Data da publicação:
Acordãos na integra
Maria Helena Mallmann - TST
Inclusão de agregados em plano de saúde por 20 anos se incorpora ao contrato de trabalho
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014.
PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO. Ante a possível violação ao artigo 468 da CLT, deve ser provido o agravo de instrumento.
II - RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014.
PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO. A controvérsia diz respeito à manutenção da forma de participação/contribuição financeira por parte de três substituídos do sindicato autor com dependentes inscritos no plano de saúde gerido pelo reclamado, Conselho Federal de Economia, anteriormente à edição da Portaria 30/2013, que alterou a forma de concessão do benefício. No caso, o Tribunal Regional deu provimento ao recurso do reclamado para indeferir o pedido de manutenção do plano nos moldes em que era praticado, sob o fundamento de que o benefício não se incorporou ao contrato de trabalho dos empregados. Consignou que, por omissão ou liberalidade do reclamado, houve a manutenção do plano de saúde aos empregados com a inclusão de parentes e agregados, sem a necessidade de comprovação da dependência legal, critérios exigidos na Portaria COFECON 30/2013, para manutenção do plano de assistência médico-hospitalar e odontológica apenas aos empregados e dependentes legais. Delimitado no acórdão regional que o empregador, por mera liberalidade, permitiu por mais de 20 anos, que os seus funcionários incluíssem no plano de saúde seus dependentes sem a necessidade de comprovação da dependência legal, tem-se que tal situação gerou nos empregados a convicção do direito, aderindo ao contrato de trabalho, especialmente em se considerando a habitualidade do benefício, a boa-fé objetiva do contrato de trabalho entre as partes e o princípio da primazia da realidade. Assim, o direito à manutenção no plano de assistência médico-hospitalar e odontológica dos dependentes incluídos por mera liberalidade do empregador e com habitualidade incorporou-se ao contrato de trabalho dos empregados, exsurgindo nítida a nulidade da alteração lesiva prevista na Portaria COFECON 30/2013 quanto a esses empregados. Caracterizada violação ao art. 468 da CLT. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-ARR-70-95.2014.5.10.0010, Maria Helena Mallmann, DEJT 22.03.19).
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão mediante a qual foi denegado seguimento ao recurso de revista.
A parte recorrida apresentou contraminuta ao agravo de instrumento e contrarrazões ao recurso de revista.
Não houve a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
I – AGRAVO DE INSTRUMENTO
Conheço do agravo de instrumento, uma vez que atendidos os pressupostos de admissibilidade.
1 – PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO
Eis o teor da decisão denegatória:
"Sentença Normativa/Convenção e Acordo Coletivos de Trabalho / Acordo e Convenção Coletivos de Trabalho.
Alegação(ões):
- contrariedade à(s) Súmula(s) nº 51; nº 277; nº 440 do colendo Tribunal Superior do Trabalho.
- violação do(s) artigo 5º, inciso XXVI, da Constituição Federal.
- violação do(s) Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 468.
- divergência jurisprudencial:
A egr. 3ª Turma, por meio do acórdão às fls. 1189/1195V, deu provimento ao recurso do reclamado para julgar improcedentes os pedidos iniciais, tendo em vista que as portarias editadas pelo COFECON, não violaram o acordo coletivo de trabalho, tampouco o disposto no art. 468 da CLT e Súmula nº51/TST. Eis a ementa da decisão, verbis:
"ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. PLANO DE SAÚDE. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. O reconhecimento dos acordos e convenções coletivas de trabalho encontra-se consagrado na Carta Constitucional (art. 7º, XXVI, da CF). As condições estabelecidas em Convenção precisam ser fielmente cumpridas (pacta sunt servanda). Firmado acordo coletivo com o SINDECOF-DF, no qual restaram confirmadas as Portarias nº 30/13 e 34/14, esta alterando a forma de concessão do auxílio saúde, que passou a ser pela forma de reembolso. Assim, dou provimento ao recurso do réu para julgar improcedentes os pedidos iniciais, tendo em vista que as portarias editadas pelo COFECON, não violaram o acordo coletivo de trabalho tampouco o disposto no art. 468 da CLT e Súmula nº51/TST. Recurso conhecido parcialmente e provido. "
Recorre de revista o Sindicato-Reclamante. Sustenta que o plano de saúde e suas regras integram o contrato de trabalho, não podendo sofrer alterações lesivas aos empregados.
