TST - INFORMATIVOS 2022 256 - de 06 a 17 de junho

Data da publicação:

Acordão - TST

Cláudio Mascarenhas Brandão - TST



DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 223-G DA CLT INTRODUZIDO PELA LEI Nº 13.467/2017. DIREITO INTERTEMPORAL. EVENTO DANOSO OCORRIDO EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA NOVEL LEGISLAÇÃO. IRRETROATIVIDADE. CONDIÇÃO PREJUDICIAL AO OFENDIDO. ARBITRAMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA DA CAUSA RECONHECIDA.



AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017. PROVIDÊNCIA PRELIMINAR. PETIÇÕES NºS 291779/2021-0 (RECLAMADA) E 320392/2021-3 (RECLAMANTE). Uma vez homologada a renúncia do autor, quanto à pretensão de incidência do IPCA-E para correção das verbas deferidas na presente ação, afigura-se descabida a insurgência da ré, por meio de agravo interno, bem como a retratação do empregado, ainda que o objetivo das duas manifestações seja a aplicação da decisão proferida pelo STF na ADC 58. Isso porque, nos termos do artigo 487, III, "c", do CPC, o ato homologatório acarreta a extinção do processo, com resolução do mérito, produz coisa julgada material, somente é passível de desconstituição por ação rescisória (CPC, arts. 525, § 15, 535, § 8º, e 966) ou, ainda, pela via da impugnação à execução (CPC, art. 525, §12) ou dos embargos à execução (CPC, art. 535, § 5º) e acarreta a perda do interesse jurídico no exame do recurso pendente de julgamento. Nada a deferir.

DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 223-G DA CLT INTRODUZIDO PELA LEI Nº 13.467/2017. DIREITO INTERTEMPORAL. EVENTO DANOSO OCORRIDO EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA NOVEL LEGISLAÇÃO. IRRETROATIVIDADE. CONDIÇÃO PREJUDICIAL AO OFENDIDO. ARBITRAMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA DA CAUSA RECONHECIDA. A problemática cinge-se sobre a aplicação de direito intertemporal, em face do advento da Lei nº 13.467/2017, que introduziu o artigo 223-G da CLT. O mencionado dispositivo elenca parâmetros para o arbitramento da reparação por danos morais. De início, é de salientar que pela natureza híbrida da norma em epígrafe, caracterizada por sua repercussão no campo processual, mas com disciplina lastreada no âmbito do direito material, deve se ter por norte a regra da inaplicabilidade retroativa da lei, nos moldes dos artigos 5º, XXXVI, da Constituição Federal e 6º do Código Civil, que garantem o respeito ao ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Logo, apenas as relações jurídicas substanciais formadas após a sua vigência sofrerão, em tese, os impactos advindos de tais alterações. E, aqui, faz-se necessário esclarecer que, por se tratar de preceito que visa tutelar o dano extrapatrimonial e demais aspectos das obrigações decorrentes da responsabilidade civil (efeitos conexos do contrato de trabalho), o momento da adequação do regime jurídico aplicável coincide, justamente, com o da ocorrência da lesão a que se visa tutelar, e não com a data de celebração do vínculo. Ou seja, nos casos de ofensas constituídas anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017, não incidirão as modificações ora mencionadas, salvo aquelas que não apresentem conteúdo prejudicial e possam servir de balizamento para a fixação da indenização (incisos I a XII do artigo 223-G). Acrescenta-se, ainda, que, embora a pretensão de exigir a reparação civil surja, apenas, com a ciência inequívoca da lesão sofrida pelo empregado - nos moldes da teoria da actio nata registrada na Súmula nº 278 do STJ -, é com o nascimento do direito subjetivo que se determinam, no particular, quais as normas regerão a relação jurídica de direito material, estabelecida no período da ocorrência do fato jurídico. Assim, sem adentrar na questão da constitucionalidade do artigo celetista, deverá ser levado em consideração o tempo do surgimento da lesão para fins de observância das alterações constantes do artigo 223-G da CLT, que restringem o direito à reparação, inclusive por se tratar de interpretação que garante condição mais benéfica ao trabalhador, condizente, desse modo, com os princípios basilares do direito laboral. Na hipótese, o quadro fático delineado no acórdão regional demonstra que as primeiras manifestações da doença ocupacional (lesões) ocorreram em agosto de 2017, razão pela qual a análise da pretensão de majoração da reparação dos danos morais tomará por base o ordenamento jurídico precedente, vigente à época dos fatos. No mérito da questão, ainda que se busque criar parâmetros norteadores para a conduta do julgador, certo é que não se pode elaborar uma tabela de referência para a reparação do dano moral. A lesão e a reparação precisam ser avaliadas caso a caso, a partir de suas peculiaridades. Isso porque, na forma prevista no caput do artigo 944 do Código Civil, "A indenização mede-se pela extensão do dano". O que se há de reparar é o próprio dano em si e as repercussões dele decorrentes na esfera jurídica do ofendido. Nessa esteira, o Tribunal Regional fixou a indenização em R$10.000,00, com base nos seguintes aspectos: extensão do dano (incapacidade parcial e temporária), fator causador da patologia e tempo de serviço em prol de instituições bancárias demandadas. O valor arbitrado pela Corte de origem mostra-se proporcional à própria extensão do dano. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST-AIRR-90-23.2019.5.14.0003, 7ª Turma, rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, julgado em 8/6/2022).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-90-23.2019.5.14.0003, em que é Agravante LUIZ OTAVIO DE SOUZA SANTOS e Agravado BANCO BRADESCO S.A..

