TST - INFORMATIVOS 2019 0198 - 10 de junho

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Acordãos na integra

Dora Maria da Costa - TST



RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO. RECURSO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. Com efeito, o art. 47 da Lei n° 11.101/2005 preceitua que a recuperação judicial de uma empresa é um meio utilizado para evitar sua falência, tratando-se de uma tentativa de recuperar aquela atividade evitando o fechamento e as consequentes demissões e não pagamento dos credores, a evidenciar, sem sombra de dúvidas, que se encontra financeiramente incapaz de arcar com as despesas do processo.



A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO. Constatada a aparente violação do artigo 5º, LV, da Constituição Federal, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido.

B) RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO. RECURSO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. Com efeito, o art. 47 da Lei n° 11.101/2005 preceitua que a recuperação judicial de uma empresa é um meio utilizado para evitar sua falência, tratando-se de uma tentativa de recuperar aquela atividade evitando o fechamento e as consequentes demissões e não pagamento dos credores, a evidenciar, sem sombra de dúvidas, que se encontra financeiramente incapaz de arcar com as despesas do processo. In casu, o Tribunal Regional entendeu que a dicção do art. 899, § 10, da CLT, que autoriza a isenção do depósito recursal em relação às empresas em recuperação judicial, somente se aplica na fase de cognição processual, de modo que não conheceu do agravo de petição interposto pela executada, por ausência de garantia do juízo, nos termos do art. 884 da CLT. Entretanto, tem-se que a executada não possui recursos para a garantia do juízo, tendo em vista o deferimento da recuperação judicial, não havendo dúvidas, outrossim, que o pagamento dos débitos da empresa são realizados mediante habilitação no juízo da recuperação judicial. Por conseguinte, exigir da executada a garantia do juízo resultaria no comprometimento do próprio plano de recuperação judicial, o qual tem a finalidade de viabilizar o soerguimento da empresa. Dessa forma, observa-se que a decisão recorrida foi de encontro aos princípios do contraditório e da ampla defesa, insculpidos no inciso LV do art. 5° da CF, mormente diante dos termos dos arts. 47, 49 e 52, III, da Lei nº 11.101/2005 e 899, § 10, da CLT, e tendo em vista que, antes da expedição da certidão de crédito, para habilitação no juízo universal, é preciso enfrentar as impugnações apresentadas a fim de que haja o acerto dos cálculos de liquidação. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-10193-45.2017.5.03.0107, Dora Maria da Costa, DEJT, 07.06.19).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-10193-45.2017.5.03.0107, em que é Recorrente TELEMAR NORTE LESTE S.A. e Recorrido MARCELO ALEXANDRE DE PAIVA.

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, pela decisão de fls. 94/95 (seq. 18), denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela executada.

Inconformada, a executada interpôs agravo de instrumento, às fls. 99/104 (seq. 18), insistindo na admissibilidade da revista.

Contraminuta e contrarrazões às fls. 107/111 (seq. 18).

Dispensada a remessa dos autos à Procuradoria-Geral do Trabalho, nos termos do art. 95 do RITST.

É o relatório.

V O T O

A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA

I – CONHECIMENTO

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade atinentes à tempestividade e à regularidade de representação processual, e estando o preparo sub judice, conheço do agravo de instrumento.

II – MÉRITO

EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO.

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela executada, por reputá-lo deserto. Eis os fundamentos da decisão:

"PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS

O recurso é próprio, tempestivo (acórdão publicado em 15/10/2018; recurso de revista interposto em 24/10/2018, considerando a contagem do prazo em dias úteis), sendo regular a representação processual (ID. bea8f8a e ID. 4e5050f).

Deserção.

Nos termos do art. 884 da CLT e do item II da Súmula 128 do C. TST, a garantia do juízo constitui pressuposto indispensável para o devedor embargar a execução ou interpor qualquer recurso subsequente.

A Turma fundamentou o seguinte no acórdão recorrido (ID. 0111a70):

A garantia do juízo consiste em requisito indispensável à parte executada para que possa exercer seu direito de se opor à execução, o que não foi cumprido pela agravante, nem mesmo ao interpor o presente agravo de petição. Saliento que a dicção do art. 899, §10, da CLT, que autoriza a isenção do depósito recursal, somente se aplica na fase de cognição processual. E, em se tratando de execução, a inexigibilidade da garantia ou penhora é restrita "às entidades filantrópicas e/ou àqueles que compõem ou compuseram a diretoria dessas instituições" (§6º, art. 884 da CLT) - o que não é o caso da executada.

Ao interpor o presente recurso de revista, cumpria à parte sanar tal irregularidade, garantindo integralmente o juízo, ainda que para discutir a possibilidade de vir a ser dispensada do preparo, se assim desejasse, por se encontrar em fase de recuperação judicial. No entanto, a recorrente nada depositou, tampouco ofereceu bens à penhora.

