Data da publicação:
Acordão - TST
Ives Gandra Martins Filho - TST
VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRABALHO - QUEIMADURAS DE 3º GRAU POR TODO O CORPO E PERDA TOTAL DA CAPACIDADE LABORATIVA
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA – TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA – VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRABALHO – QUEIMADURAS DE 3º GRAU POR TODO O CORPO E PERDA TOTAL DA CAPACIDADE LABORATIVA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS (PENSÃO VITALÍCIA EM PARCELA ÚNICA), MORAIS E ESTÉTICOS – ÓBICE DA SÚMULA 126 DO TST – DESPROVIMENTO.
1. Nos termos do art. 896-A, § 1º, I, da CLT, constitui transcendência econômica o elevado valor da causa. In casu, a discussão gira em torno da Responsabilidade Civil da Empregadora em razão de acidente de trabalho que ocasionou queimaduras por todo o corpo do Autor, limitando a sua capacidade laborativa. Em virtude do acidente do trabalho sofrido pelo Reclamante, houve a condenação da Empregadora no pagamento de indenização por danos materiais a título de pensão mensal vitalícia paga em parcela única (R$ 1.601.600,00), morais (R$ 300.000,00) e estéticos (R$ 250.000,00). Nesse contexto, ante o montante elevado, resta reconhecida a transcendência econômica da causa.
2. O Supremo Tribunal Federal, ao fixar tese para o Tema 932 de repercussão geral, entendeu compatível com o art. 7º, XXVIII, da CF, a responsabilidade objetiva do empregador por acidente de trabalho ocorrido em atividade de risco. A Suprema Corte definiu quais atividades seriam de risco, falando genericamente "nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade".
3. In casu, como consignado no acórdão regional, o Reclamante, como técnico operacional, realizava, dentre as suas atividades, os registros de imagens dos fornos que apresentassem problemas. Na ocasião do sinistro, foi informado de que havia problemas na produção devido à existência de água no forno, tendo sido necessário que o Reclamante adentrasse o recinto, após comunicado de que as condições eram seguras, quando ocorreu a explosão que ocasionou o acidente que deixou o Reclamante com queimaduras de 3º grau em todo o seu corpo e limitação da sua capacidade laboral.
4. A jurisprudência pacífica do TST segue no sentido de não se admitir recurso de revista para rediscutir o valor da indenização por danos materiais ou morais, quando este não extrapola os limites da razoabilidade, para mais ou para menos. No caso dos autos, os valores indenizatórios definidos não se mostram excessivos, na medida em que o TRT consignou que ficaram comprovadas as limitações permanentes e relevantes quanto à parte física e de labor, reputando que houve perda total da capacidade do Autor, dadas as limitações funcionais que impedem o desempenho da atividade antes exercida. Nesse sentido, as deformidades do Reclamante, que geram profundo abalo psicológico, somadas à incapacitação inclusive para a realização de atividades corriqueiras do Acidentado, justificam as indenizações nos patamares fixados pelas duas instâncias ordinárias, uma vez que, em determinadas situações, os sofrimentos permanentes decorrentes do acidente chegam a serem maiores e mais profundos do que a própria morte. E, no caso dos danos materiais, o valor elevado decorre do pagamento da pensão vitalícia em parcela única.
5. Assim, o agravo de instrumento não merece prosperar, porquanto o recurso de revista, que versa sobre responsabilidade civil da Empregadora e indenização por danos materiais, morais e estéticos, não reúne condições de admissibilidade, tropeçando no óbice da Súmula 126 do TST. Ressalte-se que não há tese jurídica em debate, mas tentativa de reavaliação da prova, em busca de se fazer justiça no caso concreto, sendo certo que o TST, após a Lei 13.467/17, passou a julgar apenas teses, e não casos.
Agravo de instrumento desprovido. (TST-AIRR-693-48.2017.5.08.0128, 4ª Turma, rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho, julgado em 7/6/2022)
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-693-48.2017.5.08.0128, em que é Agravante SIDERÚRGICA NORTE BRASIL S.A. e é Agravado JOELSON PEREIRA DE SOUZA.