Acerca da alegação de que a alteração promovida pelo Reclamado foi prejudicial aos trabalhadores visto que a norma anterior seria mais benéfica e deveria incorporar-se aos contratos de trabalho em vigor, a Egr. Turma refutou tal assertiva esclarecendo que as Partes confirmaram a validade das portarisa COFECON Nº 30/13 e 34/14, pontuou o Regional:
"Para mais disso, conforme alegado nas razões recursais, firmado acordo coletivo com o SINDECOF-DF, no qual restaram confirmadas as Portarias nº 30/13 e 34/14, esta alterando a forma de concessão do auxílio saúde, que passou a ser pela forma de reembolso. Tal acordo conferiu validade às Portarias COFECON nº 30/13 e 34/14. Esta última de 31 de dezembro de 2014. Portanto, editada após a propositura da presente demanda e que traz expresso no §2º do art. 2º,que para'[...]fins de comprovação da dependência legal deverá ser observado os critérios estipulados na Portaria 30/2013, bem como os estipulados na presente Portaria' (fl. 1199v)." (fl. 1195 - grifo nosso).
Diante desse contexto, não há que se falar em alteração lesiva na aplicação de condições previstas na portaria COFECON nº. 30/13 que estipulam critérios para a inclusão de parentes e agregados dos empregados no plano de saúde, constituindo tal fato, tão-somente, a observância de condições previamente ajustadas entre as partes, não incorrendo o julgado em ofensa ao art. 468 da CLT e a Súmula nº 51 do TST.
Tampouco há que se falar em lesão ao art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal. Por sua vez, a Súmula nº. 440 do C.TST trata de hipótese diversa, não aproveitando aos recorrentes.
Destarte, a decisão proferida pelo Colegiado, longe de violar os dispositivos elencados, confere validade ao art. 7º, XXVI, da C.F. e a Súmula 277 do C. TST.
Registro, por fim, que os arestos transcritos pelo recorrente mostram-se inespecíficos (Súmula nº 296/TST).
Inviável, pois, o processamento do apelo.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DENEGO seguimento ao recurso de revista."
O sindicato reclamante alega que, por liberalidade do reclamado, permitiu, durante mais de 20 anos, que todos os seus funcionários incluíssem no plano de saúde, como dependentes, os seus genitores, sem a necessidade de comprovar a dependência financeira, aderindo tal situação ao contrato de trabalho, não podendo ser alterada, por se tratar de direito adquirido dos empregados. Afirma que o novo acordo coletivo somente foi lavrado após o ingresso da presente ação e somente foi juntado aos autos após a prolação da sentença. Aduz que a possibilidade de inclusão dos agregados ao plano de saúde tornou-se ato jurídico perfeito e direito adquirido dos substituídos, remanescendo nula, em relação aos substituídos, a Portaria 30/2013 que alterou as condições mencionadas.
Aponta violação dos arts. 5º, XXXVI, da CF/1988 e 468 da CLT, bem como contrariedade às Súmulas 51, 277 e 440 do TST. Transcreve arestos ao confronto de teses.
Analiso.
O Tribunal Regional deu provimento ao recurso do reclamado para indeferir o pedido de manutenção do plano nos moldes em que era praticado pelo empregador há mais de vinte anos, sob o fundamento de que o benefício não se incorporou ao contrato de trabalho dos três empregados substituídos pelo sindicato autor.
Por vislumbrar uma possível violação do artigo 468 da CLT, dou provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.
II – RECURSO DE REVISTA
Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade, examino os específicos do recurso de revista.
1 – PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO.
O Tribunal Regional, no que concerne ao tema destaque, consignou:
"PLANO DE SAÚDE. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO.
O sindicato autor, em nome de três substituídos(fl.4), sustentou que o COFECON publicou portaria determinando, para efeito de inclusão de dependentes legais, na forma dos incisos II e III do art. 16 da Lei nº 8.213/91, a comprovação, pelos empregados, de liame familiar e de dependência econômica, de ordem a serem incluídos como beneficiários do plano de saúde/odontológico gerido por aquele conselho.
