DISSÍDIO COLETIVO - ACORDO / CONVENÇÃO Poder normativo

Data da publicação:

Acordão - TST

Maria Helena Mallmann - TST



Comandante consegue reintegração por causa de dispensa contrária à norma coletiva. A convenção restringe o poder de despedir no caso de redução da força de trabalho.



RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO ANTES DA LEI Nº 13.015/2014.

NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.

Ante a possibilidade de provimento quanto ao mérito do recurso de revista, deixa-se de analisar a preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional, nos termos do artigo 282, § 2º, do CPC/2015 (antigo art. 249, §2º, do CPC/73).

Recurso de revista não conhecido.

AERONAUTA. CRITÉRIOS PARA A DISPENSA IMOTIVADA. NORMA COLETIVA. REINTEGRAÇÃO. Verifica-se que a cláusula 9ª da norma coletiva 2011/2013, celebrada espontaneamente entre os Sindicatos, estabeleceu parâmetros a serem considerados para as dispensas em caso de redução da força de trabalho, assim o direito da reclamada dispensar seus empregados se submete ao acatamento dos critérios estabelecidos por força do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal. Esta Corte tem entendido que a reclamada se obriga a efetivar os critérios previamente estabelecidos em Acordo Coletivo de Trabalho que restringe o poder de despedir do empregador quando verificada a necessidade de redução da força de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-2132-02.2012.5.02.0043, Maria Helena Mallmann, DEJT, 14.06.19)

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-2132-02.2012.5.02.0043, em que é Recorrente RICARDO NEY PRIMAVERA DE CASTRO e Recorrido VRG LINHAS AÉREAS S.A.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região negou provimento ao apelo para manter na íntegra a decisão de base, nos termos da fundamentação.

O reclamante interpõe recurso de revista às fls. 1296/1336, com fundamento no artigo 896 da CLT.

Despacho de admissibilidade às fls. 1374/1377, sem a apresentação de contrarrazões, conforme certidão de fls. 1379.

Ausente parecer Ministerial.

É o relatório.

V O T O

Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade, examino os específicos do recurso de revista.

Inicialmente, destaco que o presente apelo será apreciado à luz da Consolidação das Leis do Trabalho, sem as alterações promovidas pela Lei n.º 13.015/2014, que se aplica apenas aos recursos interpostos em face de decisão publicada já na sua vigência, o que não é a hipótese dos autos.

  1. – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.
    1. Conhecimento.

O autor pugna pela nulidade do v. acórdão recorrido por negativa de prestação jurisdicional. Aponta violação dos arts. 832 da CLT, 458 do CPC/73 e 93, IX, da CF.

Ao exame.

Tendo em vista a possibilidade de provimento quanto ao mérito do recurso de revista, deixo de analisar a referida preliminar, nos termos do art. 282, § 2º, do CPC/2015 (antigo art. 249, § 2º, CPC/73).

2- AERONAUTA. CRITÉRIOS PARA A DISPENSA IMOTIVADA. NORMA COLETIVA. REINTEGRAÇÃO.

O Tribunal Regional da 2ª Região, no que concerne ao tema destaque, consignou:

DA REGULARIDADE DA DISPENSA - REINTEGRAÇAO

2- Insistiu o reclamante na irregularidade de sua dispensa, pois a ré teria descumprido o preceituado na Cláusula 9ª da CCT 2011/2013 (fls. 31), pretendendo - então – a reintegração no emprego.

3- Razão não lhe assiste.

4-4Dispõe a cláusula 9ª da CCT 2011/2013 o seguinte:

Pois bem.

Em interpretação à disposição citada este órgão fracionário já firmou entendimento no sentido de que a norma coletiva detém caráter meramente programático, não se revestindo de densidade normativa bastante a assegurar a reintegração do trabalhador, haja vista a carência de definição da enunciada necessidade de redução da força de trabalho, a par da falta de cominação específica por seu descumprimento ou de expressa concessão de garantia de emprego.

6- (...)

