Data da publicação:
Acordão - TRT
Alexandre Luiz Ramos - TST
PANDEMIA- COVID-19. REALIZAÇÃO DE TESTAGEM. CORREIOS. O arcabouço normativo que visa estabelecer mecanismos que assegurem o direito a um ambiente de trabalho hígido, com observância de medidas que visem reduzir riscos à saúde em prestígio à segurança dos trabalhadores encontra respaldo na Convenção nº 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)
PROCESSO TRT/SP Nº1000671-10.2020.5.02.0071
PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO
RECURSO ORDINÁRIO DA 71ª VT DE SÃO PAULO/SP
RECORRENTES: SINDICATO DOS TRABALHADORES DA EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS E SIMILARES DE SÃO PAULO, REGIÃO DA GRD SAO PAULO E Z POSTAL DE SOROCABA - SINTECT-SP
EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
RECORRIDOS: OS MESMOS
RELATOR: ALVARO ALVES NÔGA
EMENTA
PANDEMIA- COVID-19. REALIZAÇÃO DE TESTAGEM. CORREIOS. O arcabouço normativo que visa estabelecer mecanismos que assegurem o direito a um ambiente de trabalho hígido, com observância de medidas que visem reduzir riscos à saúde em prestígio à segurança dos trabalhadores encontra respaldo na Convenção nº 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), nos artigos 7º, XXII, 196 e 225 da Constituição da República e 157, I, da CLT. Cumpre ao empregador adotar as medidas necessárias à segurança de seus empregados para o combate à disseminação da Covid-19, incluindo a realização de testes e exames na hipótese da confirmação de trabalhador contaminado. Tal obrigação é dimensão da função social de que se reveste a empresa à luz do princípio da livre iniciativa conjugado com o princípio maior do Estado de Direito que é o da preservação da vida humana, mormente quando os empregados da reclamada são chamados a dar continuidade a serviços essenciais à população em meio a uma crise sanitária da magnitude da que estamos vivenciando. É a preservação da vida o bem maior do Estado de Direito, cuja proteção não pode ser minimizada ou negligenciada.
RELATÓRIO
Inconformado com os termos da sentença (ID ff1a8f8), que julgou Procedente em Parte a ação civil pública, recorre ordinariamente o Sindicato reclamante com as razões expressas no ID 22fec9f, em que se insurge quanto à improcedência dos pedidos de condenação da reclamada a proceder à testagem de todos os empregados do CDD Água Branca sempre que algum empregado em atividade nesta unidade for contaminado pela COVID-19 e emissão de CAT para trabalhadores que tenham sido contaminados. Tempestividade observada. Contrarrazões através do ID cf6ccaa.
A reclamada recorre com as razões expressas no ID 7bfee13 em que, em preliminar alega nulidade da sentença; no mérito se insurge quanto ao decidido acerca da determinação de liberação do trabalho presencial de todos os empregados que trabalhem na unidade na hipótese de confirmação de caso com testagem positiva para COVID-19. Preparo dispensado. Tempestividade observada. Contrarrazões através do ID be3e494.
O Parecer do D. Representante do Ministério Público está no ID b84919a e é pelo provimento do recurso do Sindicato autor e pelo não provimento do recurso da reclamada.
Intimados acerca de documentos colacionados pela reclamada em contrarrazões, o Sindicato autor se manifestou através do ID 10e471e e o D. Representante do Ministério Público através do ID 020467c.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
VOTO
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT é empresa pública federal instituída pelo Decreto-Lei nº 509/69. Trata-se de empresa pública pertencente à Administração Pública Indireta da União, com regime jurídico de direito privado.
O artigo 173, §1º, da Constituição Federal prevê que as empresas públicas e as sociedades de economia mista sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal, em diversas decisões consignou que a ECT se equipara à Fazenda Pública, entendendo que o artigo 12 do Decreto-Lei 509/69 foi recepcionado pela Constituição Federal e prevê tal condição.