Tal determinação, segundo o sindicato autor, feriu o disposto no art. 468 da CLT c/c a Súmula 277/TST, na medida em que a concessão de benefícios relativos à inclusão de dependentes e agregados ao plano de saúde em questão, não era assim exigida anteriormente. Desse modo, em razão da habitualidade ao longo de vários anos, incorporou-se ao contrato de trabalho.
O Juízo de origem assim fundamentou o deferimento do pleito:
"MANUTENÇÃO DE DEPENDENTES EM PLANO DE SAÚDE Alega o sindicato autor, atuando em nome de três substituídos, que a reclamada publicou a Portaria 30/2013, determinando a comprovação da ligação familiar e dependência econômica de dependentes inseridos como agregados no plano de saúde, com esteio na previsão do art. 16 da Lei nº 8.213/91, sob alegação de necessidade de corte de gastos. Relata que o plano de saúde é concedido anualmente a todos os empregados que aderirem, havendo habitualidade nas regras concebidas para a concessão do benefício desde 2004. Sustenta que antes do advento da Portaria nº 30/2013 a reclamada tentou por meio de acordo coletivo realizar a exclusão de beneficiários do plano de saúde, o que não foi aceito pelos empregados, razão pela qual não houve aprovação de ACT que abarcasse o período de 1º/5/2013 a 30/4/2014, mantendo-se vigentes as garantias estabelecidas no ACT anterior. Afirma que o direito dos empregados consistente na inclusão de dependentes agregados e o percentual de contribuição fixado, que se perpetuou durante anos, aderiu ao contrato de trabalho, havendo ilegalidade na determinação contida na Portaria nº 30/2013. Indica que o ACT vigente nunca estipulou qualquer critério para comprovação de dependência econômica de beneficiários e que havendo norma específica, mais precisamente o contrato administrativo para regular a matéria, não se pode cogitar de aplicação de norma menos benéfica, no caso, a Lei 8.213/91. Pede a antecipação da tutela para que não haja corte ilegal e abusivo dos benefícios dos empregados e respectivos dependentes e em sede de cognição definitiva, a declaração de nulidade do ato que determinou o corte dos benefícios dos empregados quanto à utilização do plano por esses empregados e por seus dependentes agregados.A reclamada em contestação sustenta que por meio de ACT estendeu aos dependentes legais dos empregados plano de assistência médico-hospitalar e odontológica, fixando percentuais de contribuição de 1% para o titular e 0,3% para cada dependente, nos moldes fixados no ACT 2004 e que em virtude dessa previsão em norma coletiva, contratou, por meio de licitação, empresa especializada. Alega que no contrato com a operadora do plano de saúde ficou estabelecido no item 3 quem são os beneficiários do plano, sendo que, conforme o § 4º do item 3.2 da cláusula 3ª, o ônus da adesão do agregado é integralmente do empregado, que deve autorizar o desconto referente a tal benefício na folha de pagamento, para mero repasse à empresa prestadora dos serviços. Informa que em 2013, o então presidente da reclamada constatou abusos na inscrição de beneficiários, pelo fato de dependentes agregados estarem sendo inseridos no plano como dependentes legais, sem haver o pagamento correto do valor que seria devido ao plano em tal modalidade de dependentes. Aponta que devido ao desvirtuamento do benefício e a impossibilidade de solução amigável entre as partes envolvidas, editou a Portaria nº 30/2013, com a finalidade de fazer cumprir as regras preestabelecidas nas normas do edital, ACT e contrato administrativo. Registra que a reclamada, como entidade autárquica, deve observar todos os princípios que regem a administração pública, notadamente, quanto à descrição legal do que sejam dependentes legais. Alega que caso o empregado opte por incluir beneficiário agregado, deve arcar integralmente com o valor definido pela contratante para o plano de saúde, ressaltando que a dependência legal é uma condição transitória não havendo ilegalidade na exigência de comprovação de seus requisitos.
