, denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela reclamante, porquanto não atendidos os requisitos do art. 896 da CLT.

Inconformada, interpõe agravo de instrumento a reclamante sustentando, em síntese, que a revista merecia regular processamento.

Foram apresentadas contraminuta ou contrarrazões.

Ausente o parecer do Ministério Público do Trabalho, a teor do art. 95 do RITST.

É o relatório.

V O T O

1 – CONHECIMENTO

Conheço do agravo de instrumento, eis que preenchidos regularmente os pressupostos legais para a sua admissibilidade.

2 – MÉRITO

2.1 - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/73 E ANTERIORMENTE À ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 13.015/2014 – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – EMPREGADO DEMITIDO APÓS O REGISTRO DE SUA CANDIDATURA PARA A CIPA MAS ANTERIORMENTE À ELEIÇÃO EM VIRTUDE DE SUA ANULAÇÃO PELA COMISSÃO ELEITORAL  – CONDUTA PATRONAL OBSTATIVA DE DIREITO

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário da reclamante, mantenho a sentença que indeferiu o pedido de reconhecimento da estabilidade prevista no art. 10, II, "a", do ADCT, consignando, para tanto, os seguintes fundamentos, a fls. 903-909:

III. MÉRITO III. 1 – DA GARANTIA DE EMPREGO. MEMBRO DA CIPA. ANULAÇÃO IRREGULAR DE ELEIÇÃO

A reclamante pretende a reforma da r. sentença recorrida, que indeferiu a garantia estabilitária por ela pleiteada, sustentando que ao arguir a anulação da eleição para a CIPA, como fato impeditivo do direito postulado, a ré atraiu para si o ônus respectivo, do qual não se desvencilhou satisfatoriamente, na medida em que o procedimento patronal não observou as disposições legais sobre a matéria, através da Norma Regulamentadora nº 05, do Ministério do Trabalho e Emprego.

A ré, em alegações defensivas (fls. 33/45), refutou a pretensão inicial, sustentando que a eleição realizada em 16/06/2009 foi anulada, haja vista as denúncias de irregularidades na votação, comprovadas após a apuração realizada.

Delineados os fatos mais relevantes, articulados pelas partes, observa-se que o conjunto probatório produzido nos autos não corrobora a tese inicial, quanto à estabilidade e/ou à indenização pretendidas.

Inicialmente, cabe mencionar que pela regra do artigo 10, II, a, do ADCT: "II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: a) do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato;". Portanto, embora confira estabilidade provisória ao membro da CIPA desde o registro da candidatura, a garantia prevista no dispositivo em comento dirige-se exclusivamente aos trabalhadores eleitos.

Na hipótese, a prova documental colacionada pela defesa, materializada pelo documento de fls. 37 (vol. docs.), dá conta de que a eleição foi anulada, em razão de irregularidades no certame seletivo.

In casu, a irresignação obreira cinge-se à alegação de que não observadas pela demandada, as regras estabelecidas na NR-5 retrocitada, especificamente em seu item 5.42, mencionado nas razões recursais e no documento coligido pela defesa (vol. docs. – s/nº), segundo o qual: "As denúncias sobre o processo eleitoral deverão ser protocolizadas na unidade descentralizada do MTE, até trinta dias após a data da posse dos novos membros da CIPA.". (grifei)

Ora, exsurge do acervo documental colacionado pela defesa, cujo teor não restou elidido por qualquer contraprova da reclamante, que sequer houve posse dos novos integrantes da CIPA, de cuja eleição a autora participou, para o período de 2009/2010, diante das irregularidades constatadas.

Ao mesmo tempo, permite-se observar que o requerimento colacionado à inicial (fls. 22), referente ao registro da referida Comissão, dirigido ao Delegado Regional do Trabalho, encontra-se apócrifo e sequer contou com a chancela do competente órgão para sua homologação, a fim de referendá-lo, nos moldes preconizados nos itens "C7" e "C8"1, da NR-5 acostada pela defesa, tal como representado pelo requerimento protocolado em 30/08/2010, junto ao Ministério do Trabalho (vol. docs. – s/nº), referente ao calendário anual 2010/2011. Portanto, sendo nulo o ato, tem-se que o mesmo não produz quaisquer efeitos.

