Data da publicação:
Acordão - TST
Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira - TST
SUCESSÃO DE EMPREGADORES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA AMBEV S.A. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. NÃO CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 896, § 1º- A, DA CLT. TRECHO INSUFICIENTE. A transcrição de trecho do acórdão que não traz todos os fundamentos adotados pelo Regional não atende ao disposto no art. 896, § 1º-A, I e III, da CLT. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.
II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. SUCESSÃO DE EMPREGADORES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
1. A teor do art. 10 consolidado, "qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seu empregados.
2. A forma aparentemente singela em que são postas as hipóteses tipificadoras da sucessão trabalhista, a despeito das críticas doutrinárias, lançadas ao longo do tempo, representa conceito jurídico indeterminado, que traduz pontos de mobilidade e de abertura do sistema para as modificações da realidade. Os tipos abertos, consistentes na "alteração da estrutura jurídica" e "mudança na propriedade", permitem que a Lei se faça mais sábia do que o Legislador, possibilitando ao aplicador a adequação da norma aos fins sociais a que se dirige (art. 8º da LINDB), em atendimento, de forma prospectiva, a fatos e valores supervenientes.
3. Diante disso, a visão hodierna que se tem da sucessão trabalhista é bastante ampla, estando compreendida no instituto qualquer situação fática que traduza alteração intra ou interempresarial, sendo irrelevante o vínculo entre sucedido e sucessor e a natureza do título que possibilitava ao titular do estabelecimento a utilização dos meios de produção nele organizados.
4. Assim, na hipótese, o fato é que houve, na prática, sucessão de empregadores, pois não houve interrupção na prestação de serviços, continuando o reclamante a laborar para a sucessora, razão pela qual se declara a responsabilidade solidária entre eles. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-ARR-502-16.2016.5.09.0126, 3ª Turma, rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, julgado em 13/10/2021).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo n° TST-ARR-502-16.2016.5.09.0126, em que é Agravante e Recorrida AMBEV S.A. e Agravado e Recorrente JULIO CESAR ZANCO e são Agravados e Recorridos J CATARINO PIRES E CIA LTDA., CRBS S.A. e LOG 20 LOGÍSTICA S.A..
O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, pelo acórdão de fls. 808/817, complementado pelo de fls. 838/840, proferido em sede de embargos declaratórios, deu provimento ao recurso ordinário da quarta reclamada e negou provimento aos apelos da segunda e da terceira rés.
Inconformados, o reclamante e a terceira demandada interpuseram recursos de revista, com base no art. 896, "a" e "c", da CLT (fls. 829/837 e 846/855).
Apenas o apelo do autor foi admitido pelo despacho de fls. 860/864.
Contrarrazões a fls. 867/875.
A terceira reclamada interpôs agravo de instrumento (fl. 876/884).
Contrarrazões a fls. 889/895 e contraminuta a fls. 896/899.
Os autos não foram encaminhados ao d. Ministério Público do Trabalho (RI/TST, art. 95).
É o relatório.
V O T O
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA AMBEV S.A.
ADMISSIBILIDADE.
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.
MÉRITO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
A ora agravante pretende a reforma da decisão regional quanto aos temas assinalados.
Entretanto, em razões de recurso de revista, não indica, ônus que lhe cabia, os trechos da decisão recorrida que consubstanciam o prequestionamento da controvérsia objeto do apelo, nos termos do § 1º-A do art. 896 da CLT com a redação da Lei nº 13.015/2014, com a seguinte dicção:
"Art. 896
a)
b)
c)
§ 1º
§ 1º-A - Sob pena de não conhecimento, é ônus da parte:
I - indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista.
...
III - expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte."
A transcrição de trecho insuficiente do acórdão, que não permite extrair todos os fatos e os fundamentos pelos quais a Corte a quo manteve a responsabilidade solidária da terceira reclamada, não atende ao disposto no art. 896, § 1°-A, I e III, da CLT.
Nesse sentido, em casos semelhantes, os seguintes precedentes:
"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. DECISÃO RECORRIDA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRESSUPOSTOS INSERTOS NO ART. 896, §1º-A, DA CLT. TRANSCRIÇÃO DE TRECHO INSUFICIENTE. Ao transcrever trecho insuficiente da decisão recorrida, que não satisfaz a exigência inserta no art. 896, §1º-A, I, da CLT, porque não contém todos os fundamentos a serem combatidos, a parte recorrente não procede ao adequado e necessário confronto analítico de que trata o inc. III do mesmo dispositivo, tornando inviável a apreciação das alegações de violação de dispositivo constitucional nos termos do §8º do art. 896 da CLT. Agravo conhecido e desprovido." (Ag-AIRR-500-72.2006.5.02.0035, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, 3ª Turma, DEJT 5.4.2019).
"AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 896, § 1º-A, I e III, DA CLT. NÃO PROVIMENTO. Nas razões do seu recurso de revista, o reclamante, conquanto se insurja contra a decisão que lhe foi desfavorável, não apresenta impugnação específica a todos os fundamentos apresentados pela egrégia Corte Regional. Ademais, realizou a transcrição de apenas um trecho do v. acórdão, o qual não traz a totalidade dos fundamentos adotados no v. acórdão que consubstancia o prequestionamento da controvérsia. Em vista do exposto, aplica-se à espécie o artigo 896, § 1º-A, I e III, da CLT. Agravo a que se nega provimento, com aplicação de multa." (Ag-AIRR-10388-48.2014.5.01.0541, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, 4ª Turma, DEJT 5.4.2019).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. TOMADOR DE SERVIÇOS. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TRECHO INSUFICIENTE. A transcrição de trecho insuficiente do v. acórdão regional, ou seja, que não abrange todos os fundamentos adotados pela c. Corte para manter a responsabilidade subsidiária do ente público, não atende ao requisito descrito pelo art.896, §1°-A, I, da CLT, bem como impede a demonstração analítica das alegadas ofensas legais e constitucionais conforme exige o art.896, § 1°-A, III, da CLT. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento." (AIRR-100794-10.2016.5.01.0036, Relatora Desembargadora Convocada Cilene Ferreira Amaro Santos, 6ª Turma, DEJT 5.4.2019).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/14. TUTELA INIBITÓRIA - HORAS IN ITINERE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DANO MORAL. TRANCRIÇÃO INSUFICIENTE E QUE NÃO ABRANGE TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. EXIGÊNCIA CONTIDA NO ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT. Deve ser confirmada a negativa de seguimento do recurso de revista, ainda que por fundamento diverso. Isso porque, a transcrição insuficiente dos capítulos do acórdão recorrido referente aos temas debatidos em seu arrazoado recursal, não cumpre com exatidão o requisito insculpido no art. 896, § 1º-A, I e III, da CLT, dado que não demonstra a viabilidade da discussão engendrada na revista por meio da adequada demonstração do prequestionamento da matéria abordada no arrazoado recursal, o que pressupõe a transcrição de todos os fundamentos adotados e o cotejamento analítico das teses veiculadas na decisão e no recurso, o que não ocorreu na espécie. Precedentes da 5ª Turma. Agravo de instrumento desprovido." (AIRR-24084-15.2014.5.24.0056, Relator Ministro Emmanoel Pereira, 5ª Turma, DEJT 22.3.2019).
"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. INDICAÇÃO DO TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA QUE CONSUBSTANCIA O PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA OBJETO DA INSURGÊNCIA RECURSAL. NECESSIDADE. Dentre as inovações inseridas na sistemática recursal trabalhista pela Lei n.º 13.015/2014, consta, expressa e literalmente, sob pena de não conhecimento do Recurso de Revista, a exigência de que a parte proceda à indicação do trecho da decisão que consubstancia o prequestionamento da matéria impugnada no Apelo. Não atendida a exigência, o Recurso não merece ser conhecido. No caso, a Recorrente não atentou para a previsão contida no dispositivo celetário acima mencionado, porquanto transcreveu uma pequena parte da decisão recorrida que não serve para identificar os fundamentos de fato e de direito dos quais se valeu o julgado a quo para resolver a controvérsia, procedimento que não se admite, à luz das exigências trazidas pela nova Lei n.º 13.015/2014. Agravo conhecido e não provido." (Ag-AIRR-20685-50.2014.5.04.0018, Relator Desembargador Convocado Roberto Nobrega de Almeida Filho, 1ª Turma, DEJT 5.10.2018).
"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 - PRESCRIÇÃO. PROMOÇÕES. DIFERENÇAS SALARIAIS. INOBSERVÂNCIA DE PRESSUPOSTO FORMAL DE ADMISSIBILIDADE PREVISTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. INDICAÇÃO DE TRECHO INSUFICIENTE À CONFIGURAÇÃO DO PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA. Nos termos do artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, é ônus da parte indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista. Constatada, no presente caso, a transcrição de trecho insuficiente à configuração do prequestionamento, por não abranger todos os fundamentos relevantes adotados pelo Tribunal Regional para decidir a controvérsia, tem-se por inviabilizado o recurso de revista. Agravo de instrumento a que se nega provimento. [...]." (ARR-678-71.2014.5.09.0091, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, 8ª Turma, DEJT 31.1.2019).