Restou patenteado que até dezembro de 2013 o reclamado permitiu a inclusão no plano de saúde empresarial de pessoas não enquadradas como dependentes legais nessa categoria, cobrando dos empregados o percentual de 0,3% por cada um desses dependentes. Se não permitiu, ao menos omitiu-se em verificar se efetivamente tais dependentes deveriam ser enquadrados ou não nessa categoria, omitindo-se de cobrar o valor efetivamente devido ao plano de saúde.
A partir do momento em que foi detectada a pretensa irregularidade, o reclamado, por meio de seu presidente à época, tomou providências para tentar fazer cessar a impropriedade, por meio da Portaria nº 30/2013.
Aqueles empregados atingidos, ou seja, os que tinham dependentes não enquadrados como legais, mas cuja adesão nessa condição foi permitida pela reclamada desde 2004, aproximadamente, ingressaram com a presente ação, para tentar reaver seu direito à inserção desses parentes como dependentes sujeitos apenas ao pagamento da contribuição de 0,3%.
A questão discutida nos autos parece-me, portanto, relativa ao seguinte pressuposto: a liberalidade do empregador em permitir que dependentes agregados contribuíssem com o mesmo percentual dos dependentes legais, que ocorreu durante anos, inclusive à margem dos acordos coletivos de trabalho, agrega-se ou não aos contratos individuais de trabalho dos empregados substituídos.
O próprio reclamado reconhece, em sua manifestação sobre os documentos juntados pela réplica, que "as regras de adesão foram estipuladas, mas não estavam sendo respeitadas pelos empregados do COFECON, seja pelo fato de terem sido inseridas pessoas como dependentes legais dos empregados de forma irregular e em desacordo com o previsto no contrato celebrado com a Amil e com o Acordo Coletivo de Trabalho, seja pelo fato de diversos agregados terem sido inseridos no plano como dependente legal, seja ainda pelo fato de não terem sido descontados dos empregados os valores referentes ao pagamento do plano de saúde de seus agregados incluídos no plano" (fls. 920/921).
Ora, se as regras não estavam sendo respeitadas pelos empregados do COFECON, alguém permitiu tal desrespeito. Se estavam sendo inseridos dependentes que deveriam ser classificados como agregados na condição de legais, alguém autorizou que tal procedimento fosse acatado. Se deixaram de ser cobradas as mensalidades devidas pelos dependentes agregados, alguém deixou de cobrá-las. A solução passa pela responsabilização das autoridades administrativas que promoveram tais equívocos, ou pelo menos omitiram-se em tomar as providências pertinentes, e não pela retirada dos benefícios daqueles que tiveram, sob aparência de legalidade, seus requerimentos de inclusão de dependentes acolhidos.
A jurisprudência pacífica neste Regional e na Corte Superior Trabalhista é no sentido de que os direitos e benefícios relativos ao contrato de trabalho são regidos pelas normas vigentes na data de admissão do empregado ou adesão ao normativo, sendo que alterações posteriores somente podem ser admitidas quando mais benéficas ao trabalhador.
O fundamento está no art. 468 da CLT (Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.) e ainda no entendimento expresso na Súmula 51 do c. TST, especialmente o item I: NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT. (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 163 da SBDI-1) – Res. 129/2005 – DJ 20.04.2005 I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula nº 51 – RA 41/73, DJ 14.06.1973) II – Havendo a coexistência de dois regulamentos na empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. (ex-OJ nº 163 – Inserida em 26/03.1999) Deve haver, ainda, a identificação da norma mais favorável ao trabalhador, restando cristalino, assim, que a Portaria nº 30/2013 veio para alterar situações pessoais mais benéficas, as quais devem prevalecer para os empregados até então abrangidos pela norma, que regerá apenas as situações voltadas para o futuro, não podendo atingir, para prejudicar, direitos já consolidados, seja pela liberalidade, seja pela habitualidade. E ambos os aspectos se verificam no caso em tela.
Em outras palavras, a incidência dos termos da Portaria nº 30/2014, no tocante aos dependentes dos substituídos, representaram restrição de direitos considerando as condições até então praticadas e, considerando o prejuízo causado aos empregados, constituem alteração contratual lesiva e, portanto, não se aplicam aos substituídos, com fundamento no artigo 468 da CLT e Súmula 51/TST.