Ante o exposto, não conheço do recurso, porque deserto.

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista." (fl. 94 - seq. 18)

Na minuta do agravo de instrumento, às fls. 99/104 (seq. 18), a executada insiste na impossibilidade de garantia do juízo.

Argumenta que a interpretação literal do art. 884, caput, da CLT não é a mais adequada para o presente caso, em razão da particularidade da situação da empresa, que se encontra em recuperação judicial, sendo necessária uma análise teleológico-sistemática da citada norma.

Afirma que a garantia do juízo, com a constrição de valores, evidentemente impactará de forma deletéria no caixa da recuperanda, o que poderá comprometer todo o processo de soerguimento da companhia, na contramão do objetivo precípuo da Lei nº 11.101/2005.

Aduz que o não conhecimento dos recursos interpostos nas instâncias inferiores importou em negativa de prestação jurisdicional e cerceamento de defesa, com ofensa literal aos artigos 5º, XXXIV, "a", XXXV e LV, e 93, IX, da Constituição Federal.

Ao exame.

Para melhor elucidação da questão controvertida, cumpre transcrever os fundamentos constantes no acórdão regional:

"Preliminar de não conhecimento do agravo de petição arguida em contraminuta pelo exequente. Ausência de garantia do juízo. A executada interpôs agravo de petição, em face da decisão de ID 6371a71 que não conheceu dos embargos à execução por ausência da garantia do juízo. Argumenta a agravante que, às empresas em recuperação judicial, devem ser aplicadas, por analogia, as disposições do art. 899, § 10, da CLT. Não lhe assiste razão, contudo, uma vez que não há como suplantar o pressuposto de admissibilidade recursal, na forma estabelecida nos arts. 884, caput, da CLT e conforme a Instrução Normativa n. 03/93 do TST. A garantia do juízo consiste em requisito indispensável à parte executada para que possa exercer seu direito de se opor à execução, o que não foi cumprido pela agravante, nem mesmo ao interpor o presente agravo de petição. Saliento que a dicção do art. 899, §10, da CLT, que autoriza a isenção do depósito recursal, somente se aplica na fase de cognição processual. E, em se tratando de execução, a inexigibilidade da garantia ou penhora é restrita "às entidades filantrópicas e/ou àqueles que compõem ou compuseram a diretoria dessas instituições" (§6º, art. 884 da CLT) - o que não é o caso da executada. Logo, não cabe a aplicação analógica do referido dispositivo legal. Registro que não socorre a agravante a invocação da Lei 11.101/2005, em face da expressa disposição legal quanto à imprescindibilidade da garantia do juízo para fins de satisfação do crédito trabalhista, sem a qual não se admite a oposição de embargos à execução e de agravo de petição. Ademais, não há que se falar em ofensa ao exercício do contraditório ou da ampla defesa (art. 5º, XXXV, LIV e LV, da CR), eis que a observância de pressuposto processual trata de exigência legal prevista na norma aplicável ao caso. Acentuo, ainda, que não se tratando de massa falida, inaplicável, ao caso, o entendimento contido na Súmula 86 do TST. No mesmo sentido, esta d. Turma proferiu as seguintes decisões: 0010804-74.2017. 5.03.0114- AP. Relator Desemb. Márcio Ribeiro do Vale. Julgamento: 09.03.2018; 0011785-22.2016.5.03.0023-AP. Relator Juiz Vitor Salino de Moura Eça. Julgamento: 05.09.2018. Por esses fundamentos, acolho a preliminar suscitada pelo agravado/exequente em contraminuta e deixo de conhecer do agravo de petição, por ausência de garantia do juízo. Custas pela agravante, no importe de R$ 44,26 nos termos do art. 789-A, IV, da CLT." (fls. 77/78 - seq. 18)

Com efeito, nas razões do recurso de revista (fls. 82/93 - seq. 18), a executada defende a impossibilidade de garantia do juízo, porquanto se encontra em processo de recuperação judicial.

Enfatiza que a interpretação da norma do art. 884, caput e § 3º, da CLT não pode ficar restrita a uma análise estritamente literal, revelando-se impositiva uma interpretação teleológico-sistemática do texto de acordo com a recuperação judicial concedida às recuperandas, na forma da Lei nº 11.101/2005.

Ressalta que é necessária a aplicação do artigo 899, § 10, da CLT, que isenta a empresa em recuperação judicial de depósito recursal, uma vez que, diante da indisponibilidade de recurso para garantia do juízo, não pode, em execução, ser imposta a efetivação dessa garantia para que os embargos sejam conhecidos.

Aponta violação dos artigos 5º, II, XXXIV, "a", XXXV, LIII e LV, 93, IX, 114 e 202 da Constituição Federal, 899, § 10, da CLT e 47 da Lei nº 11.101/2005 e divergência jurisprudencial.