Reforça o entendimento acima, a prova oral produzida nos autos, em especial o depoimento da testemunha convidada pela ré (Patrícia dos Santos G. Pita Brilhante), conforme se extrai de seu depoimento, verbis:

"presta serviços na reclamada desde maio de 2000 como secretária escolar afirmando que não votou na eleição para CIPA no ano de 2009, pois ao chegar por volta das 7h30min/8:00 horas a urna não estava na portaria, acrescentando, ainda, que a urna deveria permanecer até 19:00 horas, sendo certo que a depoente iria votar neste horário, mas a urna foi aberta pela auxiliar administrativa Karen e pela diretora administrativa a Srª Paula, reclamante, assim, em razão das irregularidades ocorridas, bem como não haver quórum mínimo, a eleição foi declarada nula, tendo sido assinado o comunicado pela depoente e pela vice-presidente Srª Mirian, em agosto do ano das eleições; afirma a testemunha que foi mantida a CIPA da eleição anterior, razão pela qual a autora não foi empossada em qualquer cargo, até porque reitera, o resultado não foi homologado; a depoente recebeu denúncias de irregularidades na votação, por essa razão chamou a Srª Mirian e tiveram a informação de que alguns funcionários votaram mais de uma vez citando por exemplo a Srª Tatiana que chegou a votar seis vezes e Srª Rosana que votou duas vezes; o termo em que decretada a nulidade da eleição foi divulgado no âmbito da empresa fixado no mural, além da portaria onde é assinalado o ponto; a urna não tinha chave, era lacrada; a depoente teve ciência dos fatos aqui narrados ao receber as informações quando estava em sua sala, buscando dirigir-se até o local em que haveria a votação, vendo que a urna não estava mais lá, retornando para a sua sala, procurando checar quem havia votado a questão das irregularidades por exemplo como os estagiários que não deveriam votar e votaram recebendo então a informação pela Srª Tatiana de que havia votado mais de uma vez; (...). (gn)

Opostamente aos detalhes expostos no depoimento acima reproduzido, o depoimento da testemunha apresentada pela obreira (Myrene Russo Coelho) revelou-se inconsistente, posto que nada comprovou acerca dos fatos articulados na peça de estreia, na medida em que seu ingresso, perante a reclamada, ocorreu somente em julho/2009, portanto, em data posterior à realização da eleição (junho/2009), consoante se verifica de sua oitiva:

"prestou serviços na reclamada de julho a novembro de 2009 como coordenadora de RH (...), afirmando que não participou da eleição para a CIPA no ano de 2009, vez que citada eleição, segundo palavras da depoente ‘já tinha sido feita’ não se lembrando o nome do presidente da comissão mas sabendo que a autora integrava a CIPA pois, ainda uma vez, segundo afirmado pela depoente ‘as pessoas comentavam’; indagada quais pessoas teriam dado essa informação última reportou-se em especial ‘ao pessoal da limpeza’; (...)". (destaquei)

Destarte, inexistindo nos autos prova definitiva de que a autora tenha, de fato, sido eleita como membro da CIPA, ainda que na condição de suplente (Súmula nº 339, I, do TST), para que pudesse reivindicar a garantia estabilitária ou indenização equivalente, nenhuma alteração merece o r. julgado de primeiro grau quanto ao tema.

Mantenho. 

Opostos embargos de declaração, foram eles rejeitados pelo Tribunal Regional nos seguintes termos, a fls. 919-921:

VOTO

Conheço dos embargos, por preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade.