Considerando-se que consta no polo passivo um ente da administração pública indireta (equiparado à Fazenda Pública), há recurso "ex officio", sendo conhecido, nos termos do artigo 475, §2º, do CPC, e porque o valor da condenação foi arbitrado e é ilíquido (Súmula nº 490 do STJ).
Destarte, proceda-se à retificação da autuação para constar também o recurso "ex officio".
Conhece-se, pois, dos recursos, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.
Conhece-se do documento colacionado em contrarrazões, porque se cuida de versão atualizada do Protocolo de Medidas de Proteção ao Covid-19 emitido pela reclamada, tratando-se de documento superveniente.
V O T O
RECURSO DA RECLAMADA E "EX OFFICIO"
NULIDADE - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO
Alega a recorrente nulidade da sentença por ausência de fundamentação.
A sentença está fundamentada e foi respeitado o contraditório e a ampla defesa.
A questão relacionada ao acerto ou não do quanto decidido é matéria de mérito e com ele será analisada.
Rejeita-se.
OBRIGAÇÃO DE FAZER - MEDIDAS PROFILÁTICAS - CRISE SANITÁRIA - COVID-19
A reclamada insurge-se quanto à condenação ao cumprimento de obrigações de fazer relacionadas à contaminação de seus empregados pelo vírus Sars-Cov-2, o coronavírus.
Alega que elaborou Protocolos de Medidas de Proteção à Covid-19 que vêm sido adotados com eficiência e rigor.
Assevera que os empregados que tiveram confirmação de contaminação pelo coronavírus foram liberados e foi realizada a higienização da unidade após a confirmação dos casos, sem notificação de novos casos.
Sustenta que a determinação de fechamento da unidade ou afastamento dos empregados como medida punitiva em caso de descumprimento da decisão findará por prejudicar toda a comunidade que se beneficia dos serviços essenciais prestados na Unidade Água Branca.
Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Sindicato dos Empregados da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos das Regiões Operacionais de São Paulo e Região - Unidade Água Branca.
Narrou o Sindicato na inicial que a reclamada não está cumprindo todas as medidas sanitárias a fim de evitar a contaminação de seus empregados pela Covid-19, na unidade da reclamada denominada CDD Água Branca, unidade dos Correios que possui cerca de 80 funcionários.
Asseverou que há casos suspeitos e confirmados de empregados contaminados, sem que a reclamada proceda à emissão de CATs e sem determinar a liberação de todos os empregados da unidade para o trabalho remoto por 15 dias.
Alegou que o primeiro Protocolo de Medidas de Prevenção adotado pela empresa foi alterado e emitido novo protocolo que passou a prever que apenas os empregados que trabalharam no raio de dois metros do empregado contaminado cumpririam medidas de isolamento.
A reclamada em defesa sustentou que cumpriu todos os procedimentos previstos no Plano de Ação Geral de Prevenção da Covid-19.
A sentença determinou a liberação do trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração, de todos os empregados que laboram no CDD Água Branca em caso de entrega de atestado de caso confirmado pela COVID-19 nesta unidade, por 15 dias, com a possibilidade de retorno antecipado se for realizado exame laboratorial que descarte a doença e se estiverem assintomáticos por mais de 72 horas; abstenção de se exigir trabalho presencial desses trabalhadores enquanto não exauridos os prazos fixados, sob pena de multa de R$ 50.000,00 por trabalhador nessa condição e honorários advocatícios.
Pois bem.
A crise sanitária provocada pela Covid-19 demandou tomada de medidas circunstanciais e sem precedentes repercutindo sobremaneira no cotidiano de todos nós.
E o que se vê hoje, transcorridos mais de 12 meses do registro do primeiro caso de infecção no Brasil, é que a pandemia persiste e, infelizmente, em nosso país, está em escalada, agravando-se a cada dia, com registro de 487.401 vidas ceifadas pela doença (www.covid.saude.gov.br, último acesso em 14/06/2021, às 15h44).
O arcabouço normativo que visa estabelecer mecanismos que assegurem o direito a um ambiente de trabalho hígido, com observância de medidas que visem reduzir riscos à saúde em prestígio à segurança dos trabalhadores encontra respaldo na Convenção nº 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), nos artigos 7º, XXII, 196 e 225 da Constituição da República e 157, I, da CLT.