Não preenchido um dos pressupostos de admissibilidade, impossível o processamento do recurso de revista.
Mantenho o r. despacho agravado.
Em síntese e pelo exposto, conheço do agravo de instrumento e, no mérito, nego-lhe provimento.
Por tudo quanto dito, não cabe exame de transcendência.
II – RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE.
Tempestivo o apelo (fls. 10/11) e regular a representação (fl. 29 e 807), estão presentes os pressupostos genéricos de admissibilidade.
1 - SUCESSÃO DE EMPREGADORES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
1.1 – CONHECIMENTO.
Atendendo ao pressuposto do art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a parte transcreveu e destacou os seguintes trechos do acórdão (fls. 831/832):
"Assiste-lhe razão. Na petição inicial o autor narrou que foi admitido pela primeira ré (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) em 28-10-2014 na função de ajudante de motorista para realização de transporte de produtos comercializados pela segunda ré (CRBS S/A) e produzidos pela terceira ré (AMBEV S.A.). Disse que, rescindido o contrato de prestação de serviços com a primeira, a quarta ré (Log20 Logística S.A.) assumiu referido transporte de produtos, em julho de 2015. Dessa forma, o primeiro contrato de trabalho foi rescindido em 31-07-2015, sendo admitido pela quarta ré (Log20 Logística S.A.) em 1º-08-2015 e dispensado em 19-11-2015. Postulou a unicidade contratual e o reconhecimento da responsabilidade solidária das reclamadas.
A primeira ré (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) apresentou contestação (fls. 354-366) em que confirmou a rescisão do contrato de prestação de serviços com a terceira ré (AMBEV S.A.) em 31-07-2015, bem como a sua substituição pela quarta reclamada (Log20 Logística S.A.). Nesse contexto, apontou que em ‘31 de julho de 2015, todos os trabalhadores haviam cumprido o aviso prévio.’ (fl. 355), bem como que "Na prática, houve mera substituição de operador logístico, com recontratação da maioria dos funcionários da sucedida.’ (fl. 356)
A quarta reclamada (Log20 Logística S.A.), por sua vez, contestou o pedido de reconhecimento de sucessão empresarial sob o argumento de que a substituição de prestadoras de serviço em relação à tomadora não teria o condão de configurar tal sucessão.
Cumpre observar que da simples leitura da defesa da primeira ré (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) fica evidente a sustentação da tese de sucessão de empresas e a tentativa de atribuir às demais reclamadas a responsabilidade solidária, mormente porque não se defende contra as demais pretensões obreiras que dizem respeito à condenação ao pagamento de verbas trabalhistas. Não se pode atribuir a moldura da confissão para suas afirmações. Entretanto, este fato não elide a veracidade dos fatos comprovados por meio das provas colhidas.
Não deixo de considerar relevante o fato de o empregado sofrer prejuízo com o procedimento adotado, pois para ele o contrato de trabalho é único, as condições de trabalho não se alteram. A solução de continuidade gera prejuízos, porque novas condições passam a ser estabelecidas para seu contrato sem que na realidade ele sofra modificações de fato. Mas é isto que resulta do sistema de terceirização adotado e que tem sido admitido nas relações comerciais. Deixo ressalvado que individualmente consideraria correta a sentença proferida.
Dito isto, destaco que ficou incontroversa a contratação da primeira ré (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) e, logo após, da quarta (Log20 Logística S.A.) pelas segunda (CRBS S/A) e terceira (AMBEV S.A.) para prestação de serviço terceirizado na realização de entregas de bebidas (contestação à fl. 162 e contrato de prestação de serviços de fls. 302-325).
Não há controvérsia ademais em relação à admissão de mais da metade dos empregados da primeira ré pela quarta. No caso do autor, sua admissão pela quarta reclamada deu-se em 1º-08-2015, logo em seguida à sua demissão pela primeira, na mesma função anteriormente exercida de ajudante de entrega, bem como sua demissão em 19-11-2015 (carteira de trabalho à fl. 25, ficha de registro à fl. 512 e termo de rescisão do contrato de trabalho às fls. 519-520).
Está claro, então, que os ativos relacionados à atividade desenvolvida pela primeira reclamada (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) não foram transferidos à quarta (Log20 Logística S.A.), isto é, não ocorreu a transferência de um complexo empresarial na sua universalidade ou de parte significativa dos estabelecimentos destas empresas.
