TST - INFORMATIVOS 2017 2017 154 - 07 a 13 de março

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Walmir Oliveira da Costa - TST



03 -Dispensa discriminatória. Presunção. Empregado portador de tuberculose. Súmula n° 443 do TST. A SBDI-I, por maioria, conheceu dos embargos, por contrariedade à Súmula nº 443 do TST e, no mérito, por unanimidade, deu-lhes provimento para reconhecer o caráter discriminatório da dispensa sem justa causa de empregada portadora de tuberculose.



Resumo do voto.

Dispensa discriminatória. Presunção. Empregado portador de tuberculose. Súmula n° 443 do TST. A SBDI-I, por maioria, conheceu dos embargos, por contrariedade à Súmula nº 443 do TST e, no mérito, por unanimidade, deu-lhes provimento para reconhecer o caráter discriminatório da dispensa sem justa causa de empregada portadora de tuberculose. Na hipótese, a Subseção reformou decisão turmária que não conhecera do recurso de revista sob o fundamento de que a presunção prevista na Súmula nº 443 do TST não se aplica ao caso em que o vínculo foi mantido por mais de seis anos após a empresa ter ciência da doença, não houve afastamento do trabalho para tratamento de saúde, nem a percepção de benefício previdenciário, não havia incapacidade de ordem psiquiátrica ao tempo da dispensa e muito menos nexo causal com as condições laborais. Prevaleceu o entendimento de que, sendo incontroverso que a reclamada sabia que a reclamante era portadora de tuberculose, não há base legal para se exigir, como requisitos para a comprovação da dispensa discriminatória, a imediatidade da despedida, a redução da capacidade laboral, o afastamento para tratamento de saúde, a concessão de auxílio-doença ou o nexo causal entre a enfermidade e o trabalho realizado. Ademais, a fundamentação da Corte regional, endossada pela Turma do TST, adotou posicionamento diametralmente oposto aos termos da Súmula nº 443 do TST, pois reputou à reclamante o ônus de comprovar a discriminação alegada. Vencidos os Ministros João Oreste Dalazen, Ives Gandra Martins Filho, Aloysio Corrêa da Veiga, Márcio Eurico Vitral Amaro e Cláudio Mascarenhas Brandão.

A C Ó R D Ã O

RECURSO DE EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. REGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE TUBERCULOSE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO.

1. A eg. Sétima Turma não conheceu do recurso de revista, quanto à reintegração no emprego com base em dispensa discriminatória, sob o fundamento de não ser aplicável a presunção prevista na Súmula nº 443 do TST, dado que a tuberculose não impediu a manutenção do vínculo de emprego por mais de seis anos após a empresa ter ciência da doença; não houve afastamento do trabalho para tratamento de saúde nem a percepção de benefício previdenciário; não havia incapacidade de ordem psiquiátrica ao tempo da dispensa; tampouco foi provado nexo causal com as condições laborais.

2. Todavia, tratando-se de controvérsia envolvendo empregado acometido por doença grave, ou que cause estigma ou preconceito, nos termos da Súmula nº 443 desta Corte, o exercício do direito potestativo de dispensa, sem justa causa, conduz à presunção de conduta discriminatória, e arbitrária, não elidida por nenhuma das premissas fáticas fixadas na origem e, portanto, suficiente a invalidar o ato de dispensa e a assegurar o retorno ao emprego.

Recurso de embargos conhecido e provido.  (TST-E-ED-RR-65800-46.2009.5.02.0044, SBDI-I, rel. Min. Walmir Oliveira da Costa, 05.05.2017).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-65800-46.2009.5.02.0044 (convertido de agravo regimental de mesmo número), em que é Embargante VALERIA DA COSTA PINTO PINA e Embargado NALCO BRASIL LTDA.

Trata-se de agravo regimental interposto pela reclamante (fls. 790-795) contra a decisão do Presidente da Sétima Turma, que negou seguimento ao recurso de embargos (fls. 771-773).

Foram apresentadas contrarrazões ao agravo e impugnação aos embargos, às fls. 790-795 e 797-802, respectivamente.É o relatório.

