TST - INFORMATIVOS 2017 2017 170 - 28 novembro a 19 dezembro

Data da publicação:

Subseção I Especializada em Dissídios Individuais

Guilherme Caputo Bastos - TST



07 -Recurso de revista. Conhecimento. Violação do art. 927, caput, do Código Civil de 2002. Impossibilidade. Fato gerador do dano ocorrido sob a vigência do Código Civil de 1916. É inviável o conhecimento de recurso de revista por violação do art. 927, caput, do Código Civil de 2002, na hipótese em que o fato gerador do pedido de indenização por danos morais ocorreu no ano de 2000, quando o referido dispositivo legal ainda não se encontrava em vigor. Sob esse fundamento, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos interpostos pela reclamada, por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, deu-lhes provimento para determinar o retorno dos autos à Turma de origem, a fim de que, afastada a reconhecida afronta ao art. 927, caput, do CC de 2002, prossiga na análise das demais alegações trazidas no recurso de revista, considerando que os fatos ocorreram sob a vigência do Código Civil de 1916. Vencidos os Ministros Aloysio Corrêa da Veiga, relator, João Oreste Dalazen, Márcio Eurico Vitral Amaro e José Roberto Freire Pimenta. (TST-E-ED-RR-353-90.2010.5.10.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, red. p/ acórdão Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 14.12.2017).



Resumo do voto.

Recurso de revista. Conhecimento. Violação do art. 927, caput, do Código Civil de 2002. Impossibilidade. Fato gerador do dano ocorrido sob a vigência do Código Civil de 1916. É inviável o conhecimento de recurso de revista por violação do art. 927, caput, do Código Civil de 2002, na hipótese em que o fato gerador do pedido de indenização por danos morais ocorreu no ano de 2000, quando o referido dispositivo legal ainda não se encontrava em vigor. Sob esse fundamento, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos interpostos pela reclamada, por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, deu-lhes provimento para determinar o retorno dos autos à Turma de origem, a fim de que, afastada a reconhecida afronta ao art. 927, caput, do CC de 2002, prossiga na análise das demais alegações trazidas no recurso de revista, considerando que os fatos ocorreram sob a vigência do Código Civil de 1916. Vencidos os Ministros Aloysio Corrêa da Veiga, relator, João Oreste Dalazen, Márcio Eurico Vitral Amaro e José Roberto Freire Pimenta.

A C Ó R D Ã O

AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DA RECLAMADA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. MOTORISTA. ACIDENTE FATAL OCORRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PROVIMENTO.

1. Evidenciada a existência de divergência jurisprudencial, merece ser processado o recurso de embargos.

2. Agravo regimental a que se dá provimento.

EMBARGOS DA RECLAMADA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. MOTORISTA. ACIDENTE FATAL OCORRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PROVIMENTO.

1. Inviável o conhecimento do recurso de revista por afronta a dispositivo de lei que não estava em vigor à época em que ocorrido o fato gerador do pedido de compensação.

2. É cediço que, a teor dos artigos 6º da LINDB e 5º, XXXVI, da Constituição Federal, a lei de natureza material produzirá efeito imediato e geral, respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

3. Extrai-se dos referidos dispositivos que os atos praticados, as situações jurídicas já consolidadas e os direitos implementados sob a égide da norma revogada serão por ela disciplinados, ante a impossibilidade da aplicação retroativa da norma revogadora.

4. Na hipótese, a Turma, conquanto tenha reconhecido que o acidente fatal sofrido pelo empregado ocorreu no ano de 2000, anteriormente à entrada em vigor do CC/2002, conheceu do recurso de revista com fulcro no artigo 927, caput, desse diploma legal.

5. Desse modo, o recurso de revista não poderia ter sido conhecido por violação a norma jurídica inaplicável ao fato gerador do pedido de compensação por danos morais, já que não vigente à época da sua ocorrência.

6. Assim, afastado o fundamento que ensejou o conhecimento do recurso de revista, deve ser determinado o retorno dos autos à egrégia Terceira Turma, a fim de que prossiga no exame das demais alegações recursais, considerando que os fatos ocorreram sob a égide do CC de 1916.

7. Recurso de embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-E-ED-RR-353-90.2010.5.10.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, red. p/ acórdão Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 21.09.2017).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-353-90.2010.5.10.0000, em que é Embargante CALTA - CALCÁRIO TAGUATINGA LTDA. e Embargado(a) DEUZELINA RAIMUNDO DO NASCIMENTO LIMA E OUTROS.

Rogo vênia ao Excelentíssimo Ministro Relator para adotar o voto por ele proferido em sede de agravo regimental, provido, à unanimidade, em sessão de julgamento e o relatório dos embargos.

"O r. despacho da Presidência da c. 3ª Turma, denegou o recurso de embargos da reclamada, por não configurada a hipótese do art. 894, II, da CLT.

A reclamada interpõe Agravo Regimental (às fls. 1082/1088), sob o argumento que demonstrou divergência jurisprudencial apta ao conhecimento dos Embargos.

Os reclamantes apresentaram impugnação aos Embargos (às fls. 1094/1096) e contraminuta ao Agravo Regimental (às fls. 1091/1092).

A d. Procuradoria do Trabalho não se manifestou.

É o relatório.

