AUDIÊNCIA OU SESSÃO DE JULGAMENTO Audiência Telepresencial

Data da publicação:

Subseção II Especializada em Dissídios Individuais

Evandro Pereira Valadão Lopes - TST



NULIDADE DA SENTENÇA RESCINDENDA POR CERCEIO DO DIREITO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE TÉCNICA DE OITIVA DE TESTEMUNHAS EM AUDIÊNCIA TELEPRESENCIAL.



RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA INTERPOSTO PELA AUTORA. DECISÃO RESCINDENDA TRANSITADA EM JULGADO SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015.  1. VÍNCULO DE EMPREGO. ERRO DE FATO. RECURSO ORDINÁRIO QUE NÃO IMPUGNA ESPECIFICADAMENTE O FUNDAMENTO DA DECISÃO RECORRIDA NO TEMA. AUSÊNCIA DE REGULARIDADE FORMAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 422, I, DO TST. NÃO CONHECIMENTO.

I. Ação rescisória ajuizada com amparo no inciso VIII do art. 966 do CPC de 2015 pretendendo desconstituir sentença proferida em reclamação trabalhista, em que julgada improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego.

II. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou a ação rescisória improcedente no tema, sob o fundamento de que o fato sobre o qual se invoca erro, qual seja, a existência da relação de emprego, consiste exatamente no objeto da controvérsia instalada no processo matriz, circunstância que obsta o corte rescisório por erro de fato, a teor do § 1º do art. 966 do CPC de 2105 e da OJ nº 136 da SBDI-2 do TST.

III. Não obstante, a autora não impugnou o fundamento eleito pelo TRT quanto ao tema no recurso ordinário, razão pela qual o apelo se revela desfundamentado no particular, atraindo a exegese contida na Súmula nº 422, I, do TST.

IV. Recurso ordinário de que não se conhece no particular.

2. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO RESCINDENDA TRANSITADA EM JULGADO SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015. ART. 966, V, DO CPC DE 2015. NULIDADE DA SENTENÇA RESCINDENDA POR CERCEIO DO DIREITO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE TÉCNICA DE OITIVA DE TESTEMUNHAS EM AUDIÊNCIA TELEPRESENCIAL. INDEFERIMENTO DE REQUERIMENTO DE REDESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA.  VIOLAÇÃO DA NORMA JURÍDICA INSCULPIDA NO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. CARACTERIZAÇÃO.

I. Ação rescisória com amparo no art. 966, V, do CPC de 2015, em que se pretende desconstituir sentença em que, com base na prova oral e documental, se julgou improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego.

II. Alegação de violação do art. 5º, XXXV e LV, da CRFB em razão do indeferimento da oitiva de duas testemunhas em audiência telepresencial.

III. No caso em exame, a controvérsia consiste em decidir sobre a caracterização de afronta ao art. 5º, XXXV e LV, da CRFB apta a deflagrar o corte rescisório de sentença em que, em reclamação trabalhista, se julgou improcedente pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego amparada também na prova oral, em hipótese na qual, na fase de instrução, em audiência telepresencial, foi indeferido requerimento de oitiva de duas testemunhas que não conseguiram ingressar na sala virtual de audiência, havendo registro em ata que uma delas chegou a conectar-se à sala virtual de espera e que, em relação à outra, não foi informado ao juízo a pretensão de sua oitiva no início dos depoimentos.

IV. O Código de Processo Civil de 2015, em seu art. 1º, ao dispor que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil", chancela a constitucionalização do processo, que demanda a adoção de critérios hermenêuticos valorativos para a aplicação das normas processuais infraconstitucionais, cuja instrumentalização deve servir ao mister de concretização das disposições constitucionais.

V. O Conselho Nacional de Justiça, por meio da sua Resolução nº 354/2020, que disciplina o cumprimento digital de ato processual, normatizou, em seu art. 7º, I, que, em audiência telepresencial, a oitiva de testemunha será equiparada às presenciais para todos os fins legais, asseguradas as prerrogativas processuais das partes e testemunhas. 

VI. De outro lado, nos termos do art. 825 da CLT, no processo do trabalho, as testemunhas comparecerão à audiência independentemente de intimação, sendo certo que as ausentes serão intimadas, de ofício ou a requerimento da parte, ficando sujeitas a condução coercitiva.

VII. Outrossim, o art. 849 da CLT estabelece que "a audiência de julgamento será contínua; mas, se não for possível, por motivo de força maior, concluí-la no mesmo dia, o juiz ou presidente marcará a sua continuação para a primeira desimpedida, independentemente de nova notificação".

VIII. Nesse cenário, sob o prisma hermenêutico da constitucionalização do processo, na reclamação trabalhista matriz, diante da impossibilidade técnica de as testemunhas prestarem depoimento em audiência telepresencial e do requerimento da parte autora insistindo em sua oitiva, cumpria ao magistrado determinar a redesignação da audiência com supedâneo no art. 849 da CLT, porquanto a situação configura força maior que autoriza a marcação de nova audiência.