Contudo, os presentes embargos desatendem o disposto no art. 897-A, da CLT c/c o art. 535, do CPC, por não haver omissão, contradição ou obscuridade do v. Acórdão embargado, estando a decisão assente aos requisitos ditados pelos arts. 458, do CPC, 832 da CLT e 93, IX, da Constituição Federal.

No caso em exame, depreende-se que a embargante manifesta tão-somente insatisfação com o resultado do julgamento, na medida em que não se vislumbra qualquer omissão no v. Acórdão atacado, nos termos aduzidos, porquanto emerge da manifestação da demandante, o nítido caráter revisional do julgado, na parte em que lhe foi desfavorável, tendo em vista que a matéria objeto dos presentes embargos encontra-se prequestionada, havendo pronunciamento expresso sobre o tema, consoante se denota a fls. 95/96v.

Importa notar, que a despeito de decidir contrariamente aos seus interesses, o v. Acórdão abordou toda a matéria impugnada e de modo fundamentado. Não é função do julgador analisar a demanda sob o prisma que pretende a parte. Cabe ao juiz conhecer dos pleitos e apreciá-los sob os fundamentos suficientes ao deslinde da controvérsia, expondo as razões que firmaram seu convencimento, consoante o conjunto probatório apresentado nos autos, o que, na presente hipótese, resultou no insucesso da tese da embargante, não ensejando, sob nenhum aspecto, afronta ao disposto na OJ nº 256, do C. TST.

Por tais fundamentos, outra não pode ser a conclusão senão pela rejeição da medida interposta.

A reclamante, inconformada com esta decisão, sustenta, em razões de revista, que a decisão de anular a eleição da CIPA compete apenas ao Ministério do Trabalho e Emprego, o que não ocorreu no caso dos autos, em que a referida anulação foi procedida pela própria comissão eleitoral, razão pela qual não subsiste o motivo alegado pela reclamada para validar a sua demissão sem justa causa.

Aduz que era da reclamada o ônus de provar os fatos obstativos do seu direito à estabilidade provisória, malogrando neste encargo.

Pontua que "É incontroverso nos autos que a autora se inscreveu para as eleições de CIPA e foi eleita no pleito de 16/6/2009, atendendo-se assim ao que dispõem as regras dos artigos 10, II, do ADCT e 165 da CLT. Logo, se ato seguinte a empresa resolve dispensar o reclamante, aproveitando-se de procedimento feito pela comissão eleitoral, que ao arrepio da lei, torna sem efeito as eleições, este deve ser prontamente combatido por esta especializada, haja vista não só a apuração não ter sido feita pelo próprio órgão competente, mas principalmente pelo fato de também não se atentar para a garantia insculpida no item 31.7.16.4.3, que reserva o direito dos empregados já inscritos no certame anulado de novamente concorrerem. Esse aspecto, no caso concreto, é de substancial importância. Então, se automaticamente a autora encontrava-se inscrita para o novo pleito realizado, a sua dispensa sem justa causa, ocorrida em 11/9/2009, após a anulação interna do processo eleitoral, se deu em período que o obreiro encontrava-se protegido pela regra do art. 10 do ADCT da CF/88. Por conseguinte, há que se adaptar as finalidades da garantia da estabilidade no período anterior às eleições, prevista no art. 10, inciso II, item a, ao ADCT, às exigências sociais como desdobramentos dos direitos e princípios fundamentais de dignidade e isonomia do trabalhador candidato ao cargo de representante na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA)" (fls. 162-163).

Indica violação dos arts. 10, II, "a", da Constituição Federal; 9º, 165 e 818 da CLT; e 333, II, do CPC/1973, bem como ofensa às Normas Regulamentadoras nos 5 e 31 do MTE. Transcreve, ainda, arestos para o confronto de teses.