O objetivo de tais normas é garantir a proteção à vida, a higidez física e mental dos trabalhadores, com a finalidade última de se conferir concreção ao princípio vetor do Estado Democrático de Direito que é a salvaguarda da dignidade da pessoa humana.
E, para tanto, a empresa é chamada a cumprir a sua função social, constitucionalmente prevista, e agir como agente transformador da sociedade, o que só é alcançado quando alia interesses econômicos com os princípios preconizados pela Constituição Federal relacionados com a solidariedade, a justiça social, o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana.
No Brasil, a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do vírus Sars-Cov-2, foi decretada pelo Ministro da Saúde, em 03/02/2020, através da Lei nº 13.979/20. Após, o Decreto Legislativo nº 06, de 20/03/2020 reconheceu o estado de calamidade pública no país.
Diante desse cenário, sobreleva-se a necessidade de ampliação dos cuidados para preservação da higidez física dos trabalhadores.
A não observância das medidas sanitárias que visam diminuir os riscos de contaminação pelo coronavírus configura violação ao artigo 3º da Lei nº 13.979/20 e ao artigo 268, do Código Penal.
A Portaria Conjunta nº 20, de 18 de junho de 2020, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, que estabelece medidas a serem observadas visando à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 em ambientes de trabalho determinou:
"Art. 1º Aprovar, na forma prevista no Anexo I desta Portaria, as medidas necessárias a serem observadas pelas organizações visando à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 em ambientes de trabalho, de forma a preservar a segurança e a saúde dos trabalhadores, os empregos e a atividade econômica.
§ 1º As medidas previstas nesta portaria não se aplicam aos serviços de saúde, para os quais devem ser observadas as orientações e regulamentações específicas, e poderão ser revistas ou atualizadas por meio de portaria conjunta, a qualquer momento em razão dos avanços no conhecimento e controle da pandemia.
§ 2º O disposto nessa Portaria não determina ou autoriza a abertura de estabelecimentos, apenas apresenta conjunto de disposições a serem observadas por aqueles que se encontrarem em funcionamento.
(omissis)
2.5 A organização deve afastar imediatamente os trabalhadores das atividades laborais presenciais, por quatorze dias, nas seguintes situações:
a) casos confirmados da COVID-19;
b) casos suspeitos da COVID-19;
c) contatantes de casos confirmados da COVID-19.
2.5.1 O período de afastamento dos contatantes de caso confirmado da COVID-19 deve ser contado a partir do último dia de contato entre os contatantes e o caso confirmado..
2.5.2 Os trabalhadores afastados considerados casos suspeitos poderão retornar às suas atividades laborais presenciais antes do período determinado de afastamento quando: a) exame laboratorial descartar a COVID-19, de acordo com as orientações do Ministério da Saúde; e b) estiverem assintomáticos por mais de 72 horas."(g.n)
No âmbito da reclamada, a primeira versão do Protocolo de Medidas de Prevenção ao Coronavírus, de 24/03/2020 estava alinhado à Portaria 20/20, pois estabeleceu que uma vez identificado algum caso confirmado de trabalhador contaminado pelo coronavírus na respectiva unidade de trabalho seriam liberados todos os demais empregados dessa unidade por 15 dias para a realização de trabalho remoto (ID 8331a40):
"6.2 Gestor
a) Em caso do empregado comunicar sintomas da COVID-19, o gestor deverá liberá-lo imediatamente, para trabalho remoto;
b) Uma vez identificado caso confirmado na unidade de trabalho, liberar os empregados da unidade por 15 dias para realização de trabalho remoto."
Após, a reclamada editou protocolos sucessivos e alterou de forma substancial as medidas preventivas de modo desfavorável aos trabalhadores, como se observa abaixo na versão subsequente ao primeiro protocolo supra reproduzido (ID 04c0784):
"6.2 Gestor
b) Uma vez identificado caso confirmado na unidade de trabalho, liberar os demais empregados que trabalham no raio de 2 metros de proximidade, por 15 dias, para realização de trabalho remoto."