A parte autora, não se conformando com a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, que negou seguimento ao recurso de revista, interpõe o presente agravo de instrumento. Sustenta que foram preenchidos todos os pressupostos legais para o regular processamento daquele recurso.

Contraminuta e contrarrazões ausentes.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 95, § 2º, II, do Regimento Interno do TST.

É o relatório.

V O T O

PROVIDÊNCIA PRELIMINAR – PETIÇÕES NºS 291779/2021-0 (RECLAMADA) E 320392/2021-3 (RECLAMANTE)

A reclamada pugna seja reconsiderada a decisão de fls. 897 que, ao homologar a renúncia do autor ao direito a que se funda ação, constante no pedido de letra "c" da petição inicial, determinou a incidência do índice TR para correção dos débitos trabalhistas e considerou prejudicado o exame do seu agravo de instrumento.

Requer que sejam observados os critérios definidos no julgamento da ADC 58 pelo Supremo Tribunal Federal. Caso não reconsiderada, solicita que a petição seja recebida como agravo interno.

Por sua vez, o autor apresentou petição nos autos concordando com o pleito formulado pela ré, no sentido da aplicação dos índices estabelecidos na decisão da Suprema Corte.

Sem razão.

Uma vez homologada a renúncia do autor, quanto à pretensão de incidência do IPCA-E para correção das verbas deferidas na presente ação, afigura-se descabida a insurgência da ré, por meio de agravo interno, bem como a retratação do empregado, ainda que o objetivo das duas manifestações seja a aplicação da decisão proferida pelo STF na ADC 58.

Isso porque, nos termos do artigo 487, III, "c", do CPC, o ato homologatório acarreta a extinção do processo, com resolução do mérito, produz coisa julgada material, somente é passível de desconstituição por ação rescisória (CPC, arts. 525, § 15, 535, § 8º, e 966) ou, ainda, pela via da impugnação à execução (CPC, art. 525, §12) ou dos embargos à execução (CPC, art. 535, § 5º) e acarreta a perda do interesse jurídico no exame do recurso pendente de julgamento.

Nada a deferir

AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELO AUTOR

MARCOS PROCESSUAIS E NORMAS GERAIS APLICÁVEIS

Considerando que o acórdão regional foi publicado em 10/9/2019, incidem as disposições processuais da Lei nº 13.467/2017.

CONHECIMENTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

MÉRITO

TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA

Nos termos do artigo 896-A da CLT, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 13.467/2017, antes de adentrar o exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista, é necessário verificar se a causa oferece transcendência.

Primeiramente, destaco que o rol de critérios de transcendência previsto no mencionado preceito é taxativo, porém, os indicadores de cada um desses critérios, elencados no § 1º, são meramente exemplificativos. É o que se conclui da expressão "entre outros", utilizada pelo legislador.

Pois bem.

A parte autora insiste no processamento do seu recurso de revista. Pugna pela aplicação do artigo 223-G da CLT e a consequente majoração da reparação por danos morais.

Com efeito, em se tratando de recurso em que se discute a "existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista", revela-se presente a transcendência jurídica da causa (inciso IV do § 1º do aludido dispositivo), a justificar que se prossiga no exame do apelo.

Assim, admito a transcendência da causa.