O Tribunal Regional asseverou que a reclamante não fazia jus à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, "a", da Constituição Federal, uma vez que, não obstante o registro de sua candidatura, a eleição resultou anulada por decisão da comissão eleitoral. Concluiu o Tribunal Regional que "Destarte, inexistindo nos autos prova definitiva de que a autora tenha, de fato, sido eleita como membro da CIPA, ainda que na condição de suplente (Súmula nº 339, I, do TST), para que pudesse reivindicar a garantia estabilitária ou indenização equivalente, nenhuma alteração merece o r. julgado de primeiro grau quanto ao tema" (fls. 139).

É incontroverso nos autos que a reclamante candidatou-se a integrar a CIPA e que a eleição realizada em 16/6/2009 foi anulada por decisão da comissão eleitoral em virtude de irregularidades havidas no dia da eleição, como, por exemplo, a ausência do quórum de 50% dos empregados da reclamada, além da denúncia de que as urnas teriam ficado desguarnecidas de supervisão e controle, permitindo-se que os empregados votassem quantas vezes quisessem (registro que estas informações foram retiradas da contestação da reclamada, a fls. 52-64).

É incontroverso, ainda, que a reclamante foi demitida sem justa causa em 11/9/2009 e que a nova eleição para a CIPA ocorreu em junho de 2010 (informações colhidas da contestação da reclamada).

Esclareço que o resumo dos fatos aqui empreendido tem o objetivo apenas de situar melhor a controvérsia para a sua correta compreensão. Os fatos não são controvertidos, pois a discussão latente nos autos é jurídica.

A reclamante, ao registrar sua candidatura a membro da CIPA, tinha a legítima expectativa de participar do processo eleitoral até o seu desfecho. Surgidas intercorrências no curso do processo eleitoral – o que é natural e previsível – deveriam elas ter sido superadas pela comissão eleitoral a fim de que o processo eleitoral tivesse seguimento e chegasse a bom termo. Registro que a comissão eleitoral é integrada por trabalhadores indicados pelos empregados e pelo empregador e o seu âmbito de atuação é o próprio ambiente de trabalho.

Neste contexto, a conduta patronal de demitir a reclamante, logo após a anulação da eleição e antes mesmo que o processo eleitoral pudesse ser retomado, configurou prática obstativa de aquisição de direito, conforme previsto no art. 129 do Código Civil, verbis:

Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.

Trata-se, ainda, de inequívoco rompimento da boa-fé objetiva, pois a expectativa despertada na reclamante, de participar do processo eleitoral a membro da CIPA até a proclamação do resultado, encontra respaldo no art. 422 do Código Civil, que prevê o dever de as partes contratantes agirem umas com as outras com lealdade e transparência, respeitando os legítimos interesses e expectativas que naturalmente defluem das várias situações surgidas no curso das relações contratuais mantidas entre as partes.

Inspirada pela boa-fé objetiva, a reclamada deveria ter mantido o emprego da reclamante até a conclusão definitiva do processo eleitoral.

Ressalto que a lentidão da comissão eleitoral em definir os rumos do processo eleitoral não pode afetar os direitos da reclamante.

Nesse contexto, dou provimento ao agravo de instrumento por violação do art. 10, II, "a", do ADCT.

II – RECURSO DE REVISTA

1 - CONHECIMENTO

Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, concernentes à tempestividade (fls. 154 e 164), à representação regular (fls. 12), sendo a reclamante beneficiária da justiça gratuita (fls. 91) e custas devidas ao final.

Passo ao exame dos pressupostos intrínsecos.

1.1 - RECURSO DE REVISTA - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Deixo de apreciar a presente arguição de nulidade em face da possibilidade de julgamento favorável à parte a quem interessaria a declaração de nulidade, nos termos do art. 249, § 2º, do CPC/73.

