Data da publicação:
Acordão - TST
Alexandre de Souza Agra Belmonte - TST
ACORDO EXTRAJUDICIAL. QUITAÇÃO PELA EXTINTA RELAÇÃO JURÍDICA. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE.
RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ACORDO EXTRAJUDICIAL. QUITAÇÃO PELA EXTINTA RELAÇÃO JURÍDICA. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. O Tribunal Regional manteve a r. sentença que homologara o acordo extrajudicial, não outorgando ampla, geral e irrestrita quitação. A Lei 13.467/17, em vigor desde 11/11/17, instituiu o processo de jurisdição voluntária na Justiça do Trabalho, atinente à homologação, em juízo, de acordo extrajudicial. Da exegese dos arts. 855-B ao 855-E da CLT, conclui-se pela possibilidade de o acordo extrajudicial regular a terminação contratual nos moldes ajustados pelas partes, na medida em que não há uma lide, mas partes interessadas na homologação, não cabendo, assim, ao magistrado a postura natural do processo jurisdicional. Ele deve ficar adstrito à regularidade formal do acordo que lhe é submetido a exame, indagando se o ajustado corresponde à vontade das partes e esclarecendo os efeitos do ajuste. O judiciário pode até afastar cláusulas que considerar abusivas, fraudatórias ou ilegais, mas não lhe cabe, sem a identificação de vícios, restringir os efeitos do ato praticado, quando as partes pretendem a quitação total do contrato. As medidas de simplificação dos procedimentos de desligamento laboral asseguram ao empregado, pelo novo procedimento, a facilitação de cumprimento do pactuado com o empregador, pelo que a lei precisa ser interpretada não somente pelo princípio da boa fé, que rege os negócios jurídicos, como também pelo matiz dos princípios que informam a dinâmica das relações de trabalho atuais, como simplicidade, celeridade, redução da litigiosidade e a maior autonomia para os ajustes durante o contrato e os destinados à sua terminação. De qualquer sorte, o sistema jurídico coloca à disposição do jurisdicionado os meios adequados para a rescisão e a anulação, conforme o caso, dos ajustes viciados. Recurso de revista conhecido por violação do art. 855-B da CLT e provido. (TST-RR-1001432-05.2018.5.02.0720, 3ª Turma, rel. Min. Alexandre Agra Belmonte, julgado em 10/09/2021).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1001432-05.2018.5.02.0720, em que é Recorrente BANCO VOTORANTIM S.A. (SUCESSORA DE BV FINANCEIRA S.A, CRÉDITO) e Recorrido CLEBER DA SILVA MARTINS.
O e. Tribunal Regional, pelo v. acórdão às págs. 132-136, complementado às págs. 156-158, por força de embargos de declaração, negou provimento ao recurso ordinário da empresa reclamada.
Dessa decisão, a reclamada interpõe recurso de revista.
O recurso foi admitido pelo despacho de págs. 265-267.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Dispensada a intervenção do d. Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
Satisfeitos os pressupostos extrínsecos do recurso, passo à análise dos intrínsecos.
1 – CONHECIMENTO
1.1 – ACORDO EXTRAJUDICIAL - QUITAÇÃO PELA EXTINTA RELAÇÃO JURÍDICA - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL - POSSIBILIDADE
Em razões de revista, a recorrente afirma que foi efetuada transação extrajudicial seguindo todos os requisitos legais, conforme determina a norma celetista, dando ampla, geral e irrevogável quitação ao contrato de trabalho.
Diante disso, conclui que, não havendo fim ilícito ou proibido por lei, não existe justificativa para o juiz se negar a homologar o acordo nos exatos termos ajustados.
Denuncia violação dos artigos 855-B, §§ 1º e 2º, e 769 da CLT, 5º, II e XXXVI, da Constituição Federal, 104, I, II e III, e 840 do CCB e 165, caput, do CPC, contrariedade à Orientação Jurisprudencial 132 da SBDI-2 do TST e divergência jurisprudencial.
O Tribunal Regional assim dirimiu a controvérsia, conforme trecho transcrito no recurso (art. 896, § 1º-A, I, da CLT):
"[...]
II - Mérito do apelo da Reclamada. Quitação integral do contrato de trabalho.
O juiz pode recusar a homologação do acordo extrajudicial, nos termos propostos, em decisão fundamentada.
O artigo 723, parágrafo único, do CPC, reconhece o princípio da discricionariedade em matéria de tutela judicial de interesses submetidos à jurisdição voluntária, ao enunciar que: "o juiz não é obrigado a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que considerar mais conveniente ou oportuna".
No processo do trabalho, o caráter discricionário do ato de homologação judicial de acordo entre as partes é reforçado pela jurisprudência consolidada na Súmula 418 do TST, que afasta a caracterização da homologação judicial como um direito líquido e certo das partes.
O próprio artigo 855-D da CLT, trazido pela reforma trabalhista, à luz de sua interpretação literal e lógico-dedutiva, deixa claro que o Juiz do Trabalho analisará o acordo apresentado pelas partes, designando audiência se entender necessário, antes de proferir a sentença.
A faculdade prevista no capítulo III-A do Título X da CLT não alcança as matérias de ordem pública.
O acordo extrajudicial só será homologado em juízo se estiverem presentes, em concreto, os requisitos previstos nos artigos 840 a 850 do Código Civil para a transação.
Não será homologado em juízo o acordo extrajudicial que imponha ao trabalhador condições meramente potestativas, ou que contrarie o dever geral de boa-fé objetiva (artigos 122 e 422 do Código Civil).