R E L A T Ó R I O
Contra o despacho denegatório do recurso de revista proferido pela Vice-Presidência do 8º Regional, com fulcro na Súmula 126 do TST e no art. 896, 1º-A, III, da CLT (págs. 5.186-5.192), agrava de instrumento a Reclamada, pretendendo o reexame das questões relativas à competência da Justiça do Trabalho, à responsabilização civil do empregador no acidente de trabalho, ao pagamento de indenizações por dano moral, estético e material, à cumulação das indenizações por dano moral e estético e aos valores fixados como indenizações por dano moral, material e estético (págs. 5.201-5.209).
Foram apresentadas, pelo Reclamante, contrarrazões à revista e contraminuta ao agravo de instrumento (págs. 5.215-5.218), dispensando-se a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 95, § 2º, II, do RITST.
É o relatório.
V O T O
1) CRITÉRIO DE TRANSCENDÊNCIA
Tratando-se de agravo de instrumento interposto contra despacho denegatório de recurso de revista referente a acórdão regional publicado após a entrada em vigor da Lei 13.467/17, tem-se que o apelo ao TST deve ser analisado à luz do critério de transcendência previsto no art. 896-A da CLT, que dispõe:
Art. 896-A - O Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, examinará previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.
§ 1º São indicadores de transcendência, entre outros:
I - econômica, o elevado valor da causa;
II - política, o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência sumulada do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal;
III - social, a postulação, por reclamante-recorrente, de direito social constitucionalmente assegurado;
IV - jurídica, a existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista. (Grifos nossos).
Não é demais registrar que o instituto da transcendência foi outorgado ao TST para que possa selecionar as questões que transcendam o interesse meramente individual (transcendência econômica ou social em face da macrolesão), exigindo posicionamento desta Corte quanto à interpretação do ordenamento jurídico trabalhista pátrio, fixando teses jurídicas que deem o conteúdo normativo dos dispositivos da CLT e legislação trabalhista extravagante (transcendência jurídica) e garantam a observância da jurisprudência, então pacificada, pelos Tribunais Regionais do Trabalho (transcendência política).
Sendo a transcendência um juízo de delibação, prévio à análise do recurso em seus demais pressupostos, e tais pressupostos não podendo ser afastados com base no reconhecimento da transcendência de alguma das matérias ventiladas no apelo, temos que o vício formal na veiculação do recurso de revista lhe retira ipso facto a transcendência recursal.
Com efeito, o critério de transcendência constitui filtro seletor de matérias que mereçam pronunciamento do TST para firmar teses jurídicas pacificadoras da jurisprudência trabalhista. Se o recurso de revista nem sequer ultrapassa o seu próprio conhecimento, por vício formal ostensivo, o apelo carece de transcendência para ser analisado, já que não se poderá reabrir o mérito da discussão. Ou seja, a eventual transcendência de tópico de recurso de revista não supre o não preenchimento dos pressupostos extrínsecos ou intrínsecos deste.
No caso dos autos, em face do elevado valor da condenação que é de R$ 2.151.600,00 (dois milhões, cento e cinquenta e um mil e seiscentos reais - pág. 5.105), reconheço a transcendência econômica da causa.
2) COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO
A Reclamada pretende que seja decretada a incompetência da Justiça do Trabalho para a execução dos eventuais créditos apurados na presente ação, devendo a ação prosseguir no Juízo em que se processa o plano de recuperação judicial da Empresa, sob pena de violação do art. 6º, § 2º, da Lei 11.101/05 (pág. 5.72).
Todavia, a jurisprudência desta Corte Superior manifesta o entendimento de que o deferimento do processamento da recuperação judicial não tem o condão de suspender o processo trabalhista que se encontra em fase de conhecimento (E-ED-RR14300-72.2007.5.04.0005, 18/10/2012, Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, SDI-1, DEJT de 26/10/12; Ag-AIRR-1000198-64.2017.5.02.0706, 3ª Turma, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, DEJT de 27/09/19; ARR-95600- 95.2008.5.01.0040, Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, DEJT de 13/10/17; AIRR-1168-87.2013.5.15.0018, Rel. Min. Kátia Magalhães Arruda, 6ª Turma, DEJT de 04/12/15; AIRR-1034-60.2013.5.15.0018, Rel. Des. Conv. André Genn de Assunção Barros, 7ª Turma, DEJT de 03/10/2014; RR-10723-11.2014.5.15.0078, Rel. Min. Fernando Eizo Ono, 4ª Turma, DEJT de 27/10/2017; AIRR-ARR-142500-17.2009.5.04.0009, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, DEJT de 24/08/18).