IX. Cumpre destacar que não era possível exigir a adoção de qualquer conduta pela reclamante em audiência com o fim de solucionar o problema, pois cumprido seu ônus de convidar as testemunhas, na forma do art. 825 da CLT, sendo certo que a testemunha é apenas indicada e convidada pelas partes, podendo também ser inquirida de ofício pelo juiz (art. 461 do CPC de 2015), haja vista que a prova pertence aos autos, não às partes, não cabendo à reclamante, em audiência telepresencial, solucionar problema técnico de conexão à internet da testemunha, tampouco empreender meios de obrigá-la a se conectar, pois a condução coercitiva, por óbvio, é providência que somente incumbe ao juiz determinar, a teor do art. 825 da CLT.

X. De igual modo, não se pode exigir da reclamante que obrigasse as testemunhas a produzirem prova da falha de conexão com a internet, pois, repita-se, à parte incumbe apenas indicar e convidar, sendo-lhe defeso impor qualquer providência a cargo da testemunha.

XI. O quadro narrado na audiência telepresencial do processo matriz se assemelha à hipótese em que, em audiência presencial, a testemunha está presente na sala de espera do pregão, mas, em seguida, deixa a unidade judiciária por alguma razão médica de baixa gravidade. Em tal cenário, não há dificuldade em se compreender pela configuração da força maior que autoriza a redesignação de audiência de que trata o art. 849 da CLT, pois não é possível exigir da parte que indicou e convidou a testemunha que solucione a sua necessidade de saúde e tampouco que a obrigue a permanecer na sala de audiência para prestar depoimento.

XII. Assim, como a audiência telepresencial se equipara à presencial para todos os efeitos, a teor do art. 7º, I, da Resolução nº 354/2020 do CNJ, forçoso concluir que a identidade de circunstâncias impunha ao juiz determinar a redesignação da audiência de instrução para colher o depoimento das testemunhas.

XIII. Nesse cenário, como foi julgada improcedente na sentença rescindenda a pretensão de vínculo de emprego amparada também na prova oral, estando demonstrado o prejuízo da ora autora, tem-se que o indeferimento da oitiva das testemunhas no caso em exame importou em mácula ao princípio do contraditório e ampla defesa, lapidado no art. 5º, LV, da Constituição de República, situação que autoriza o corte rescisório com espeque no art. 966, V, do CPC de 2015.

XIV. Recurso ordinário de que se conhece no tema e a que dá provimento para julgar procedente a ação rescisória. (TST-ROT-9172-89.2021.5.15.0000, Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 30/06/2023)

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário Trabalhista n° TST-ROT-9172-89.2021.5.15.0000, em que é Recorrente FABIANA COSTA GARBIM e Recorrido DANIELE DELEFRATI GALLI - ME.

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou improcedente a pretensão desconstitutiva.

FABIANA COSTA GARBIM, autora da ação rescisória, interpôs recurso ordinário.

Contrarrazões apresentadas pela parte ré.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, na forma do art. 95 do RITST.

É o relatório.

V O T O

1 – CONHECIMENTO

PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO ORDINÁRIO. VÍNCULO DE EMPREGO. ERRO DE FATO. EXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA SOBRE O FATO. OJ 136 DA SBDI-2 DO TST E § 1º DO ART. 966 DO CPC DE 2015. RECURSO ORDINÁRIO QUE NÃO IMPUGNA ESPECIFICADAMENTE O FUNDAMENTO DA DECISÃO RECORRIDA NO TEMA. AUSÊNCIA DE REGULARIDADE FORMAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 422, I, DO TST. NÃO CONHECIMENTO.

FABIANA COSTA GARBIM ajuizou ação rescisória com supedâneo no art. 966, V e VIII, do CPC de 2015, pretendendo desconstituir sentença proferida pela Vara do Trabalho de Orlândia, nos autos da reclamação trabalhista nº 0010924-80.2020.5.15.0146, em que julgada improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego e seus consectários.

Em relação à improcedência ao tema da relação de emprego, a autora postulou o corte rescisório com suporte no erro de fato, sob a alegação de que o vínculo restou cabalmente caracterizado, conforme demonstrou a prova documental, sendo certo que, no processo matriz, a testemunha indicada pela reclamada afirmou que nunca viu a reclamante apenas porque não frequentava a sala de monitoramento onde a autora laborava e por desconhecer quais trabalhadores se ativavam na atividade de monitoramento, razão pela qual sustenta a procedência da ação rescisória com base no inciso VIII do art. 966 do CPC de 2015.

O TRT da 15ª Região rechaçou a pretensão de corte rescisório amparada no art. 966, VIII, do CPC de 2015 nos seguintes termos:

VIOLAÇÃO A NORMA JURÍDICA - ERRO DE FATO - VÍNCULO DE EMPREGO

Sustenta a autora que o vínculo de emprego não foi devidamente reconhecido no processo de referência, em razão do que pretende a rescisão do julgado para que seja reconhecida a relação empregatícia, efetivamente havida e comprovada pela prova testemunhal. Aponta que o não reconhecimento da relação de emprego importou em violação a norma jurídica e foi resultado de erro de fato. Pede a rescisão do julgado.

Analiso.

Apesar da alegação de que restou caracterizado o vínculo de emprego que não foi reconhecido pela Origem, conforme se observa na decisão da Origem, houve fundada controvérsia sobre os fatos e a Origem rejeitou a pretensão com análise das provas dos autos, inclusive da prova oral da trabalhadora.