Assim, eventuais diferenças pecuniárias, em relação aos dependentes dos substituídos já inscritos no plano, porventura devidas à operadora do plano de saúde na pactuação de novos contratos deverá ser arcada integralmente pelo reclamado, autorizada apenas a dedução do percentual observado até a data anterior à da edição da Portaria 30/2013.
Não há restrição de aplicação dos efeitos da referida Portaria nº 30/2013 para os empregados contratados a partir da data de sua assinatura (27/12/2013), tampouco para a inclusão de novos dependentes de empregados no plano de saúde a partir dessa data.
Quanto à alegação de que a reclamada, como entidade equiparada à autarquia, tem que observar todos os princípios que regem a administração pública, óbvio que não se pode esquivar de tal responsabilidade. Todavia, restou patenteado que a reclamada, por meio de seus administradores, por certo período, omitiu-se quanto à fiscalização do enquadramento dos requerimentos de inclusão de dependentes no plano de saúde, não se admitindo que apenas neste momento venha dizer que tudo não passou de erro, retirando direitos que já estão agregados aos contratos de trabalho dos beneficiários. Deve, assim, assumir, perante seus empregados, os ônus financeiros da omissão que perdurou durante anos. A observância dos princípios da administração pública deve, sim, ser relevada em relação às administrações anteriores que permitiram tal situação.
Por fim, no tocante à alegação de que a dependência legal é uma condição transitória, não havendo ilegalidade na exigência de comprovação de seus requisitos, há que se esclarecer que a reclamada, em relação aos substituídos, jamais praticou essa regra. Assim, ratifico que em relação aos dependentes dos substituídos, incluídos no plano de saúde até 26/12/2013, nada pode ser exigido em inovação ao que até então era praticado.
Ante todo o exposto, acolho o pleito exordial, nos seguintes termos: para declarar a nulidade da Portaria nº 30/2013, de 27/1/2013, em relação aos empregados substituídos e seus dependentes inscritos no plano de saúde anteriormente a essa data, determinando-se ao reclamado a manutenção da forma de participação/contribuição financeira por parte dos empregados, em razão do plano de saúde médico-hospitalar e odontológico, sem necessidade de comprovação de "ligação familiar e dependência econômica dos beneficiários"(fls.927/933, sem grifos no original).
Insurge-se o reclamado iterando termos da defesa, no sentido de irregularidades quanto às normas que regem o benefício do auxílio saúde, pois estendidos àqueles que não os dependentes legais, conforme previsto em acordo coletivo. Desse modo, ao firmar contrato com a AMIL teriam direito ao benefício o titular, servidor ativo, seus dependentes, a saber: cônjuge ou companheiro, filhos ou enteados.
Também teriam direito ao plano, os agregados, assim considerados mãe e pai do empregado, cônjuge separado ou divorciado, desde que dependente de pensão alimentícia; maiores de 60 anos ou pessoas portadoras de deficiência, estes dois últimos, desde que dependentes economicamente do empregado. Contudo, em relação a esses agregados, caberia ao empregado a responsabilidade pelo pagamento integral do plano de saúde, na forma preconizada no §4º do item 3.2 da cláusula terceira do contrato firmado com a AMIL.
Afirma que a portaria foi editada em conformidade aos acordos coletivos vigentes. Portando, visava a correção de falhas no procedimento interno de concessão do benefício, antes não observado.
Ao cabo, sustenta que ao longo do presente feito, houve alteração na forma de concessão do auxílio saúde no âmbito do COFECON, passando a ser sob a forma de reembolso. Isso por meio de acordo coletivo firmado com o SINDECOF-DF, no qual restaram confirmadas as Portarias nº 30/13 e 34/14, esta alterando a forma de concessão do auxílio saúde, que passou a ser pela forma de reembolso.
Em razão da anuência do sindicato autor aos termos das Portarias COFECON nº 30/13 e 34/14, entende não haver nulidade dos referidos atos administrativos, pela constatada falta de interesse de agir.
