DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO Revista aos empregados

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Acordãos na integra

TST - Emmanoel Pereira



A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais desta Corte tem como pacificado o entendimento de que a fiscalização do conteúdo de bolsas, mochilas e pertences pessoais dos empregados, indiscriminadamente e sem qualquer contato físico, não caracteriza ofensa à honra ou à intimidade do trabalhador, capaz de gerar dano moral passível de reparação. Na hipótese dos autos, o Regional assevera que o dano decorreu especificamente "da revista de bolsas e sacolas, realizada sem qualquer abuso" e que recaía apenas sobre os empregados. Em tal contexto, não se verifica conduta abusiva, ilícita ou excesso perpetrado pela empregadora, mas sim, ato que decorre do poder diretivo e fiscalizador do empregador, não havendo falar em danos morais. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-76-42.2016.5.05.0311, Emmanoel Pereira, DEJT 29.03.19).



RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES PESSOAIS. INDENIZAÇÃO.

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais desta Corte tem como pacificado o entendimento de que a fiscalização do conteúdo de bolsas, mochilas e pertences pessoais dos empregados, indiscriminadamente e sem qualquer contato físico, não caracteriza ofensa à honra ou à intimidade do trabalhador, capaz de gerar dano moral passível de reparação. Na hipótese dos autos, o Regional assevera que o dano decorreu especificamente "da revista de bolsas e sacolas, realizada sem qualquer abuso" e que recaía apenas sobre os empregados. Em tal contexto, não se verifica conduta abusiva, ilícita ou excesso perpetrado pela empregadora, mas sim, ato que decorre do poder diretivo e fiscalizador do empregador, não havendo falar em danos morais. Precedentes.

Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-76-42.2016.5.05.0311, Emmanoel Pereira, DEJT 29.03.19).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-76-42.2016.5.05.0311, em que é Recorrente LOJAS AMERICANAS S.A. e Recorrida CARLA PATRICIA GOMES DE OLIVEIRA.

O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, na fração de interesse, manteve a sentença quanto à condenação em danos morais decorrentes de revista de bolsas e pertences dos seus empregados.

A reclamada interpôs recurso de revista, com fulcro no artigo 896, "a" e "c", da CLT.

O apelo foi admitido pela Presidência da Corte Regional quanto ao tema "responsabilidade civil do empregador – empregado – indenização por dano moral – revistas íntimas – pertences".

Contrarrazões não foram apresentadas.

Não houve remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

I – CONHECIMENTO.

Atendidos os pressupostos comuns de admissibilidade do recurso de revista, passa-se ao exame dos pressupostos específicos.

DANO MORAL. REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES PESSOAIS. INDENIZAÇÃO.

O Tribunal Regional consignou os seguintes fundamentos:

REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

Investe ainda a recorrente contra a sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais em razão de realizar revistas de bolsas e mochilas de seus empregados ao final da jornada de trabalho.

Atesta que tal entendimento significa restrição do seu poder diretivo e direito de fiscalização, inclusive porque não existe nos autos qualquer prova de que a revista fosse feita de forma a proporcionar aos empregados qualquer tipo de constrangimento, ocorrendo indistintamente e por amostragem e consistindo, "unicamente, na verificação do interior das bolsas, mochilas e sacolas dos empregados ao final do expediente de trabalho".

Acaso mantida a condenação, pugna pela redução do montante indenizatório de R$10.000,00, o qual atestou excessivo e desproporcional.

Trata-se de discussão acerca da existência de danos morais decorrentes da revista de bolsas e sacolas, realizada sem qualquer abuso.

Aqui vale invocar o art. 373-A, inc. IV da CLT, que veda a realização de revista íntima nas empregadas. E, embora se tenha a expressão 'revista íntima', esta não deve ser considerada no seu sentido literal, mas sim teleológico, na medida em que busca preservar a intimidade da mulher (e aos homens, obviamente) como um todo e não apenas no seu aspecto físico, mas também na esfera psicológica.

Lembro que a 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho1, realizada no ano de 2007, aprovou o Enunciado nº 15 sobre revista de empregado no sentido de ser expressamente proibido qualquer espécie de revista pessoal para ambos os sexos, in verbis:

I - REVISTA. ILICITUDE. Toda e qualquer revista, íntima ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade do trabalhador.

II - REVISTA ÍNTIMA - VEDAÇÃO A AMBOS OS SEXOS. A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens em face da igualdade entre os sexos inscrita no art. 5º, inc. I, da Constituição da República. (www.anamatra.org.br/jornada)

Como bem destacado pelo Ministro Cláudio Brandão "Toda revista, seja íntima ou não, promove uma devassa na vida privada do indivíduo. A dignidade do ser humano é composta de atributos da personalidade e da individualidade".

