TRT 02/SP - BOLETIM DE JURISPRUDÊNCIA - 2020 22 - 06/11/2020

Data da publicação:

Acordão - TRT

Rovirso Aparecido Boldo - TRT/SP



Conflito de jurisdição ou competência Conflito negativo de competência.



Processo SDI-3 nº 1000163-83.2020.5.02.0000

Conflito Negativo de Competência

Suscitante: Juízo da 01ª Vara do Trabalho de Jandira

Suscitado: Juízo da 02ª Vara do Trabalho de Barueri

EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO LUGAR. VEDAÇÃO DE CONHECIMENTO EX-OFFICIO DA INCOMPETÊNCIA RELATIVA. A competência rationi loci pode ser prorrogada se não houver oportuna arguição de exceção de incompetência pela parte que se sentir prejudicada. Não cabe ao Juízo remeter de oficio o feito a órgão jurisdicional diverso, pois não se trata de matéria de ordem pública a autorizar tal providência (artigos 64 e 65, do CPC e art. 799, da CLT e inteligência da OJ 149, da SDI-2, do C. TST).

ESCOLHA DO FORO PELO AUTOR. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO À DEFESA. A despeito de a CLT estipular de forma exauriente as regras de competência de foro, por meio da fixação do local da prestação de serviços, independentemente do local da contratação (artigo 651, § 3º da CLT), há que sopesar as particularidades do caso concreto, em que se revela controversa até mesmo a contratação e não houve insurgência da reclamada quanto ao foro escolhido pelo reclamante. A interpretação sistemática da constituição privilegia o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXVI, da CF), como forma de minimizar os custos de deslocamento das partes e testemunhas. Remessa dos autos ao Juízo originalmente escolhido pelas partes. (PJe TRT/SP 1000163-83.2020.5.02.0000 - CC - SDI3- Rel. Rovirso Aparecido Boldo - DeJT 1/07/2020).

Diante da ausência de discriminação do local de trabalho na reclamação trabalhista n. 1001547-91.2019.5.02.0202, ajuizada por Rafael Pereira Garcia em face de Transporte Transportadora Amorim Ltda, o Juízo da 02ª Vara do Trabalho de Barueri, observado o endereço da empresa, remeteu o feito à Vara do Trabalho de Jandira (decisão de fl. 17), a qual suscitou o presente conflito negativo de competência (fls. 2/4).

Informações do Juízo suscitado à fl. 62, ratificando que não há menção ao local de trabalho na petição inicial da reclamação trabalhista, valendo o endereço da reclamada como local de prestação de serviços.

Manifestação do Ministério Público do Trabalho, pela desnecessidade de emissão de parecer circunstanciado (fl. 65).

É o relatório.

VOTO

O presente conflito negativo de competência tem como finalidade precípua decidir dentre a 01ª Vara do Trabalho de Jandira e a 02ª Vara do Trabalho de Barueri qual será a responsável pela apreciação das pretensões articuladas na reclamatória n. 1001547-91.2019.5.02.0202.

Circunscrito à disciplina do artigo 66, do CPC, bem assim como, 803 a 809, da CLT, e 164 e seguintes do Regimento Interno deste Regional, o conflito de competência ou conflito de jurisdição, expressão utilizada pela CLT, ganha concretude nas seguintes hipóteses do código processual adjetivo:

Art. 66. Há conflito de competência quando:

I - 2 (dois) ou mais juízes se declaram competentes;

II - 2 (dois) ou mais juízes se consideram incompetentes, atribuindo um ao outro a competência;

III - entre 2 (dois) ou mais juízes surge controvérsia acerca da reunião ou separação de processos.

Parágrafo único. O juiz que não acolher a competência declinada deverá suscitar o conflito, salvo se a atribuir a outro juízo.

O reclamante distribuiu a ação 1001547-91.2019.5.02.0202 perante a 02ª Vara do Trabalho de Barueri. Da análise da contestação da reclamada afere-se que não foi arguida exceção de incompetência em razão do lugar (fls. 31/44).

A competência rationi loci não é absoluta, como fundamentado pelo Juízo suscitado. Trata-se de competência relativa, a exigir manifestação contrária expressa da parte que se julgar prejudicada (art. 64, do CPC e art. 799, da CLT). A ausência de arguição prorroga a competência territorial e não autoriza que o Juízo conheça de oficio da matéria (art. 65, do CPC).

Nesse sentido, a doutrina de Mauro Schiavi: "a competência territorial é relativa, pois prevista no interesse da parte. Portanto, o juiz não pode conhecê-la de ofício. Caso não impugnada pelo reclamado no prazo da resposta (exceção de incompetência em razão do lugar - artigos 799 e seguintes da CLT), prorroga-se a competência." (in: Manual de Direito Processual do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2009. 230 p).

Corroborando tal vedação de reconhecimento de oficio da incompetência relativa, a OJ 149, da SDI-2,do C. TST, in verbis:

149. Conflito de competência. Incompetência territorial. Hipótese do art. 651, § 3º, da CLT. Impossibilidade de declaração de ofício de incompetência relativa. (DeJT 03/12/2008)

Não cabe declaração de ofício de incompetência territorial no caso do uso, pelo trabalhador, da faculdade prevista no art. 651, § 3º, da CLT. Nessa hipótese, resolve-se o conflito pelo reconhecimento da competência do juízo do local onde a ação foi proposta.