O reconhecimento dos acordos e convenções coletivas de trabalho encontra-se consagrado na Carta Constitucional (art. 7º, XXVI, da CF). As condições estabelecidas em Convenção precisam ser fielmente cumpridas (pacta sunt servanda). Nessa seara, há de se conferir validade a cláusula normativa prevista em instrumento coletivo que determinou a manutenção de plano de assistência médico-hospitalar e odontológica aos empregados do réu, incluso os dependentes legais destes (fl.482v). Condição esta, assegurada na Portaria COFECON nº30 de 27 de dezembro de 2013 (fls. 478/480).
Certo que houve habitualidade, por cerca de 20 anos, na manutenção do plano de saúde, sem os critérios exigidos naquela portaria, o que propiciou a inclusão de parentes e agregados dos empregados, de certa forma, indiscriminadamente. Seja por omissão ou liberalidade do órgão réu.
Inicialmente, cumpre-me manifestar entendimento no sentido de que o plano de saúde, não tem o caráter de contraprestação pelo trabalho prestado. O objetivo da concessão é social, diz respeito ao bem estar dos empregados, à segurança quanto à assistência médico-odontológica diferenciada, tendo em conta a precariedade desses serviços por entes públicos.Dessa forma, não pode ser integrado ao contrato de trabalho como preconizado pelo art. 468 da CLT c/c com a Súmula 51/TST, podendo ser retirado a qualquer tempo pela empresa.
A interpretação de manutenção do plano de saúde nos padrões então vigentes, não permite ilação de imutabilidade das suas condições de custeio ou de adesão de forma indiscriminada, com a inclusão de parentes e agregados sem a devida comprovação de dependência legal, pois como visto, esses padrões estão vinculados estritamente a fatores etários e econômico-financeiros, sem que isso importe violação à cláusula do ACT ou mesmo ao contrato de trabalho.Atente-se, além disso, caso não observados parâmetros socioeconômicos, por certo, todo o plano de benefício restaria comprometido.
Para mais disso, conforme alegado nas razões recursais, firmado acordo coletivo com o SINDECOF-DF, no qual restaram confirmadas as Portarias nº 30/13 e 34/14, esta alterando a forma de concessão do auxílio saúde, que passou a ser pela forma de reembolso. Tal acordo conferiu validade às Portarias COFECON nº 30/13 e 34/14. Esta última de 31 de dezembro de 2014. Portanto, editada após a propositura da presente demanda e que traz expresso no §2º do art. 2º,que para"[...]fins de comprovação da dependência legal deverá ser observado os critérios estipulados na Portaria 30/2013, bem como os estipulados na presente Portaria" (fl. 1199v).
Releva observar que o sindicato recorrido disse que apenas um dos substituídos no presente feito, José Luiz Pereira Barboza, recusou-se a efetuar a contratação particular, na forma da Portaria nº 34/14, devido ao alto custo que teria de arcar e por não concordar com determinações de ordem burocráticas constantes dessa portaria. Os demais substituídos acataram-na, por necessidade de tratamento médico premente e por não possuírem nenhum plano de saúde (fls. 1079/1080).
Ora, à exceção de José Luiz Pereira Barboza, os demais substituídos, de fato, não têm interesse no presente feito, uma vez que acordaram à nova portaria, que valida aquela tida por nula – Portaria nº30/13 -.Não prospera assim, a argumentação do recorrido no sentido de, conquanto tivesse o acordo coletivo acolhido a Portaria nº 34/14, que respalda a de nº20/13, esta é objeto de discussão da presente demanda o que abrange os três substituídos.
Nesse cenário, não há espaço para ter por nula a Portaria nº30/2013.
Assim, dou provimento ao recurso do réu para julgar improcedentes os pedidos iniciais, tendo em vista que as portarias editadas pelo COFECON, não violaram o acordo coletivo de trabalho, tampouco o disposto no art. 468 da CLT e Súmula nº51/TST.
Recurso provido."
O sindicato reclamante alega que, por liberalidade do reclamado, permitiu, durante mais de 20 anos, que todos os seus funcionários incluíssem no plano de saúde, como dependentes, os seus genitores, sem a necessidade de comprovar a dependência financeira, aderindo tal situação ao contrato de trabalho, não podendo ser alterada, por se tratar de direito adquirido dos empregados. Afirma que o novo acordo coletivo somente foi lavrado após o ingresso da presente ação e somente foi juntado aos autos após a prolação da sentença. Aduz que a possibilidade de inclusão dos agregados ao plano de saúde tornou-se ato jurídico perfeito e direito adquirido dos substituídos, remanescendo nula, em relação aos substituídos, a Portaria 30/2013 que alterou as condições mencionadas.