Portanto, a decisão regional, proferida em estrita observância aos artigos 896, § 5º, da CLT e 557, caput, do CPC, é insuscetível de reforma.
3) VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRABALHO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR - INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS – ÓBICE DA SÚMULA 126 DO TST
No que diz respeito à responsabilidade civil da Empregadora pelo acidente de trabalho sofrido pelo Reclamante, quando da manutenção do forno para a produção de lâminas de aço, que provocou queimaduras de 3º grau no corpo do Obreiro e limitação da sua capacidade laborativa, a Reclamada alega que não há de se falar em responsabilidade objetiva, que houve negligência do Empregado no uso dos EPIs fornecidos, pretendendo, assim, a reforma do julgado para afastar a condenação ao pagamento de indenização por danos estéticos, morais e materiais ou reduzir os valores arbitrados. O recurso veio calcado em violação dos arts. 5°, II, V e X, e 7º, XXVIII, da CF e 927 e 944, V, do CC e em divergência jurisprudencial.
O Regional assentou o seguinte, verbis
Restou incontroverso a ocorrência do acidente do trabalho, eis que o dano físico experimentado pelo empregado decorreu diretamente da atividade laboral que prestava em benefício do empregador, ou seja, houve nexo causal entre o acidente e o trabalho exercido.
Em regra, a responsabilidade civil só decorre de dolo ou culpa do agente ativo em relação ao dano causado a outrem por ato ilícito, conforme o disposto nos arts. 186 e 927 do Código Civil. Contudo, haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de terceiros, tudo nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. Trata-se, portanto, de hipótese de responsabilidade civil objetiva fundada no risco da atividade exercida pelo agente ativo.
No caso dos autos, a principal atividade da recorrente é a produção de laminados longos de aço (Classificação Nacional de Atividades Econômicas: 24.23-7), cujo risco é fixado em grau máximo pelo Norma Regulamentadora nº 4, constante da Portaria n.º 3.214/1978 elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
Sendo assim, a recorrente tem o dever de reparar o dano causado pelo acidente do trabalho sofrido pelo reclamante, independentemente da existência de culpa, pois ao caso aplica-se a responsabilidade objetiva do empregador.
Ainda que assim não fosse, o representante legal da reclamada declarou que ‘... que segundo o padrão de rotina, em caso de vazamento, deve-se aguardar o mínimo de 40min a 1h após o fechamento da água; que o reclamante voltou do intervalo quando estavam todos na cabine e de imediato, somente fazendo uso do jaleco sem sequer fechá-lo corretamente, desceu para registrar as imagens, sem que tivesse condições seguras para tanto; que o reclamante deveria estar usando luva e protetor facial ao se expor à área e assim também não o fez;...; que as situações do gênero, como vazamento de água podem ocorrer, tanto que há um procedimento para essa situação, mas não ocorriam habitualmente; que o reclamante nunca foi advertido por ter adotado procedimento errado nas situações de vazamento de água ocorridas...’ (ID. bab1054 - Pág. 2).
A testemunha apresentada ao juízo pela reclamada, senhor Sócrates dos Santos Mendes declarou ‘...que o acidente que envolveu o reclamante é considerado grande e por isso houve necessidade de acionar o coordenador; que o coordenador considerou que já havia condições seguras para realização da inspeção; que nessa ocasião já havia passado em torno de 1h do desligamento da água e a equipe de manutenção composta pelo depoente e o Sr. Claudiovan chegou a ir na plataforma, local onde fica o forno; que esse é o procedimento de inspeção, no qual o reclamante, como operador operacional também pode ir e foi para fazer o registro das imagens do problema; que é comum ocorrer o vazamento de água no forno; que não é comum, entretanto, na proporção do acidente que envolveu o reclamante...que a autorização passada pelo coordenador à equipe de manutenção para realização da inspeção foi dada pelo telefone; que no dia a dia o procedimento adotado nos casos de vazamento é sempre observar que o tempo mínimo que se espera para evaporar a água após o fechamento é de 30min;...; que quando o depoente foi até a plataforma verificou que ainda havia água e retornou para a cabine; que nesse interstício não se comunicou com o reclamante; que da cabine não é possível verificar a existência da água na plataforma que foi vista pelo depoente in loco; que quando o depoente entrou na cabine o reclamante entrou e saiu da cabine rapidamente; que "alguém disse que disse ao reclamante que não havia condição segura para ir até a plataforma"; que não se recorda exatamente quem foi essa pessoa e também não presenciou esse fato; que qualquer pessoa que for acessar a plataforma deve usar os seguintes EPIS: blusão e calça anti chamas, capuz, óculos e capacete; que não conseguiu verificar se quando o reclamante desceu para a plataforma estava fazendo o uso desses EPI's.’ (ID. bab1054 - Pág. 3).