V O T O

I - AGRAVO REGIMENTAL

1. CONHECIMENTO

Satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade recursal, pertinentes à tempestividade (fls. 774 e 786) e à representação processual (fls. 582 e 671), CONHEÇO do agravo regimental.

2. MÉRITO

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE TUBERCULOSE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO

A Presidência da Sétima Turma denegou seguimento ao recurso de embargos interposto pela reclamante, mediante os seguintes fundamentos (fls. 771-772), in litteris:

A 7ª Turma do TST, por unanimidade, não conheceu do recurso de revista da reclamante, mantendo o entendimento de que sua dispensa não foi discriminatória. Para tanto, registrou que:

Como se observa, o Tribunal Regional registrou que o laudo pericial concluiu pela ausência de incapacidade de ordem psiquiátrica da trabalhadora ao tempo da dispensa, também anotando que a obreira desistiu de provar o nexo etiológico entre a moléstia que a afligiu – tuberculose – e as condições de trabalho a que submetida.

Aduziu a ausência de notícias acerca de eventual impedimento para a dispensa, pois não vivenciou a obreira qualquer afastamento por doença ou percebeu benefício previdenciário, concluindo que caberia a ela comprovar a discriminação alegada.

Por fim, ao observar que o contrato de trabalho vigorou por mais de seis anos após a ciência empresarial da moléstia que afligiu a trabalhadora, afirmou a regularidade do ato de dispensa, indeferindo a indenização postulada.

Nesse contexto, uma vez consignado, no acórdão regional, que a tuberculose não constituiu impedimento para a manutenção do vínculo de emprego por mais de seis anos – premissa fática inafastável nesta instância recursal (Súmula 126 do TST), inviável reconhecer que a dispensa efetivada pela Reclamada foi discriminatória.

Não há falar, assim, em aplicação da presunção estabelecida na Súmula 443 do TST, tampouco em violação a preceitos de lei (fls. 716-717).

Inconformada, a reclamada interpõe o presente recurso de embargos à SBDI-1 do TST, no qual se insurge contra a mencionada decisão, colacionando aresto para o confronto de teses e alegando contrariedade aos termos da Súmula nº 443 do TST.

Inicialmente, mister registrar que não há falar em contrariedade à Súmula invocada, porquanto a decisão embargada foi proferida de acordo com a interpretação conferida pela 7ª Turma acerca da sua aplicação aos casos de, mesmo ciente da doença grave que acomete o obreiro, a reclamada mantém seu contrato de trabalho por mais seis anos, sendo que somente com a comprovação de divergência jurisprudencial válida seria possível a admissão do presente apelo.

No entanto, nenhum dos arestos colacionados para confronto de teses registra tal premissa fática, tampouco os demais fundamentos de fato consignados na decisão embargada, quais sejam: laudo pericial comprovando a ausência de incapacidade de ordem psiquiátrica da trabalhadora ao tempo da dispensa e ausência de impedimento para a dispensa decorrente de afastamento por doença ou percepção de benefício previdenciário. Portanto, ante à inespecificidade dos arestos, incide como óbice ao processamento do apelo, o entendimento consubstanciado na Súmula nº 296 do TST.

Assim, não admito o recurso de embargos, pois ausentes os pressupostos do inciso II do art. 894 da CLT, nos termos do § 2º do art. 2º da Instrução Normativa nº 35/2012.

A agravante requer o processamento dos, em razão da demonstração de divergência jurisprudencial específica, de violação de dispositivos legais e de contrariedade à súmulas do TST.

Argumenta ser incontroverso que sofria de tuberculose no momento da dispensa, razão pela qual não poderia ter sido dispensada sem justo motivo. Alega que a doença se agravou durante a prestação de serviços, ocasionado inclusive o afastamento do trabalho por três meses. Ressalta que a enfermidade constitui doença grave.

Impugna a aplicação da Súmula nº 126 do TST. Reitera a indicação de ofensa aos arts. 151 da Lei nº 8.213/90 e 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88, contrariedade à Súmula nº 443 do TST e arestos ao confronto.