Conforme visto, o suposto erro de fato se consubstancia exatamente no elemento controvertido na reclamatória, qual seja, a existência ou não de vínculo de emprego, pelo que, ex viparte final do §1º do art, 966 do CPC/2015, não se mostra rescindível, o que demonstra apenas a intenção da autora de utilizar a presente ação como sucedâneo recursal.

Se a parte estava insatisfeita com o resultado da lide, deveria ter interposto o competente apelo, não servindo esta ação rescisória, repita-se, como sucedâneo recursal. [grifei]

No recurso ordinário, a autora apenas reitera as alegações tecidas na petição inicial quanto ao erro de fato.

Pois bem.

Por regularidade formal, entende-se a necessidade de o recorrente, quando da prática do ato judicial, observar todos os requisitos especificados pela legislação para seu aperfeiçoamento. Do contrário, o apelo sequer deve ser admitido.

Sendo o ato de recorrer espécie de ato impugnativo, e, por lógica semântica, no contexto do que se afirma, sendo a impugnação o ato de se opor a algo, deve, aquele que se opõe, necessariamente, analisar o objeto de oposição . Trata-se de conclusão cartesiana, na medida em que não se faz possível se opor a algo que não tenha sido, pregressamente, analisado.

Há, inclusive, vozes na doutrina que entendem pela necessidade de postulação analítica quando da interposição do apelo.

Fredie Didier e Leonardo Carneiro (Curso de Direito Processual Civil, V. 3, 2020, p. 164), ao discorrerem sobre o pressuposto recursal da regularidade formal, sustentam que "(...) deve o recorrente, por exemplo, sob pena de inadmissibilidade de seu recurso: a) apresentar as suas razões, impugnando especificamente os fundamentos da decisão recorrida (art. 932, III, CPC)".

Ainda segundo os respeitados autores "as partes, no recurso, têm de apresentar a sua fundamentação de modo analítico, tal como ela é exigida para a decisão judicial (art. 489, § 1º, CPC). A parte não pode expor suas razões de modo genérico (...)".

Nelson Nery Junior (Teoria geral dos recursos. RT, 2004, p. 176-177), discorrendo sobre o assunto afirma que "vige, no tocante aos recursos, o princípio da dialeticidade. Segundo este, o recurso deverá ser dialético, isto é, discursivo. O recorrente deverá declinar o porquê do pedido de reexame da decisão. Só assim a parte contrária poderá contra-arrazoá-lo, formando-se o imprescindível contraditório em sede recursal. (…) As razões do recurso são o elemento indispensável a que o Tribunal, para qual se dirige, possa julgar o mérito do recurso, ponderando-se em confronto como os motivos da decisão recorrida. A falta acarreta o não conhecimento".

Em outras palavras, a parte, ao interpor o recurso, deve formular suas alegações, combatendo os fundamentos autônomos e independentes utilizados pelo juízo a quo.

Sem tal característica, não haverá oposição ao objeto guerreado. Sem oposição, não há antítese. Sem antítese, não há dialética. Sem dialética, não há contradição de ideias, vale dizer, não há efetiva discordância.

Insta salientar, outrossim, que o disposto no artigo 899 da CLT, segundo o qual "os recursos serão interpostos por simples petição", não infirma tal obrigação na medida em que o dispositivo foi elaborado à luz do jus postulandi, princípio que não se aplica aos meios legais de impugnação da decisões judiciais e às ações impugnativas de competência deste Tribunal Superior (Súmula n° 425/TST) .

Portanto, compete ao recorrente impugnar o julgado de forma específica, apontando não só a parte que pretende ver reformada, mas também os motivos pelos quais entende ter havido error in judicando.

No mesmo sentido, a Súmula nº 422 do TST:

RECURSO. FUNDAMENTO AUSENTE OU DEFICIENTE. NÃO CONHECIMENTO (redação alterada, com inserção dos itens I, II e III) - Res. 199/2015, DEJT divulgado em 24, 25 e 26.06.2015. Com errata publicado no DEJT divulgado em 01.07.2015

I – Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida.

II – O entendimento referido no item anterior não se aplica em relação à motivação secundária e impertinente, consubstanciada em despacho de admissibilidade de recurso ou em decisão monocrática.

III – Inaplicável a exigência do item I relativamente ao recurso ordinário da competência de Tribunal Regional do Trabalho, exceto em caso de recurso cuja motivação é inteiramente dissociada dos fundamentos da sentença.

No caso dos autos, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, ao julgar improcedente a ação rescisória quanto à invocação do inciso VIII do art. 966 do CPC de 2015, em última análise, erigiu o óbice da OJ nº 136 da SBDI-2 do TST, fundamentando que o fato sobre o qual a autora invocou erro consistia exatamente no objeto da controvérsia do processo matriz, qual seja, a existência de vínculo de emprego, circunstância que obsta a caracterização de erro de fato a deflagrar o pretenso corte rescisório.

No recurso ordinário, a autora não impugnou o fundamento eleito pelo TRT, limitando-se a reiterar a alegação de erro de fato declinada na petição inicial, sem impugnar o óbice da existência de controvérsia, razão pela qual o apelo se revela desfundamentado, atraindo a exegese contida na Súmula nº 422, I, do TST.

