Data da publicação:
Acordão - TST
Breno Medeiros - TST
SEM APRESENTAR CONTROLE DE JORNADA, EMPREGADORA DOMÉSTICA É CONDENADA A PAGAR HORAS EXTRAS ALEGADAS POR TRABALHADORA
RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. EMPREGADO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DOS CONTROLES DE PONTO. ÔNUS DA PROVA. LEI COMPLEMENTAR Nº 150/2015. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. De acordo com o art. 12 da Lei Complementar nº 150/2015, vigente desde o termo inicial do contrato de trabalho da autora, "é obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo." Desse modo, a não apresentação dos controles de jornada em juízo pelo empregador doméstico enseja a presunção relativa da jornada alegada na inicial, a qual pode ser elidida por prova em sentido contrário, nos termos da Súmula nº 338, I, desta Corte, aplicável analogicamente à hipótese. No caso dos autos, o e. TRT, com base na distribuição do ônus da prova, manteve a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras, uma vez que a reclamada não apresentou os controles de horário da reclamante, empregada doméstica, tampouco demonstrou, por outros meios de prova, a inexistência do direito postulado. Conforme se verifica, não tendo a reclamada se desincumbido do ônus processual que lhe cabia, o Regional ao concluir que à autora faz jus ao recebimento de horas extraordinárias, decidiu em consonância com a nova realidade normativa decorrente da Lei nº 150/2015 e com a Súmula nº 338, I, desta Corte. Precedentes. Assim sendo, em pese a transcendência jurídica reconhecida, não há como prosseguir no exame da revista. Recurso de revista não conhecido. (TST-RR-737-04.2020.5.20.0007, Breno Medeiros, DEJT 14/04/23)
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-737-04.2020.5.20.0007, em que é Recorrente GABRIELA CESPEDES PASSOS e é Recorrida MILENNA GOMES SOARES.
Trata-se de recurso de revista interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional, mediante o qual foi dado parcial provimento ao recurso da reclamada.
A reclamada procura demonstrar a satisfação dos pressupostos do artigo 896 da CLT.
O recurso de revista foi admitido pela autoridade local em razão de potencial divergência jurisprudencial.
Contrarrazões apresentadas.
Sem remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
I - CONHECIMENTO
EMPREGADO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DOS CONTROLES DE PONTO. ÔNUS DA PROVA. LEI COMPLEMENTAR Nº 150/2015.
O e. TRT consignou, quanto ao tema:
"JORNADA DE TRABALHO
Assevera a Reclamada:
Da condenação indevida em sobrejornadas (ônus da prova da reclamante/presunção relativa)
A sentença a quo, condenou a reclamada em absurda jornada, atribuindo a mesmas ônus da prova face a ausência de juntada de cartão de ponto aos autos, pautando-se para tanto na lei 150/2015, a qual determina a obrigatoriedade do Registro de ponto aos empregadores domésticos.
[...]
Data máxima vênia, o entendimento do juízo de piso quanto aplicação da presunção absoluta, não pode prosperar diante do caso concreto.
A princípio temos a inexistência de qualquer pedido na exordial para apresentação dos Registros de ponto como meio de prova, e por consectário ausência de qualquer determinação pelo juízo para que a reclamada juntasse aos autos registros de ponto ou similares sob pena de confissão, razão pela qual tornasse justificada a não apresentação de tais controles de ponto.
Ademais, a ausência de juntada de controle de horários pela empregadora não acarreta, por si só, a aplicação da jornada contida na jornada sobre-humana de mais de 14 horas diárias durante mais de 5 anos, e alguns períodos sem intervalo, como apontado na petição inicial.
É que a própria reclamante declarou em audiência, "que não havia ninguém na casa da reclamada na maior parte do tempo para controlar seus horários", tendo inclusive disponibilidade para realizar cursos, sendo razoável concluir que a autora possuía certa autonomia na organização da prestação dos serviços e que sua jornada não extrapolava a 8ª hora diária e a 44ª semanal".