7- Ainda em casos idênticos as seguintes ementas de julgamento "REINTEGRAÇAO NO EMPREGO. NORMA COLETIVA. Cláusula que estabelece critérios para a dispensa em caso de necessidade de redução da força de trabalho. Por se tratar de compromisso que envolve limitação ao poder diretivo do empregador, tem aplicação limitada, única e exclusivamente, ao caso de necessidade de redução de força de trabalho como referido na disposição. Quando nada se fixou, objetivamente, para se apurar o que seria a tal redução, fica evidente que a ré não se obrigou a tanto, através da norma coletiva, para toda e qualquer situação de dispensa, a conferir verdadeira garantia de emprego aos mais antigos. Recurso da autora a que se nega provimento" (TRT da 2ª Região, 11ª T., RO 00565-2009-078-02-00-4, Rel. Des. EDUARDO DE AZEVEDO SILVA, j. 07/07/2010,  DOE 20/07/2010)

(...)

8- Indevida, portanto, a reintegração pretendida, bem assim a indenização substitutiva.

Mantenho."

O reclamante sustenta ser nula sua dispensa e devida a reintegração. Alega que não foi observado o procedimento de rescisão disposto na cláusula 9ª da CCT. Afirma que a referida cláusula estabelece critérios, os quais não foram observados, para a dispensa dos empregados, fundada em grave motivo de ordem econômica, que determine a necessidade de redução do quadro de pessoal. Pugna por sua reintegração em face do princípio da boa-fé contratual.

Aponta violação dos arts. 5.º, XXXVI, 7.º, XXVI, da Constituição Federal, 247, 421 e 422, do Código Civil, 535, 538, do CPC, além de contrariedade à Súmula 277 do TST. Transcreve arestos ao confronto de teses.

Analiso.

A Corte de origem manteve a sentença de 1º grau que indeferiu o pedido de reintegração no emprego da reclamante assentando que: "Em interpretação à disposição citada este órgão fracionário já firmou entendimento no sentido de que a norma coletiva detém caráter meramente programático, não se revestindo de densidade normativa bastante a assegurar a reintegração do trabalhador, haja vista a carência de definição da enunciada necessidade de redução da força de trabalho, a par da falta de cominação específica por seu descumprimento ou de expressa concessão de garantia de emprego."

Verifica-se que a cláusula 9ª da norma coletiva 2011/2013, celebrada espontaneamente entre os Sindicatos, estabeleceu parâmetros a serem considerados para as dispensas em caso de redução da força de trabalho, assim o direito de a reclamada dispensar seus empregados se submete ao acatamento dos critérios estabelecidos por força do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal.

Nesse sentido:

PRELIMINAR ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE REVISTA PRESSUPOSTO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE RECURSO DE REVISTA. INDICAÇÃO DO TRECHO REFERENTE AO PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA CONTROVERTIDA. ARTIGO 896, § 1º-A, INCISO I, DA CLT. ARGUIÇÃO EM CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE REVISTA. No caso, em que pese o recurso de revista em apreço tenha sido interposto após a entrada em vigor da Lei nº 13.015/2014, refere-se ao acórdão regional prolatado sob a vigência da disciplina processual trabalhista anterior, motivo pelo qual não está sujeito aos novos requisitos do artigo 896 da CLT, como é o caso do § 1º-A, inciso I, da CLT. Preliminar rejeitada RECURSO DE REVISTA AERONAUTA. DISPENSA COLETIVA. CRITÉRIOS EXPRESSAMENTE PREVISTOS EM NORMA COLETIVA. DESCUMPRIMENTO. NULIDADE DA RESCISÃO CONTRATUAL. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. No caso, a controvérsia refere-se à validade da dispensa do autor, quanto à obrigatoriedade da reclamada de observar os critérios fixados em norma coletiva da categoria para dispensa dos empregados, bem como a sanção em caso de descumprimento dos termos nela estabelecidos. Importante salientar que as normas coletivas pactuadas entre o empregador e a entidade sindical da categoria profissional têm o condão de complementar ou até mesmo flexibilizar as disposições do contrato de trabalho, desde que respeitados os direitos indisponíveis e irrenunciáveis do trabalhador. Assim, ao se firmar acordo coletivo de trabalho, no qual foram estabelecidos critérios de precedência para dispensa de empregado, as partes estão obrigadas ao seu cumprimento, independentemente da previsão expressa de penalidade em caso de não observância, em respeito ao artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, que assegura validade às convenções e acordos coletivos. Desse modo, tendo em vista que a reclamada dispensou o autor do emprego, sem observar os critérios estabelecidos na Cláusula 9ª da norma coletiva 2011/2013, à qual estava vinculada por força do artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, impõe-se o reconhecimento de nulidade da rescisão contratual. Por outro lado, ressalta-se que a reclamada não tinha o direito discricionário acerca do cumprimento ou não das cláusulas convencionais, pois não há falar em direito potestativo quanto ao gerenciamento da força de trabalho. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 901-83.2012.5.01.0069 , Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, DEJT 18/3/2016)

