TST - INFORMATIVOS 2019 0197 - 03 de junho

Data da publicação:

Acordão - TST

Alexandre Luiz Ramos - TST



CONTRATO DE APRENDIZAGEM. NÚMERO DE APRENDIZES. COTA LEGAL. FUNÇÃO DE MAGAREFE. NÃO CONHECIMENTO. I. Os arts. 428 e 429 da CLT dizem respeito, respectivamente, ao contrato de aprendizagem e à obrigação da empresa de contratar aprendizes nos percentuais mínimo e máximo ali estabelecidos. II. No caso dos autos, a controvérsia se atrela à necessidade ou não de formação profissional para o exercício das atividades de magarefe (auxiliar de frigorífico), tendo o Tribunal de origem entendido que o Autor não comprovou que tais funções efetivamente demandam a referida formação profissional. Logo, não demonstrada a necessidade de formação profissional, não se discute o atendimento aos percentuais de contratação de aprendizes estabelecidos no referido preceito legal. Dessa forma, o Tribunal Regional, ao assim decidir, não incorreu em ofensa aos arts. 428 e 429 da CLT. III. Recurso de revista de que não se conhece. (TST-RR-442-15.2010.5.09.0656, Alexandre Luiz Ramos, julgado em 29.5.2019)



RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO AUTOR (MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO). ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014.

CONTRATO DE APRENDIZAGEM. NÚMERO DE APRENDIZES. COTA LEGAL. FUNÇÃO DE MAGAREFE. NÃO CONHECIMENTO.

I. Os arts. 428 e 429 da CLT dizem respeito, respectivamente, ao contrato de aprendizagem e à obrigação da empresa de contratar aprendizes nos percentuais mínimo e máximo ali estabelecidos.

II. No caso dos autos, a controvérsia se atrela à necessidade ou não de formação profissional para o exercício das atividades de magarefe (auxiliar de frigorífico), tendo o Tribunal de origem entendido que o Autor não comprovou que tais funções efetivamente demandam a referida formação profissional. Logo, não demonstrada a necessidade de formação profissional, não se discute o atendimento aos percentuais de contratação de aprendizes estabelecidos no referido preceito legal. Dessa forma, o Tribunal Regional, ao assim decidir, não incorreu em ofensa aos arts. 428 e 429 da CLT.

III. Recurso de revista de que não se conhece. (TST-RR-442-15.2010.5.09.0656, Alexandre Luiz Ramos, DEJT, 31.0519).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-442-15.2010.5.09.0656, em que são Recorrentes MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO e BRF - BRASIL FOODS S.A. e Recorridos OS MESMOS.

O Tribunal Regional do Trabalho da 09ª Região deu provimento parcial ao recurso ordinário interposto pela Ré, para "(a) afastar o deferimento de tutela antecipada para abstenção de manutenção de empregado sem registro; e (b) diminuir o valor do dano moral coletivo, fixando-o em R$ 100.000,00" (fl. 421).

Além disso, a Corte Regional negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo Autor (fl. 421).

O Autor interpôs recurso de revista (fls. 446/461), tendo sido a insurgência admitida com relação ao tema "RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO/INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO", por violação dos arts. 5º, V, da Constituição Federal e 944 do Código Civil (decisão de fls. 624/631).

A Ré também interpôs recurso de revista (fls. 480/510). A insurgência foi admitida quanto ao tema "RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO/INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO", por violação dos arts. 5º, V, da Constituição Federal e 944 do Código Civil (decisão de fls. 631/632).

Esta Corte Superior não conheceu do recurso de revista interposto pela Ré quanto aos temas "nulidade processual por negativa de prestação jurisdicional", "legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho", "atribuição legal do ministério do trabalho (auditor fiscal do trabalho) para analisar os requisitos da relação de emprego", "terceirização - abate de frango pelo método halal" e "dano moral coletivo – caracterização - valor arbitrado à indenização" (fl. 981).

Ainda, esta Corte Superior conheceu do recurso de revista interposto pela Reclamada com relação ao tema "HORA NOTURNA REDUZIDA. FLEXIBILIZAÇÃO POR MEIO DE NORMA COLETIVA", por divergência jurisprudencial. No mérito, a Turma deu provimento ao recurso de revista, para "julgar improcedente o pedido formulado na petição inicial no sentido de que a Reclamada passasse a considerar a hora noturna reduzida para cálculo da jornada de trabalho, nos termos do art. 73, § 1º, da CLT" (fl. 981).