V O T O

CONHECIMENTO

Conheço do Agravo Regimental, porque regular e tempestivo.

MÉRITO

O r. despacho não admitiu os Embargos, ao fundamento:

"A Eg. 3ª Turma deu provimento ao recurso de revista dos reclamantes, sob os seguintes fundamentos (fls. 430/438):

"O Tribunal Regional, quanto ao tema, assim decidiu:

3.1. RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS.

Na inicial, os reclamantes pugnam pela condenação da reclamada em danos materiais e morais, assim estipulados:

a) R$ 179.650,00 - devido a danos emergentes;

b) R$ 119.766,66 - devido a lucros cessantes;

c) R$ 40.000,00 - devido aos danos morais;

d) R$ 9.862,00 - pensão mensal devida

O Juízo a quo, com base no laudo pericial, negou o pedido de indenização ao argumento de não ter restado caracterizada a culpa da reclamada (fls. 399/402).

Irresignados, recorrem os autores.

Argumentam que o reclamante faleceu em decorrência de acidente automobilístico quando estava desempenhando seu labor na qualidade de motorista, transportando outro empregado da reclamada de Taguatinga/TO para Brasília/DF, portanto, resta caracterizada a sua responsabilidade objetiva (Teoria do Risco) no evento, fato que por si só já comprova a sua obrigação de indenizar a família do obreiro falecido.

Aduziu, ainda, que conforme as provas produzidas nos autos, especialmente a testemunhal, restou comprovado que o reclamante no dia anterior ao acidente foi buscar o empregado em questão em Brasília. Depois ajudou citada pessoa a consertar um compressor, sendo certo que quando terminaram o serviço pegou a estrada para retorno à Brasília, onde aquele outro iria pegar ônibus para a cidade de São Paulo.

Restou comprovado, no entender dos reclamantes que o empregado antes de sofrer o acidente que ocasionou o seu falecimento desempenhou jornada em muito superior ao limite constitucional/legal, tendo esse fato contribuído para ocorrência do acidente que vitimou fatalmente o Sr. Manoel Pereira Lima.

Para a caracterização da responsabilização civil por danos causados, seja material ou moral, é necessária a observância de três condições gerais: conduta humana, nexo de causalidade e dano. Conjugados esses três elementos, presente estará o direito do empregado à reparação civil.

Incontroverso nos autos a ocorrência do acidente de trânsito (boletim de ocorrência de fls. 34 e verso e CAT de fl. 47).

O mesmo se diga com relação ao dano, caracterizado pela morte do empregado da reclamada, Sr. Manoel Pereira Lima, respectivamente marido e pai dos reclamantes (certidão de óbito de fl. 28).

Necessário, ainda, para a determinação de pagamento de indenização por danos morais e materiais pela reclamada, aos reclamantes, a comprovação do nexo causal, ou seja, a relação entre o acidente e os serviços desempenhados pelo de cujus à empresa, a qual é latente nos autos, posto que o reclamante, quando da ocorrência do acidente era motorista da reclamada e estava realizando viagem via terrestre de Taguatinga/TO para Brasília/DF, trazendo o mecânico que foi àquela cidade para realizar o conserto de um compressor, para embarcar para São Paulo/SP.

Para ser devido o pagamento de indenização por danos morais e materiais cabe, ainda, ser demonstrado nos autos a conduta culposa da reclamada, ou seja, se agiu com negligência, imperícia ou imprudência, conforme termos dos arts. 186, do Código Civil e art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal.

Conforme laudo pericial realizado pela Polícia Civil do Estado de Goiás ‘TERCEIRA CIRCUNSCRIÇÃO REGIONAL DE POLÍCIA TÉCNICO CIENTÍFICA’ restou devidamente comprovada a ocorrência de acidente automobilístico que acarretou a morte dos condutores dos dois veículos envolvidos no sinistro, o Sr. Manoel Pereira Lima e Sr. Leonardo Ferreira de Souza, bem como, que o acidente ocorreu única e exclusivamente pela conduta do motorista do carro que vinha em sentido contrário ao do ‘de cujus’, VW/Logus, segunda pessoa citada, senão vejamos:

‘DINÂMICA DO EVENTO:

De conformidade com as evidências materiais colhidas no local do acidente plotadas em croqui, bem como as fotografias apresentadas, os peritos passaram a discutir a natureza do acidente em sua provável dinâmica: Trafegava normalmente pela GO-118, em sentido terezina/Alto Paraíso, a unidade V-2 (FIAT), quando ao chegar no Km 222,700, teve o seu percurso interrompido repentinamente pela unidade V-1 (LOGUS) que trafegava em sentido contrário e invadiu sua mão de direção (de V-2), colidindo frontalmente, tendo como consequências a morte de ambos condutores e danos de grandes proporções em ambas unidades.

Pelos vestígios materiais, ponto de impacto, pontos de repouso das unidades, condições da pista (boa conservação) e pela sinalização horizontal (faixas centrais), como esta plotado em croqui, os peritos subscritores são levados a crerem que o conduta da unidade V-1 provavelmente trafegava atrás de outro veículo e ao perceber que a faixa contínua de sua mão de direção havia terminado para iniciar faixa fragmentada, deve ter tentado realizar manobra de ultrapassagem, porém V-2 que trafegava em sentido contrário, ocupava a faixa de rolamento naquele mesmo local e mesmo momento, acontecendo o acidente, visto que não ficou evidenciado nenhuma marca de frenagem tanto de V-1, quanto de V-2.