Em que pese a Lei Complementar nº 150/2105, ao tratar o assunto relativo à empregada doméstica, atribuir ônus da prova a empregadora, quando a mesma não manteve registros de frequência, o fato é que posteriormente, a Lei nº 13.467/2017 que tratou da regulamentação da Reforma Trabalhista, firmou que o ônus da prova será do reclamante, e que as empresas só atrairiam o ônus da prova para si, caso a empresa mantivessem em seus quadros mais de 10 (dez empregados ) nos termos do §2 do artigo 74 da CLT
É no mínimo sem sentido que a legislação tenha beneficiado uma empresa com até 10 (dez ) empregados e permaneça penalizando às empregadoras de domésticas, tendo apenas uma empregada contratada.
Ressalte-se ainda que, em muitos casos, como inclusive no presente, a doméstica dorme na casa da empregadora, onde se verifica ainda maior dificuldade de ser controlada a jornada de trabalho.
É importante se frisar que, o artigo 45 da Lei Complementar nº 150/2015, diz textualmente que, as matérias tratadas na referida Lei e que não sejam reservadas constitucionalmente a Lei Complementar, poderão ser objeto de alteração por Lei Ordinária, o que demonstra que a Lei nº 13.467 advinda em 2017, para fazer ajustes na Reforma Trabalhista não foi omissa, apenas não foi expressa em relação ao controle de horário de trabalho em relação às domésticas.
E não poderia o legislador dar entendimento diverso em relação à mesma matéria(domestica) em atenção ao ônus da prova em relação aos horários extraordinários, devendo então ser o entendimento correto que a residência que contrate menos de 10 (dez ) empregadas domésticas não será obrigada a manter registros de frequência, ademais, nos casos de empregadas domésticas, sendo um ponto de confronto entre as legislações acima descritas.
Como paliativo para mitigar o absurdo jurídico, a jurisprudência vem concordando que a jornada de trabalho declinada na exordial tenha presunção relativa, podendo ser elidida através de prova testemunhal e até mesmo pela confissão em contrário da própria doméstica que muitas vezes exacerba o número de horas extras ao ponto de colidir de frente com os princípios da boa fé, da verossimilhança e da primazia da realidade, cujos princípios devem nortear a conduta do bom julgador.
E na proteção do direito ao bem da verdade real a jurisprudência vem neste sentido, conforme pode ser observada a seguir:
[...]
Em suma, Diga Turma, a Súmula - 338 do TST - Tribunal Superior do Trabalho não resta aplicada na relação de emprego doméstico, e esta é a opinião que vem tomando forma e inclinando a jurisprudência neste norte, onde praticamente define a inversão do ônus da prova em relação ao que está disposto na Lei Complementar nº 150/2015, vejamos a jurisprudência do TRT da 10ª Região:
[...]
Por conseguinte, diante do caso concreto, temos que afastada a presunção em favor da reclamante quanto ao ônus da prova, temos que a reclamante não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, e não poderia, seja porque laborava sozinha a maior parte do tempo, seja porque não trouxe aos autos qualquer outra prova quanto a sobrejornada, inclusive testemunhal.
DO PLEITO SUCESSIVO
Na hipótese remota de mantido o posicionamento quanto ao ônus da prova, requer seja reduzida as horas extras seja pelo princípio da máxima experiência, seja pelas contradições da própria reclamante, eis que entre o seu depoimento e jornada descrita, decorrem várias contradições, apontando jornada diversas ora majoradas ora reduzidas, vejamos:
[...]
Do cotejo entre o disposto na inicial e depoimento, temos que a reclamante sem delimitar períodos confessou que:
Durante o período de 2017 a 2018, não laborava a partir das 18:00 horas, razão pela qual neste período não há jornada extraordinária, eis que limitada das 06:00 ás 14:30 de segunda a sexta feira com 1 hora de intervalo e das 17:00 ás 18:00, laborando portanto menos de 44 horas semanais.
De igual forma, no período da pandemia, entre março e junho, onde abusivamente discorre a jornada das 06:00 ás 22:00 de domingo a domingo, não laborou ao menos das 14:30 ás 15:30 nas terças feiras.