O Tribunal Regional concluiu que a garantia do juízo consiste em requisito indispensável à parte executada para que possa exercer seu direito de se opor à execução, o que não foi cumprido pela executada, não havendo como suplantar o pressuposto de admissibilidade recursal, na forma estabelecida no art. 884, caput, da CLT.

Assim, entendeu que a dicção do art. 899, § 10, da CLT, que autoriza a isenção do depósito recursal em relação às empresas em recuperação judicial, somente se aplica na fase de cognição processual, de modo que, em se tratando de execução, a inexigibilidade da garantia ou penhora é restrita "às entidades filantrópicas e/ou àqueles que compõem ou compuseram a diretoria dessas instituições", consoante o § 6º do art. 884 da CLT, o que não é o caso da executada. Dessa forma, deixou de conhecer do agravo de petição interposto pela executada, por ausência de garantia do juízo.

Nos moldes do § 10 do art. 899 da CLT, introduzido pela Lei n° 13.467/17, "são isentos do depósito recursal os beneficiários da justiça gratuita, as entidades filantrópicas e as empresas em recuperação judicial", sendo que, nos termos do art. 20 da IN n° 41/TST, referido dispositivo consolidado tem aplicabilidade para os recursos interpostos às decisões proferidas a partir de 11/11/2017, hipótese dos autos.

Logo, estando a empresa executada em recuperação judicial, não pairam dúvidas de que está isenta do recolhimento do depósito recursal.

Nesse sentido, importa destacar que, de acordo com o comando do art. 899 da CLT, o depósito recursal visa garantir ao empregado numerário suficiente para assegurar a execução, ou seja, o depósito recursal tem como finalidade precípua resguardar que o vencedor da demanda receba ao menos parte do valor da condenação fixada, garantindo a execução da dívida com a disponibilização de quantia ao juízo.

De outro modo, é certo que a interposição de qualquer recurso na fase de execução somente pode ser realizada quando garantido o juízo da execução ou realizada penhora de bens suficientes à garantia do débito.

Por sua vez, o art. 47 da Lei n° 11.101/2005 preceitua que "a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica", ou seja, a recuperação judicial de uma empresa é um meio utilizado para evitar sua falência, tratando-se de uma tentativa de recuperar aquela atividade evitando o fechamento e as consequentes demissões e não pagamento dos credores, a evidenciar, sem sombra de dúvidas, que se encontra financeiramente incapaz de arcar com as despesas do processo.

Além disso, a Lei n° 11.101/2005, em seu artigo 49, estabelece que "Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos".

Já o art. 52, III, da supramencionada lei, dispõe:

"Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:

(...)

III - ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6º desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1º, 2º e 7º do art. 6º desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3º e 4º do art. 49 desta Lei;

(...)"

Nessa perspectiva, tem-se que a executada não possui recursos para a garantia do juízo, tendo em vista o deferimento da recuperação judicial, não havendo dúvidas, outrossim, que o pagamento dos débitos da empresa são realizados mediante habilitação no juízo da recuperação judicial.

Por conseguinte, exigir da executada a garantia do juízo resultaria no comprometimento do próprio plano de recuperação judicial, o qual tem a finalidade de viabilizar o soerguimento da empresa.

Dessa forma, observa-se que a decisão recorrida foi de encontro aos princípios do contraditório e da ampla defesa, insculpidos no inciso LV do art. 5° da CF, mormente diante dos termos das normas acima referidas, e tendo em vista que, antes da expedição da certidão de crédito, para habilitação no juízo universal, é preciso enfrentar as impugnações apresentadas a fim de que haja o acerto dos cálculos de liquidação.

Nesse contexto, configurada possível afronta literal e direta ao artigo 5º, LV, da Constituição Federal, dou provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.

B) RECURSO DE REVISTA

I - CONHECIMENTO

Preenchidos os pressupostos comuns de admissibilidade recursal, passo ao exame dos específicos do recurso de revista.

EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO.

Tendo em vista os fundamentos expostos por ocasião da análise do agravo de instrumento, ficou demonstrada a ofensa ao art. 5º, LV, da CF.

Assim, conheço do recurso de revista por violação do supramencionado dispositivo constitucional.

II – MÉRITO

EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DESERÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO.

Como consequência lógica do conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 5º, LV, da Constituição Federal, dou-lhe provimento para afastar a conclusão de ausência de garantia do juízo e determinar o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga no exame dos embargos à execução interpostos pela executada, como entender de direito.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: a) conhecer do agravo de instrumento e dar-lhe provimento para determinar o processamento do recurso de revista; e b) conhecer do recurso de revista por violação do artigo 5º, LV, da Constituição Federal e, no mérito, dar-lhe provimento para afastar a conclusão de ausência de garantia do juízo e determinar o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga no exame dos embargos à execução interpostos pela executada, como entender de direito.

Brasília, 5 de junho de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Dora Maria da Costa

Ministra Relatora

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