Esta Corte tem entendido que a reclamada se obriga a efetivar os critérios previamente estabelecidos em Acordo Coletivo de Trabalho que restringe o poder de despedir do empregador quando verificada a necessidade de redução da força de trabalho.

Cito precedentes:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. AERONAUTA. PROCEDIMENTOS PARA DISPENSA DO EMPREGADO PREVISTOS EM NORMA COLETIVA. NÃO OBSERVÂNCIA. NULIDADE DA DISPENSA. REINTEGRAÇÃO. Instituindo os Sujeitos Coletivos, representantes das categorias profissional e econômica, mediante convenção coletiva de trabalho, critérios e procedimentos para a dispensa do empregado, ainda que sem justa causa, obriga-se a Empregadora a cumprir tais procedimentos e critérios estabelecidos, sob pena de violação ao disposto no art. 7º, XXVI, da CF. Assim sendo, comprovada a não observância desse regramento para a dispensa do Reclamante, torna-se inválida a ruptura contratual efetivada, sendo, portanto, devida a sua reintegração. Agravo de instrumento desprovido. (AIRR - 11239-70.2013.5.01.0073 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 18/10/2017, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/10/2017)

"(...) RECURSO DE REVISTA AERONAUTA. DISPENSA COLETIVA. CRITÉRIOS EXPRESSAMENTE PREVISTOS EM NORMA COLETIVA. DESCUMPRIMENTO. NULIDADE DA RESCISÃO CONTRATUAL. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. No caso, a controvérsia refere-se à validade da dispensa do autor, quanto à obrigatoriedade da Reclamada de observar os critérios fixados em norma coletiva da categoria para dispensa dos empregados, bem como a sanção em caso de descumprimento dos termos nela estabelecidos. Importante salientar que as normas coletivas pactuadas entre o empregador e a entidade sindical da categoria profissional têm o condão de complementar ou até mesmo flexibilizar as disposições do contrato de trabalho, desde que respeitados os direitos indisponíveis e irrenunciáveis do trabalhador. Assim, ao se firmar acordo coletivo de trabalho, no qual foram estabelecidos critérios de precedência para dispensa de empregado, as partes estão obrigadas ao seu cumprimento, independentemente da previsão expressa de penalidade em caso de não observância, em respeito ao artigo 7.º, inciso XXVI, da Constituição da República, que assegura validade às convenções e acordos coletivos. Desse modo, tendo em vista que a Reclamada dispensou o autor do emprego, sem observar os critérios estabelecidos na Cláusula 9.ª da norma coletiva 2011/2013, à qual estava vinculada por força do artigo 7.º, inciso XXVI, da Constituição da República, impõe-se o reconhecimento de nulidade da rescisão contratual. Por outro lado, ressalta-se que a Reclamada não tinha o direito discricionário acerca do cumprimento ou não das cláusulas convencionais, pois não há falar em direito potestativo quanto ao gerenciamento da força de trabalho. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido." (RR - 901-83.2012.5.01.0069, Relator: Ministro José Roberto Freire Pimenta, 2.ª Turma, DEJT 18/3/2016.)