Caso o condutor de V-1 (VW LOGUS) houvesse tomado de mais cautela ao inicial ultrapassagem, teria observado a presença de V-2 e o acidente não teria ocorrido.

CONCLUSÃO

Depois de efetuado o levantamento pericial de local e analisadas as circunstâncias em que ocorreu o acidente, os Peritos Criminais concluem como sendo causa do mesmo a imprudência do condutor de V-1 (VW LOGUS) em deixar sua mão-de-direção repentinamente e invadir a mão-de-direção da unidade V-2 (FIAT).’ (fl. 40)

Inicialmente, tenho que não prospera a alegação dos recorrentes de violação pelo Juiz sentenciante, quando da prolação da sentença, aos termos dos arts. 131 e 436, ambos do CPC, ao basear-se somente nele para indeferir o pedido formulado na petição de ingresso, posto que essa é a única prova existente nos autos acerca da dinâmica do acidente em questão, principalmente no que se refere à responsabilidade pelo seu acontecimento, tendo sido produzido pela Polícia Civil do Estado de Goiás (conclusão retrotranscrita).

Saliento que restou demonstrado nos autos a inexistência de testemunha que tenha presenciado a ocorrência do infortúnio.

De se notar que quando da prolação do decisum o julgador manifestou-se expressamente e considerou para a conclusão a que chegou, sobre as outras questões suscitadas pelos autores, tais como, o fato do obreiro ter prestado jornada elastecida, a viagem ser realizada em horário noturno e a exiguidade de tempo para a sua conclusão, ou seja, a chegada a Brasília para embarque do mecânico para São Paulo, o que comprova que ele não se ateve exclusivamente ao laudo, sendo lógico, que ele foi o documento principal para que se chegasse à conclusão da falta de responsabilidade da reclamada no evento.

Ainda, há que ser levado em consideração que o laudo pericial em questão foi realizado por profissionais devidamente habilitados para tal mister, peritos da Polícia Civil do Estado de Goiás, portanto, merece acolhimento pelo julgador. Todavia, tal laudo poderia ter sido desconstituído pelos autores, desde que tivessem produzido provas nesse sentido, ônus que lhes competia, nos termos dos arts. 333, I, do CPC e 818, da CLT.

Entretanto, as provas testemunhais produzidas pelos autores (fls. 300/313) apenas comprovam a alegação de que o reclamante, antes de realizar a viagem que o vitimou havia cumprido jornada elastecida, porém, como restou sobejamente comprovado nos autos, a ocorrência do infortúnio deveu-se única e exclusivamente a atitude do motorista do carro que vinha em sentido contrário.

Não há qualquer prova nos autos que o acidente teria ocorrido devido a suposto cansaço do emprego, a alta velocidade empreendida pelos veículos, problemas mecânicos, etc. Ante a existência do laudo, resta indene de dúvidas que caberiam aos autores tal prova.

Além disso, nenhuma atitude que a empresa pudesse ter tomado poderia ter amenizado a ocorrência, haja vista a conclusão do laudo.

Restou sobejamente comprovado, dessa forma, que a reclamada não teve qualquer responsabilidade ou culpa relativamente ao acidente ocorrido que vitimou o empregado, sendo certo que o mesmo deveu-se à imprudência do motorista do veículo que vinha em sentido contrário.

Assevero, por fim, que não há que se falar em responsabilidade objetiva da reclamada, tese defendida pelos autores, segundo a qual é necessária para a sua caracterização apenas o nexo de causalidade entre a conduta e o dano causado, tendo em vista os termos do art. 7º, XXVIII, da Carta Magna e art. 186, do Código Civil, uma vez que a atividade exercida não trás em si eminente risco de dano para o empregado.

Pontuo, que no entendimento dessa Relatora a indenização por danos morais e materiais somente deve ser indenizada pelo empregador em caso responsabilidade subjetiva dessa.

Portanto, ausente a culpa da empresa no evento que causou a morte do seu empregado, um dos requisitos da responsabilização civil (conduta), não há se falar em indenização por danos materiais e morais.

Nego provimento ao recurso. (fls. 137-141 - destacamos)

No recurso de revista, os Reclamantes sustentam, em síntese, que o dever de indenizar decorre da responsabilidade objetiva da Reclamada, o que dispensaria a comprovação de culpa. Apontam violação dos arts. 7º, XXVIII, da CF; 186, 927, parágrafo único do CC, e 930 do CC; 131 e 436 do CPC. Transcrevem arestos para o confronto de teses.

Com razão.

A regra geral do ordenamento jurídico, no tocante à responsabilidade civil do autor do dano, mantém-se com a noção da responsabilidade subjetiva (arts. 186 e 927, caput, CC). Assim também estabelecia o art. 159 do CC/16.

No plano das relações de trabalho, a responsabilidade subjetiva do empregador tem assento inclusive constitucional (art. 7º, XXVIII, CF).