E aqui, é importante protegermos os atributos da personalidade humana, incorporados ao art. 5º, X, da Carta Constitucional, que caracteriza o direito subjetivo constitucional à dignidade. A sua violação deve ser objeto de reparação, forte no princípio da reparação integral seja patrimonial ou moral.

O direito à intimidade engloba objetos de uso pessoal, já que não cabe a ninguém saber o que uma pessoa carrega dentre os seus pertences, mormente quando as jornadas de trabalho duram, em regra, oito horas, 1/3 da duração do dia, o que impõe trazer consigo objetos que lhe convém.

Diz Alice Monteiro de Barros que:

não é o fato de um empregado encontrar-se subordinado ao empregador ou de deter este último o poder diretivo que irá justificar a ineficácia da tutela à intimidade no local de trabalho, do contrário, haveria degeneração da subordinação jurídica em um estado de sujeição do empregado.

Muito já foi debatido e votos brilhantes foram proferidos em defesa da dignidade da pessoa humana, sobretudo do trabalhador que se submete a situações humilhantes e degradantes, ainda nos dias atuais, ao ter tolhida a sua liberdade de dispor sobre os seus pertences.

E não se argumente que o patrimônio deve ser protegido, porque este já foi colocado em 2º plano pela Carta Magna, dando relevo ao centro de todo arcabouço jurídico que é o SER HUMANO. Sem mencionar que os avanços tecnológicos possibilitam as formas mais criativas de controle e fiscalização de patrimônio.

Portanto, autorizar a revista pessoal nada mais seria do que transferir para o sujeito privado prerrogativa somente assegurada à autoridade pública nos casos expressamente previstos em lei, o que não se verifica na hipótese.

E, no caso concreto, a revista recaía apenas sobre os empregados, estando os clientes isentos de tal fiscalização, o que já demonstra, no mínimo, desconfiança do empregador em relação aos seus trabalhadores.

Diante desta conduta ilícita do empregador, é inexorável a mácula que produz na esfera íntima do trabalhador.

Deve-se salientar que, no caso, o dano moral independe de prova, porque a respectiva percepção decorre do senso comum. O sofrimento atinge o ser, descabendo a sua mensuração por outrem, vez que tem natureza subjetiva. Entretanto, esse sofrimento configura dano moral indenizável. Constatada a presença do ato ilícito (ato culposo), ensejando um dano moral (ofensa à honra subjetiva da empregada) e o nexo causal entre o ato praticado e o prejuízo sofrido, a reclamada deve reparar o dano, na forma dos arts. 186, 927 e 942 e seguintes, do Código Civil.

Este posicionamento, inclusive, se coaduna com o IUJ apreciado pelo Pleno deste Regional, dando ensejo à edição da Súmula:

SÚMULA TRT5 Nº 22 - "REVISTA PESSOAL. PERTENCES DO EMPREGADO. I - É ilícito ao empregador realizar revista pessoal em pertences do empregado. II - A prática da revista em pertences do empregado, sejam bolsas, sacolas, carteiras, mochilas ou qualquer outro acessório que ele porte, configura violação ao direito fundamental de proteção à intimidade e à dignidade humana (Art. 1º, III, e incisos II e X do art. 5º da CF/88), acarretando dano de natureza moral."

(Resolução Administrativa nº 0075/2015 - Divulgada no Diário Eletrônico do TRT da 5ª Região, edições de 18, 19 e 20.01.2016, de acordo com o disposto no art. 187-B do Regimento Interno do TRT da 5ª Região)

Diante do exposto, mantenho a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

Quanto ao montante indenizatório dos danos morais, urge frisar que a legislação não estabelece critérios objetivos para a fixação do valor da indenização, tendo em vista o subjetivismo próprio ao dano moral e a lesão a direito de natureza não patrimonial, possibilitando o ordenamento jurídico a sua estimativa por arbitramento judicial.

Contudo, o STJ estabeleceu critérios que servem de orientação ao julgador, os quais adoto diante do caso concreto, quais sejam: arbitramento com moderação e razoabilidade; proporcionalidade ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico da vítima e ao porte econômico do réu; atenção à realidade e às circunstâncias do caso concreto, valendo-se da experiência e do bom senso.

Destarte, levando-se em consideração os aspectos acima mencionados, entendo que o montante fixado em primeiro grau revelou-se efetivamente excessivo e desproporcional à gravidade do dano, o que impõe a sua redução para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Reformo.

A reclamada sustenta ser indevida a condenação ao dano moral, não havendo falar em abusividade na revista de bolsas e mochilas de seus empregados. Aponta violação dos artigos 944 do Código Civil, 5º, V, da Constituição Federal e transcreve arestos para demonstrar o dissenso pretoriano.

Razão assiste à reclamada.