DANOS MORAIS – VALOR DA INDENIZAÇÃO – APLICAÇÃO DO ARTIGO 223-G DA CLT INTRODUZIDO PELA LEI Nº 13.467/2017 – DIREITO INTERTEMPORAL – EVENTO DANOSO OCORRIDO EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA NOVEL LEGISLAÇÃO – IRRETROATIVIDADE – CONDIÇÃO PREJUDICIAL AO OFENDIDO - ARBITRAMENTO – PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE – TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA DA CAUSA RECONHECIDA

O agravante pretende o processamento do recurso de revista às fls. 669/697. Sustenta, em síntese, que deve ser aplicado o artigo 223-G da CLT para que a ofensa sofrida pelo empregado seja enquadrada, no mínimo, como de natureza média. Sucessivamente, requer a majoração da indenização, sob o argumento de que não foram observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade na sua fixação. Aponta violação daquele preceito e dos artigos 5º, V e X, da Constituição Federal e 944 do Código Civil, dentre outros. Transcreve jurisprudência.

Observados os requisitos do artigo 896, § 1º-A, I, II, e III, eis a decisão recorrida:

"(...) 2.2.2 DO DANO MORAL PELA DOENÇA OCUPACIONAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO (INSURGÊNCIA COMUM AOS APELOS)

O Bradesco, ao argumento de não haver fundamento para o deferimento de indenização por danos morais, requer exclusão da condenação.

Por sua vez, a reclamante pleiteia majoração do quantum arbitrado.

A presença dos requisitos aptos a ensejar o dever de indenizar do Banco reclamado foi devidamente analisada no início do exame meritório, em tópico próprio destinado à aferição dos pressupostos da responsabilidade civil patronal, pelo que despiciendas maiores explanações a respeito.

A Sentença, por seu turno, assim fundamentou o deferimento da indenização por dano moral, fixando o respectivo quantum nos seguintes termos (id. 0017f04 - Pág. 12):

B) DANO MORAL

No que se refere à indenização por danos morais, é presumida a lesão não patrimonial sofrida pelo reclamante (in re ipsa), em razão de sua incapacidade, pois, o abalo psicoemocional decorrente da lesão, ainda que temporária, aliado ao constrangimento por se encontrar inapto para algumas atividades profissionais, em idade ativa, é patente.

Assim, e considerando a responsabilidade civil do banco, condena-se o reclamado a pagar indenização por danos morais ao reclamante, que ora se arbitra em R$ 4.000,00, levando-se em conta a extensão do dano (incapacidade parcial e temporária) e a gravidade da culpa (art. 944 do CC), bem como o nexo técnico epidemiológico do trabalho na empresa ré para o surgimento da doença ocupacional, assim como a capacidade econômica das partes, o caráter inibitório e compensatório da indenização e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

(...).

O dano moral afigura-se como dor pessoal, sofrimento íntimo, abalo psíquico que afeta a imagem do indivíduo perante grupo social a que se insere. Quando relacionado ao contrato de trabalho, considera-se ato lesivo à moral todo aquele que afeta o indivíduo na vida profissional, decorrente de eventuais abusos cometidos pelo empregador, quer por ação ou omissão.

In casu, entendeu-se pela origem ocupacional das lesões de que o obreiro padece, bem como presentes todos os pressupostos para responsabilização objetiva e subjetiva do Banco reclamado, considerado o risco da atividade bancária à espécie de lesão, além de evidenciada a culpa (pela omissão patronal), como alhures já explanado, pelo que não há como afastar a condenação, em si, em danos morais, razão pela qual deve ser mantida a sentença, neste particular.

Dessarte, nesse contexto, não se pode olvidar que o dano moral decorreu do próprio fato (in re ipsa, sendo, pois presumido), concernente à aquisição das lesões em si, que certamente causaram ao trabalhador angústia e dor moral, além da dor física.

Outrossim, não se deve perder de vista que a reparação por acidente de trabalho (aqui tomado em seu viés atípico ou por equiparação) pauta-se nas premissas de valorização social do trabalho e dignidade da pessoa do trabalhador, fundamentos constitucionais, de que emanam os preceitos que regem os direitos sociais mínimos dos trabalhadores, bem ainda "outros que visem a melhoria de sua condição social".