Por fim, a Turma não conheceu integralmente do recurso de revista interposto pelo Autor com relação aos temas "BASE DE CÁLCULO PARA INCIDÊNCIA LEGAL DE CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES", "INTERVALO PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO" e "VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO". (fl. 981).

O Reclamante interpôs recurso de embargos da decisão (fls. 996/1.007), tendo a Ré apresentado impugnação aos embargos (fls. 1.058/1.064).

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais desta Corte conheceu do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, deu-lhe provimento, para "determinar o retorno dos autos à 4ª Turma deste Tribunal a fim de que prossiga no exame da violação dos artigos 428 e 429 da CLT, como entender de direito" (fl. 1.101).

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

O recurso de revista é tempestivo, está subscrito por advogado regularmente constituído e cumpre os demais pressupostos extrínsecos de admissibilidade.

  1. CONTRATO DE APRENDIZAGEM. NÚMERO DE APRENDIZES. COTA LEGAL. FUNÇÃO DE MAGAREFE

O Autor pretende o conhecimento do recurso de revista por violação dos arts. 428 e 429 da CLT. Alega que "não existe nenhum amparo legal para que as empresas frigoríficas privada sejam eximidas de cumprir a cota relativa aos contratos de aprendizagem, uma vez que os aprendizes podem ser alocados em áreas administrativas" e que "cabe a empresa encontrar e disponibilizar local adequado em que o contrato de aprendizagem possa ser exercido de forma segura e incólume" (fl. 450). Aduz que "os aprendizes não precisam necessariamente realizar atividades nessa área", pois "há diversas áreas em que os aprendizes poderão realizar atividades, a exemplo da área administrativa" (fl. 452).

Sustenta que "a inclusão é para efeito de cálculo de cota de aprendizes, não significa que os aprendizes devem, necessariamente, atuar na área" (fl. 452).

Transcreve aresto para a demonstração da divergência jurisprudencial.

Consta do acórdão:

"B. COTA DE APRENDIZAGEM

O Juízo de origem julgou improcedente a pretensão do Ministério Público do Trabalho no que se refere à contratação de aprendizes, fundamentando que a base de cálculo adotada pela Reclamada para a contratação do número de aprendizes (588) é adequada, bem como as listagens de fls. 167 e 168, não impugnadas pela parte Reclamante, demonstram a contratação do número de empregados-aprendizes em quantidade suficiente para atender ao disposto no art. 429 da CLT:

O art. 429, da CLT assim prevê expressamente:

‘Art. 429. Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional.’

É premissa fundamental para a contratação de aprendizes e, consequentemente, para a delimitação da base de cálculo para a definição do número de vagas a serem ocupadas, do enquadramento dos empregos como aqueles que demandem formação profissional.

O auto de infração lavrado em 04-03-2010 indica que a Reclamada possuía 3393 empregados vinculados ao frigorífico, cujas funções demandavam formação profissional, o que teria sido extraído do CBO - Classificação Brasileira de Ocupações. Ressalta que a Instrução Normativa 26/2001 indica que a habilitação profissional de nível técnico ou superior decorre de lei. O auditor do trabalho conclui, ainda, que havia apenas 10 aprendizes contratados e que 170 (cento e setenta) deixaram de ser admitidos.

O Decreto nº 5.598/2005, ao regulamentar o art. 429, da CLT assim previu em seu art. 10:

‘Art. 10. Para a definição das funções que demandem formação profissional, deverá ser considerada a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.’

Diante de tal interpretação, qualquer profissão listada na CBO demanda formação profissional e, consequentemente, deve ser inclusa na base de cálculo para que se encontre o correto número de aprendizes. Não é bem assim.

A CBO lista uma infinidade de cargos e atividades profissionais e não profissionais e, em meu entendimento, a definição criada pelo Decreto nº 5.598/2005 não ultrapassa o crivo da razoabilidade.