1.2 - RECURSO DE REVISTA – RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/73 E ANTERIORMENTE À ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 13.015/2014 – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – EMPREGADO DEMITIDO APÓS O REGISTRO DE SUA CANDIDATURA PARA A CIPA MAS ANTERIORMENTE À ELEIÇÃO EM VIRTUDE DE SUA ANULAÇÃO PELA COMISSÃO ELEITORAL  – CONDUTA PATRONAL OBSTATIVA DE DIREITO

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário da reclamante e manteve a sentença que indeferiu o pedido de reconhecimento da estabilidade prevista no art. 10, II, "a", do ADCT, consignando, para tanto, os seguintes fundamentos, a fls. 903-909:

III. MÉRITO III. 1 – DA GARANTIA DE EMPREGO. MEMBRO DA CIPA. ANULAÇÃO IRREGULAR DE ELEIÇÃO

A reclamante pretende a reforma da r. sentença recorrida, que indeferiu a garantia estabilitária por ela pleiteada, sustentando que ao arguir a anulação da eleição para a CIPA, como fato impeditivo do direito postulado, a ré atraiu para si o ônus respectivo, do qual não se desvencilhou satisfatoriamente, na medida em que o procedimento patronal não observou as disposições legais sobre a matéria, através da Norma Regulamentadora nº 05, do Ministério do Trabalho e Emprego.

A ré, em alegações defensivas (fls. 33/45), refutou a pretensão inicial, sustentando que a eleição realizada em 16/06/2009 foi anulada, haja vista as denúncias de irregularidades na votação, comprovadas após a apuração realizada.

Delineados os fatos mais relevantes, articulados pelas partes, observa-se que o conjunto probatório produzido nos autos não corrobora a tese inicial, quanto à estabilidade e/ou à indenização pretendidas.

Inicialmente, cabe mencionar que pela regra do artigo 10, II, a, do ADCT: "II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: a) do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato;". Portanto, embora confira estabilidade provisória ao membro da CIPA desde o registro da candidatura, a garantia prevista no dispositivo em comento dirige-se exclusivamente aos trabalhadores eleitos.

Na hipótese, a prova documental colacionada pela defesa, materializada pelo documento de fls. 37 (vol. docs.), dá conta de que a eleição foi anulada, em razão de irregularidades no certame seletivo.

In casu, a irresignação obreira cinge-se à alegação de que não observadas pela demandada, as regras estabelecidas na NR-5 retrocitada, especificamente em seu item 5.42, mencionado nas razões recursais e no documento coligido pela defesa (vol. docs. – s/nº), segundo o qual: "As denúncias sobre o processo eleitoral deverão ser protocolizadas na unidade descentralizada do MTE, até trinta dias após a data da posse dos novos membros da CIPA.". (grifei)

Ora, exsurge do acervo documental colacionado pela defesa, cujo teor não restou elidido por qualquer contraprova da reclamante, que sequer houve posse dos novos integrantes da CIPA, de cuja eleição a autora participou, para o período de 2009/2010, diante das irregularidades constatadas.

Ao mesmo tempo, permite-se observar que o requerimento colacionado à inicial (fls. 22), referente ao registro da referida Comissão, dirigido ao Delegado Regional do Trabalho, encontra-se apócrifo e sequer contou com a chancela do competente órgão para sua homologação, a fim de referendá-lo, nos moldes preconizados nos itens "C7" e "C8"1, da NR-5 acostada pela defesa, tal como representado pelo requerimento protocolado em 30/08/2010, junto ao Ministério do Trabalho (vol. docs. – s/nº), referente ao calendário anual 2010/2011. Portanto, sendo nulo o ato, tem-se que o mesmo não produz quaisquer efeitos.

Reforça o entendimento acima, a prova oral produzida nos autos, em especial o depoimento da testemunha convidada pela ré (Patrícia dos Santos G. Pita Brilhante), conforme se extrai de seu depoimento, verbis:

"presta serviços na reclamada desde maio de 2000 como secretária escolar afirmando que não votou na eleição para CIPA no ano de 2009, pois ao chegar por volta das 7h30min/8:00 horas a urna não estava na portaria, acrescentando, ainda, que a urna deveria permanecer até 19:00 horas, sendo certo que a depoente iria votar neste horário, mas a urna foi aberta pela auxiliar administrativa Karen e pela diretora administrativa a Srª Paula, reclamante, assim, em razão das irregularidades ocorridas, bem como não haver quórum mínimo, a eleição foi declarada nula, tendo sido assinado o comunicado pela depoente e pela vice-presidente Srª Mirian, em agosto do ano das eleições; afirma a testemunha que foi mantida a CIPA da eleição anterior, razão pela qual a autora não foi empossada em qualquer cargo, até porque reitera, o resultado não foi homologado; a depoente recebeu denúncias de irregularidades na votação, por essa razão chamou a Srª Mirian e tiveram a informação de que alguns funcionários votaram mais de uma vez citando por exemplo a Srª Tatiana que chegou a votar seis vezes e Srª Rosana que votou duas vezes; o termo em que decretada a nulidade da eleição foi divulgado no âmbito da empresa fixado no mural, além da portaria onde é assinalado o ponto; a urna não tinha chave, era lacrada; a depoente teve ciência dos fatos aqui narrados ao receber as informações quando estava em sua sala, buscando dirigir-se até o local em que haveria a votação, vendo que a urna não estava mais lá, retornando para a sua sala, procurando checar quem havia votado a questão das irregularidades por exemplo como os estagiários que não deveriam votar e votaram recebendo então a informação pela Srª Tatiana de que havia votado mais de uma vez; (...). (gn)

Opostamente aos detalhes expostos no depoimento acima reproduzido, o depoimento da testemunha apresentada pela obreira (Myrene Russo Coelho) revelou-se inconsistente, posto que nada comprovou acerca dos fatos articulados na peça de estreia, na medida em que seu ingresso, perante a reclamada, ocorreu somente em julho/2009, portanto, em data posterior à realização da eleição (junho/2009), consoante se verifica de sua oitiva:

"prestou serviços na reclamada de julho a novembro de 2009 como coordenadora de RH (...), afirmando que não participou da eleição para a CIPA no ano de 2009, vez que citada eleição, segundo palavras da depoente ‘já tinha sido feita’ não se lembrando o nome do presidente da comissão mas sabendo que a autora integrava a CIPA pois, ainda uma vez, segundo afirmado pela depoente ‘as pessoas comentavam’; indagada quais pessoas teriam dado essa informação última reportou-se em especial ‘ao pessoal da limpeza’; (...)". (destaquei)

Destarte, inexistindo nos autos prova definitiva de que a autora tenha, de fato, sido eleita como membro da CIPA, ainda que na condição de suplente (Súmula nº 339, I, do TST), para que pudesse reivindicar a garantia estabilitária ou indenização equivalente, nenhuma alteração merece o r. julgado de primeiro grau quanto ao tema.

Mantenho. 

Opostos embargos de declaração, foram eles rejeitados pelo Tribunal Regional nos seguintes termos, a fls. 919-921:

VOTO

Conheço dos embargos, por preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade.

Contudo, os presentes embargos desatendem o disposto no art. 897-A, da CLT c/c o art. 535, do CPC, por não haver omissão, contradição ou obscuridade do v. Acórdão embargado, estando a decisão assente aos requisitos ditados pelos arts. 458, do CPC, 832 da CLT e 93, IX, da Constituição Federal.

No caso em exame, depreende-se que a embargante manifesta tão-somente insatisfação com o resultado do julgamento, na medida em que não se vislumbra qualquer omissão no v. Acórdão atacado, nos termos aduzidos, porquanto emerge da manifestação da demandante, o nítido caráter revisional do julgado, na parte em que lhe foi desfavorável, tendo em vista que a matéria objeto dos presentes embargos encontra-se prequestionada, havendo pronunciamento expresso sobre o tema, consoante se denota a fls. 95/96v.