Ao exame.

Na hipótese, a eg. Sétima Turma não conheceu do recurso de revista da reclamante, mantendo o entendimento de que sua dispensa não foi discriminatória, conforme os fundamentos sintetizados na ementa:

RECURSO DE REVISTA. (...) 2. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA DE EMPREGADA PORTADORA DE TUBERCULOSE. NÃO CONFIGURAÇÃO. Situação em que o Tribunal Regional registrou que o laudo pericial concluiu pela ausência de incapacidade de ordem psiquiátrica da trabalhadora ao tempo da dispensa, também anotando que a obreira desistiu de provar o nexo etiológico entre a moléstia que a afligiu – tuberculose – e as condições de trabalho a que submetida. Aduziu a ausência de notícias acerca de eventual impedimento para a dispensa, pois não vivenciou a obreira qualquer afastamento por doença ou percebeu benefício previdenciário, concluindo que caberia a ela comprovar a discriminação alegada. Por fim, ao observar que o contrato de trabalho vigorou por mais de seis anos após a ciência empresarial da moléstia que afligiu a trabalhadora, afirmou a regularidade do ato de dispensa, indeferindo a indenização postulada. Nesse contexto, considerando que a enfermidade não constituiu impedimento para a manutenção do vínculo de emprego por seis anos, conclui-se provada a ausência de dispensa discriminatória pela Reclamada. Incólumes os dispositivos apontados como violados. Recurso de revista não conhecido. (...) (grifos apostos)

Especificamente quanto ao tema, constam do acórdão turmário os seguintes termos, verbis:

1.2 DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. EMPREGADA PORTADORA DE TUBERCULOSE. NÃO CONFIGURAÇÃO

O Tribunal Regional não reconheceu o caráter discriminatório da dispensa da Reclamante, por ser portadora de tuberculose, consignando os seguintes fundamentos:

"III – DA DISPENSA

5- Disse a reclamante que a dispensa é nula e deve ser considerada discriminatória porque na ocasião estava doente e inapta, pelo que cabível a indenização prevista no art. 4° da Lei n° 9.029/95, a qual estabelece o pagamento em dobro da remuneração do período do afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.

6- Historiou que a empresa tinha ciência de que a demandante era portadora de tuberculose, com redução de 40% da sua capacidade laborativa e, a par disso, para desenvolver suas atividades fazia viagens internacionais semanais, as quais lhe causaram stress, afetaram o seus sistema imunológico e agravaram o seu estado físico. Não obstante tudo isso, foi demitida, tudo redundando numa depressão maior.

7- Pelo exposto, busca o reconhecimento de que a despedida foi abusiva, arbitrária; por motivo torpe, discriminatória e ilegal.

8- Pois bem. O laudo pericial de fls. 202/217 entendeu que a autora não detém incapacidade sob aspecto psiquiátrico, sendo exato que a prova técnica não logrou ser superada por outra de idêntica natureza.

9- Quanto ao aspecto físico, a própria demandante abriu mão de provar nexo causal entre a sua doença (tuberculose) e as atividades cumpridas em favor da ré (fls. 240). Aliás, registro que não tenho notícias de que viajar constantemente de avião e ser instada a cumprir metas econômicas em favor do empregador cause essa doença em alguém.

10- Com relação ao desligamento, não há prova de que houvesse impedimento para isso. Não existe notícia de afastamento por doença e muito menos recebimento de benefício previdenciário, de forma que só posso concluir pela regularidade do ato.

11- Concluo, portanto, que não há falar em reintegração, em indenização por despedida discriminatória e muito menos em dano moral, haja vista que despedir imotivadamente o empregado é direito potestativo do empregador.

12- Mantenho a improcedência de todos esses pedidos." (fls. 394/395)

Em sede de embargos de declaração, acrescentou:

"8- A própria reclamante admite que a empresa tinha ciência de que ela era portadora de tuberculose. Ora, se isso não foi impedimento para a vigência da relação de emprego por mais de seis anos, caberia à autora provar que foi a causa para o desligamento, encargo do qual não se desincumbiu.