As disposições dos arts. 855-B e seguintes da CLT não obrigam o magistrado a homologar o acordo extrajudicial que se lhe apresenta, constituindo faculdade do juiz a homologação do acordo, que passa pelo exame da admissibilidade, legalidade e validade. Nesse sentido, o Enunciados 110 e 123 editados na II Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho da Anamatra que cuidam da recusa da homologação do acordo extrajudicial e dos requisitos para a sua homologação: [...] Há, ainda, diretrizes dos Cejuscs-JT-2 nos processos de jurisdição voluntária, a serem observadas pelos julgadores no ato de homologação de acordos extrajudiciais: [...] Não se pode comparar a homologação de acordo extrajudicial com o PDV, cuja quitação geral foi reconhecida pelo STF, em certas circunstâncias, pois esse depende de ampla negociação coletiva com expressa menção a essa possibilidade no PDV, o que não ocorreu no caso dos autos.
Também não há comparação com o acordo homologado junto à Justiça do Trabalho, após propositura de reclamação trabalhista, pois nesse caso há alegações das partes e conjunto probatório, bem como o juiz pode rejeitar a homologação e enfrentar o mérito.
Por esses fundamentos, a sentença que homologou o acordo extrajudicial, não outorgando ampla geral e irrestrita quitação, deve ser mantida. Rejeito o apelo."
Ao exame.
O Tribunal Regional manteve a r. sentença que homologara o acordo extrajudicial, não outorgando ampla, geral e irrestrita quitação.
A Lei 13.467/17, em vigor desde 11/11/17, instituiu o processo de jurisdição voluntária na Justiça do Trabalho atinente à homologação, em juízo, de acordo extrajudicial.
Preceituam os artigos 855-B ao 855-E da CLT, introduzidos pela referida lei:
"Art. 855-B. O processo de homologação de acordo extrajudicial terá início por petição conjunta, sendo obrigatória a representação das partes por advogado.
§ 1º As partes não poderão ser representadas por advogado comum.
§ 2º Faculta-se ao trabalhador ser assistido pelo advogado do sindicato de sua categoria.
Art. 855-C. O disposto neste Capítulo não prejudica o prazo estabelecido no § 6º do art. 477 desta Consolidação e não afasta a aplicação da multa prevista no § 8º art. 477 desta Consolidação.
Art. 855-D. No prazo de quinze dias a contar da distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se entender necessário e proferirá sentença.
Art. 855-E. A petição de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados.
Parágrafo único. O prazo prescricional voltará a fluir no dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que negar a homologação do acordo."
Da exegese dos textos acima transcritos conclui-se pela possibilidade de o acordo extrajudicial regular a terminação contratual e por fim à relação contratual de trabalho, na medida em que não há uma lide, mas partes interessadas na homologação, não cabendo ao magistrado a postura natural do processo jurisdicional.
Em se tratando de procedimento de jurisdição voluntária, em que não há partes e sim interessados, o magistrado deve ficar adstrito à regularidade formal do acordo que lhe é submetido a exame, indagando se o ajustado corresponde à vontade das partes e esclarecendo os efeitos do ajuste. O judiciário pode até afastar eventuais cláusulas que considerar abusivas, fraudatórias e ilegais, mas não lhe cabe restringir os efeitos do ato praticado, quando não aponta esses vícios e a vontade das partes é direcionada à quitação geral.
Com efeito, nesse tipo de procedimento a atuação do magistrado consiste em administrar interesses privados. Não lhe é dado, mormente quando as partes estão assistidas ou representadas por advogados distintos, substituí-las, para dar ao ajuste oferecido um tom diferente daquele que corresponde à vontade dos interessados. Poderia até o ajuste, na visão do magistrado, ter sido melhor encetado desta ou daquela forma ou proteger melhor esse ou aquele interessado. Mas não lhe cabe interferir na vontade das partes, que certamente resultaram de tratativas que, no conjunto, atenderam às suas expectativas.
As medidas de simplificação dos procedimentos de desligamento laboral assegura ao empregado, pelo novo procedimento, a facilitação de cumprimento do pactuado com o empregador.
Assim, a lei precisa ser interpretada não somente pelo princípio da boa fé, que rege os negócios jurídicos, como também pelo matiz dos princípios que informam a dinâmica das relações de trabalho atuais, como simplicidade, celeridade e redução da litigiosidade e a maior autonomia para os ajustes durante o contrato e os destinados à terminação contratual.
De qualquer sorte, o sistema jurídico coloca à disposição do jurisdicionado os meios adequados para a rescisão e anulação, conforme o caso, dos ajustes viciados.
Nesse contexto, o magistrado tem a faculdade de homologar ou não o acordo extrajudicial, nos termos do art. 855-D, mas não lhe é franqueado substituir-se à vontade deduzida dos requerentes.
Do exposto, conheço do recurso de revista por violação do art. 855-B da CLT.
2 - MÉRITO
2.1 - ACORDO EXTRAJUDICIAL - QUITAÇÃO PELA EXTINTA RELAÇÃO JURÍDICA - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL - POSSIBILIDADE
Conhecido o recurso de revista, por violação do art. 855-B da CLT, dou-lhe provimento para, reformando a decisão regional, homologar o termo de "Transação Extrajudicial" apresentado pelos interessados, sem ressalvas, com efeito de quitação geral do extinto contrato de trabalho.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, vencido o Ministro Maurício Godinho Delgado, conhecer do recurso de revista por violação do art. 855-B da CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando a decisão regional, homologar o termo de "Transação Extrajudicial" apresentado pelos interessados, sem ressalvas, com efeito de quitação geral do extinto contrato de trabalho.
Brasília, 4 de agosto de 2021.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
ALEXANDRE AGRA BELMONTE
Ministro Relator
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