Importa notar, que a despeito de decidir contrariamente aos seus interesses, o v. Acórdão abordou toda a matéria impugnada e de modo fundamentado. Não é função do julgador analisar a demanda sob o prisma que pretende a parte. Cabe ao juiz conhecer dos pleitos e apreciá-los sob os fundamentos suficientes ao deslinde da controvérsia, expondo as razões que firmaram seu convencimento, consoante o conjunto probatório apresentado nos autos, o que, na presente hipótese, resultou no insucesso da tese da embargante, não ensejando, sob nenhum aspecto, afronta ao disposto na OJ nº 256, do C. TST.

Por tais fundamentos, outra não pode ser a conclusão senão pela rejeição da medida interposta.

A reclamante, inconformada com esta decisão, sustenta, em razões de revista, que a decisão de anular a eleição da CIPA compete apenas ao Ministério do Trabalho e Emprego, o que não ocorreu no caso dos autos, em que a referida anulação foi procedida pela própria comissão eleitoral, razão pela qual não subsiste o motivo alegado pela reclamada para validar a sua demissão sem justa causa.

Aduz que era da reclamada o ônus de provar os fatos obstativos do seu direito à estabilidade provisória, malogrando neste encargo.

Pontua que "É incontroverso nos autos que a autora se inscreveu para as eleições de CIPA e foi eleita no pleito de 16/6/2009, atendendo-se assim ao que dispõem as regras dos artigos 10, II, do ADCT e 165 da CLT. Logo, se ato seguinte a empresa resolve dispensar o reclamante, aproveitando-se de procedimento feito pela comissão eleitoral, que ao arrepio da lei, torna sem efeito as eleições, este deve ser prontamente combatido por esta especializada, haja vista não só a apuração não ter sido feita pelo próprio órgão competente, mas principalmente pelo fato de também não se atentar para a garantia insculpida no item 31.7.16.4.3, que reserva o direito dos empregados já inscritos no certame anulado de novamente concorrerem. Esse aspecto, no caso concreto, é de substancial importância. Então, se automaticamente a autora encontrava-se inscrita para o novo pleito realizado, a sua dispensa sem justa causa, ocorrida em 11/9/2009, após a anulação interna do processo eleitoral, se deu em período que o obreiro encontrava-se protegido pela regra do art. 10 do ADCT da CF/88. Por conseguinte, há que se adaptar as finalidades da garantia da estabilidade no período anterior às eleições, prevista no art. 10, inciso II, item a, ao ADCT, às exigências sociais como desdobramentos dos direitos e princípios fundamentais de dignidade e isonomia do trabalhador candidato ao cargo de representante na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA)" (fls. 162-163).

Indica violação dos arts. 10, II, "a", da Constituição Federal; 9º, 165 e 818 da CLT; 333, II, do CPC/1973, bem como ofensa às Normas Regulamentadoras nos 5 e 31 do MTE. Transcreve, ainda, arestos para o confronto de teses.

O Tribunal Regional asseverou que a reclamante não fazia jus à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, "a", da Constituição Federal, uma vez que, não obstante o registro de sua candidatura, a eleição resultou anulada por decisão da comissão eleitoral. Concluiu o Tribunal Regional que "Destarte, inexistindo nos autos prova definitiva de que a autora tenha, de fato, sido eleita como membro da CIPA, ainda que na condição de suplente (Súmula nº 339, I, do TST), para que pudesse reivindicar a garantia estabilitária ou indenização equivalente, nenhuma alteração merece o r. julgado de primeiro grau quanto ao tema" (fls. 139).

É incontroverso nos autos que a reclamante candidatou-se a integrar a CIPA e que a eleição realizada em 16/6/2009 foi anulada por decisão da comissão eleitoral em virtude de irregularidades havidas no dia da eleição, como, por exemplo, a ausência do quórum de 50% dos empregados da reclamada, além da denúncia de que as urnas teriam ficado desguarnecidas de supervisão e controle, permitindo-se que os empregados votassem quantas vezes quisessem (registro que estas informações foram retiradas da contestação da reclamada, a fls. 52-64).