Pondere-se que o Juízo que declinou da competência sequer tem certeza do local da prestação dos serviços. Na peça informativa, a autoridade judicial suscitada assim se expressou: "A ação trabalhista em epígrafe foi distribuída originalmente a esta Vara, sem que o Autor indicasse expressamente o local de sua prestação de serviços. Por outro lado, a ré está sediada no município de Jandira. Com a devida vênia, salvo melhor juízo, não houve qualquer informação nos autos de que o autor tenha prestado serviços ou celebrado o contrato nesta Comarca. Era o que me cumpria informar" (fl. 62, grifou-se).

O Juízo suscitante, todavia, transcreveu trecho da petição inicial na qual se infere que o reclamante era motorista carreteiro prestando serviços em várias cidades pelo interior de São Paulo e outros estados, verbis:"iniciava a sua jornada por volta das 04h00, trabalhando até ás 20h00 de segunda a sábado, tendo em vista que constantemente fazia viagens para as cidades do interior de São Paulo (São José do Rio Preto, Presidente Prudente, Campinas, etc.), bem como seguia viagens para o Rio de Janeiro, Belo Horizonte e outros estados da federação".

Não se tem certeza sequer do local de contratação, pois a ação versa sobre eventual reconhecimento do vínculo e não há documentos nos autos que garantam o foro. O reclamante forneceu endereço residencial em Itapevi (fl. 6). A reclamada situa-se em Jandira (certidão de citação de fls. 27/28). As procurações outorgadas pelo reclamante e pela reclamada foram firmadas em Barueri (fl. 10 e fl. 30, respectivamente). Tudo leva a crer que Barueri fosse a localidade de mais fácil acesso para ambas as partes.

A despeito de a CLT estipular de forma exauriente as regras de competência de foro, por meio da fixação do local da prestação de serviços, independentemente do local da contratação (artigo 651, § 3º da CLT), há que sopesar as particularidades do caso concreto, em que se revela controversa até mesmo a contratação e não houve insurgência da reclamada quando o foro escolhido pelo reclamante. Ademais, privilegia-se o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXVI, da CF), como forma de minimizar os custos de deslocamento das partes e testemunhas.

Com efeito, a interpretação sistemática das regras processuais trabalhistas, sob a ótica constitucional, garante ao reclamante a prerrogativa de eleger, como foro para distribuição da reclamatória trabalhista, o local da prestação de serviço ou da contratação e mesmo de outro que lhe for mais conveniente, desde que não cause prejuízo à defesa.

É de se ter em conta que o TST já se expressou no sentido de validar até mesmo a opção pelo foro do domicílio do autor, regra extraída do CPC, a direcionar o entendimento de que é possível a relativização das hipóteses expressamente previstas no art. 651, do diploma consolidado, verbis:

Ementa:

RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NO FORO DO DOMICÍLIO DO RECLAMANTE. LOCALIDADE DISTINTA DO LOCAL DA CONTRATAÇÃO E DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. VIOLAÇÃO DO ART. 651, CAPUT,DA CLT. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de considerar o Domicílio do Autor como fato definidor da competência territorial, toda vez que esse não cause embaraço à defesa, havendo exceção nas hipóteses em que a empresa possua atuação nacional e, ao menos, a contratação ou arregimentação tenha ocorrido naquela localidade. II. No caso em apreço, com fundamento na hipossuficiência econômica do Reclamante, a Corte Regional asseverou que a competência para apreciar a presente demanda é a da Vara do Trabalho do domicílio do Reclamante, mesmo tendo ele prestado serviço em localidade diversa. Acrescentou que a Reclamada não apresentou prova contrária à situação financeira do Reclamante e que a tramitação do processo na localidade do domicílio do Autor não implica dificuldade ao exercício do direito de defesa. III. Demonstrada a violação do art. 651, caput, da CLT. IV. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. Processo: RR - 800-76.2016.5.09.0459. Data de Julgamento: 18/03/2020, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 27/03/2020.

Diante desse contexto, declara-se a competência ratione loci do Juízo da 02ª Vara do Trabalho de Barueri, determinando o retorno dos autos à origem para processar e julgar a lide, conforme entender de direito.

Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da SDI3, do Tribunal Regional da Segunda Região, em por unanimidade de votos, reconhecer a competência ratione locido Juízo da 02ª Vara do Trabalho de Barueri, nos termos do voto do Relator.

  • Presidiu o julgamento: Desembargador do Trabalho Rovirso Aparecido Boldo
  • Relator: Desembargador do Trabalho Rovirso Aparecido Boldo
  • Revisor: Desembargador do Trabalho Sérgio José Bueno Junqueira Machado
  • Procurador: Dra. Marisa Regina Murad Legaspe  
  • Tomaram parte no julgamento os Exmos. Magistrados do Trabalho: Nelson Nazar, Sonia Maria de Oliveira Prince Rodrigues Franzini, Mércia Tomazinho, Eduardo de Azevedo Silva, Rovirso Aparecido Boldo, Sérgio José Bueno Junqueira Machado, Maria de Lourdes Antonio, Kyong Mi Lee, Mauro Vignotto, Margoth Giacomazzi Martins.

ROVIRSO APARECIDO BOLDO

Relator

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