O novo CC/2002, em seu art. 927, parágrafo único, suscitou uma nova leitura no que tange à responsabilidade civil no âmbito laboral, à luz do art. 7º, caput, da CF, porquanto, tratando-se de atividade empresarial, ou de dinâmica laborativa (independentemente da atividade da empresa), fixadoras de risco especialmente acentuado para os trabalhadores envolvidos, desponta a exceção ressaltada pelo dispositivo, tornando objetiva a responsabilidade empresarial por danos acidentários (responsabilidade em face do risco).

Todavia, preserva-se a compreensão de ser incabível a responsabilidade objetiva do empregador quando se tratar de acidente submetido ao Código Civil/1916.

O caso dos autos trata de acidente de trabalho ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002, marco geral em que foi inserida expressamente a hipótese de responsabilidade objetiva, conforme explicitado. No entanto, o dano relatado na presente demanda não se insere nas disposições comuns retratadas no Código Civil de 1916, por se tratar de acidente sofrido por motorista da empresa no exercício de suas funções.

Na hipótese, é aplicável por analogia a Súmula 187/STF, segundo a qual - a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com opassageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva -, de maneira que afasta o alegado pela Reclamada em sentido contrário.

Com efeito, o acidente de trabalho retratado atrai a responsabilidade civil objetiva do empregador, a qual prescinde da comprovação de culpa, por força do artigo 17 do Decreto nº 2.681, de 7 de dezembro de 1912, de seguinte teor:

‘Art. 17 - As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea.

A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas:

1ª - Caso fortuito ou força maior;

2ª - Culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada’.

Embora referida legislação trate de responsabilidade civil em estradas de ferro, é aplicável, por analogia, à empresa Reclamada.

Ademais, a despeito de a norma referir-se aos danos provocados aos viajantes, não se pode restringir a aplicação do preceito aos casos de contrato de transporte, em detrimento daqueles que mais se expõem aos riscos da atividade - na medida em que os empregados, por lidarem diariamente com o perigo e má conservação das rodovias do país, têm maior propensão, evidentemente, a acidentes do que os demais, indistintamente -, sob pena inclusive de afronta à dignidade da pessoa humana e à valorização mínima deferível ao trabalho (art. 1°, III e 170, caput, da CF/88).

Além disso, a responsabilidade civil objetiva do empregador em acidentes decorrentes das relações de trabalho não se baseia exclusivamente no art. 927, parágrafo único, do CC de 2002. Sabe-se que a própria CLT, no caput do seu art. 2º, prevê que os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador. Nesse sentido, os seguintes precedentes:

‘DANO MORAL. ACIDENTE DO TRABALHO. RISCO INERENTE À ATIVIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. A atividade de transporte de valores em carro forte é, pela sua natureza, indubitavelmente uma atividade de risco acentuado e, de acordo com o art. 2º da CLT, os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador. Saliente-se que, embora o art. 7º, inc. XXVIII, da Constituição da República estabeleça a obrigação do empregador, quando incorrer em dolo ou culpa, de indenizar oempregado em razão de acidente de trabalho, o caput desse dispositivo ressalta que os direitos ali previstos não o são de forma taxativa, ao dispor 'além de outros que visem à melhoria de sua condição social'. Dessa forma, não há impedimento constitucional para a incidência do art. 927 do Código Civil, que no seu parágrafo único dispõe: ‘Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem’. Dessa forma, revela-se objetiva a responsabilidade do empregador quando há risco inerente à sua atividade. Recurso de Embargos de que se conhece e a que se dá provimento’. (Processo: E-RR - 84700-90.2008.5.03.0139 Data de Julgamento: 03/12/2009, Relator Ministro: João Batista Brito Pereira, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 11/12/2009) (g.n).

‘RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DO TRABALHO. - MOTOBOY -. DANO MORAL E ESTÉTICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. TEORIA DO RISCO DA ATIVIDADE. 1. Tese regional, fulcrada na exegese dos artigos 2º da CLT e 927, parágrafo único, do Código Civil, a afirmar a responsabilidade objetiva, nas atividades em que um dos contratantes exponha o outro a risco, bem como a assunção, pelo empregador, dos riscos da atividade econômica. 2. Prevalecendo nesta Corte compreensão mais ampla acerca da exegese da norma contida no caput do art. 7.º da Constituição da República, revela-se plenamente admissível a aplicação da responsabilidade objetiva à espécie, visto que o acidente automobilístico de que foi vítima o trabalhador - que laborava na função de -motoboy- -, ocorreu no exercício e em decorrência da atividade desempenhada para a reclamada, notadamente considerada de risco. Precedentes. 3. Inviolados os arts. 7º, XXVIII, da Constituição da República e 186 e 927 do Código Civil. Inespecífico o aresto paradigma coligido. Aplicação das Súmulas 23 e 296 do TST. Recurso de revista não conhecido’.

(Processo: RR - 59300-11.2005.5.15.0086 Data de Julgamento: 03/08/2011, Relatora Ministra: Rosa Maria Weber, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/08/2011) (g.n)

‘AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ÓBITO DO EMPREGADO. ATIVIDADE DE RISCO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. Considerando que o próprio TRT reconhece que o empregado, no exercício das funções de vendedor, a serviço do empregador, envolveu-se em acidente automobilístico, verifica-se que o temamerece enfrentamento pelo enfoque do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil. Agravo de instrumento provido.

RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. 1. É incontroverso que o acidente automobilístico que levou o empregado a óbito ocorreu no momento em que o de cujus executava seu trabalho para a reclamada, tendo o TRT registrado que a empresa desenvolvia atividade - voltada para o comércio de cereais, com transporte rodoviário de carga -. 2. Em Sessão do dia 04/11/2010, ao examinar o Processo nº TST-9951600-43.2006.5.09.0664, a SBDI-1/TST decidiu que a responsabilidade é objetiva em caso de acidente em trabalho de risco acentuado, restando estabelecido que não é a atividade da empresa, mas o específico labor do empregado que define o risco. 3. No caso, não há dúvidas quanto ao risco da atividade do empregado que trabalhava conduzindo veículo de carga em rodovias. 4. Vale transcrever trecho de acórdão da SBDI-1/TST, da lavra da Exma. Ministra Maria Calsing, para quem - a atividade de motorista exercida pelo reclamante configura-se de risco. A despeito de tratar-se de um ato da vida comum - dirigir automóvel, que estaria inserido, como tal, no risco genérico, a frequência do exercício de tal atividade, necessária e habitual à consecução dos objetivos patronais, expõe o reclamante a maior probabilidade de sinistro. - (trecho extraído do acórdão proferido nos autos do Processo TST-E-ED-RR-102300-42.2007.5.03.0016, julgado em 10/11/2011). 5. Nesse contexto, a decisão merece ser reformada para reconhecer a responsabilidade objetiva da reclamada e condená-la em indenização por danos morais e materiais. Recurso de revista conhecido e provido’ (TST-RR-128800-37.2008.5.02.0373, Data de Julgamento: 23/05/2012, Relator Ministro: Horácio Raymundo de Senna Pires, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/05/2012).

‘RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. MOTORISTA DE CAMINHÃO. TEORIA DO RISCO DA ATIVIDADE. EXEGESE QUE SE EXTRAI DO CAPUT DO ARTIGO 7° DA CF C/C OS ARTIGOS 2° DA CLT E 927, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC. Esta Corte tem entendido que o artigo 7°, XXVIII, da Constituição Federal, ao consagrar a teoria da responsabilidade subjetiva, por dolo ou culpa do empregador, não obsta a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva às lides trabalhistas, mormente quando a atividade desenvolvida pelo empregador pressupõe a existência de risco potencial à integridade física e psíquica do trabalhador e o acidente ocorreu na vigência doRepública, ao elencar o rol de direitos mínimos assegurados aos trabalhadores, não exclui a possibilidade de que outros venham a ser reconhecidos pelo ordenamento jurídico infraconstitucional, tendo em mira que o próprio caput do mencionado artigo autoriza ao intérprete a identificação de outros direitos, com o objetivo da melhoria da condição social do trabalhador. De outra parte, a teoria do risco da atividade empresarial sempre esteve contemplada no artigo 2° da CLT, e o Código Civil de 2002, no parágrafo único do artigo 927, reconheceu, expressamente, a responsabilidade objetiva para a reparação do dano causado a terceiros. No caso dos autos, não há dúvida quanto ao risco imanente à atividade empresarial do transporte de cana de açúcar, e o reclamante, na condição de motorista, sofreu acidente de trabalho que ocasionou-lhe a amputação do seu membro inferior direito, sendo devida a reparação correspondente, em razão dos danos morais e materiais. Recurso de revista não conhecido’. (Processo: RR - 114400-47.2005.5.15.0054 Data de Julgamento: 15/09/2010, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 17/09/2010) (g.n)

Registre-se, por cautela, que, de fato, a culpa de terceiro é uma das excludentes do dever de indenizar. Contudo, citado entendimento não se aplica quando a possibilidade de sofrer o infortúnio, mesmo causado por terceiros, for aumentada em razão do exercício do trabalho, pelo que se aplica, diferentemente do alegado pela Reclamada, a responsabilidade civil objetiva do empregador, com base no risco conexo e previsível daquela atividade econômica.

No caso concreto, o TRT consignou ser incontroverso que o obreiro sofreu acidente automobilístico durante viagem a serviço da empresa Reclamada, em veículo dela, e que, após o evento, veio a falecer.

Ao sopesar as provas dos autos, mormente o laudo pericial elaborado pela Polícia Civil do Estado de Goiás, concluiu que o acidente decorreu por culpa de terceiro, sendo inaplicável à hipótese a responsabilização objetiva da Reclamada ao fundamento de que a atividade exercida pelo de cujus - motorista - não implica, por si só, eminente risco de dano para o empregado.

Contudo, a função de motorista desenvolvida pelo de cujus para a Reclamada, demandando contínuas viagens, inclusive por rodovias, atrai a aplicação da responsabilidade civil objetiva ao empregador, porque resulta em exposição do empregado a risco exacerbado, maior do que aquele inerente ao cotidiano da maioria dos demais indivíduos.

Diante do quadro fático relatado pelo Tribunal a quo, desponta o dever de indenizar o Reclamante pelo infortúnio ocorrido.

Diante do exposto, CONHEÇO do recurso de revista por violação do art. 927, caput, do CC.

II) MÉRITO

MOTORISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO OCORRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Em consequência do conhecimento do recurso de revista por violação ao art. 927, ‘caput’, do CC, declaro a responsabilidade civil objetiva da Reclamada. Assim, estando presentes os pressupostos dano, e nexo-causal, resulta o dever do empregador de indenizar.