Ressalte-se que não se está aqui apreciando eventual erro ou acerto do teor do acórdão recorrido, mas apenas analisando o pressuposto do recurso ordinário sob o prisma da dialética recursal, não satisfeita no caso em análise.

Por derradeiro, cumpre destacar que a parte não invoca no apelo em exame a violação de norma jurídica como causa de rescindibilidade em relação ao tema do vínculo de emprego, fazendo-o apenas em relação à alegação de nulidade da sentença rescindenda por cerceio do direito de defesa.  

Portanto, o recurso ordinário não alcança conhecimento em relação à alegação de erro de fato, porquanto ausente o pressuposto recursal da regularidade formal que determina sejam impugnados especificadamente os fundamentos da decisão recorrida (art. 932, III, do CPC/2015).

Pelo exposto, não conheço do recurso ordinário apenas em relação ao tema "vínculo de emprego".

Satisfeitos os pressupostos recursais relativos à tempestividade (acórdão recorrido publicado em 31/5/2022), à representação processual e dispensado o preparo, conheço do recurso ordinário quanto ao tema remanescente.

2 – MÉRITO

AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO RESCINDENDA TRANSITADA EM JULGADO SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015. ART. 966, V, DO CPC DE 2015. NULIDADE DA SENTENÇA RESCINDENDA POR CERCEIO DO DIREITO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE TÉCNICA DE OITIVA DE TESTEMUNHAS EM AUDIÊNCIA TELEPRESENCIAL. INDEFERIMENTO DE REQUERIMENTO DE REDESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA.  VIOLAÇÃO DA NORMA JURÍDICA INSCULPIDA NO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. CARACTERIZAÇÃO.

FABIANA COSTA GARBIM ajuizou ação rescisória com supedâneo no art. 966, V, do CPC de 2015, pretendendo desconstituir sentença proferida pela Vara do Trabalho de Orlândia, nos autos da reclamação trabalhista nº 0010924-80.2020.5.15.0146, em que julgado improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego e seus consectários.

A autora sustentou que, no processo matriz, figurou como reclamante e, em audiência telepresencial realizada em 22/6/2021, após o depoimento prestado por sua primeira testemunha, requereu a oitiva de mais duas testemunhas, Juliana Peres e Fabiana Cristina Rangon, para as quais encaminhara carta-convite.

Narrou que ambas se conectaram à sala de audiência, porém, por problemas em suas conexões com a internet, não conseguiram se manter no ambiente virtual e perderam o sinal.

Alegou que, não obstante tenha insistido no depoimento das aludidas testemunhas — haja vista que a desconexão decorreu de problemas de ordem técnica —, o juízo de primeiro grau indeferiu o requerimento e proferiu sentença de improcedência, situação que, dado o prejuízo verificado, configurou nulidade do julgado por cerceio do seu direito de defesa, de modo que caracterizada a violação da norma jurídica insculpida no artigo 5º, XXXV e LV, da Constituição da República de 1988 a autorizar o corte rescisório com arrimo no art. 966, V, do CPC de 2015.

Eis o teor da sentença rescindenda na fração de interesse:

Vínculo empregatício. Anotação em CTPS. Verbas. Jornada. Intervalo. Adicional noturno. Multa dos artigos 477 e 467 da CLT

A parte reclamante alega que trabalhou para a parte reclamada no período de 1/6/2017 a 9/10/2019, nas funções de agente de monitoramento eletrônico, mediante remuneração mensal no valor de R$ 1.750,00. Postula o vínculo empregatício e o pagamento de parcelas trabalhistas daí decorrentes.

A parte reclamada se defende alegando que a parte reclamante não lhe prestou serviços. Nega o vínculo empregatício. Requer a improcedência da ação.

Quando é negado o vínculo empregatício, duas hipóteses principais podem ocorrer: a primeira, a parte ré nega que a parte autora lhe tenha prestado serviços - e nesse caso cabe inteiramente ao reclamante o ônus da prova; na segunda, a reclamada reconhece que havia prestação de serviços - e, em tal caso, a jurisprudência e a doutrina tendem a reconhecer o vínculo empregatício se a parte ré não provar a autonomia, a eventualidade ou outra circunstância que descaracterize a relação empregatícia.

A posição da defesa, de não reconhecer o trabalho prestado pelo reclamante, atribuiu ao obreiro o ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito, nos termos dos artigos 818 da CLT e 333 do CPC.

A relação de emprego compõe-se das figuras do empregador e empregado, tal como definidas nos artigos 2º e 3º ambos da Consolidação das Leis do Trabalho, observados os pressupostos ali insertos.

Considera-se empregador, a pessoa física ou jurídica que exerça atividade econômica ou a exploração de um negócio, e que para a realização desses fins, contrate, assalarie e comande a prestação pessoal de serviços. É o que emerge do artigo 2º, da CLT.

Da prova documental e oral produzida, conclui-se que a reclamante não prestou serviços para a parte reclamada; ou ao menos não conseguiu provar a existência do liame empregatício, ônus que lhe pertencia, conforme já consignado.

A testemunha ouvida a convite da parte demandante prestou informações vagas, sem o peso necessário para a convicção do magistrado. Veja que o testigo sequer trabalhou (em tese) com a reclamante; já que afirmou que "cobria folgas" daquela e que a viu apenas quando do "treinamento".