Com relação à valoração que se dá ao dano moral, reputo serem inaplicáveis as disposições do novel art. 223-G da CLT, introduzido pela Lei 13.467/2017, na mensuração do dano moral no caso vertente, pois se trata de parâmetros inerentes a instituto de direito material e, por essa natureza, não se aplicam a contrato de trabalho celebrado anteriormente à vigência da referida lei (autor admitido em 7-2-2014), o que se coaduna com o princípio do direito adquirido, nos termos do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, assim como prima pela segurança jurídica.

Em nosso sistema jurídico, a legislação infraconstitucional não tem eficácia retroativa, não podendo reger situações já consumadas sob a égide da lei anterior, afigurando-se, portanto, desnecessária discussão acerca de eventual inconstitucionalidade do dispositivo, pelo que a fixação do quantum indenizatório não deve obedecer a critério absoluto, puramente objetivo ou tarifado.

Nesse contexto, o arbitramento figura como um dos mais utilizados, e se desenvolve de modo que o julgador deve operar se atendo aos vários vetores, com moderação proporcional ao grau de culpa do ofensor e à capacidade econômica das partes, de modo tal que se outorgue ao ofendido uma justa compensação, sem enriquecê-lo indevidamente; ao mesmo tempo que esse valor deve ser significativo o bastante ao causador do dano, para que se preocupe em agir com maior cuidado, ao adotar procedimentos que possam novamente causar lesões morais às pessoas, ou seja, a faceta pedagógica dessa condenação.

Nessa toada, o montante que serve ao ressarcimento do dano moral se situa no plano satisfativo, sendo que a importância paga à vítima deverá propiciar uma satisfação que mitigue, de algum modo, a dor causada pelo ato ilícito contra ela cometido. A reparação deverá compreender todas as consequências dolorosas imediatas e mediatas do ato que as causou.

Assim, entendo que o valor indenizatório fixado pelo juízo a quo em R$4.000,00 (quatro mil reais) mostra-se desproporcional ao dano suportado, inclusive destoando das quantias comumente fixadas por esta 1ª Turma em casos análogos, em que sopesados fatores específicos igualmente evidenciados nestes autos, como a atividade bancária como fator causador de patologias relacionadas às LER/DORT, mediante nexo direto (causal), bem como o tempo de serviço em prol de instituições bancárias demandadas, de modo que para manter equidade com outros julgados, o quantum indenizatório deve ser majorado para R$10.000,00 (dez mil reais), dando-se parcial provimento ao recurso obreiro, no particular.

Por conseguinte, nega-se provimento ao apelo patronal no que pretendia exclusão da condenação.

Em suma, apelo obreiro parcialmente provido e recurso patronal não provido, no tópico. (...)" (fls. 531/533 - destaquei)

A problemática cinge-se sobre a aplicação de direito intertemporal, em face do advento da Lei nº 13.467/2017, que introduziu o artigo 223-G da CLT.

O mencionado dispositivo elenca parâmetros para o arbitramento da reparação por danos morais, trazendo em seu conteúdo as seguintes disposições:

  Art. 223-G.  Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:

I - a natureza do bem jurídico tutelado;

II - a intensidade do sofrimento ou da humilhação;

III - a possibilidade de superação física ou psicológica;

IV - os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;

V - a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;

VI - as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;

VII - o grau de dolo ou culpa;

VIII - a ocorrência de retratação espontânea;

IX - o esforço efetivo para minimizar a ofensa;

X - o perdão, tácito ou expresso;

XI - a situação social e econômica das partes envolvidas;

XII - o grau de publicidade da ofensa.

§ 1o  Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:

I - ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;

II - ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;

III - ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;

IV - ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.

§ 2o  Se o ofendido for pessoa jurídica, a indenização será fixada com observância dos mesmos parâmetros estabelecidos no § 1o deste artigo, mas em relação ao salário contratual do ofensor.

§ 3o  Na reincidência entre partes idênticas, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da indenização."

De início, é de salientar que pela natureza híbrida da norma em epígrafe, caracterizada por sua repercussão no campo processual, mas com disciplina lastreada no âmbito do direito material, deve se ter por norte a regra da inaplicabilidade retroativa, nos moldes dos artigos 5º, XXXVI, da Constituição Federal e 6º do Código Civil, que garantem o respeito ao ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Logo, apenas as relações jurídicas substanciais formadas após a sua vigência sofrerão, em tese, os impactos advindos das tais alterações.