A outra testemunha apresentada ao juízo pela reclamada, senhor Cledson da Paixão Ramos, disse que ‘... que os EPI's recomendados para quem acessa a plataforma do forno elétrico são: botas, calça, casaco retardante a chamas, capacete, óculos, protetor facial e luvas; que pela investigação realizada o reclamante não estava utilizando protetor facial, por ocasião do acidente...’ (ID. bab1054 - Pág. 4).
A testemunha Wanderson Pereira de Almeida declarou ‘que quanto mais presencial melhor feed back o reclamante para elaboração do relatório; que a empresa fornecia câmera fotográfica para uso pelo reclamante; que a empresa fornecia luva aluminizada ao reclamante; que esse tipo de luva impede a mobilidade dos dedos para conseguir a utilização da máquina fotográfica; que acompanhou o reclamante tirando fotografia na área do trabalho; que o manuseio da câmera era feito sem as luvas... ‘ (ID. 034b917 - Pág. 1).
Apesar de considerar que ao caso aplica-se a teoria da responsabilidade objetiva, há provas de que a reclamada não cumpriu e nem fez cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, de acordo com o art. 157 da CLT, evidenciando sua atitude culposa. Vejamos.
O representante da reclamada confessou que o reclamante nunca sofreu qualquer advertência, ainda que tivesse conhecimento de que não foram adotadas todas as medidas preventivas para a realização da faina. Essa negligência importa em culpa da recorrente, já que o simples fornecimento dos EPI's não exime o empregador de tomar as medidas que conduzam à diminuição ou eliminação da nocividade, dentre as quais as relativas ao uso efetivo do equipamento pelo empregado, nos termos da Súmula nº 289 do TST.
Ademais, não há dúvida de que o vazamento de água ocorria de forma recorrente, o que implica concluir que o contexto fático delineado nos autos caracteriza a exposição ao risco intermitente de acidente por explosão.
Inexiste culpa na ação do reclamante. Há prova testemunhal de que outros empregados poderiam ter sofrido acidente, tanto que após 10 (dez) minutos depois que a equipe de manutenção passou pela plataforma houve a explosão. Infelizmente ainda havia um trabalhador no momento, mas poderiam ter sido outros mais a sofrer as consequências do acidente. A prova testemunhal esclareceu que da cabine não é possível verificar a existência da água na plataforma, havendo necessidade de verificação no local onde ocorreu a explosão.
E nesse aspecto, também há prova de que foi o coordenador da equipe que liberou, via telefone, o acesso à plataforma. Ou seja, a equipe de manutenção, dentre eles o reclamante, estava apenas cumprindo ordens, já que foi dado uma ordem por superior hierárquico que, após uma hora, liberou o acesso à plataforma.
Portanto, o reclamante observou o tempo mínimo para poder acessar à plataforma e o fez após a ordem de seu coordenador de equipe, senhor Marcos Antônio, que considerou que já havia condições seguras para a inspeção, segundo a prova testemunhal oriunda da oitiva da testemunha Sócrates dos Santos Mendes.
Se não fazia uso do protetor facial foi porque a reclamada não forneceu esse equipamento para o reclamante.
Quanto ao uso de luvas, ainda que o empregado as estivesse usando, os equipamentos fornecidos têm restrições e não protegeriam o reclamante contra uma explosão tão grave, pois há relato de que havia um grande vazamento de água no dia do acidente.
Assim, não há que se falar em culpa concorrente ou exclusiva do recorrido. Ora, conforme já mencionado, o acidentado sofreu redução da capacidade laboral em decorrência do acidente de trabalho sofrido, circunstância que, a meu ver, configura o dano extrapatrimonial relatado na petição inicial.
Por todo o exposto, deve ser mantida a r. decisão de origem que condenou a reclamada no pagamento de indenização por dano moral, material e estético.