Em análise.
O magistrado de piso assim decidiu:
Da jornada de trabalho. Das horas extras por labor em sobrejornada. Das horas extras por redução do intervalo interjornadas. Dos reflexos legais
[...]
Pois bem.
De saída, registro que, uma vez alegado o trabalhado extraordinário e não apresentado os controles de ponto, é de se presumir verdadeira a jornada declinada na Petição Inicial.
Isso, porque, nos termos da Lei Complementar 150/2015, é obrigatório o registro de horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo (vide art. 12).
Dito isso, transcrevo os depoimentos colhidos, quanto ao tema em apreço, com vistas a analisar se a reclamada se desvencilhou do seu ônus.
Em depoimento pessoal, a reclamante disse o seguinte:
[...]
A testemunha apresentada pela reclamada, Sra. MARILUCIA OLIVEIRA DOS SANTOS, declarou o seguinte:
[...]
Como se observa dos excertos destacados, a testemunha apresentada pela reclamada entrou em contradição em seu depoimento, por várias vezes.
[...]
Como se vê dos excertos transcritos, para além das contradições apontadas, a todo tempo a testemunha tenta reduzir o conjunto de atividades atribuídas à reclamante, quando a própria defesa narra que a autora também tinha por atribuição cuidar da filha da reclamada.
Ora, essas declarações da testemunha são mais do que suficientes para caracterizar o depoimento como absolutamente tendencioso e, por isso mesmo, imprestável.
Nesse contexto, considerando que a reclamada não se desincumbiu de seu ônus processual, e em atenção às informações constantes da vestibular e extraídas da prova oral, fixo que a autora, no período de 01/11/2017 até 19/03/2020, laborou de 06h00 até 14h30, com 01 hora de intervalo intrajornada, e de17h30 até 20h30, de segunda a quinta, e de 06h00 até 14h00, com 01 hora de intervalo intrajornada, às sextas.
Ainda, fixo que no período de 20/03/2020 até 06/10/2020, a autora laborou de segunda a domingo, de 06h00 até 20h00, tomando a imprecisão da exordial em prejuízo da própria autora, com 01 hora de intervalo intrajornada, sendo que, no referido período, usufruiu de folga em 03 finais de semana.
Todavia, considerando que a jornada fixada no período de 01/11/2017 até 19/03/2020 revela horas destinadas à compensação, face à ausência de labor aos sábados, bem como a existência de horas extras habituais, a hipótese atrai a aplicação do entendimento contido no item IV da Súmula 85 do TST, que fixa o pagamento como extraordinárias das horas que ultrapassarem a jornada semanal, em como o pagamento apenas do adicional sobre as horas destinadas à compensação.
Nesse contexto, quanto ao período de 01/11/2017 até 19/03, decido julgar procedente em parte o pedido, para condenar a reclamada a/2020pagar: 05h00 extra por semana; adicional de horas extras incidente sobre 04 horas por semana; e reflexos sobre DSR, 13º salários, férias, aviso prévio e FGTS.
No que se refere ao período de ,20/03/2020 até 06/10/2020decido julgar procedente em parte o pedido, para condenar a reclamada pagar horas extras por labor em sobrejornada, assim consideradas as horas trabalhadas além da 8ªdiária e 44ª semanal, bem como reflexos em DSR, 13º salários, férias + 1/3, aviso prévio e FGTS.
Ainda, da jornada ora fixada se observa o desrespeito ao intervalo interjornadas.
Logo, e considerando a limitação ao pedido (arts. 141 e 492 do CPC), decido julgar procedente o pedido para condenar a reclamada a pagar horas extras pela concessão parcial do intervalo interjornadas, no período de 20/03/2020 até 06/10/2020 com reflexos em férias +1/3, 13º salário, aviso prévio, DSR e FGTS.
Sob análise.
Destaca-se que apenas a partir de 01/06/2015 se tornou obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo, conforme art. 12, da Lei Complementar 150/2015.