Aponta violação dos arts. 5º, XXXVI, da CF/1988 e 468 da CLT, bem como contrariedade às Súmulas 51, 277 e 440 do TST. Transcreve arestos ao confronto de teses.
Analiso.
A controvérsia diz respeito à manutenção da forma de participação/contribuição financeira por parte de três substituídos do sindicato autor com dependentes inscritos no plano de saúde gerido pelo reclamado, Conselho Federal de Economia, anteriormente à edição da Portaria 30/2013, que alterou a forma de concessão do benefício para reembolso.
No caso, o Tribunal Regional deu provimento ao recurso do reclamado para indeferir o pedido de manutenção do plano nos moldes em que era praticado, sob o fundamento de que o benefício não se incorporou ao contrato de trabalho dos empregados. Delimitou que, por omissão ou liberalidade do reclamado, houve a manutenção do plano de saúde aos empregados com a inclusão de parentes e agregados, sem a necessidade de comprovação da dependência legal, critérios exigidos na Portaria COFECON 30/2013, para manutenção do plano de assistência médico-hospitalar e odontológica apenas aos empregados e dependentes legais.
Delimitado no acórdão regional que o empregador, por mera liberalidade, permitiu por mais de 20 anos, que os seus funcionários incluíssem no plano de saúde seus dependentes sem a necessidade de comprovação da dependência legal, tem-se que tal situação gerou nos empregados a convicção do direito, aderindo ao contrato de trabalho, especialmente em se considerando a habitualidade do benefício, a boa-fé objetiva do contrato de trabalho entre as partes e o princípio da primazia da realidade.
Segundo dispõe o art. 468 da CLT "Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia."
Assim, o direito à manutenção no plano de assistência médico-hospitalar e odontológica dos dependentes incluídos por mera liberalidade do empregador e com habitualidade incorporou-se ao contrato de trabalho dos empregados, exsurgindo nítida a nulidade da alteração unilateral prevista na Portaria COFECON 30/2013 quanto a esses empregados.
Pelo exposto, ante a violação ao art. 468 da CLT, conheço do recurso de revista.
4.2 – mérito
Conhecido por violação do artigo 468 da CLT, dou provimento ao recurso de revista, para, restabelecer a sentença que declarou a nulidade da Portaria 30/2013, quanto aos empregados substituídos e seus dependentes inscritos no plano de saúde anteriormente a 27/1/2013, e determinou a manutenção da forma de participação/contribuição financeira por parte dos empregados, em razão do plano de saúde médico-hospitalar e odontológico, sem necessidade de comprovação de "ligação familiar e dependência econômica dos beneficiários".
ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I - dar provimento ao agravo de instrumento quanto ao tema "PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO", por possível violação ao art. 468 da CLT, para determinar o processamento do recurso de revista e a intimação das partes interessadas de que o julgamento do recurso dar-se-á na primeira sessão ordinária subsequente à data da referida publicação; e II - conhecer do recurso de revista quanto ao tema "PLANO DE SAÚDE. INCLUSÃO DE DEPENDENTES. FORMA DE CONCESSÃO. MODIFICAÇÃO APÓS VINTE ANOS. MERA LIBERALIDADE DO EMPREGADOR. INCORPORAÇÃO AO CONTRATO DE TRABALHO", por violação ao art. 468 da CLT e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer a sentença que declarou a nulidade da Portaria 30/2013, quanto aos empregados substituídos e seus dependentes inscritos no plano de saúde anteriormente a 27/1/2013, e determinou a manutenção da forma de participação/contribuição financeira por parte dos empregados, em razão do plano de saúde médico-hospitalar e odontológico, sem necessidade de comprovação de "ligação familiar e dependência econômica dos beneficiários". Mantido o valor da condenação.
Brasília, 19 de março de 2019.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
MARIA HELENA MALLMANN
Ministra Relatora
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