Por tais fundamentos, mantenho a r. sentença. (Págs. 5.098-5.101, grifos nossos).
No caso, verifica-se que o TRT, com fundamento nas provas oral e documental, concluiu que ficaram configurados o dano efetivo, o nexo causal e a culpa da Reclamada a ensejar a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e estéticos em reparação às deformidades permanentes apresentadas pelo Autor e limitadoras da sua capacidade laborativa.
Ora, o Supremo Tribunal Federal, ao fixar tese para o Tema 932 de repercussão geral, entendeu a responsabilidade objetiva do empregador por acidente de trabalho ocorrido em atividade de risco compatível com o art. 7º, XXVIII, da CF.
No caso concreto, o TRT consignou que o Reclamante, como técnico operacional, realizava, dentre as suas atividades, os registros de imagens dos fornos que apresentassem problemas, e que, na ocasião do sinistro, foi informado de que havia problemas na produção devido à existência de água no forno, tendo sido necessário que o Reclamante adentrasse o recinto, após comunicado de que as condições eram seguras, quando ocorreu a explosão que ocasionou o acidente que deixou o Reclamante com queimaduras de 3º grau por todo o seu corpo e limitação da sua capacidade laborativa para a mesma função antes exercida.
O Regional demonstrou a gravidade das sequelas do acidente no seguinte trecho:
O recorrido sofreu queimaduras de terceiro grau em todo o seu corpo (braços, tórax e pernas), pelo que se discute o direito à indenização por danos materiais e o percentual para fixação do seu valor.
O laudo pericial, quanto ao grau de incapacidade que acomete o reclamante, apenas indica parâmetros, não havendo obrigação de adotá-los como fundamentos da decisão, não estando o juízo adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme se depreende do art. 479 do CPC/15, pelo que, pelo princípio do livre convencimento motivado, pode reconhecer, não só com base na prova pericial, mas também em relação a todo o restante do conjunto probatório a incapacidade laborativa total do reclamante.
E nesse aspecto, restou comprovado que o reclamante está incapacitado para exercer suas atividades anteriores, pois teve uma redução de 80% (oitenta por cento) quanto ao uso das mãos, possuindo uma incapacidade grave, cerca de 70% da mão direita e 90% da mão esquerda, conforme documento sob ID. 51dc72c - Pág. 13.
Quanto ao tórax, conforme prova pericial, teve "restrição torácica pela queimadura e pela dor; diminuição de força muscular respiratória; medidas de mecânica respiratória diminuídas; diminuição da força muscular inspiratória e expiratória, queda no fluxo expiratório e na capacidade vital; dificuldades respiratórias aos médios e grandes esforços." (ID. 51dc72c - Pág. 12).
Refere o laudo que o reclamante possui sérias limitações funcionais e severas restrições, possuindo ritmo e qualidade de movimentos anormais em seus movimentos ativos, quando tem aumento da quantidade da dor decorrente do acidente. As fotos que foram juntadas aos autos demonstram que o reclamante não terá condições de exercer a função de técnico operacional, não só pelas limitações físicas, mas também pelas psicológicas. Nesse sentido, vejamos laudo psicológico juntado com a prova pericial: [...]
O conjunto probatório dos autos demonstra que o reclamante não terá mais capacidade de exercer a função anteriormente desempenhada, estando totalmente incapacitado para o trabalho de técnico operacional, pelo que, neste aspecto, não há como modificar a quantia indenizatória. O reclamante praticamente perdeu totalmente a habilidade manual da mão esquerda e hoje sequer possui capacidade para realizar atividades corriqueiras, como sua limpeza pessoal (escovar dente, por exemplo).
Considerando as descrições do cargo e sua complexidade, atuando na supervisão e manutenção de fornos, operacionalidade e equipamentos periféricos que compõem o sistema, resta evidente que tais atividades não poderão mais ser desempenhadas pelo recorrido, principalmente considerando o alto risco de explosão envolvido.
O reclamante não possui condições físicas para desempenhar a antiga função não só pelos danos causados em suas mãos, mas também pela redução da capacidade respiratória em razão da restrição torácica pela queimadura e consequente dificuldades respiratórias para médios e grandes esforços (ID. 51dc72c - Pág. 12), limitações que o atingirão em qualquer atividade operacional. Assim, penso que o reclamante está total e permanente incapacitado para exercer quaisquer funções, em razão das restrições físicas e psicológicas que apresenta.