Os documentos anexados com a réplica, não possuem o condão de provar ou até mesmo evidenciar a existência de relação jurídica entre as partes. São diplomas que podem ser produzidos unilateralmente pelo(a) interessado(a), não possuindo valor probante para o fim a que se destina a presente demanda. 

A subordinação é um dos requisitos inerentes à configuração do vínculo empregatício; circunstância essa não provada nos autos, porquanto, frise-se, sequer a prestação de serviços ficou evidenciada.

Destarte, não emergindo da prova produzida nos autos a existência simultânea dos requisitos basilares do vínculo empregatício (subordinação e não eventualidade – artigo 3º da CLT) na alegada relação havida entre as partes, indefere-se o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego entre Reclamante e Reclamada, no período vindicado na prefacial, julgando-se improcedentes os demais pedidos formulados, porquanto inteiramente dependentes da relação de emprego entre as partes.

Outrossim, imperioso transcrever o teor da ata de audiência para fins de exata compreensão do delineamento fático do processo matriz:

ATA DE AUDIÊNCIA

Em 22 de junho de 2021, na sala de sessões da MM. Vara do Trabalho de Orlândia, sob a direção do(a) Exmo(a). Sr(a). Juiz(a) do Trabalho RODRIGO PENHA MACHADO, realizou-se audiência relativa à Ação Trabalhista - Rito Sumaríssimo número 0010924-80.2020.5.15.0146, supramencionada.

Às 10:27, aberta a audiência, foram apregoadas as partes.

Presente a parte autora FABIANA COSTA GARBIM, pessoalmente, acompanhado(a) de seu(a) advogado(a), Dr(a). THIAGO DOS SANTOS CARVALHO, OAB 309929/SP.

Presente a parte ré DANIELE DELEFRATI GALLI, pessoalmente, acompanhado(a) de seu(a) advogado(a), Dr(a). LUCAS BASTOS OLIVEIRA, OAB 361156/SP.

Registra-se também a presença dos servidores desta Vara do Trabalho na sala virtual, a saber: Leandro Cristino Alves.

Tendo em vista o disposto nos §§ 1º, 4º e 5º do artigo 6º, do PROVIMENTO GP-VPJ-CR Nº 4/2013, caberá ao próprio advogado cuidar da regularidade da representação processual, bem como efetivar o seu credenciamento no sistema PJe e sua habilitação em cada processo que pretenda atuar. Deverá(ão), portanto, efetuar(em) eventuais regularidades pertinentes no prazo de 5 (cinco) dias.

Tendo em vista as medidas temporárias adotadas por este Regional no sentido de prevenção da disseminação da COVID 19, conforme Portaria Conjunta GP-VPA-VPJ-CR no 005/2020 e a concomitante essencialidade do serviço prestado pela Justiça do Trabalho, e considerando a autorização legal de realização de atos processuais por meio eletrônico, conforme art. 334, §7º c/c 236, §3º do CPC e a Resolução Administrativa no 4/2017 do TRT 15ª Região; registro que essa audiência foi realizada por via da ferramenta ZOOM, sendo conduzida pelo Juiz da Vara do Trabalho de Orlândia e do Posto Avançado em Morro Agudo, o qual subscreve esta ata ao final.

 Tentativa de Conciliação:

Pretensão da parte reclamante: R$ 17.000,00

Proposta da parte reclamada: R$ 1.500,00

Neste momento, em razão da necessidade de produção de prova oral, passo a instruir o presente feito, iniciando a gravação da presente audiência de instrução, através do aplicativo "ZOOM", sendo que o link de acesso à gravação de áudio e vídeo será disponibilizado no processo em até 10 (dez) dias, nos termos do COMUNICADO GP-CR nº 02/2020.

INCONCILIADOS

Dispensados os depoimentos pessoais pelas partes e pelo juízo.

Primeira testemunha do(a) reclamante: Roberta Cristina da Silva David, identidade nº 41.189.612-X, solteira, nascido em 03/04/1987, residente e domiciliado(a) na Rua B, n. 62 - Sales Oliveira/SP. Advertida e compromissada. Depoimento:

1. que trabalhou na reclamada do final de 2018 a meados de 2019;

2. que trabalhava no monitoramento;

3. que recebia por plantão, a quantia de R$ 80,00, para cobrir folgas da reclamante; que trabalhava em média de dois a três plantões por semana;

4. que recebia da Sr.a Daniele;

5. que trabalhou com a reclamante somente em treinamento, sendo que após apenas cobria as folgas da autora;

6. que recebia o pagamento em dinheiro ou mediante depósito ou transferência; que trabalhava das 19h às 07h;

7. que não poderia sair da reclamada para fazer refeição, comendo no próprio local de trabalho, uma vez que não podia abandonar o monitoramento.

Nada mais.

Indeferida a pergunta da parte autora: "Se a testemunha pode confirmar se as fotos juntadas aos autos são da reclamada ou se o sistema apresentado é utilizado pela reclamada".

A reclamante pretende ouvir mais duas testemunhas, Juliana ou Fabiana.