É incontroverso, ainda, que a reclamante foi demitida sem justa causa em 11/9/2009 e que a nova eleição para a CIPA ocorreu em junho de 2010 (informações colhidas da contestação da reclamada).

Esclareço que o resumo dos fatos aqui empreendido tem o objetivo apenas de situar melhor a controvérsia para a sua correta compreensão. Os fatos não são controvertidos, pois a discussão latente nos autos é jurídica.

A reclamante, ao registrar sua candidatura a membro da CIPA, tinha a legítima expectativa de participar do processo eleitoral até o seu desfecho. Surgidas intercorrências no curso do processo eleitoral – o que é natural e previsível – deveriam elas ter sido superadas pela comissão eleitoral a fim de que o processo eleitoral tivesse seguimento e chegasse a bom termo. Registro que a comissão eleitoral é integrada por trabalhadores indicados pelos empregados e pelo empregador e o seu âmbito de atuação é o próprio ambiente de trabalho.

Neste contexto, a conduta patronal de demitir a reclamante, logo após a anulação da eleição e antes mesmo que o processo eleitoral pudesse ser retomado, configurou prática obstativa de aquisição de direito, conforme previsto no art. 129 do Código Civil, verbis:

Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.

Trata-se, ainda, de inequívoco rompimento da boa-fé objetiva, pois a expectativa despertada na reclamante, de participar do processo eleitoral a membro da CIPA até a proclamação do resultado, encontra respaldo no art. 422 do Código Civil, que prevê o dever de as partes contratantes agirem umas com as outras com lealdade e transparência, respeitando os legítimos interesses e expectativas que naturalmente defluem das várias situações surgidas no curso das relações contratuais mantidas entre as partes.

Inspirada pela boa-fé objetiva, a reclamada deveria ter mantido o emprego da reclamante até a conclusão definitiva do processo eleitoral.

Ressalto que a lentidão da comissão eleitoral em definir os rumos do processo eleitoral não pode afetar os direitos da reclamante.

Conheço do recurso de revista por violação do art. 10, II, "a", do ADCT.

2 – MÉRITO

2.1 - ESTABILIDADE PROVISÓRIA – EMPREGADO DEMITIDO APÓS O REGISTRO DE SUA CANDIDATURA PARA A CIPA MAS ANTERIORMENTE À ELEIÇÃO EM VIRTUDE DE ANULAÇÃO DA ELEIÇÃO – CONDUTA OBSTATIVA DE DIREITO

Como corolário lógico ao conhecimento do recurso de revista por violação do art. 10, II, "a", do ADCT, dou provimento ao apelo para condenar a reclamada ao pagamento de indenização substitutiva dos direitos concernentes aos meses do período estabilitário equivalente a 24 meses da última remuneração da reclamante, correspondendo a 12 meses relativos ao exercício do mandato de membro da CIPA e 12 meses referentes ao ano seguinte ao término do mandato, conforme se apurar em liquidação de sentença.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento da reclamante e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o processamento do recurso de revista. Por maioria, conhecer do recurso de revista, por violação do art. 10, II, "a", do ADCT e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a reclamada ao pagamento de indenização substitutiva dos direitos concernentes aos meses do período estabilitário equivalente a 24 meses da última remuneração da reclamante, correspondendo a 12 meses relativos ao exercício do mandato de membro da CIPA e 12 meses referentes ao ano seguinte ao término do mandato, conforme se apurar em liquidação de sentença. Juros e correção monetária na forma da lei. Descontos fiscais autorizados, na forma da Súmula nº 368 do TST. Invertidos os ônus da sucumbência. Custas no valor de R$ 460,00 (quatrocentos e sessenta reais), calculadas sobre o valor ora arbitrado à condenação de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais). Honorários advocatícios incabíveis, porque não atendido o requisito alusivo à representação sindical previsto na Súmula nº 219, I, "a", do TST. Vencido o Desembargador Roberto Nóbrega de Almeida Filho.

Brasília, 26 de junho de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Ministro Vieira de Mello Filho

Relator

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