Entende-se que a alteração promovida não pode prevalecer porque é dissonante com as orientações gerais estabelecidas pela Portaria Conjunta nº 20/20, do Ministério da Saúde, que visam à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 nos ambientes de trabalho.
De se obtemperar que a prova oral produzida revela que na unidade Água Branca os funcionários se movimentam de forma muito próxima, cerca de um metro e 20 cm de distância, e não houve afastamento de empregado que esteve em contato com empregado contaminado, como confessou o preposto:
"que o local é uma área operacional em que as pessoas se movimentam muito com proximidade e não se recorda de qualquer pessoa que tenha sido afastada em razão dessa proximidade;... que o espaçamento não permite o distanciamento chegar a 02 metros, estimando que chega por volta de 01 metro e 20cm'.
Assim, quanto à determinação de liberação para trabalho remoto de todos os empregados da unidade quando da apresentação de atestado confirmando empregado contaminado pela COVID-19, na Unidade Água Branca, correta a decisão, eis que em consonância com as diretrizes traçadas na Portaria nº 20/20 e com a primeira versão do Protocolo adotado pela reclamada constante do ID 8331a40.
Nega-se provimento ao recurso da reclamada, no particular.
RECURSO DO SINDICATO AUTOR
TESTAGEM
O Sindicato autor não se conforma com a improcedência do pedido de condenação da reclamada a proceder à testagem de todos os empregados do CDD Água Branca sempre que algum trabalhador que esteja em atividade nesta unidade apresentar diagnóstico positivo para a Covid-19.
O artigo 3º, da Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus estabelece, dentre as medidas para a contenção da doença, a realização de exames médicos e testes laboratoriais:
"Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)
I - isolamento;
II - quarentena;
III - determinação de realização compulsória de:
a) exames médicos;
b) testes laboratoriais;
c) coleta de amostras clínicas;
d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou
e) tratamentos médicos específicos;"
O art. 3º-J da citada lei, com a redação conferida pela Lei nº 14.023/2020, estabelece:
"o poder público e os empregadores ou contratantes adotarão, imediatamente, medidas para preservar a saúde e a vida de todos os profissionais considerados essenciais ao controle de doenças e à manutenção da ordem pública."
O parágrafo primeiro, do referido artigo enumera os profissionais essenciais ao controle de doenças e à manutenção da ordem pública e, no inciso XXX, faz menção a outros profissionais:
"outros profissionais que trabalhem ou sejam convocados a trabalhar nas unidades de saúde durante o período de isolamento social ou que tenham contato com pessoas ou com materiais que ofereçam risco de contaminação pelo novo coronavírus."
Já o Decreto nº 10.282, de 20/03/2020, que regulamenta a Lei 13.979/2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais, inclui os serviços postais (art. 3º, §1º, inciso XXI) e, no §7º, determina:
"Na execução dos serviços públicos e das atividades essenciais de que trata este artigo devem ser adotadas todas as cautelas para redução da transmissibilidade da covid -19."
Mas não é só.
O artigo 168 da CLT dispõe expressamente acerca da realização obrigatória dos exames médicos a cargo do empregador:
"Art. 168 - Será obrigatório exame médico, por conta do empregador, nas condições estabelecidas neste artigo e nas instruções complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho:
I - a admissão;
II - na demissão;
III - periodicamente.
§ 1º - O Ministério do Trabalho baixará instruções relativas aos casos em que serão exigíveis exames:
a) por ocasião da demissão;
b) complementares.
§ 2º - Outros exames complementares poderão ser exigidos, a critério médico, para apuração da capacidade ou aptidão física e mental do empregado para a função que deva exercer."
E, ainda, a Norma Regulamentadora 7 estabelece que compete ao empregador custear sem ônus para o empregado todos os procedimentos relacionados ao PCMSO (item 7.4.1, "b").
O arcabouço normativo citado permite inferir que cumpre ao empregador adotar as medidas necessárias à segurança de seus empregados para o combate à disseminação da Covid-19, incluindo a realização de testes e exames.