9- Aliás, é sabido que a tuberculose de há muito deixou de ter aquele estigma de doença incurável e altamente letal, inspiradora de grandes obras literárias na ficção e na poesia (‘Eu sei que vou morrer... dentro do meu peito/ um mal terrível me devora a vida. /Triste Assaverus, que no fim da estrada/só tem por braços uma cruz erguida. Sou o cipreste qu'inda mesmo florido/Sombra da morte no ramal encerra! /Vivo - que vaga entre o chão dos mortos./ Morto - entre os vivos a vagar na Terra’ - CASTRO ALVES) é que, entre outros comportamentos, gerava o afastamento do portador do convívio social por receio de contágio. 

10 - Atualmente é uma doença curável e controlável, sem maiores repúdios no meio social. Interessante, aliás, o site da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo a respeito da tuberculose (http://www.saude.spgov.br/ses/perfil/cidadao/ temas-de-saude/tuberculose/tratamento).

11- Aliás, a reclamante não passou por exame para a detectação de tuberculose, mas sim houve apenas laudo psiquiátrico, no qual consta a seguinte frase: ‘neste episódio ocorreu aberração da conduta médica uma vez que Autora foi demitida, como apta e em curso de tratamento para tuberculose!’ (fls. 205).

12- Ora, O próprio psiquiatra ao responder aos quesitos aduziu que a tuberculose seria ‘objeto de avaliação pericial pneumológica’ (fls. 206)

13- Sucede que a demandante desistiu da prova ‘com relação ao alegado nexo causal da tuberculose alegada com a atividade exercida’ (fls. 240), sem esquecer que o parecer do assistente técnico da ré não foi impugnado com relação ao conteúdo, e dele consta que a postulante cuidou da tuberculose durante um ano, recebendo alta em maio de 20l0 (fls. l94).

Assim, reitero o entendimento de que não houve prova de que a demandante era portadora de ‘tuberculose ocupacional’ e muito menos de que se encontrava em estado grave e inapta para o trabalho por ocasião da dispensa. Prestados os presentes esclarecimentos, subsiste o decidido a respeito." (fls. 638/640)

Em seu recurso de revista, a Reclamante alega que o laudo pericial foi conclusivo quanto ao tratamento de tuberculose no ato da dispensa.

Diz que o próprio Tribunal Regional, ao discorrer sobre a doença às fls. 638/640, reconhece que a Reclamante era portadora da enfermidade.

Assevera que "a prova técnica produzida nos autos demonstra o flagrante tratamento discriminatório e arbitrário sofrido pela reclamante portadora de tuberculose, constituindo, portanto, abuso de direito potestativo de resilição do contrato de trabalho e ato ilícito, nos termos do art. 187 e 927 do Código Civil" (fl. 653).

Alega que sítios eletrônicos especializados demonstram a gravidade da doença e sua repercussão social.

Aponta violação dos arts. 1º, III, 3º, IV, 5º, I, X e XXX, 7º, XXXI, da CF, 9º da CLT, 182, 186, 187, 422 e 927 do Código Civil, e 4º da Lei 9.029/95, bem como contrariedade à Súmula 443 do TST.

Transcreve julgados.

Ao exame.

Observo que o quadro fático delineado no acórdão regional demonstra, de fato, que a Reclamante era portadora de tuberculose na ocasião de sua dispensa.

Com efeito, as considerações da Corte a quo quanto à ciência da empresa acerca da enfermidade durante o vínculo de emprego, aliadas às conclusões da perícia técnica psicológica e do parecer técnico juntado pela Demandada, no qual consignado que a cura da tuberculose ocorreu apenas em 2010, corroboram a tese obreira nesse ponto.

Nada obstante, não é possível concluir que a dispensa da Reclamante ocorreu em razão da enfermidade adquirida.

Como se observa, o Tribunal Regional registrou que o laudo pericial concluiu pela ausência de incapacidade de ordem psiquiátrica da trabalhadora ao tempo da dispensa, também anotando que a obreira desistiu de provar o nexo etiológico entre a moléstia que a afligiu – tuberculose – e as condições de trabalho a que submetida.