E, aqui, faz-se necessário esclarecer que, por se tratar de preceito que visa tutelar o dano extrapatrimonial e demais aspectos das obrigações decorrentes da responsabilidade civil (efeitos conexos do contrato de trabalho), o momento de adequação do regime jurídico aplicável deve coincidir, justamente, com o da ocorrência da lesão a que se visa tutelar, e não com a data de celebração do vínculo.

Ou seja, nos casos de ofensas constituídas anteriormente à vigência da Lei nº 13.467/2017, não incidirão as modificações ora mencionadas, salvo aquelas que não apresentem conteúdo prejudicial e possam servir de balizamento para a fixação da indenização (incisos I a XII do artigo 223-G).

No artigo intitulado "O Dano Extrapatrimonial Trabalhista após a Lei nº 13.467/2017", Sebastião Geraldo de Oliveira[1] assim se manifesta quanto ao tema em específico:

"No exato momento em que ocorreu a ofensa de natureza extrapatrimonial, nasceu também a pretensão da vítima para obter a reparação do direito que foi violado, conforme a consagrada teoria da actio nata, tanto que o Código Civil estabelece no art. 189: ‘Violado o direito, nasce para o titular a pretensão". Como consequência, o regime jurídico a ser aplicado é aquele que estava em vigor naquela data.

Desse modo, o nosso entendimento é que o novo regramento do dano extrapatrimonial somente será aplicado para as ofensas ocorridas a partir de 11 de novembro de 2017, considerando, ainda, as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 808/2017 no período da sua vigência, qual seja, de 14 de novembro de 2017 a 23 de abril de 2018. Para as ofensas anteriores, independentemente da data em que for realizado o julgamento, prevalece o antigo regime jurídico.

Nas lesões de natureza continuada, será necessário verificar se até o dia 10 de novembro de 2017 já havia ofensa moral caracterizada, hipótese que indicará a aplicação do regramento anterior à reforma. Entretanto, se a consolidação da ofensa só ocorreu após o dia 10 de novembro de 2017, a regência será da lei nova.

Para as doenças ocupacionais, será considerada, para fins de verificação do regime jurídico aplicável, a data da ciência inequívoca da incapacidade laboral, como assentado na Súmula nº 278 do STJ. Aliás, a teoria da actio nata para fins de início da fluência do prazo prescricional será também considerada para verificar a legislação aplicável.

Entendemos ainda que as normas da reforma trabalhista sobre o dano extrapatrimonial são aplicáveis para todas as ofensas ocorridas a partir de 11 de novembro de 2017, mesmo para os trabalhadores admitidos em data anterior. Isso porque é firme a jurisprudência do STF no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico, ressalvando-se a garantia da irredutibilidade salarial. A propósito, aqui também pode ser adotada a importante regra de direito intertemporal do Código Civil de 2002, fazendo-se as devidas adequações. (...)" (destaquei).

Acrescento, ainda, em contraponto aos ensinamentos acima delineados, que, embora a pretensão de exigir a reparação civil surja, apenas, com a ciência inequívoca da lesão sofrida pelo empregado - nos moldes da teoria da actio nata registrada na Súmula nº 278 do STJ -, é com o nascimento do direito subjetivo que se determinam, no particular, quais as normas regerão a relação jurídica de direito material, estabelecida no período da ocorrência do fato jurídico.

Assim, sem adentrar na questão da constitucionalidade do artigo celetista, deverá ser levado em consideração o tempo do surgimento da lesão para fins de observância das alterações constantes do artigo 223-G da CLT, que restringem o direito à reparação, inclusive por se tratar de interpretação que garante condição mais benéfica ao trabalhador, condizente, desse modo, com os princípios basilares do direito laboral.

Nessa direção, cito julgado recente desta Corte Superior:

"4. VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. O processamento do recurso de revista não se viabiliza por ofensa ao art. 223-G da CLT, incluído pela Lei no 13.467/2017, o qual não se aplica ao caso concreto, uma vez que os atos jurídicos se regem pela lei da época em que ocorreram (tempus regit actum). Agravo de instrumento conhecido e não provido." (RRAg - 20092-90.2018.5.04.066, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 09/04/2021)

É oportuno colacionar, também, os fundamentos contidos no bojo do referido acórdão:

"Por outro lado, tratando-se o art. 223-G da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017 de questão de direito material, sua aplicação segue os ditames do direito intertemporal, de forma que os atos jurídicos se regem pela lei da época em que ocorreram (tempus regit actum). Assim, considerando que, embora a presente ação tenha sido ajuizada na vigência da Lei nº 13.467/2017, certo é que, à época dos fatos, conforme narrado na petição inicial, a lei citada ainda não se encontrava em vigor, de forma que esse dispositivo constitucional não viabiliza o conhecimento da revista."