O acórdão dos embargos de declaração está assim colocado (fls. 567/569):

"(...)

Não procede a alegada contradição em face do conhecimento do apelo por violação ao art. 927, caput, do CCB e da apontada ausência de prequestionamento das normas utilizadas. O recurso de revista foi conhecido à luz do dispositivo de lei que rege a matéria e, além disso, a reclamação trabalhista foi ajuizada em 21/05/2002, antes, portanto, da vigência do Novo Código Civil, caso em que não havia possibilidade de a parte prequestionar o referido dispositivo legal.

Ressalte-se que o disposto no art. 927, caput, do atual Código Civil guarda correspondência, por analogia, com a Súmula 187/STF, atraindo, por conseguinte, a responsabilidade civil objetiva do Empregador, a qual prescinde da comprovação de culpa, por força do artigo 17 do Decreto nº 2.681, de 7 de dezembro de 1912, vigente à época dos fatos.

Na hipótese, fixadas as premissas fáticas necessárias ao deslinde da controvérsia no acórdão recorrido, a decisão embargada concluiu pela responsabilidade objetiva da Reclamada, conforme a fundamentação exposta. Foi realizado, portanto, o enquadramento jurídico adequado aos fatos apresentados.

(...)".

A embargante alega que não se aplica, no caso, o art. 927, caput e parágrafo único, do CCB/2002, sob o argumento de que tal preceito não estava em vigor na época da ocorrência do acidente automobilístico que vitimou o empregado. Afirma, entre outros aspectos, que não exerce atividade econômica no ramo de transporte. Indica violação do arts. 5º, II e XXXVI, e 7º, XXVIII, da Constituição Federal e alguns preceitos de lei. Transcreve julgados.

Pontue-se, de início, que o art. 894, II, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 11.496/2007, somente autoriza o recurso de embargos ante a demonstração de divergência jurisprudencial entre Turmas do TST (OJ 95/SBDI-1) ou destas com as decisões proferidas pela Seção de Dissídios Individuais, desde que a matéria não se encontre superada por súmula ou orientação jurisprudencial desta Corte ou do STF.

Ociosa, portanto, a indicação de ofensa a dispositivos de lei e da Constituição Federal.

Os arestos ofertados a fls. 562/564 são inespecíficos, pois não consideram todos os aspectos delineados no acórdão embargado, entre eles, morte do empregado, "a função de motorista desenvolvida pelo de cujus para a Reclamada, demandando contínuas viagens, inclusive por rodovias", incidência da Súmula 187/STF, por analogia, e dos arts. 17 do Decreto nº 2.681/1912 e 2º, caput, da CLT.

A divergência jurisprudencial, hábil a impulsionar o recurso de embargos (CLT, art. 894, II), há de partir de arestos que, reunindo as mesmas premissas de fato e de direito ostentadas pelo caso concreto, ofereçam diverso resultado.

A ausência ou acréscimo de qualquer circunstância alheia ao caso posto em julgamento faz inespecíficos os julgados, na recomendação da Súmula 296/TST.

Ante o exposto, por não configurada a hipótese do art. 894, II, da CLT e com base nos arts. 557, caput, do CPC e 81, IX, do RI/TST, denego seguimento ao recurso de embargos".

Pelas razões de Agravo Regimental sustenta a reclamada que demonstrou divergência jurisprudencial sobre a aplicação da responsabilidade civil do empregador e quanto à exclusão da responsabilidade quando o fato danoso ocorreu por culpa de terceiro e anterior à vigência do Código Civil da 2002. Alega não ser aplicável o art. 927 do Código Civil em razão do acidente ter ocorrido antes da vigência do Documento.

A c. 3ª Turma conheceu do recurso de revista dos reclamantes, por violação ao art. 927, caput, do CC e, no mérito, deu-lhe provimento para julgar procedentes os pedidos de indenização por danos morais e pensão mensal, sob o fundamento de que deve ser aplicado ao caso, por analogia, o teor da Súmula 187 do STF que determina a responsabilidade objetiva, independente de culpa.

Ressalte-se que a v. decisão consignou que o acidente fatal sofrido pelo reclamante ocorreu em 2000 e que a ação trabalhista foi ajuizada em 21.05.2002.

A reclamada opôs Embargos de Declaração (às fls. 563/571), que foi acolhido com efeito modificativo ao julgado para autorizar a dedução de antecipação de tutela do valor da pensão mensal vitalícia.

Nas razões dos Embargos (às fls. 577/741), a reclamada sustentou que deve ser aplicado o art. 7º, XXVIII, da CF, que prevê a responsabilidade civil subjetiva do empregador em acidente de trabalho pelo motivo do acidente ter ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002. Sustenta não ser aplicável o art. 927, caput e parágrafo único do CC em razão do acidente ter ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002. Alega divergência jurisprudencial. Colaciona arestos.

O r. despacho denegou o recurso de Embargos da reclamada por inespecificidade dos arestos paradigmas, a teor da Súmula 296 do TST.