"(...) RECURSO DE REVISTA. AERONAUTA. DISPENSA. CLÁUSULA COLETIVA ESTABELECENDO PROCEDIMENTO EM CASO DE REDUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO. NATUREZA. A cláusula coletiva estabelece uma ordem de precedência nas dispensas a serem realizadas pela empresa em caso de redução da força de trabalho, remanescendo a discussão quanto aos efeitos do descumprimento do pactuado. As normas programáticas, como o próprio nome sugere, consubstanciam programas e diretrizes ad futurum, que vêm acompanhados de conceitos indeterminados e carecem de outra lei ou, como na hipótese, de outra disposição normativo-coletiva que as regulamente. São, por definição, de aplicação diferida e conferem elasticidade ao ordenamento jurídico, competindo ao órgão estatal ou, in casu, às partes convenentes fixar os meios a fim de possibilitar sua plena eficácia. É dizer. Obrigam a implementação do novo comando regulamentar a que se condicionam. No caso dos autos, a cláusula coletiva em exame não detém conteúdo programático; ao contrário, esvazia-se em si mesma, não exigindo posterior edição regulamentar a fim de que atinja a completude de seus efeitos. Ora, se o sindicato que representa a empresa Reclamada entendeu por bem impor tal limitação ao exercício do poder potestativo empresarial de definir a ordem de dispensa de seus empregados em caso de redução da força de trabalho, tal disposição, longe de ostentar natureza meramente programática, criou verdadeira obrigação entre as partes representadas, dentre as quais figura a Recorrente. Admitir a interpretação pretendida pela Reclamada seria equivalente a tornar letra morta a disposição livremente negociada entre os sindicatos patronal e obreiro, implicando verdadeira recusa ao reconhecimento da negociação coletiva, que foi elevada ao patamar constitucional pela Carta de 1988 em seu artigo 7.º, XXVI. Não significa atribuir, por outro lado, interpretação extensiva aos negócios jurídicos, procedimento vedado no ordenamento pátrio (art. 114 do Código Civil), tanto que não foi conferida ao reclamante qualquer estabilidade no emprego, nada impedindo que a Reclamada, após obedecer a ordem de dispensas previstas no instrumento coletivo, venha a efetivar a ruptura do contrato do Reclamante. Recurso de revista conhecido por divergência jurisprudencial e provido." (RR - 1861-77.2012.5.02.0015, Relator: Desembargador Convocado Breno Medeiros, 8.ª Turma, DEJT 25/9/2015.)

Assim, tendo em vista que a reclamada dispensou o autor sem observar os critérios estabelecidos na Cláusula 9ª da norma coletiva 2011/2013, à qual estava vinculada, por força do artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, impõe-se o reconhecimento de nulidade da rescisão contratual.

Pelo exposto, conheço do recurso de revista por violação ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal que garante a validade das convenções e acordos coletivos.

2.1 – MÉRITO

Conhecido o apelo por violação ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, dou-lhe provimento para declarando a nulidade da dispensa do autor, condenar a reclamada à reintegração do reclamante no emprego, com o pagamento das parcelas salariais respectivas desde seu desligamento. Custas pela reclamada, no importe de R$ 400,00 (quatrocentos reais), sob o valor que ora se arbitra à condenação (R$ 20.000,00).

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista quanto ao tema "AERONAUTA. CRITÉRIOS PARA A DISPENSA IMOTIVADA. NORMA COLETIVA. REINTEGRAÇÃO", por violação ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a reclamada à reintegração do reclamante no emprego, com o pagamento das parcelas salariais respectivas desde seu desligamento. Custas pela reclamada, no importe de R$ 400,00 (quatrocentos reais), sob o valor que ora se arbitra à condenação (R$ 20.000,00).

Brasília, 12 de junho de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

MARIA HELENA MALLMANN

Ministra Relatora

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