Registra-se que a testemunha Juliana estava na sala de espera virtual, quando foi desconectada, sendo que não retornou e que a testemunha Fabiana não adentrou à sala de audiência em momento algum e no início dos depoimentos, não foi informado ao Juízo que referida testemunha seria ouvida, razão pela qual preclusa a oportunidade de oitiva dessas testemunhas. Protestos do patrono da autora.

Primeira testemunha do(a) reclamada: Felipe Augusto Soares, CPF n. 465.969.008-35, solteiro, nascido em 24/02/1997, residente e domiciliado(a) na Avenida X, n. 1267 - Orlândia/SP. Advertida e compromissada. Depoimento:

1. que trabalhou para a reclamada de janeiro de 2019 até dezembro de 2020, como auxiliar de instalador de sistema eletrônico;

2. que nunca viu a reclamante e nem a conhece;

3. que trabalhava externo e não ia na sala de monitoramento;

4. que sabe quem fazia monitoramento, pois os horários não coincidiam.

Nada mais.

O(a) reclamado(a) não tem mais testemunhas a serem ouvidas.

As partes prescindem da produção de outras provas e requerem o encerramento da instrução processual. Deferido.

Razões finais remissivas pelas partes.

Tentativa conciliatória final infrutífera.

Venham os autos conclusos para JULGAMENTO, cientes as partes de que serão intimadas da decisão, pelo Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho, não se aplicando os termos da SÚMULA 197 DO COLENDO TST.

Cientes as partes e seus patronos, que conferem nesta oportunidade o inteiro teor nos termos lavrados nesta ata e concordam que não houve nenhuma intercorrência técnica hábil a invalidar o ato processual.

Nada mais.

O comparecimento das partes e testemunhas está certificado nos autos e pode ser visualizado no endereço eletrônico do TRT da 15ª Região: www. trt15.jus.br, Acompanhamento Processual, inserindo-se o número completo do processo, e serve como atestado de comparecimento para todas as pessoas que estiverem presentes no horário acima, deste dia, para todos os efeitos legais, não podendo, pela ausência ao serviço, sofrer penalidade ou desconto nos seus salários, nos termos do art. 822 da CLT.

"Conheça o aplicativo Justiça do Trabalho Eletrônica - JTe, desenvolvido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região e integrado aos sistemas judiciais da 15ª Região. Por meio dele, será possível acompanhar o andamento das pautas de audiência, iniciar chat com outros usuários da ferramenta, verificar a tramitação, consultar decisões e sentenças e até selecionar processos favoritos para recebimento de notificações acerca da movimentação. O aplicativo está disponível tanto para iphone quanto para android, podendo ser baixado nas lojas apple store e google play. Por fim, é importante esclarecer que essas consultas possuem caráter meramente informativo, não substituindo as intimações realizadas no PJe, nem ocasionando início da contagem de prazos processuais. [grifei]

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, no tema, julgou a ação rescisória improcedente com arrimo nos seguintes fundamentos:

VIOLAÇÃO A NORMA JURÍDICA - NULIDADE - CERCEAMENTO Alega a autora que houve violação a norma jurídica (art. 5º, XXXV e LV, da CF/88), porquanto houve nulidade por cerceamento de defesa, já que indeferida prova testemunhal.

Argumenta que, durante a instrução processual, após ser ouvida a primeira testemunha da trabalhadora, pretendia ouvir mais duas testemunhas (Juliana e Fabiana), mas que estas não conseguiram manter conexão estável com a internet para serem ouvidas. Aduz que restou configurado o prejuízo da autora, já que a r. Sentença resultou na improcedência da ação.

Sem razão.

Em que pesem as alegações exordiais, na ata de audiência de fl. 99, constato que restou consignado razões finais remissivas, após a parte declarar que não pretendia produzir mais provas.

Ainda que a Autora entenda que houve nulidade e cerceamento de defesa, conforme evidenciado, a parte apresentou razões finais remissivas e declarou não pretender produzir outras provas, o que cai por terra sua alegação de nulidade, conforme art. 794 da CLT.

Mesmo havendo a controvérsia sobre a possibilidade de rescindir decisão interlocutória durante a instrução do feito, o certo é que não há nulidade a ser declarada, o que inviabiliza o corte rescisório.

Nada a deferir no aspecto.

No recurso ordinário, em relação à invocação de nulidade da decisão rescindenda por cerceio de defesa, a autora reitera a alegação de violação da norma jurídica contida no art. 5º, XXXV e LV, da Constituição da República de 1988 e impugna o acórdão recorrido ao afirmar que não se resignou com o indeferimento da oitiva de testemunhas em audiência, haja vista que apresentou protesto.

À análise.

O Código de Processo Civil de 2015, em seu art. 1º, ao dispor que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil", chancela a constitucionalização do processo, que demanda a adoção de critérios hermenêuticos valorativos para a aplicação das normas processuais infraconstitucionais, cuja instrumentalização deve servir ao mister de concretização das disposições constitucionais.