Tal obrigação é dimensão da função social de que se reveste a empresa à luz do princípio da livre iniciativa conjugado com o princípio maior do Estado de Direito que é o da preservação da vida humana, mormente quando os empregados da reclamada são chamados a dar continuidade a serviços essenciais à população em meio a uma crise sanitária da magnitude da que estamos vivenciando.
É a preservação da vida o bem maior do Estado de Direito, cuja proteção não pode ser minimizada ou negligenciada.
Nesse sentido é a decisão do C. TST, nos autos do processo nº 1000350-48.2020.5.00.0000:
"AGRAVO INTERNO - SUSPENSÃO DE SEGURANÇA (SSCiv) - PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR INDEFERIDO - DECISÃO LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA DECISÃO DE VARA DO TRABALHO QUE INDEFERIU PEDIDO LIMINAR EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA - FORNECIMENTO PRIORITÁRIO DE TESTES PARA DETECÇÃO DA COVID-19 A ENFERMEIROS - AUSÊNCIA DE RISCO DE GRAVE LESÃO À ECONOMIA E SAÚDE PÚBLICAS 1. A determinação de imediata e prioritária disponibilização a enfermeiros de testes para detecção do novo coronavírus e a imposição de multa em caso de descumprimento são medidas que estão de acordo com a norma constitucional (arts. 1°, III e IV, 6°, 7°, XXII, 196 e 200, II), legal (CLT, art. 157, I) e infralegal (Decreto n° 10.282/20, art. 3°, § 7°). Não há violação à ordem, economia e saúde públicas. 2. A pretensão de que esta Corte Superior se manifeste sobre o mérito da controvérsia relativa ao processo principal não se coaduna com a via estreita das medidas de suspensão. 3. Diante da ausência de qualquer comprovação de que a decisão impugnada gere risco de lesão à economia, ordem e saúde públicas, deve ser mantido o indeferimento do pedido de suspensão. Agravo Interno a que se nega provimento. PROCESSO Nº TST-SSCiv-1000350-48.2020.5.00.0000. Relatora Min. MARIA CRISTINA IRIGOYEN PEDUZZI."
Dá-se provimento ao recurso para determinar que a reclamada proceda à testagem dos empregados da CDC - Unidade Água Branca na hipótese de constatação de empregado contaminado pelo coronavírus que tenha prestado serviço presencial na unidade, durante o estado de calamidade, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, por trabalhador atingido, limitado a R$ 100.000,00.
Reforma-se.
EMISSÃO DE CAT
Insurge-se ainda quanto ao indeferimento da determinação de emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT, para casos confirmados.
Quanto ao inconformismo do Sindicato autor quanto à improcedência do pedido de emissão automática de CATs para os casos de contaminação confirmada, merece reforma a decisão.
O artigo 29 da Medida Provisória nº 927/2020 assim estabelecia:
Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
Mas, o E. Supremo Tribunal Federal suspendeu a eficácia do art. 29 da Medida Provisória nº 927/2020 ao analisar pedido de concessão de liminar requerida no bojo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 6352.
A referida decisão do E. STF alinha-se ao quanto disposto no artigo 20, §1º, "d", da Lei nº 8.213/91, que ao tratar de doença endêmica não considerada como doença do trabalho, excepciona a "resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho".
Nesse sentido, convém pontuar ainda que o art. 169 da CLT dispõe ser obrigatória a notificação das doenças profissionais e das produzidas em virtude de condições especiais de trabalho, "comprovada ou objeto de suspeita".
Por fim, ressalta-se que a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho publicou, em 11 de dezembro de 2020, Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME dispondo acerca das normas apropriadas, na esfera do Regime Geral de Previdência Social, para o correto diagnóstico entre o trabalho e a COVID-19 para fins de concessão de benefícios como doença ocupacional, a sinalizar que a COVID-19 pode ser reconhecida como doença ocupacional pelo INSS, aplicando-se no particular o disposto no § 2º, do artigo 20, da Lei nº 8.213/91.