Conforme demonstra a ‘contra notificação extrajudicial’ (fls. 379-380), a primeira ré não chegou sequer a negociar transferência de propriedade com a quarta ré, tendo sido informada do novo operador logístico pela terceira ré (AMBEV S.A.).
Da análise deste documento, juntamente com os contratos de prestação de serviços coligidos pelas segunda (CRBS S/A) e terceira (AMBEV S.A.) reclamadas com a contestação às fls. 326-351, infere-se que a quarta (Log20 Logística S.A.) já prestava serviços àquelas e assumiria o comando da região que era de titularidade da primeira (J. Catarino Pires & Cia Ltda.).
Nesse contexto não ficou evidenciado qualquer sinal de trespasse da primeira ré para a quarta, não havendo prova suficiente nos autos que houve transferência de patrimônio apto a caracterizar a sucessão empresarial. Além disso, o fato desta haver absorvido empregados daquela, por si só, não é suficiente para caracterizar a pretendida sucessão, pois é crível que a empresa tenha se utilizado de mão de obra local para facilitar os seus serviços na nova região. Não se desincumbindo o autor do seu ônus, tendo em vista que é fato constitutivo do direito pleiteado. Também não configura a sucessão empresarial trabalhista o fato de a quarta ré ter passado a utilizar as instalações que eram usadas pela primeira, tendo em vista que isto não significa que houve a transferência de estabelecimento.
Na esfera trabalhista há sucessão quando uma pessoa adquire de outra uma empresa em seu conjunto ou parte dela, ou seja, há a transferência da unidade econômico-jurídica, como também quando ocorre modificação na estrutura jurídica da empresa (arts. 2º, § 2º, 10 e 448 da CLT).
O princípio da continuidade do contrato de trabalho faz com que o sucessor se sub-rogue nos direitos e obrigações do sucedido, passando a responder pelos encargos trabalhistas dos empregados deste, que fica isento de qualquer responsabilidade, salvo nos casos de fraude ou simulação.
Dessa forma, não ficando comprovada a transferência da unidade econômica ou de patrimônio, merece reforma a sentença para afastar o reconhecimento de sucessão empresarial e a responsabilidade da recorrente pelas verbas trabalhistas anteriores a 1º-08-2015, bem como a decisão de retificação da carteira de trabalho do autor para fins de anotação de unicidade contratual.
Fica prejudicada a apreciação dos demais tópicos recursais, pois estavam vinculados ao reconhecimento da sucessão empresarial e da responsabilidade da recorrente.
Cite-se como precedente, envolvendo as mesmas reclamadas, os julgamentos havidos nos autos de RO-0000637-28.2016.5.09.0126, de relatoria do Desembargador Aramis de Souza Silveira (acórdão publicado em 17-7-2017), de AP 0001473-68.2014.5.09.0094, de relatoria do Desembargador Aramis de Souza Silveira, DEJT de 16-08-2016 e 01483- 2015-094-09-00-6, de relatoria da Desembargadora Nair Maria Lunardelli Ramos, DEJT de 20-09-2016; e no RO n. 1496-2015-126-09-00-5, de relatoria da Desembargadora Ana Carolina Zaina, DEJT de 25-10-2016.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso para afastar o reconhecimento de sucessão empresarial e a responsabilidade da quarta ré (Log20 Logística S.A.) pelas verbas trabalhistas anteriores a 1º-08-2015, bem como a decisão de retificação da carteira de trabalho do autor para fins de anotação de unicidade contratual."
Alega o reclamante que "a quarta reclamada assumiu todos os serviços da primeira no mesmo espaço físico, para o mesmo e único tomador, utilizando-se da mesma força de trabalho ainda antes de que os respectivos trabalhadores houvessem sido dispensados por esta ou contratados por aquela". Afirma que não houve interrupção nas atividades dos empregados contratados pela quarta reclamada (Log20 Logística S.A.).
Sustenta que a quarta reclamada ocupa o espaço físico da primeira reclamada, os equipamentos, faz uso da mão de obra, bem como toda a sistemática de logística, restando evidente a ocorrência da sucessão contratual. Aduz que a sucessão trabalhista se caracteriza sempre que a pessoa do empregador é substituída na exploração do negócio, com transferência de bens e sem ruptura na continuidade da atividade empresarial, nos termos dos artigos 10 e 448 da CLT. Colaciona um aresto.