Para Cassio Scarpinella Bueno, a constitucionalização do processo "convida o estudioso do direito processual civil a lidar com métodos hermenêuticos diversos – a filtragem constitucional de que tanto falam alguns constitucionalistas — tomando consciência de que a interpretação do direito é valorativa e que o processo, como método de atuação do Estado, não tem como deixar de ser, em igual medida, valorativo, até como forma de realizar adequadamente aqueles valores: no e pelo processo." (Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. São Paulo, 2007, p. 71)

De outro lado, sobre o tema, Fredie Didier tece a seguinte lição:

De outro lado, a doutrina passa a examinar as normas processuais infraconstitucionais como concretizadoras das disposições constitucionais, valendo-se, para tanto, do repertório teórico desenvolvidos pelos constitucionalistas, Intensifica-se cada vez mais o diálogo entre processualistas e constitucionalistas, com avanços de parte a parte. O aprimoramento da jurisdição constitucional, em cujo processo se permite a intervenção do amicus curiae (ver item no capítulo sobre intervenção de terceiro) e a realização de audiências públicas, talvez seja o exemplo mais conhecido.

[...]

Não é , então, por acaso que o art. 1º do CPC, com forte caráter simbólico, está assim redigido: "O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código". (Curso de Direito Processual Civil: introdução ao Direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Fredie Didier Jr., Salvador, 2021, p. 67)

No caso em exame, a controvérsia consiste em decidir sobre a caracterização de afronta ao art. 5º, XXXV e LV, da CRFB apta a deflagrar o corte rescisório de sentença em que, em reclamação trabalhista, foi julgada improcedente pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego amparada também na prova oral, em hipótese na qual, na fase de instrução, em audiência telepresencial, foi indeferido requerimento de oitiva de duas testemunhas que não conseguiram ingressar na sala virtual de audiência, havendo registro em ata que uma delas chegou a conectar-se à sala virtual de espera e que, em relação à outra, não foi informado ao juízo a pretensão de sua oitiva no início dos depoimentos.

 A autora, nesta ação rescisória, apresentou cartas-convite que teria enviado às testemunhas, documentos que não foram impugnados pela ré.

Na ata da audiência ficou consignado o seguinte registro de relevo:

A reclamante pretende ouvir mais duas testemunhas, Juliana ou Fabiana.

Registra-se que a testemunha Juliana estava na sala de espera virtual, quando foi desconectada, sendo que não retornou e que a testemunha Fabiana não adentrou à sala de audiência em momento algum e no início dos depoimentos, não foi informado ao Juízo que referida testemunha seria ouvida, razão pela qual preclusa a oportunidade de oitiva dessas testemunhas. Protestos do patrono da autora.

No processo matriz, restou demonstrado que as testemunhas cujos depoimentos não foram colhidos foram convidadas a comparecer à audiência, quer porque receberam carta-convite, quer porque assim evidenciam os registros em ata de audiência ao informarem o ingresso de uma das testemunhas à sala virtual de espera e o requerimento da autora para que as testemunhas fossem ouvidas, o que supõe, por óbvio, a certeza da presença delas.

Em última análise, o ponto nodal nesta ação rescisória reside em verificar se o indeferimento da oitiva das testemunhas e de redesignação da audiência no processo matriz concretiza ou vulnera os princípios do acesso à justiça e da ampla defesa consubstanciados no art. 5º, XXXV e LV, da CRFB, sob a perspectiva da constitucionalização do processo.

Pois bem.

O Conselho Nacional de Justiça, por meio da sua Resolução nº 354/2020, que disciplina o cumprimento digital de ato processual, normatizou, em seu art. 7º, I, que, em audiência telepresencial — assim compreendida a audiência realizada a partir de ambiente físico externo às unidades judiciárias, conforme art. 2º, II, da aludida resolução — a oitiva de testemunha será equiparada às presenciais para todos os fins legais, asseguradas as prerrogativas processuais das partes e testemunhas. 

De outro lado, nos termos do art. 825 da CLT, no processo do trabalho, as testemunhas comparecerão à audiência independentemente de intimação, sendo certo que as ausentes serão intimadas, de ofício ou a requerimento da parte, ficando sujeitas à condução coercitiva, além das penalidades do art. 730, caso, sem motivo justificado, não atendam à intimação.

Outrossim, o art. 849 da CLT estabelece que "a audiência de julgamento será contínua; mas, se não for possível, por motivo de força maior, concluí-la no mesmo dia, o juiz ou presidente marcará a sua continuação para a primeira desimpedida, independentemente de nova notificação" [grifei].

Nesse cenário, sob o prisma hermenêutico da constitucionalização do processo, na reclamação trabalhista matriz, diante da impossibilidade técnica de as testemunhas prestarem depoimento em audiência telepresencial e do requerimento da parte autora insistindo em sua oitiva, cumpria ao magistrado determinar a redesignação da audiência com supedâneo no art. 849 da CLT, porquanto a situação configura força maior que autoriza a marcação de nova audiência.

Cumpre destacar que não era possível exigir a adoção de qualquer conduta pela reclamante e de seu patrono em audiência com o fim de solucionar o problema, pois cumprido seu ônus de convidar as testemunhas, na forma do art. 825 da CLT, sendo certo que a testemunha é apenas indicada e convidada pelas partes, podendo também ser inquirida de ofício pelo juiz (art. 461 do CPC de 2015), haja vista que a prova pertence aos autos, não às partes, não cabendo à reclamante, em audiência telepresencial, solucionar problema técnico de conexão à internet da testemunha, tampouco empreender meios de obrigá-la a se conectar, pois a condução coercitiva, por óbvio, é providência que somente incumbe ao juiz determinar, a teor do parágrafo único do citado art. 825 da CLT.