Para maior elucidação transcreve-se a conclusão da referida nota técnica:
"Ante o exposto, resta evidenciado que "à luz das disposições da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, a depender do contexto fático, a covid-19 pode ser reconhecida como doença ocupacional, aplicando-se na espécie o disposto no § 2º do mesmo artigo 20, quando a doença resultar das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relacionar diretamente; podendo se constituir ainda num acidente de trabalho por doença equiparada, na hipótese em que a doença seja proveniente de contaminação acidental do empregado pelo vírus SARS-CoV-2 no exercício de sua atividade (artigo 21, inciso III, Lei nº 8.213, de 1991); em qualquer dessas hipóteses, entretanto, será a Perícia Médica Federal que deverá caracterizar tecnicamente a identificação do nexo causal entre o trabalho e o agravo, não militando em favor do empregado, a princípio, presunção legal de que a contaminação constitua-se em doença ocupacional."
Nesse passo, entende-se que no caso de empregados diagnosticados com COVID-19, em razão do desenvolvimento de atividades presenciais consideradas essenciais durante o estado de calamidade, faz-se obrigatória a emissão de CAT, nos termos do art. 336 do Decreto nº 3.048/99, a fim de que o INSS efetue o correspondente enquadramento.
Por todo o exposto, reforma-se para determinar que a reclamada proceda à emissão de CAT, nos termos do art. 336 do Decreto nº 3.048/99, em casos confirmados de empregados contaminados pela COVID-19, quando o empregado contaminado tenha realizado atividades presenciais, durante o estado de calamidade, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, por trabalhador atingido, limitado a R$ 100.000,00.
Dá-se provimento.
"EX OFFICIO"
ASTREINTES
A Origem determinou que a reclamada se abstenha de exigir o trabalho presencial dos trabalhadores da Unidade Água Branca em caso de confirmação de empregado contaminado na unidade durante os prazos fixados, sob pena de multa de R$ 50.000,00, por trabalhador nessa condição.
A fixação de multa por descumprimento de obrigação de não fazer é legítima forma de conferir concreção à tutela jurisdicional.
Na hipótese, contudo o valor é excessivo, eis que tendo em conta a narrativa da inicial de que na Unidade Água Branca se ativam cerca de 80 trabalhadores, a multa poderia atingir a cifra de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais).
Dá-se provimento ao recurso "ex officio" para reduzir a imposição de multa por descumprimento à obrigação de não fazer no importe de R$ 5.000,00, por trabalhador nessa condição.
Reforma-se.
ANTE O EXPOSTO, ACORDAM os Magistrados integrantes da 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em: Por unanimidade de votos, CONHECER dos recursos interpostos, REJEITAR a preliminar de nulidade suscitada pela reclamada e, no mérito NEGAR PROVIMENTO ao recurso, DAR PROVIMENTO ao recurso do autor para a) determinar que a reclamada proceda à testagem de todos os empregados da CDD - Unidade Água Branca na hipótese de constatação de empregado contaminado pelo Sars-Cov-2 que tenha prestado serviço presencial na unidade, durante o estado de calamidade, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, por trabalhador atingido, limitado a R$ 100.000,00, e b) determinar que a reclamada proceda à emissão de CAT, nos termos do art. 336 do Decreto nº 3.048/99, em casos confirmados de empregados contaminados pela COVID-19, quando o empregado contaminado tenha realizado atividades presenciais, durante o estado de calamidade, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, por trabalhador atingido, limitado a R$ 100.000,00, e DAR PROVIMENTO ao recurso "ex officio" para reduzir a imposição de multa por descumprimento à obrigação de não fazer para o importe de R$ 5.000,00, por trabalhador nessa condição, mantida no mais a sentença.
Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Desembargador ALVARO ALVES NÔGA.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. ÁLVARO ALVES NÔGA (relator), IVETE BERNARDES VIEIRA DE SOUZA (revisora) e CARLOS ROBERTO HUSEK (3º votante).
Presente o ilustre representante do Ministério Público do Trabalho.
Sustentação Oral: Fabrício Máximo Ramalho
ALVARO ALVES NÔGA
Relator
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