Da mesma forma, inconteste o direito de o emprego doméstico receber pelo labor extra, tendo em vista que, com o advento da Emenda Constitucional 72/2013, foi alterada a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.
Pois bem.
Registre-se que as horas pelo labor extra deferidas decorrem da falta, pela empregadora, de seu dever legal em apresentar os controles de frequência.
Com efeito, diante do contexto, se encontra na margem do julgador a análise no sentido da razoabilidade e proporcionalidade. Dispõe a Súmula 338 do TST:
JORNADA DE TRABALHO. REGISTRO. ÔNUS DA PROVA [...]
I - É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, §2º, da CLT. A não-apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário. (ex-Súmula nº 338 - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)
II - A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário. (ex-OJ nº 234 da SBDI- 1 - inserida em 20.06.2001)
III - Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ nº 306 da SBDI-1- DJ 11.08.2003)
Não se poderia aplicar a íntegra e forma irrestrita o referido verbete, uma vez que também dispõe que a ausência dos documentos gera apenas presunção relativa de veracidade. Isso porque, no caso dos empregados domésticos, estes contam com norma específica no que se refere ao controle de jornada.
Da mesma forma, não poderia ser prejudicado o direito da Obreira em razão da falha da empregadora que, por não apresentar os documentos, obsta o direito da Reclamante em impugná-los e demonstrar suas falhas.
Nos autos foi produzida prova oral.
Quanto ao depoimento da Reclamante, afirmou que:
DEPOIMENTO DA RECLAMANTE: ÀS PERGUNTAS DO RECLAMADO, respondeu: "que trabalhava das 06h às 14h30, com intervalo intrajornada de 1 hora, e das 17h/17h30 até 20h30, de segunda a sexta-feira; que durante todo o seu contrato de trabalho, dormia na residência da reclamada; que, após encerrar sua jornada na sexta-feira, dirigia-se para sua residência, que fica em Umbaúba-SE; que, entre as 14h30 e 17h/17h30, era comum que a reclamada exigisse alguma atividade, vez que permanecia na residência; que, após o início da pandemia, a partir do dia 18/03/2020, a depoente passou a passar de domingo a domingo, cumprindo jornada de 06h até 22h, na medida em que não mais retornou para sua residência, permanecendo na casa da reclamada trabalhando sem folga ordinária até outubro de 2020, esclarecendo que houve a concessão de folgas extraordinárias em 3ocasiões, uma em agosto, outra em setembro e uma em data que não se recorda, mas a sua duração não chegou a ser de um final de semana completo; que, durante a pandemia, não usufruiu de nenhum intervalo intrajornada; que a reclamada trabalha ou trabalhava na prefeitura de Ribeirópolis SE; que, no momento da pandemia, a reclamada trabalhava na modalidade de home office; que, antes da pandemia, a reclamada saia da residência com a criança às 7h e ambas retornavam às 17h30; que, antes da pandemia, moravam na residência 3 pessoas, a reclamada, a criança Isadora e o marido da reclamada, Sr. Carlos; que, com início da pandemia, o Sr. Carlos passou a não mais residir na casa; que o Sr. Carlos permanecia fora da residência no período entre 14h e 14h30 e retornava próximo das 22h; que, ao longo de todo o contrato de trabalho, a depoente exerceu suas atividades nas duas residências mantidas pela reclamada, uma na cidade de Aracaju-SE e outra na cidade de Ribeirópolis-SE, inclusive durante o curso da pandemia; que a morada d e Ribeirópolis-SE era a residência dos pais da reclamada; que havia uma pessoa que trabalhava como empregada doméstica na residência de Ribeirópolis-SE; que, em Ribeirópolis-SE, a reclamada permanecia fora da residência no horário de 8h às 12h e das 14h às 21h/22h; [...]que fez curso de espanhol no período do início de 2017 até o fim de2018, com aulas nas sextas-feiras, a partir das 18h; que, além desse, fez um outro curso de março a junho de 2020, na modalidade online, com aulas nas terças-feiras, das 14h às 15h30; [...] que nas sextas-feiras antes da pandemia encerrava às 14h;[...]