Menciono as lições de Eduardo Gabriel Saad, que assim revela em sua obra:

‘3.1) Cota de Aprendizes. Cargos e Funções Passíveis de Aprendizagem. Diante de tudo isso, equivoca-se aquele que insiste na alegação de que o percentual mínimo de contratação de adolescentes aprendizes de 5% (cinco por cento), previsto no art. 429, da CLT, incida sobre a totalidade dos trabalhadores de uma empresa. Quem comete esse equívoco utiliza do argumento de que basta uma ocupação estar prevista na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) para que surja a obrigação de se contratar adolescentes-aprendizes. Busca ele espeque para seu pensamento no art. 10, do Decreto n. 5.598, de 1.12.05, verbis: ‘Art. 10. Para a definição das funções que demandem formação profissional, deverá ser considerada a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego’.

Ora, incide em erro crasso aquele que utiliza como fundamento esse art. 10, sem que leia o art. 9º desse mesmo decreto, olvidando-se, inclusive, do disposto na parte final do art. 429, da CLT, passando ao largo, inclusive, de que um decreto não cria obrigações, sob pena de se violentar o princípio da legalidade. Ora, não basta que o cargo esteja previsto na CBO para que haja necessidade de contratação do adolescente-aprendiz, mas, sim que tal cargo previsto nesse ato administrativo seja passivo efetivamente de aprendizagem, e não forma da norma constitucional, da CLT, do Estatuto da Criança e do Adolescente e da lei de diretrizes e bases da educação nacional.

Como demonstração de que não basta estar uma ocupação presente nesse ato administrativo de 2002 do Ministério do Trabalho e emprego, que previu a CBO, para provocar o surgimento da obrigação de contratação de adolescente-aprendiz, basta-se dizer que existem profissões nela elencadas que são incompatíveis e desaconselháveis à aprendizagem desse menor.

É o caso, por exemplo, de se pretender ministrar curso de aprendizagem de motorista de caminhão ou de automóvel a um menor de 14 a 17 anos.

Também não é o fato da CBO prever a ocupação de prostituta que alguém irá, em sã consciência, pretender ministrar a uma adolescente esse tipo de profissão.

Aliás, não se deve utilizar do raciocínio que será sempre a CBO o único ato administrativo ensejador do curso de aprendizagem do adolescente. É evidente que certas ocupações não constantes dela, que são criadas pela velocidade das atividades empresariais da área de informática, da área da pesquisa técnica e científica, vg, devem ser passíveis de aprendizagem. As exigências do mundo contemporâneo quanto às atividades profissionais não podem ficar atreladas, com a devida máxima vênia, ao reconhecimento simplório de estar ou não enquadrada em um ato administrativo, denominado CBO, que sofre atualizações com periodicidade muitas vezes bem elásticas.

Lembre-se que a CBO vigente foi elaborada no ano de 2002! E as anteriores dataram de 1982 e 1994.

Na boa doutrina pátria, essa exigência de que o percentual deve incidir sobre a totalidade do número de trabalhadores existente na empresa não encontra respaldo algum. Nesse passo, Eduardo Gabriel Saad, ao analisar o art. 429, da CLT, que trata da percentual de contratação de aprendizes adolescentes, esclarece com toda a propriedade a questão: ‘Revela notar que o cálculo do referido percentual é feito sobre o número dos empregados ocupantes de postos que demandem formação profissional: não é essa base de cálculo o total de empregados da empresa’ (cf. fls. 157, sob ‘Curso de Direito do Trabalho’, LTr Ed).

Assim como afirmado em defesa, a maior parte dos empregados da Reclamada ocupa a função de magarefe, que consiste no exercício das atividades de auxiliar de frigorífico. Tais funções não exigem formação profissional e um simples curso é suficiente para que o trabalhador possa exercê-la.

A função de auxiliar de frigorífico, além de não exigir qualquer formação profissional, é considerada penosa, pois impõe ao trabalhador elevada carga de trabalho, onde há grandes riscos para o surgimento de lesões por esforço repetitivo. Essas conclusões podem ser extraídas do próprio relatório de auditoria fiscal colacionado ao volume de documentos (fl. 33), onde há recomendação do Ministério do Trabalho para que se evite a prorrogação da jornada:

Se considerarmos, ainda, os casos de afastamentos por motivo de saúde, bem como a análise ergonômica existente, fica evidente que a prorrogação da jornada normal de trabalho deveria ser proibida nesse tipo de atividade, pois uma jornada normal de 7:20 horas (seis dias por semana - associada à repetitividade e ao ritmo intenso de trabalho) é causa do surgimento de lesões e doenças ocupacionais, relacionadas sobre tudo, com distúrbios osteomusculares dos membros superiores e coluna, fato que é corroborado pelos diversos empregados afastados com esse tipo de diagnóstico, tenha ou não havido a emissão da respectiva CAT’.