Aduziu a ausência de notícias acerca de eventual impedimento para a dispensa, pois não vivenciou a obreira qualquer afastamento por doença ou percebeu benefício previdenciário, concluindo que caberia a ela comprovar a discriminação alegada.

Por fim, ao observar que o contrato de trabalho vigorou por mais de seis anos após a ciência empresarial da moléstia que afligiu a trabalhadora, afirmou a regularidade do ato de dispensa, indeferindo a indenização postulada.

Nesse contexto, uma vez consignado, no acórdão regional, que a tuberculose não constituiu impedimento para a manutenção do vínculo de emprego por mais de seis anos – premissa fática inafastável nesta instância recursal (Súmula 126 do TST), inviável reconhecer que a dispensa efetivada pela Reclamada foi discriminatória.

Não há falar, assim, em aplicação da presunção estabelecida na Súmula 443 do TST, tampouco em violação a preceitos de lei.

Inespecífico o aresto à fl. 653, porquanto não trata da hipótese dos autos, em que verificada a manutenção da relação de emprego mesmo após o conhecimento da empresa acerca da doença adquirida pela Reclamante.

Ademais, os arestos trazidos à colação à fl. 654 também são inservíveis para o confronto de teses, já que oriundos de Turmas do TST, Órgão não especificado no artigo 896, "a", da CLT.

NÃO CONHEÇO. (grifos apostos)

Interpostos embargos de declaração, a eg. Sétima Turma assim se pronunciou (fls. 736-739), in litteris:

A Embargante busca esclarecimentos por esta Corte no tocante à negativa de prestação jurisdicional, afirmando que os pontos suscitados pela parte não foram devidamente apreciados pelo Tribunal Regional.

Requer novamente o retorno dos autos à origem, para que seja esclarecida a inaptidão para o trabalho no momento de sua dispensa, bem como para que o Tribunal Regional se manifeste sobre as conclusões periciais.

Diz que, uma vez reconhecida, por esta Turma, a existência da tuberculose, deve incidir ao caso a inteligência inscrita na Súmula 443 do TST.

Ao exame.

Observo, inicialmente, que a oposição de embargos de declaração deve adequar-se às hipóteses previstas nos artigos 535 do CPC e 897-A da CLT.

Assim, o mero inconformismo quanto ao julgamento proferido, sem a demonstração inequívoca dos vícios consagrados nos artigos 535 do CPC e 897-A da CLT, não autoriza a oposição de embargos declaratórios.

In casu, verifico que os temas renovados nos presentes embargos foram devidamente apreciados por esta Corte.

Com efeito, no acórdão às fls. 706/723, restou consignado que o Tribunal Regional, após a determinação deste Colegiado à fl. 604, entregou a prestação jurisdicional de forma adequada, esclarecendo que a Autora estava apta para o trabalho na ocasião de sua dispensa e registrando as conclusões da perícia médica.

Esta Turma, de forma contundente, registrou que "a Corte a quo atendeu ao comando desta 7ª Turma, analisando as questões apresentadas nos embargos de declaração" (fl. 713).

Quanto à aplicação da Súmula 443 do TST, assim constou do acórdão embargado: (...)

É certo, portanto, que este Colegiado, de forma explícita, apreciou todas as questões apresentadas no recurso de revista.

Na verdade, o exame das razões dos embargos revela que a pretensão da Embargante está direcionada ao reexame do julgado, o que não se mostra admissível, sem franca ofensa ao art. 5°, LIV, da Constituição Federal.

A modificação do decisum desafia recurso próprio, o que não se coaduna com a medida processual eleita, ante os limites impostos nos arts. 535 do CPC e 897-A da CLT.

NEGO PROVIMENTO.

Trata-se de hipótese na qual a reclamada dispensou, sem justa causa, a empregada portadora de tuberculose.

Este Tribunal Superior uniformizou o entendimento de que, inexistindo outra causa, e ciente o empregador do estado de saúde do trabalhador, presume-se discriminatória a dispensa imotivada de empregado portador de doença grave ou que cause estigma ou preconceito, consoante preconiza a Súmula nº 443, verbis:

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.