Logo, devido a atual condição do reclamante, sua inserção em qualquer atividade será dificílima e a redução do valor indenizatório, nos termos pretendidos pela recorrente, implica em desrespeito à dignidade do trabalhador, que terá que conviver pelo resto de sua vida com as sequelas decorrentes do acidente que sofreu. (Grifos nossos, págs. 5.102-5.104).
Diante de tal quadro fático, não mais suscetível de reexame em sede de recurso de revista, a teor da Súmula 126 do TST, não há como reformar a decisão que reconheceu a responsabilidade civil da Empresa e a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e estéticos.
Quanto à redução do montante relativo ao pleito indenizatório, a jurisprudência pacífica do TST segue no sentido de não se admitir recurso de revista para rediscutir o valor da indenização por danos materiais ou morais, quando este não extrapola os limites da razoabilidade, para mais ou para menos (cf. TST-Ag-E-ED-RR-92600-62.2010.5.17.0011, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT de 23/04/21; TST-AgR-ED-E-ED-RR-1495-48.2012.5.03.0035, Rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, DEJT de 03/04/20; TST-Ag-E-RR-126700-81.2008.5.09.0093, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, DEJT de 26/04/19; TST-Ag-E-RR-1366-25.2011.5.15.0106, Rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT de 16/11/18).
No caso dos autos, a sentença havia definido os seguintes valores: R$ 300.000,00 a título de indenização decorrente de dano moral, R$ 250.000,00 relativo ao dano estético e R$ 1.830.000,00 para o dano material (pensão mensal vitalícia), sendo que o juízo a quo reduziu este último montante para R$ 1.601.600,00 em razão do pagamento em parcela única, valores que não podem ser considerados exorbitantes, visto que, conforme demonstrado no acórdão regional, o evento danoso é de natureza gravíssima.
As deformidades do Reclamante, que geram profundo abalo psicológico, somadas à incapacitação inclusive para a realização de atividades corriqueiras do Acidentado, justificam as indenizações nos patamares fixados pelas duas instâncias ordinárias (R$ 300.000,00 para os danos morais e R$ 250.000,00 para os danos estéticos), uma vez que, em determinadas situações, os sofrimentos permanentes decorrentes do acidente chegam a serem maiores e mais profundos do que a própria morte. E, no caso dos danos materiais, o valor elevado decorre do pagamento da pensão vitalícia em parcela única (R$ 1.601.600,00).
Cumpre observar que, a alegação da Recorrente quanto à impossibilidade de cumulação das indenizações de danos morais e estéticos não merece prosperar, pois a jurisprudência deste Tribunal Superior já consolidou o entendimento de que é possível a cumulação das compensações por dano moral e por dano estético decorrentes de acidente de trabalho, visto que os direitos tutelados são distintos (RR-30800-96.2011.5.17.0011, Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, 1ª Turma, DEJT 25/8/17; RR-280-62.2011.5.04.0611, Rel. Min. Maria Helena Mallmann, 2ª Turma, DEJT 03/07/17; RR-2979-06.2014.5.17.0014, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, DEJT 6/10/17; ARR-1917-03.2012.5.08.0126, 4ª Turma, Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 08/11/19; ARR-912-65.2011.5.03.0078, Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, 6ª Turma, DEJT 26/5/17; RR-116700-76.2008.5.17.0003, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, DEJT 25/11/2016).
Nesse contexto, em que pese reconhecer a transcendência econômica da causa, mas não vislumbrando vulneração dos dispositivos constitucionais elencados no apelo, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento em recurso de revista.
ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade:
I - no tocante à competência da Justiça do Trabalho, em razão da intranscendência do apelo, negar provimento ao agravo de instrumento da Reclamada e
II – reconhecer a transcendência econômica da causa relativa à responsabilização civil do empregador no acidente de trabalho, ao pagamento de indenizações por dano moral, estético e material, à cumulação das indenizações por dano moral e estético e aos valores fixados como indenizações por dano moral, material e estético e negar provimento ao agravo de instrumento patronal.
Brasília, 7 de junho de 2022.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS FILHO
Ministro Relator
Instituto Valentin Carrion © Todos direitos reservados | LGPD Desen. e Adm by vianett