As conclusões do Ministério do Trabalho sobre o exercício da função de auxiliar de frigorífico (magarefe) desaconselham que adolescentes e jovens sejam contratados como aprendizes para executar atividade que não traz qualquer demanda intelectual e que poderá colocar em risco sua saúde e formação física. Um adolescente que iniciar o trabalho como auxiliar de frigorífico certamente terá problemas em sua formação óssea e muscular pelas atividades repetitivas a serem praticadas.

A doutrina de Eduardo Gabriel Saad, mais uma vez, se coaduna com o pensamento deste magistrado:

‘As funções dos cargos que sejam puramente mecânicas e repetitivas em si não são passíveis de aprendizagem. O conhecimento delas não outorga ao adolescente uma atividade compatível com seu desenvolvimento ou que garanta uma adequada inserção no mercado de trabalho. Serão conhecimentos pontuais e foram de um contexto de uma aprendizagem metódica. Esses conhecimentos pontuais e esparsos não habilita o aprendiz ao exercício de uma profissão não apenas dentro da uma sua empregadora e muito menos em qualquer outra empresa no mercado.’ (SAAD, Eduardo Gabriel, CLT Comentada, 45ª Edição, LTr, 2012, pág. 479)

Portanto, entendo não ser recomendável que menores ou jovens aprendizes sejam colados em frigoríficos para que aprendam a função de auxiliar de frigorífico, onde além de pouca contribuição para sua formação pedagógica e social, serão expostos a riscos ocupacionais injustificáveis. Compactuar com tal pretensão seria violar o disposto no art. 403, parágrafo único da CLT, pois certamente o desenvolvimento físico do menor seria colocado em ‘xeque’.

O Tribunal Superior do Trabalho têm observado com prudência tais situações, eis que reconhece que atividades que demandam riscos, mesmo que previstas na CBO, não devem compor a base de cálculo para o número de contratação de aprendizes:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. 1. AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE. CONTRATAÇÃO DE MENOR APRENDIZ. EMPRESA DE VIGILÂNCIA. ATIVIDADE DE RISCO. Não obstante o artigo 429 da CLT disponha que os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a contratar menores aprendizes no percentual de cinco a quinze por cento, os demais dispositivos que também tratam da matéria demonstram a preocupação do legislador em compatibilizar a exigência prevista no mencionado artigo da CLT com o local e as atividades que serão desenvolvidas pelo menor aprendiz. É inconteste a importância que foi relegada ao adequado desenvolvimento físico, moral e psicológico do aprendiz menor de idade na realização das atividades práticas de aprendizagem, ou seja, o aplicador do direito deve nortear-se pelo afastamento do exercício de atividades inadequadas e em locais que coloquem em risco a saúde do menor aprendiz. As empresas de segurança privada, de segurança eletrônica, de cursos de formação e transporte de valores desenvolvem atividades caracterizadas, de forma irrefutável, como de risco e, consequentemente, em ambientes impróprios ao convívio de menores aprendizes. Nesse contexto, é certo afirmar que não há permissão para, no caso vertente, impor a contratação de menores aprendizes. Assim, não merece reforma a decisão do Regional que manteve a sentença que declarou nulo o auto de infração lavrado pela fiscalização do trabalho com o objetivo de exigir da empresa de vigilância o cumprimento da contratação de menor aprendiz. Precedentes desta 8ª Turma. 2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VIOLAÇÃO DO ART. 20, § 4º, DO CPC NÃO CARACTERIZADA. Da decisão recorrida, não se verifica ofensa ao art. 20, § 4º, do CPC, porque o percentual arbitrado (10%) se encontra exatamente em consonância com o mencionado preceito legal. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (AIRR - 1033- 81.2010.5.20.0005 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 23/11/2011, 8ª Turma, Data de Publicação: 25/11/2011)

Diante de todo o exposto, tenho que a base de cálculo adotada pela Reclamada para a contratação do número de aprendizes (588) é adequada, bem como as listagens de fls. 167 e 168, não impugnadas pela parte Reclamante, que demonstram a contratação do número de empregados-aprendizes em quantidade suficiente para atender ao disposto no art. 429, da CLT.