Na hipótese, sendo incontroverso que a reclamada tinha ciência de que a reclamante era portadora de tuberculose, o exercício do direito potestativo de dispensa, sem justa causa, faz presumir a existência de conduta discriminatória, e arbitrária, da empregadora, suficiente a invalidar o ato e a assegurar o direito ao retorno ao emprego.

Com efeito, a gravidade da tuberculose conta com previsão legal expressa no art. 186, I, § 1º, da Lei nº 8.112/1990:

Art. 186.

(...)

§ 1º Consideram-se doenças graves, contagiosas ou incuráveis, a que se refere o inciso I deste artigo, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, cardiopatia grave, doença de Parkinson, paralisia irreversível e incapacitante, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados do mal de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e outras que a lei indicar, com base na medicina especializada. (grifos apostos)

Por sua vez, constitui fato notório que a tuberculose, anteriormente conhecida como "tísica", enseja indesejado estigma social, o qual inclusive prejudica, atualmente, o tratamento da doença:

Segundo autores, o estigma possui um substrato sociocultural cujos sujeitos, que não têm conhecimento sobre a TB, estão expostos a comportamentos negativos e a atitudes discriminatórias. Observa-se que doente e família convivem com o medo da exclusão social e, dessa forma, evitam revelar seu status e falar sobre a doença no trabalho e na comunidade. A substituição da palavra "tuberculose" por outros termos e expressões pode ser um meio de suavizar a sua condição e não revelar o diagnóstico para as pessoas do seu convívio. (TOUSO, POPOLIN, CRISPIM, et al. "Estigma social e as famílias de doentes com tuberculose: um estudo a partir das análises de agrupamento e de correspondência múltipla". Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4577-4585, 2014)

Os 80 mil brasileiros que pegam tuberculose no Brasil a cada ano sofrem, além da doença, estigma e preconceito de parte da sociedade.

O resultado é de uma pesquisa nacional encomendada pelo projeto Fundo Global TB e realizada pelo instituto DataUFF, da Universidade Federal Fluminense.

O relatório completo será apresentado no 4º Encontro Nacional de Tuberculose, que começa hoje, no Rio.

Segundo o levantamento, as reações mais comuns das pessoas próximas a alguém que teve a doença foram separar talheres, pratos e objetos pessoais (34% das respostas) ou evitar falar, tocar e se aproximar dela (30%).

Apenas 27% disseram que nada mudou. A maioria (53%) acredita ainda ser necessário internar alguém com tuberculose.

A doença não é transmitida pelo uso dos mesmos pratos, talheres ou roupas. Quando diagnosticada precocemente, não há necessidade de internação e, após 15 a 30 dias de tratamento, não há risco de contágio.

"O preconceito ajuda a afastar o paciente do posto de saúde. Mas a tuberculose é uma doença normal. Se não houvesse tanto estigma e medo de se sentir isolada, a pessoa certamente cumpriria melhor o tratamento", afirma a coordenadora do projeto, Cristina Boaretto.

Segundo ela, esse preconceito contribui para diminuir a taxa de cura da doença no Brasil. "Ainda temos um percentual de cerca de 70% de cura, quando o desejável é que essa taxa fosse de 95%." (GOIS, Antônio. "Preconceito ainda prejudica tratamento de tuberculose". Folha de São Paulo. São Paulo, quarta-feira, 26 de maio de 2010)

Sinale-se que, a partir da presunção preconizada pela Súmula nº 443 do TST, e diversamente do entendimento que contemplado no acórdão turmário, não se mostram suficientes para elidir a conclusão de que houve discriminação as premissas fáticas de que: a) a tuberculose não impediu a manutenção do vínculo de emprego por mais de seis anos após a empresa ter ciência da doença; b) não houve afastamento do trabalho para tratamento de saúde nem a percepção de benefício previdenciário; c) não havia incapacidade de ordem psiquiátrica ao tempo da dispensa; e d) tampouco foi provado nexo causal com as condições laborais.