Pretendeu a embargante demonstrar conflito jurisprudencial em face da impossibilidade de se consagrar a responsabilidade objetiva do empregador, quando há excludente por fato de terceiro, levando em consideração a decisão da c. Turma que em razão de acidente de trabalho, em que ocorreu o falecimento do empregado motorista em acidente automobilísticos, ocorrido antes da vigência de 2002. Entendeu a v. decisão embargada pela condenação da reclamada pela indenização por dano moral, por força da responsabilidade contratual do transportador pelo acidente do passageiro, aplicando a Súmula 187 do STF, por analogia.

O paradigma nº 1, identificado as fls. 627/631, originário da c. 5ª Turma, denota o conflito jurisprudencial sobre o tema, na medida em que trata de caso idêntico, em que o empregado era motorista e em que ficou configurada a culpa exclusiva de terceiro no acidente e, mesmo acidente, afasta a responsabilidade objetiva, entendendo que se aplica a responsabilidade subjetiva, sendo necessária a aferição do dano, do nexo causal e da culpa do autor do dano.

Resta demonstrado, portanto, conflito jurisprudencial na apreciação de matéria idêntica, na medida em que a v. decisão aplica a responsabilidade objetiva, em face do mesmo dano, e da ausência de culpa do empregador, mesmo quando há culpa exclusiva de terceiro.

Dou provimento ao Agravo para determinar o processamento dos Embargos, para melhor exame da divergência jurisprudencial demonstrada, determinando que seja o feito processado, na forma do art. 3º da Instrução Normativa nº 35/2012.

RECURSO DE EMBARGOS

DANOS MORAIS E MATERIAIS. MOTORISTA. ACIDENTE FATAL. EXCLUDENTE POR CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. CONFLITO JURISPRUDENCIAL DEMONSTRADO.

CONHECIMENTO

A c. 3ª Turma conheceu do recurso de revista dos reclamantes, por violação ao art. 927, caput, do CC e, no mérito, deu-lhe provimento para julgar procedentes os pedidos de indenização por danos morais e pensão mensal, sob o fundamento de que deve ser aplicado ao caso, por analogia, o teor da Súmula 187 do STF que determina a responsabilidade objetiva, independente de culpa.

Remete-se à leitura da decisão da c. Turma anteriormente já transcrita.

Pelas razões dos Embargos sustenta a reclamada que deve ser aplicado o art. 7º, XXVIII, da CF, que prevê a responsabilidade civil subjetiva do empregador em acidente de trabalho pelo motivo do acidente ter ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002. Sustenta não ser aplicável o art. 927, caput e parágrafo único do Código Civil em razão do acidente ter ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002. Colaciona arestos.

A c. 3ª Turma conheceu do recurso de revista dos reclamantes, por violação ao art. 927, caput, do CC e, no mérito, deu-lhe provimento para julgar procedentes os pedidos de indenização por danos morais e pensão mensal, sob o fundamento de que deve ser aplicado ao caso, por analogia, o teor da Súmula 187 do STF que determina a responsabilidade objetiva, independente de culpa.

Ressalte-se que a v. decisão consignou que o acidente fatal sofrido pelo reclamante ocorreu em 2000 e que a ação trabalhista foi ajuizada em 21.05.2002.

A reclamada opôs Embargos de Declaração (às fls. 563/571), que foi acolhido com efeito modificativo ao julgado para autorizar a dedução de antecipação de tutela do valor da pensão mensal vitalícia.

Pretendeu a embargante demonstrar conflito jurisprudencial em face da impossibilidade de se consagrar a responsabilidade objetiva do empregador, quando há excludente por fato de terceiro, levando em consideração a decisão da c. Turma que em razão de acidente de trabalho, em que ocorreu o falecimento do empregado motorista em acidente automobilístico, ocorrido antes da vigência de 2002.

Entendeu a v. decisão embargada pela condenação da reclamada pela indenização por dano moral, por força da responsabilidade contratual do transportador pelo acidente do passageiro, aplicando a Súmula 187 do STF, por analogia.

O paradigma nº 1, identificado as fls. 627/631, originário da c. 5ª Turma, denota o conflito jurisprudencial sobre o tema, na medida em que trata de caso idêntico, em que o empregado era motorista e em que ficou configurada a culpa exclusiva de terceiro no acidente e, mesmo acidente, afasta a responsabilidade objetiva, entendendo que se aplica a responsabilidade subjetiva, sendo necessária a aferição do dano, do nexo causal e da culpa do autor do dano.

De outro lado, também comporta conhecimento o aresto oriundo da c. 6ª Turma, diante do fundamento da c. Turma que, em embargos de declaração, não admitiu a tese de que o recurso não poderia ser analisado sob o enfoque do art. 927, parágrafo único, do código civil, porque não vigente à época do acidente:

No paradigma 3, oriundo da egrégia Sexta Turma, de seguinte teor:

"RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FATOS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVILD DE 2002. A positivação da responsabilidade civil objetiva, consistente no dever de reparar dano, independentemente de culpa, como norma de caráter geral, ocorreu com a edição do Código Civil de 2002 (com vigência a partir de 11/01/2003). In casu, como a ação trabalhista foi ajuizada em 2000, tem-se que os fatos ensejadores do pedido de reparação ocorreram antes dessa data. Nesse contexto, não há como se apreciar a denunciada mácula ao artigo 927 do CCB/2002, porque ainda não vigia no mundo jurídico. A se acolher a pretensão da reclamante, estar-se-á imprimindo efeito retroativo à norma, o que fere o artigo 5º, XXXVI, da CF, além de se impor obrigação não decorrente de lei (artigo 5º, II, da CF). Recurso de revista não provido."