Com isso, julgo improcedente a pretensão do Ministério Público do Trabalho no que se refere à contratação de aprendizes (item 4.6, da inicial).

O Autor pleiteia que as funções de magarefes sejam computadas na base de cálculo da cota de aprendizagem e, a partir daí, a empresa ré seja condenada a dotar seu quadro de pessoal do número adequado de aprendizes. Destaca que ‘a inviabilidade do cômputo na cota de aprendizagem daquelas funções que coloquem em risco a saúde do aprendiz (por ser menor), conforme fundamentado na sentença, somente seria plausível caso o limite de idade para o aprendiz fosse 18 anos (como no passado). Contudo, diante do limite máximo de 24 anos de idade, não se mostra razoável excluir a função de auxiliar de frigorífico do cálculo em tela por este motivo’.

A controvérsia reside em estabelecer se a função de auxiliar de frigorífico entra na base de cálculo do percentual da cota de aprendizagem ou não.

Adota-se, inicialmente, fundamentação do Exmo. Desembargador Ubirajara Carlos Mendes, nos autos 00161-2009-665-09-00-5, publicação 04/02/2011, desta E. Turma (destaques acrescidos):

Está disposto no art. 428 e parágrafos da CLT:

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação. (Redação dada ao caput pela Lei nº 11.180, de 23.09.2005, DOU 26.09.2005, conversão da Medida Provisória nº 251, de 14.06.2005, DOU 15.06.2005)

§ 1º A validade do contrato de aprendizagem pressupõe anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, matrícula e frequência do aprendiz na escola, caso não haja concluído o ensino médio, e inscrição em programa de aprendizagem desenvolvido sob orientação de entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica. (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 11.788, de 25.09.2008, DOU 26.09.2008)

§ 2º Ao menor aprendiz, salvo condição mais favorável, será garantido o salário mínimo hora. (AC) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.097, de 19 .12.2000, DOU 20.12.2000)

§ 3º O contrato de aprendizagem não poderá ser estipulado por mais de 2 (dois) anos, exceto quando se tratar de aprendiz portador de deficiência. (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 11.788, de 25.09.2008, DOU 26.09.2008)

§ 4º A formação técnico-profissional a que se refere o caput deste artigo caracteriza-se por atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho. (AC) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.097, de 19.12.2000, DOU 20.12.2000)

§ 5º A idade máxima prevista no caput deste artigo não se aplica a aprendizes portadores de deficiência. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 11.180, de 23.09.2005, DOU 26.09.2005, conversão da Medida Provisória nº 251, de 14.06.2005, DOU 15.06.2005)

‘§ 6º Para os fins do contrato de aprendizagem, a comprovação da escolaridade de aprendiz portador de deficiência mental deve considerar, sobretudo, as habilidades e competências relacionadas com a profissionalização. (NR) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 11.180, de 23.09.2005, DOU 26.09.2005, conversão da Medida Provisória nº 251, de 14.06.2005, DOU 15.06.2005)’

‘§ 6º Para os fins do contrato de aprendizagem, a comprovação da escolaridade de aprendiz com deficiência mental deve considerar, sobretudo, as habilidades e competências relacionadas com a profissionalização. (Parágrafo acrescentado pela Medida Provisória nº 251, de 14.06.2005, DOU 15.06.2005)’

§ 7º Nas localidades onde não houver oferta de ensino médio para o cumprimento do disposto no § 1º deste artigo, a contratação do aprendiz poderá ocorrer sem a frequência à escola, desde que ele já tenha concluído o ensino fundamental. (NR) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 11.788, de 25.09.2008, DOU 26.09.2008)’

Fácil perceber que o escopo do contrato de aprendizagem, como a própria denominação já indica, é a formação profissional do cidadão, aprimorando com o trabalho o aprendizado teórico fornecido pelas escolas técnicas.