Não há base legal para se exigir, como requisitos para a comprovação de dispensa discriminatória, a imediatidade da despedida, a redução da capacidade laboral, o afastamento para tratamento de saúde, a concessão de auxílio-doença, tampouco o eventual nexo causal entre a enfermidade e o trabalho realizado.

Constata-se, portanto, que a fundamentação da Corte Regional de origem, expressamente ratificada pela Turma, filia-se ao entendimento diametralmente oposto ao da Súmula nº 443 do TST, no sentido de que, para a reclamante ver reconhecido o direito à reintegração no emprego, "caberia a ela comprovar a discriminação alegada" (fls. 706), merecendo destaque o seguinte trecho do acórdão regional:

8 – A própria reclamante admite que a empresa tinha ciência de que ela era portadora de tuberculose. Ora, se isso não foi impedimento para a vigência da relação de emprego por mais de seis anos, caberia à autora provar que foi a causa para o desligamento, encargo do qual não se desincumbiu. (fl. 712, grifos apostos)

Assim, resultando incontroverso que a empresa estava ciente do estado de saúde da reclamante, forçoso é reconhecer que a recorrida abusou de seu direito ao despedir, sem justa causa, empregada acometida por doença grave, o que invalida o ato e, em consequência, autoriza a reintegração no emprego, como forma a assegurar a manutenção das condições dignas de sobrevivência pessoal e familiar, e ao mesmo tempo desestimular a despedida motivada apenas pelo preconceito, e não por motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro.

Dessa forma, diante da contrariedade à Súmula nº 443 do TST, merece reparos a decisão que denegou seguimento aos embargos.

Ante o exposto, configurada a hipótese prevista no art. 894, II, da CLT, DOU PROVIMENTO ao agravo regimental para determinar o processamento e julgamento do recurso de embargos, observado o procedimento estabelecido no art. 3º da Instrução Normativa nº 35/2012 do Tribunal Superior do Trabalho.

II - RECURSO DE EMBARGOS

1. CONHECIMENTO

Atendidos os requisitos de admissibilidade referentes à tempestividade (fls. 741 e 755) e à representação processual (fls. 582 e 671), passo ao exame dos embargos, regidos pela Lei nº 13.015/2014.

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE TUBERCULOSE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO

Conforme os fundamentos previamente adotados no exame do agravo regimental, em relação à ao direito à reintegração no emprego por dispensa discriminatória, aos quais me reporto, o embargante logrou demonstrar a contrariedade à Súmula nº 443 do TST.

Caracterizada a hipótese prevista no art. 894, II, da CLT, CONHEÇO do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial.

2. MÉRITO

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE TUBERCULOSE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO

Conhecido o recurso por contrariedade à Súmula nº 443 desta Corte Superior, DOU PROVIMENTO aos embargos para reconhecer o caráter discriminatório da dispensa sem justa causa da empregada portadora de tuberculose, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga no julgamento da demanda, conforme entender de direito.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho: I - por maioria, conhecer do agravo regimental e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o processamento e julgamento do recurso de embargos, observado o procedimento estabelecido no art. 3º da Instrução Normativa nº 35/2012 do Tribunal Superior do Trabalho. Vencidos os Exmos. Ministros João Oreste Dalazen, João Batista Brito Pereira, Renato de Lacerda Paiva, Aloysio Corrêa da Veiga, Márcio Eurico Vitral Amaro e Cláudio Mascarenhas Brandão; II - por maioria, conhecer dos embargos, por contrariedade à Súmula nº 443 do TST, vencidos os Exmos. Ministros João Oreste Dalazen, Ives Gandra Martins Filho, Aloysio Corrêa da Veiga, Márcio Eurico Vitral Amaro e Cláudio Mascarenhas Brandão, e, no mérito, por unanimidade, dar-lhes provimento para reconhecer o caráter discriminatório da dispensa sem justa causa de empregada portadora de tuberculose, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga no julgamento da demanda, conforme entender de direito.

Brasília, 09 de março de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Walmir Oliveira da Costa

Ministro Relator

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