O paradigma transcrito a fl. 836, oriundo do TRT da 1ª Região, sufraga tese diametralmente oposta àquela exposta no acórdão ora atacado, por trazer entendimento no sentido de que "o aproveitamento da mão de obra, a exploração da mesma atividade econômica e no mesmo espaço físico da antiga empresa, evidenciam a configuração da sucessão trabalhista".
Conheço do recurso de revista, por divergência jurisprudencial.
Reconhecida a transcendência, passo ao exame do mérito.
1.2 – MÉRITO.
A teor do art. 10 consolidado, "qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados", disposição que é complementada pela regra inserta no art. 448 da CLT, que, a par da alteração na estrutura jurídica, assinala, como hipótese de sucessão, a mudança na propriedade.
A forma aparentemente singela em que são postas as hipóteses tipificadoras da sucessão trabalhista, a despeito das críticas doutrinárias, lançadas ao longo do tempo, representa conceito jurídico indeterminado, que traduz pontos de mobilidade e de abertura do sistema para as modificações da realidade. Os tipos abertos, consistentes na "alteração da estrutura jurídica" e "mudança na propriedade", permitem que a Lei se faça mais sábia do que o Legislador, possibilitando ao aplicador a adequação da norma aos fins sociais a que se dirige (art. 8º da LINDB), em atendimento, de forma prospectiva, a fatos e valores supervenientes.
Nestes termos, está a lição de Mauricio Godinho Delgado (in Curso de Direito do Trabalho, 14ª ed., São Paulo, LTr, 2015, pág. 449):
"Conforme já exposto, a generalidade e imprecisão dos arts. 10 e 448 da CLT têm permitido à jurisprudência proceder a uma adequação do tipo legal sucessório a situações fático-jurídicas novas surgidas no mercado empresarial dos últimos anos no país. Essas situações novas, que se tornaram comuns no final do século XX, em decorrência da profunda reestruturação do mercado empresarial brasileiro (em especial mercado financeiro, de privatizações e outros segmentos), conduziram a jurisprudência a reler os dois preceitos celetistas, encontrando neles um tipo legal mais amplo do que o originalmente concebido pela doutrina e jurisprudência dominantes."
A visão hodierna que se tem da sucessão trabalhista é bastante ampla, estando compreendida no instituto qualquer situação fática que traduza alteração intra ou interempresarial.
Ainda, na esteira do prof. Délio Maranhão (in Direito do Trabalho, 17ª ed., Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1993, pág. 94), "a responsabilidade do novo empregador pelos contratos de trabalho existentes, em virtude da sucessão, opera-se ope legis, sendo irrelevante o vínculo entre sucedido e sucessor e a natureza do título que possibilitava ao titular do estabelecimento a utilização dos meios de produção nele organizados".
Sob o aspecto deontológico, a plasticidade e abertura do sistema jurídico trabalhista, em se tratando da configuração da sucessão, encontra amparo em princípios peculiares ao Direito do Trabalho, que são a despersonalização do empregador e a continuidade do contrato de trabalho, cujo corolário é o direito ao emprego (Amauri Mascaro Nascimento, Curso de Direito do Trabalho, 20ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, pág. 695).
Conforme expressamente consignado na decisão recorrida, "ficou incontroversa a contratação da primeira ré (J. Catarino Pires & Cia Ltda.) e, logo após, da quarta (Log20 Logística S.A.) pelas segunda (CRBS S/A) e terceira (AMBEV S.A.) para prestação de serviço terceirizado na realização de entregas de bebidas (contestação à fl. 162 e contrato de prestação de serviços de fls. 302-325)".
Também foi registrado que "não há controvérsia ademais em relação à admissão de mais da metade dos empregados da primeira ré pela quarta. No caso do autor, sua admissão pela quarta reclamada deu-se em 1º-08-2015, logo em seguida à sua demissão pela primeira, na mesma função anteriormente exercida de ajudante de entrega, bem como sua demissão em 19-11-2015 (carteira de trabalho à fl. 25, ficha de registro à fl. 512 e termo de rescisão do contrato de trabalho às fls. 519-520)".
Tem-se, portanto, que, na prática, houve sucessão de empregadores, pois não houve interrupção na prestação de serviços, continuando o reclamante a laborar para a sucessora, razão pela qual se declara a responsabilidade solidária entre eles.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento da AMBEV S.A. e, no mérito, negar-lhe provimento. Por unanimidade, conhecer do recurso de revista do reclamante, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reconhecida a sucessão de empregadores, declarar a responsabilidade solidária entre eles.
Brasília, 13 de outubro de 2021.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
Alberto Bresciani
Ministro Relator
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