Cita-se, por oportuno, a doutrina de Alice Monteiro de Barros:

‘(...) A formação profissional é o gênero e a aprendizagem, sua espécie. O Estatuto da Criança e o Adolescente define a aprendizagem como modalidade de formação técnico-profissional, ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor.

Já a CLT, no art. 428, com a nova redação dada pela Lei n. 10.097, de 19 de dezembro de 2000, e pela Lei n. 11.180, de setembro de 2005, considera de aprendizagem o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, por meio do qual o empregador 'se compromete a assegurar ao maior de 14 e menor de 24 anos, inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional metódica compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico e o aprendiz, a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação.'

(...)

A formação técnico-profissional, a que se refere o caput do art. 428 da CLT, com a nova redação dada pela Lei n. 10.097, realiza-se por meio de atividades teóricas e práticas metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho (art. 428, § 4º, acrescentado pela Lei n. 10.097, de 2000).

A par de todos os fundamentos científicos citados para justificar as restrições do trabalho do menor, cumpre frisar que o aprendizado, em geral, e o da criança, em especial, passam por fases sucessivas, em que novos conhecimentos são assimilados. O aprendizado feito de forma inadequada altera o ritmo normal da aquisição de conhecimento, afetando os sistemas neurológico e psicológico do jovem que passa a ter dificuldade de enfrentar novas habilidades.

(...)

Como se vê, o aprendiz é empregado destinatário de um contrato de trabalho por prazo determinado, de natureza especial, considerando que a obrigação de fazer por ele assumida junto ao empregador é também subordinada à obrigação principal do vínculo, que é o aprendizado. 'O aprendiz dever aprender e deve também trabalhar, porém, mais pela sua formação técnica do que pela empresa’.

(...)

No contrato de aprendizagem, a principal obrigação do empregador é propiciar a formação profissional (obrigação de fazer), seguida da obrigação de pagar salário (obrigação de dar). (...)’ (fls. 555/558).

No caso, o Autor não comprovou que a função de magarefe (abatedor de gado) contribuísse para aperfeiçoamento profissional dos aprendizes; que fosse atividade compatível com desenvolvimento físico, moral e psicológico; que demandasse habilidades e competências relacionadas com a profissionalização; requisitos legais exigíveis para contratação como aprendizes.

Ainda, diante das inúmeras irregularidades constatadas pelo relatório de auditoria fiscal da Superintendência Regional do Trabalho no Paraná, relativas à segurança e medicina do trabalho (tais como existência de doenças ostemusculares relacionadas ao trabalho, ritmo excessivo, pausas insuficientes, fls. 21-36 do vol. de docs.), não se mostra razoável a inclusão das atividades de magarefe para fins de cômputo da cota de aprendizagem.

Nesse sentido (00161-2009-665-09-00-5 - 04/02/2011 - 1ª Turma - Rel. Des, Benedito Xavier da Silva):

De outro lado, não se mostra razoável levar em consideração o quantitativo de empregados da empresa com o fim de se fixar o número de aprendizes a serem admitidos.

No caso, é de se excluir o quantitativo de empregados que exercem atividade de risco. Ou seja, pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, o número de aprendizes a que se refere o art. 429, ‘caput’, da CLT, deve ser calculado com base no número de trabalhadores que não operam em atividades perigosas, em razão dos riscos que são inerentes ao ramo empresarial da ré.

Aliás, o próprio art. 429 da CLT, a meu juízo, deixa claro que se deve levar em consideração as funções que demandem formação profissional e não o total de trabalhadores do estabelecimento no cálculo do número de aprendizes.

Posto isso, mantém-se a r. sentença" (fls. 411/420, destaques no original).

Como se observa, a Corte Regional manteve a sentença em que foi afastado o cômputo das funções de magarefe (auxiliar de frigorífico) na base de cálculo da cota de aprendizagem da empresa, tendo restado ali consignado que, quanto ao art. 429 da CLT, este "deixa claro que se deve levar em consideração as funções que demandem formação profissional e não o total de trabalhadores do estabelecimento no cálculo do número de aprendizes" (fl. 419).  

No aspecto, o Tribunal de origem entendeu que "o Autor não comprovou que a função de magarefe (abatedor de gado) contribuísse para aperfeiçoamento profissional dos aprendizes; que fosse atividade compatível com desenvolvimento físico, moral e psicológico; que demandasse habilidades e competências relacionadas com a profissionalização; requisitos legais exigíveis para contratação como aprendizes" (fl. 419).