O Tribunal Regional, ao dar parcial provimento ao recurso ordinário patronal, concluiu que a revista em bolsas e mochilas de empregados, estando isentos clientes de tal fiscalização, demonstra desconfiança do empregador em relação a seus trabalhadores, ensejando a indenização por dano moral.

Esta Corte superior, contudo, conforme pacificado pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, tem como pacificado o entendimento de que a fiscalização do conteúdo de bolsas, mochilas e pertences pessoais dos empregados, indiscriminadamente e sem qualquer contato físico, não caracteriza ofensa à honra ou à intimidade do trabalhador, capaz de gerar dano moral passível de reparação.

Como na hipótese o Regional registra que o dano decorreu especificamente "da revista de bolsas e sacolas, realizada sem qualquer abuso.", recaindo apenas sobre os empregados, não se verifica excesso perpetrado pela empregadora ao efetivar a revista de seus empregados, a ensejar o pagamento de compensação por danos morais.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

RECURSO DE EMBARGOS. REGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. RITO SUMARÍSSIMO. REVISTA VISUAL DE BOLSAS E SACOLAS. AUSÊNCIA DE CONTATO FÍSICO. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. A eg. Segunda Turma proferiu acórdão em harmonia com a jurisprudência desta Corte, ao dar provimento ao recurso de revista para julgar improcedente o pedido de indenização por dano moral, sob o fundamento de que o procedimento de revistas realizado diariamente ao fim da jornada de trabalho nos pertences pessoais de todos os empregados, sem contato físico e indiscriminadamente, insere-se no âmbito do poder diretivo e fiscalizatório do empregador, não caracterizando afronta às garantias asseguradas no art. 5º, V e X, da Constituição Federal, apta a gerar dano moral indenizável. 2. Nesse contexto, os embargos se afiguram incabíveis, nos termos do art. 894, § 2º, da CLT. Recurso de embargos de que não se conhece. (E-RR - 244200-45.2013.5.13.0009 , Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 19/10/2017, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 27/10/2017)

RECURSO DE REVISTA - LEI Nº 13.015/2014 - CPC/2015 - Instrução Normativa nº 40 do TST - REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES - AUSÊNCIA DE CONTATO FÍSICO. A revista em bolsas e sacolas dos empregados da empresa, realizada de modo impessoal, geral e sem contato físico, sem expor a sua intimidade, não submete o trabalhador a situação vexatória e não abala o princípio da presunção da boa-fé que rege as relações de trabalho. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SINDICAL. Nos termos da Súmula nº 219, I, do TST, para a condenação ao pagamento de honorários advocatícios a parte deve, concomitantemente, estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a situação de miserabilidade jurídica. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 20514-80.2015.5.04.0302 , Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 28/11/2018, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 30/11/2018)

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA APRESENTADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/14. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. REVISTA EM BOLSAS. AUSÊNCIA DE CONTATO CORPORAL OU QUALQUER EVIDÊNCIA DE CONDUTA DISCRIMINATÓRIA. Mostra-se prudente o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista, ante a provável divergência jurisprudencial. Agravo de instrumento provido. II - RECURSO DE REVISTA APRESENTADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/14. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. REVISTA EM BOLSAS. AUSÊNCIA DE CONTATO CORPORAL OU QUALQUER EVIDÊNCIA DE CONDUTA DISCRIMINATÓRIA. Esta Corte tem reiteradamente entendido que a fiscalização de bolsas, pastas e sacolas dos empregados, sem contato corporal e ausente qualquer evidência de que o ato possua natureza discriminatória, não é suficiente para, por si só, ensejar reparação por dano moral. Na hipótese, o Tribunal Regional concluiu ser devida a indenização por dano moral considerando a revista de bolsa da trabalhadora, uma vez que seria possível a fiscalização por outros meios de tecnologia, incorrendo em contrariedade ao entendimento desta Corte Superior. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 1353-43.2014.5.09.0088 , Relator Ministro: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 28/11/2018, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 30/11/2018)

Assim, no contexto específico dos autos, não se verifica conduta abusiva, ilícita ou excesso perpetrado pela empregadora, mas sim, ato que decorre do próprio poder diretivo e fiscalizador do empregador, não havendo falar em indenização por danos morais.

Conheço, pois, do recurso de revista por violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal.

II - MÉRITO

DANO MORAL. REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES PESSOAIS. INDENIZAÇÃO.

Conhecido o recurso de revista por violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal, a consequência lógica é o seu provimento para excluir da condenação o pagamento de indenização por dano moral. Afastada a condenação, despicienda a análise acerca do montante atribuído ao dano moral, tema remanescente do apelo.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal e, no mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação o pagamento de indenização por dano moral.

Brasília, 27 de março de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Emmanoel Pereira

Ministro Relator

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