A Reclamante não apresentou testemunha e a Reclamada, em seu depoimento, não tratou da jornada da obreira. Com relação à Testemunha da Reclamada, tem-se que, acertadamente, o juízo de piso demonstrou as contradições em seu depoimento.
Assim, consoante se depreende das informações colhidas, entendo que houve acerto do juízo de piso ao deferir as horas extras. Destaca-se que, levando-se em consideração o depoimento da Autora e as afirmações da Reclamada em sua defesa, tem-se que a fixação da jornada pelo magistrado a quo fora razoável.
Entretanto, conforme o depoimento da própria Reclamante, tem-se que a Recorrida fez um curso, na modalidade on-line, durante o período de março/2020 a junho/2020 das 14h às 15:30h, devendo, portanto, ser retirado da contagem da jornada fixada pelo juízo a quo esse período.
Reforma-se a decisão de piso neste aspecto."
Contra essa decisão foram opostos embargos de declaração, os quais foram rejeitados.
Nas razões de revista, nas quais cuidou de indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto da insurgência, atendendo ao disposto no art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a parte recorrente indica contrariedade à Súmula 338, I, do TST e divergência jurisprudencial.
Sustenta, em síntese, que a Súmula nº 338, I, do TST não é aplicável ao empregador doméstico, uma vez que a jornada de trabalho deste está disciplinada na Lei Complementar nº 150/2015 e esta "não prevê qualquer penalidade ao empregador face a não apresentação de controle de jornada (...)"
Afirma que "a Súmula 338/TST trata da exegese do art. 74, § 2º da CLT, que é direcionado especificamente às empresas com mais de 20 funcionários (ou 10, na redação antiga). Não é destinado à regulação do trabalho doméstico."
Examino.
Verifica-se a existência de transcendência jurídica, uma vez que se trata de matéria nova no âmbito desta Corte.
Pois bem.
De acordo com o art. 12 da Lei Complementar nº 150/2015, vigente desde o termo inicial do contrato de trabalho da autora, "é obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo".
Desse modo, a não apresentação dos controles de jornada em juízo pelo empregador doméstico enseja a presunção relativa da jornada alegada na inicial, a qual pode ser elidida por prova em sentido contrário, nos termos da Súmula nº 338, I, desta Corte, aplicável analogicamente à hipótese.
No caso dos autos, o e. TRT, com base na distribuição do ônus da prova, manteve a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras, uma vez que a reclamada não apresentou os controles de horário da reclamante, empregada doméstica, tampouco demonstrou, por outros meios de prova, a inexistência do direito postulado.
Conforme se verifica, não tendo a reclamada se desincumbido do ônus processual que lhe cabia, o Regional ao concluir que à autora faz jus ao recebimento de horas extraordinárias, decidiu em consonância com a Lei nº 150/2015 e com a Súmula nº 338, I, desta Corte.
Nesse sentido, vem decidindo esta Corte:
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017 (...) 2 - HORAS EXTRAS. EMPREGADO DOMÉSTICO. CONTROLE DE JORNADA. LC 150/2015. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. O artigo 12 da LC 150/2015 estabelece a obrigatoriedade do registro de horários pelo empregador doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo. Assim, a ausência de controle do horário de trabalho do empregado doméstico enseja a presunção relativa da jornada alegada na inicial, a qual pode ser elidida por prova em contrário. Pleiteado, portanto, em juízo o pagamento de horas extras, cabe ao empregador a demonstração da inexistência do direito postulado, o que não ocorreu na presente demanda. Agravo não provido. (Ag-AIRR - 1001110-22.2018.5.02.0061, Relatora Ministra: Delaíde Alves Miranda Arantes, Data de Julgamento: 25/05/2022, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 27/05/2022)
"(...)RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.467/2017 . EMPREGADO DOMÉSTICO. JORNADA DE TRABALHO. HORAS EXTRAS. REGISTRO E CONTROLE DE HORÁRIOS. ÔNUS DA PROVA DO EMPREGADOR. LEI COMPLEMENTAR Nº 150/2015. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA CONSTATADA . Assegurada ao trabalhador doméstico a duração do trabalho não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais, consoante inciso XIII do artigo 7º da Constituição Federal, o artigo 2º da Lei Complementar nº 150/2015 reforça a duração normal do trabalho doméstico e seu artigo 12 estabelece a obrigatoriedade do registro de horários pelo empregador. Trata-se de um dever legal do empregador doméstico viabilizar o registro dos horários laborados, e, por consequência lógica, é seu o ônus processual de comprovar a jornada de trabalho. A falta de tal controle, e a não apresentação em juízo, enseja a presunção relativa da jornada alegada na inicial. Ressalte-se que interpretação do mencionado artigo 12 em sentido diverso esvazia a finalidade e o alcance do dispositivo. Conclui-se, portanto, que, uma vez pleiteado em Juízo o pagamento de horas extras, é encargo do empregador doméstico, além de realizar o registro e controle da jornada de trabalho, apresentar os documentos correspondentes ou outro meio de prova suficiente a afastar as alegações da parte autora. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-102325-46.2016.5.01.0032, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 08/04/2022).