Ato contínuo, sobreveio recurso de revista da parte Autora. Esta Corte Superior decidiu que "resulta inviável conhecer do recurso de revista por ofensa aos arts. 428 e 429 da CLT, porque nestes dispositivos legais não há regulamentação específica para resolver a controvérsia" (fl. 970).

O Autor opôs embargos da decisão, tendo a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais desta Corte Superior conhecido do recurso, por divergência jurisprudencial, e lhe dado provimento, para "determinar o retorno dos autos à 4ª Turma deste Tribunal a fim de que prossiga no exame da violação dos artigos 428 e 429 da CLT, como entender de direito" (fl. 1.101), em Acórdão assim ementado:

RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 13.015/2014. CONTROVÉRSIA SOBRE A PERTINÊNCIA DA ARGUIÇÃO DE OFENSA AO ARTIGO 429 DA CLT EM RECURSO DE REVISTA QUE TRATA DO TEMA - CONTRATO DE APRENDIZAGEM. NÚMERO DE APRENDIZES. BASE DE CÁLCULO. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho com pedido, entre outros, para que a empresa contrate aprendizes em número equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, da totalidade dos empregados, cujas funções demandem formação profissional. A primeira questão trazida para debate, no recurso de embargos interposto pelo Ministério Público do Trabalho, diz respeito à possibilidade de haver o exame do meritum causae do recurso de revista à luz dos artigos 428 e 429 da CLT. Consoante reiterados precedentes de Turmas deste Tribunal, aos quais se alinha a tese sustentada pelo Parquet, os artigos 428, caput, e 429, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho, além de conceituarem o contrato de aprendizagem, estabelecem os pressupostos a serem observados na fixação da base de cálculo para a contratação de aprendizes. Por essa razão, entende-se que a arguição de ofensa aos artigos 428 e 429 da CLT, nas razões do recurso de revista, é pertinente na solução da controvérsia que visa definir a atividade que comporá a base de cálculo sobre a qual atividade incidirá o percentual mínimo legal de trabalhadores aprendizes que a empresa está obrigada a contratar. Recurso de embargos conhecido e provido. (E-ED-RR - 442-15.2010.5.09.0656, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 17/05/2018, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 25/05/2018)

Em cumprimento ao decidido pela egrégia SbDI-1, observo que os arts. 428 e 429 da CLT, em seu caput, assim dispõem:

"Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação".

"Art. 429. Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional" (destaques acrescidos). 

Depreende-se que os artigos acima transcritos dizem respeito ao contrato de aprendizagem e à obrigação da empresa de contratar aprendizes nos percentuais mínimo e máximo ali estabelecidos, em funções que demandem formação profissional.

No caso dos autos, a controvérsia se atrela à necessidade ou não de formação profissional para o exercício das atividades de magarefe (auxiliar de frigorífico), tendo o Tribunal de origem entendido que o Autor não comprovou que tais funções efetivamente demandam a referida formação profissional, na forma exigida pelo art. 429 da CLT.

Logo, partindo-se do pressuposto fixado pela SbDI-1 - de que os artigos 428 e 429 da CLT são pertinentes na solução da controvérsia que visa definir a atividade que comporá a base de cálculo sobre a qual atividade incidirá o percentual mínimo legal de trabalhadores aprendizes que a empresa está obrigada a contratar -, a subsunção aos referidos dispositivos legais resta inviável pela ausência de comprovação de que a função de magarefe demanda formação profissional hábil a invocar a aplicação do art. 429 da CLT.

Dessa forma, o Tribunal Regional, ao assim decidir, não incorreu em ofensa aos arts. 428 e 429 da CLT, mas – ao contrário - decidiu a controvérsia à luz desses dispositivos legais. 

Assim sendo, não conheço do recurso de revista.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade não conhecer do recurso de revista interposto pelo Autor (MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO) com relação ao tema "CONTRATO DE APRENDIZAGEM. NÚMERO DE APRENDIZES. COTA LEGAL. FUNÇÃO DE MAGAREFE".

Brasília, 29 de maio de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

ALEXANDRE LUIZ RAMOS

Ministro Relator

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