Verifica-se que o julgado paradigma reconheceu a impossibilidade de ser apreciada a ofensa ao artigo 927 do CC/2002, por não estar em vigor à época da ocorrência dos fatos ensejadores do pedido de reparação.

Conheço, por divergência jurisprudencial."

MÉRITO

Discute-se a possibilidade de o recurso de revista ser conhecido com base no reconhecimento de afronta a dispositivo de lei que ainda não estava em vigor à época da ocorrência dos fatos ensejadores do pedido de compensação por dano moral.

Conforme consignado no v. acórdão ora impugnado, o recurso de revista foi conhecido com fulcro no preceito inserto no artigo 896, "c", da CLT, ante o reconhecimento da denunciada afronta ao artigo 927, caput, do CC/2002, a despeito de ter sido reconhecido que os fatos ocorreram sob a égide do Código Civil de 1916, senão vejamos o seguinte excerto:

"O caso dos autos trata de acidente de trabalho ocorrido antes da vigência do Código Civil de 2002, marco geral em que foi inserida expressamente a hipótese de responsabilidade objetiva, conforme explicitado. No entanto, o dano relatado na presente demanda não se insere nas disposições comuns retratadas no Código Civil de 1916, por se tratar de acidente sofrido por motorista da empresa no exercício de suas funções."

Contra o v. acórdão, a reclamada opôs embargos de declaração, no qual alegou a existência de contradição. Aduziu ter sido reconhecida a impossibilidade de ser aplicado ao caso o preceito insculpido no artigo 927, caput, do CC/2002, mas o recurso de revista alcançou conhecimento por violação do referido dispositivo.

No particular, assim restou decidido:

"Não procede a alegada contradição em face do conhecimento do apelo por violação ao art. 927, caput, do CCB e da apontada ausência de prequestionamento das normas utilizadas. O recurso de revista foi conhecido à luz do dispositivo de lei que rege a matéria e, além disso, a reclamação trabalhista foi ajuizada em 21/05/2002, antes, portanto, da vigência do Novo Código Civil, caso em que não havia possibilidade de a parte prequestionar o referido dispositivo legal.

Ressalte-se que o disposto no art. 927, caput, do atual Código Civil guarda correspondência, por analogia, com a Súmula 187/STF, atraindo, por conseguinte, a responsabilidade civil objetiva do Empregador, a qual prescinde da comprovação de culpa, por força do artigo 17 do Decreto nº 2.681, de 7 de dezembro de 1912, vigente a época dos fatos.

Na hipótese, fixadas as premissas fáticas necessárias ao deslinde da controvérsia no acórdão recorrido, a decisão embargada concluiu pela responsabilidade objetiva da Reclamada, conforme a fundamentação exposta. Foi realizado, portanto, o enquadramento jurídico adequado aos fatos apresentados."

Ocorre que, em razão de o fato gerador do pedido de compensação ter ocorrido sob a égide do Código Civil de 1916, o recurso de revista não poderia ter sido conhecido por afronta ao artigo 927, caput, do CC/2002, como bem alega a embargante em suas razões.

É cediço que, a teor dos artigos 6º da LINDB e 5º, XXXVI, da Constituição Federal, a lei de natureza material produzirá efeito imediato e geral, respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Extrai-se dos referidos dispositivos que os atos praticados, as situações jurídicas já consolidadas e os direitos implementados sob a égide da norma revogada serão por ela disciplinados, ante a impossibilidade da aplicação retroativa da norma revogadora.

Desse modo, tendo em vista que o acidente fatal sofrido pelo empregado ocorreu no ano de 2000, época em que o artigo 927, caput, do CC/2002 não estava em vigor, o recurso de revista não poderia ter sido conhecido por violação ao preceito nele insculpido.

Assim, afastado o fundamento que ensejou o conhecimento do recurso de revista, deve ser determinado o retorno dos autos à egrégia Terceira Turma, a fim de que prossiga no exame das demais alegações recursais, verificando o preenchimento dos pressupostos intrínsecos de admissibilidade do recurso de revista, como entender de direito.

Como se sabe, o recurso de revista classifica-se como recurso de fundamentação vinculada, de modo que o seu cabimento restringe-se às hipóteses previstas no artigo 896 da CLT. No caso, afastada a possibilidade de conhecimento do referido apelo com base na alegação de afronta ao artigo 927, caput, do CC/2002, deve-se examinar se a parte trouxe em suas razões recursais alegações aptas a permitir o seu conhecimento.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso de embargos.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho por unanimidade, dar provimento ao Agravo Regimental, por aparente divergência jurisprudencial, determinando o processamento dos embargos a ser julgado na primeira sessão ordinária subsequente à data da publicação desta certidão, forma do art. 3º da Instrução Normativa nº 35/2012. Por unanimidade, conhecer dos embargos por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para determinar o retorno dos autos à egrégia Turma de origem, a fim de que, afastada a reconhecida afronta ao artigo 927, caput, do CC de 2002, prossiga na análise das demais alegações trazidas no recurso de revista, considerando que os fatos ocorreram sob a égide do CC de 1916.

Brasília, 14 de dezembro de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

CAPUTO BASTOS

Ministro Relator

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