(...) II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. HORAS EXTRAS - JORNADA EXTERNA DO TRABALHADOR DOMÉSTICO - MOTORISTA - ÔNUS DA PROVA - CONTRATO DE TRABALHO FIRMADO APÓS O INÍCIO DA VIGÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR Nº 150/2015. O artigo 12 da Lei Complementar nº 150/2015 dispõe que: "é obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo". O Tribunal Regional negou provimento ao recurso do reclamante, por entender que essa regra não se estenderia ao empregado doméstico que exerce atividades fora da residência do empregador e por verificar que o autor não apresentou prova de sua alegada jornada extenuante de motorista. Conforme bem ressaltado pelo Colegiado a quo, o encargo de comprovar as horas extras do trabalhador doméstico passou a ser do empregador a partir da vigência do indigitado artigo 12. Assim, a controvérsia dos autos encontra-se restrita à tese regional de que esse novo regramento não alcançaria os empregados que desempenham suas funções externamente e, por essa razão, o ônus da prova permaneceria com os trabalhadores. Constata-se, da literalidade do artigo 12 da LC nº 150, que o legislador, ao determinar a obrigatoriedade de registro do horário de trabalho do empregado doméstico, não limitou esse direito aos trabalhadores que desempenham suas tarefas no âmbito da residência do empregador. A presunção é a de que, se a mens legis fosse aquela compreendida pela Turma de segunda instância, haveria uma ressalva no texto legal, mesmo porque a exclusão dos obreiros externos da referida garantia andaria em sentido oposto ao espírito protetivo emanado da LC nº 150. Destarte, entende-se que a intepretação restritiva do novo dispositivo, conferida pelo Regional, viola a máxima do in dubio pro operario, desdobramento do princípio da proteção do trabalhador. Pelo exposto e nos termos dos artigos 818, II, da CLT e 373, II, do CPC, caberia à reclamada comprovar, por meio dos registros do horário de trabalho, que o autor não faria jus às horas extras indicadas na petição inicial. Atente-se, somente, para o fato de que essa conclusão não alcança o intervalo intrajornada, tendo em vista que a jurisprudência do TST encontra-se pacificada no sentido de que, em se tratando de jornada externa, a presunção do correto usufruto da pausa para descanso e alimentação milita em favor do empregador. Recurso de revista conhecido por violação do artigo 12 da Lei Complementar nº 150/2015 e parcialmente provido. CONCLUSÃO: Agravo de instrumento conhecido e desprovido, por ausência de transcendência e recurso de revista conhecido e parcialmente provido. (RRAg - 2308-36.2018.5.22.0003 , Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 16/02/2022, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 18/02/2022)
Nesse contexto, em que pese a transcendência jurídica, não há como prosseguir no exame do recurso de revista.
Ante o exposto, não conheço do recurso de revista.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista.
Brasília, 12 de abril de 2023.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
BRENO MEDEIROS
Ministro Relator
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