De igual modo, não se pode exigir da reclamante que obrigasse as testemunhas a produzirem prova da falha de conexão com a internet, pois, repita-se, à parte incumbe apenas indicar e convidar, sendo-lhe defeso impor qualquer providência a cargo da testemunha.

O quadro narrado na audiência telepresencial do processo matriz se assemelha à hipótese em que, em audiência presencial, a testemunha está presente na sala de espera do pregão, mas, em seguida, deixa a unidade judiciária por alguma razão médica de baixa gravidade. Em tal cenário, não há dificuldade em se compreender pela configuração da força maior que autoriza a redesignação de audiência de que trata o art. 849 da CLT, pois não é possível exigir da parte que indicou e convidou a testemunha que solucione a sua necessidade de saúde e tampouco que a obrigue a permanecer na sala de audiência para prestar depoimento.

Assim, como a audiência telepresencial se equipara à presencial para todos os efeitos, a teor do art. 7º, I, da Resolução nº 354/2020 do CNJ, forçoso concluir que a identidade de circunstâncias impunha a adoção de conduta diversa no processo matriz, devendo o juiz determinar a redesignação da audiência de instrução para colher o depoimento das testemunhas Juliana Peres e Fabiana Cristina Rangon.

Nesse cenário, como a sentença rescindenda julgou improcedente a pretensão de vínculo de emprego amparada também na prova oral, estando demonstrado o prejuízo da ora autora, tem-se que o indeferimento da oitiva das testemunhas no caso em exame importou em mácula ao princípio do contraditório e ampla defesa, lapidado no art. 5º, LV, da Constituição de República, situação que autoriza o corte rescisório com espeque no art. 966, V, do CPC de 2015.

Nem se invoque o teor da OJ nº 97 da SBDI-2 do TST, pois, no caso, além de a parte autora não invocar violação à norma jurídica de nenhum dispositivo infraconstitucional, tem-se que a vulneração ao art. 5º, LV, da CRFB é direta e manifesta, porque não se trata de alegação genérica e desfundamentada, mas de invocação clara de nulidade processual na instrução que macula a coisa julgada material em razão da condução do processo em desalinho com o princípio do contraditório e ampla defesa.

Também revela-se inócua a circunstância de a autora, no início dos depoimentos, não ter informado a pretensão de oitiva da testemunha Fabiana, uma vez que a testemunha, em regra, comparece a convite da parte ou de ofício pelo próprio juiz, podendo ser contraditada pela parte adversa e indeferida pelo juiz no momento de sua qualificação, de modo que não há prejuízo algum que atraia a preclusão do seu depoimento se requerido antes do encerramento da instrução, como no caso em exame, a teor do art. 794 da CLT.

Por derradeiro, só sobra o fundamento de que o fato de a reclamante consignar razões finais remissivas importou em concordância com o indeferimento da prova oral, pois há registro de protestos na ata de audiência especificamente contra o indeferimento das oitivas das testemunhas.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso ordinário para julgar procedente a ação rescisória, com amparo no artigo 966, V, do CPC de 2015, e, em juízo rescindente, reconhecendo a violação manifesta à norma jurídica insculpida no art. 5º, LV, da CRFB, rescindir a sentença proferida nos autos da reclamação trabalhista nº 0010924-80.2020.5.15.0146 e, em juízo rescisório, declarar a nulidade do ato que indeferiu a oitiva das testemunhas em 22/6/2021 e de todos os atos processuais seguintes, ressalvados os depoimentos já prestados, a critério do Juízo, conforme art. 461 do CPC de 2015, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de Orlândia a fim de que proceda à oitiva das testemunhas Juliana Peres e Fabiana Cristina Rangon e prossiga no processamento e julgamento da reclamação trabalhista, conforme entender de direito.

Condeno a ré em honorários advocatícios na ação rescisória, no importe de 10% calculados sobre o valor da condenação, arbitrado em R$33.800, na forma do art. 85 do CPC de 2015.

Custas processuais pela ré, no importe de R$676,00.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer parcialmente do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe provimento para julgar procedente a ação rescisória, com amparo no artigo 966, V, do CPC de 2015, e, em juízo rescindente, reconhecendo a violação manifesta à norma jurídica insculpida no art. 5º, LV, da CRFB, rescindir a sentença proferida nos autos da reclamação trabalhista nº 0010924-80.2020.5.15.0146, condenado a ré em honorários advocatícios no importe de 10% sobre o valor da condenação, arbitrado em R$33.800,00, e, em juízo rescisório, declarar a nulidade do ato que indeferiu a oitiva das testemunhas em 22/6/2021 e de todos os atos processuais seguintes, ressalvados os depoimentos já prestados, a critério do Juízo, conforme art. 461 do CPC de 2015, determinando o retorno dos autos à Vara do Trabalho de Orlândia a fim de que proceda à oitiva das testemunhas Juliana Peres e Fabiana Cristina Rangon e prossiga no processamento e julgamento da reclamação trabalhista, conforme entender de direito. Custas processuais pela ré, no importe de R$676,00.

Brasília, 27 de junho de 2023.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

EVANDRO VALADÃO

Ministro Relator

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