Na hipótese, o quadro fático delineado no acórdão regional demonstra que as primeiras manifestações da doença ocupacional (lesões) ocorreram em agosto de 2017, razão pela qual passo à análise da pretensão de majoração da reparação dos danos morais com fulcro no ordenamento jurídico precedente, vigente à época dos fatos.

Pois bem.

Ante a inexistência de critérios precisos para a aferição do prejuízo moral decorrente da conduta de outrem, não é fácil a tarefa do magistrado, no que toca ao arbitramento do valor da respectiva indenização.

A doutrina reconhece a dificuldade e aponta para o problema de indenizações discrepantes, considerando fatos semelhantes com valores muito diferentes, ou, então, situações extremamente distantes, com valores próximos. Nesse sentido: "Não sendo possível atingir matematicamente um resultado econômico preciso, o quantum da indenização por dano moral é deixado ao arbitramento dos juízes. A falta de critérios contribui para a disparidade, às vezes gritante, entre os valores indenizatórios. Os Tribunais de Alçada e de Justiça do Rio de Janeiro, por exemplo, atribuíram, respectivamente, no mesmo ano de 1991, 100 salários mínimos para a perda de dois cachorros e 20 salários mínimos para a perda de dois filhos (Carlos Edison do Rego Monteiro Filho, Elementos, p. 147)" (Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes. Código civil interpretado conforme a Constituição da República. v. I. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 341).

Ainda que se busque criar parâmetros norteadores para a conduta do julgador, certo é que não se pode elaborar uma tabela de referência para a reparação do dano moral. A lesão e a reparação precisam ser avaliadas caso a caso, a partir de suas peculiaridades.

Isso porque, na forma prevista no caput do artigo 944 do Código Civil, "A indenização mede-se pela extensão do dano". Essa regra decorre, também, da projeção do Princípio Constitucional da Solidariedade (art. 3º, I, CF) em sede de responsabilidade civil e faz com que a preocupação central do ordenamento jurídico se desloque do agente causador do dano para a vítima, sempre com o objetivo de lhe garantir a reparação mais próxima possível do dano por ela suportado.

A indenização, portanto, tem por finalidade recompor o status quo do ofendido independentemente de qualquer juízo de valor acerca da conduta do autor do dano. O que se há de reparar é o próprio dano em si e as repercussões dele decorrentes na esfera jurídica do ofendido. Sob essa ótica, é preciso atentar-se "à efetiva repercussão da lesão sobre a vítima, não como classe econômica ou como gênero, mas como pessoa humana, cujas particulares características precisam ser levadas em conta no momento de quantificação do dano" (Anderson Schreiber. Direito civil e constituição. São Paulo: Atlas, 2013. p. 188).

No caso, o Tribunal Regional fixou a indenização em R$10.000,00, com base nos seguintes aspectos: extensão do dano (incapacidade parcial e temporária), fator causador da patologia e tempo de serviço em prol de instituições bancárias demandadas.

Ademais, em regra, a intervenção desta Corte para reduzir ou aumentar o montante fixado apenas será possível nas situações em que se mostrar irrisório ou exorbitante. Não é o caso.

Dessa forma, não se há de falar em afronta à literalidade dos artigos apontados.

Os arestos colacionados são inservíveis, pois oriundos do mesmo órgão prolator da decisão que ora se combate.

Nego provimento.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, em face da providência preliminar, determinar que a atualização dos créditos trabalhistas reconhecidos na presente ação observe os seguintes parâmetros, adequados aos limites temporais da modulação dos efeitos da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento conjunto da ACD nº 58, ADC nº 59, ADI nº 5.867 e ADI nº 6.021: a) incidência do IPCA-E na fase pré-judicial; b) a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil). Ainda, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao agravo de instrumento do autor.

Brasília, 8 de junho de 2022.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

CLÁUDIO BRANDÃO

Ministro Relator

 


[1] Novas Matizes do direito do trabalho / coordenadores Luiz Eduardo Gunther, Hélio Gomes Coelho Júnior. Colaboração: Andréa Duarte Silva, Elisandra Cristina Guevara Millarch – São Paulo: Ltr, 2019. Págs. 138/139.

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